Quando A Caça Vira O Caçador escrita por Padalecki, Samuel Sobral


Capítulo 18
Dezessete - Jenny


Notas iniciais do capítulo

Eu espero que tenha conseguido descreveer bem as coisas ai.... .-.
Boa leitura pra vocês seus limds.


E ME DIGAM O QUE ACHARAM DO BUNNER *---------*
o bunner, caso nao apareça lá em baixo...: https://fbcdn-sphotos-b-a.akamaihd.net/hphotos-ak-prn1/1013660_385868431519651_2041688731_n.jpg



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– Por que tenho a impressão de que eu vou perder? – Perguntou Mason, deprimido.

Revirei meus olhos para ele e andei com o bispo para a esquerda. Então sorri ameaçadoramente.

– Cheque. – Falei, suspirando como se aquele jogo de xadrez estivesse absurdamente tedioso.

– Quando foi que ficou tão inteligente? – Perguntou Mason enquanto coçava seu queixo e olhava fixamente para o meu Rei.

Havíamos começado o treinamento à uma semana, e era a coisa mais impressionante que eu já vira e fizera na vida. Descobri-me tão ágil quanto Mason, quando treinada, devido ao fato de ser líder de torcida. E minhas habilidades com as lâminas não estavam nada ruins também, embora eu ainda não conseguisse acertar todos os alvos. E meus reflexos estavam melhorando. Mas... o que realmente estava fazendo a diferença era o modo como meu cérebro estava começando a trabalhar.

É algo quase inexplicável. Era como se tudo naquele novo mundo fizesse sentido e se tornasse óbvio. Ler os grandes e poeirentos livros do galpão havia se tornado uma rotina depois da escola e do treino da torcida. Eu pegava centenas deles e os lia em uma ou duas horas. E não, não estou exagerando.

Em minhas leituras diárias, eu descobrira a existência de monstros que eu não julgava ser verdadeiras. O Coringa, por exemplo, que se tratava de um ser híbrido entre metamorfos e vampiros, e que tinha o hábito horrível de “desenhar” um sorriso no rosto de suas vítimas com as próprias unhas pontudas e amarelas.

E, com minha mãe, aprendi sobre a trégua dos “Nulla Silva”, que seria “Sem floresta” em latim. O que era irônico, pois essa trégua dizia que todos os monstros que não quisessem ser mortos pelos caçadores, deviam ficar na floresta ou, no máximo, em seu perímetro, o mais longe da cidade possível. Aos que precisavam se alimentar, dizia que deviam ter a sorte de encontrar perdidos pela floresta. Um dos tópicos da trégua incluía até que o guarda-florestal da região os ajudaria com alimento uma vez à cada três meses. E também havia os animais, que eram livres para serem caçados pelos monstros.

Era essa a trégua que eu e Mason havíamos quebrado.

Mas não estou nem um pouquinho arrependida.

Mason andou com a rainha e eliminou meu cheque. Ele obtinha um sorriso maroto no rosto, era um sorriso torto, mas que, de algum modo, era mais bonito que o sorriso normal. Era como se só ele tivesse o segredo do mundo.

– Cheque. – Ele disse, olhando-me de um jeito malicioso.

Nossa rotina na escola estava surpreendendo todo mundo. Nós quase não nos desgrudávamos, e ele ficava presente – estudando, é claro – em meus treinos da torcida. Nós estudávamos juntos para as matérias na biblioteca, e passávamos o intervalo sozinhos em algum lugar, discutindo sobre como era estranho ainda não termos sido atacados.

Nessa uma semana de treinamento acirrado, havíamos feito expedições pela floresta com Rob, mas... era como se os monstros não quisessem nos encontrar. Como se eles estivessem unidos para planejar alguma coisa. Alguma coisa ruim.

Robert e Megan estavam ficando neuróticos com isso. Eles precisavam nos treinar na prática, e era por isso que eu e Mason estávamos jogando xadrez em plena madrugada na casa dele. Com Rigle me olhando ameaçadoramente de vez em quando e Beliscão empoleirado graciosamente em meus ombros.

– Prepare-se para ser aniquilado, deixou sua rainha sem defesa. Idiota. – Falei, rindo, enquanto utilizava meu bispo para derrubar sua Rainha e deixava-o de frente ao Rei.

– Não cante vitória tão cedo, Clein. – Disse ele enquanto movimentava seu Rei para uma casa ao lado.

Nós ainda não havíamos conversado sobre o nosso “quase beijo pós-quase morte”, e imagino que Mason nem tenha sequer percebido que eu quase o beijara. E também não entendo porque quase o fiz. Eu estava emocionada com toda a nossa aventura, e ele estava ficando realmente gostoso com aqueles músculos avantajados e aquele olhar de garoto malcriado.

Eu estava prestes a fazer uma jogada suicida com a minha Rainha quando escutamos um barulho vindo da cozinha, onde nossos pais estavam conversando. Parecia que eles estavam quebrando pratos lá dentro.

Eu e Mason nos encaramos com olhos arregalados e nos levantamos do sofá em uníssono, caminhando lado a lado até a cozinha. Mason suspirou fundo enquanto girava a maçaneta, fazendo suspense. Eu revirei meus olhos e o empurrei, escancarando a porta enquanto ele reclamava.

A cena que vi depois consistia em Robert segurando um dos pulsos de minha mãe enquanto ela o olhava com raiva e tentava se aproximar de um prato de porcelana que jazia em cima da pia. Quando eles nos viram, afastaram-se rapidamente. Mamãe começou a massagear seu pulso enquanto Robert resmungava.

– Está tudo bem aqui? – Perguntei com certa cautela.

Os dois se entreolharam com raiva.

– Robert não quer que investiguemos a floresta. – Resmungou minha mãe, voltando seus olhos para os meus.

Bufei.

– É perigoso! – Exclamou Robert ultrajado. – É ainda mais perigoso quando não sabemos o que está havendo entre eles! Pensem, pelo amor de Deus! Não é estranho o fato de os monstros ainda estarem tão... silenciosos? Numa época não muito distante dessa, nós já estaríamos em guerra, mas por alguma razão estranha o bastante para termos receio, eles parecem ter ignorado o aviso que vocês mandaram para eles ao matar todos aqueles Wendigos. – Ele nos olhou com raiva, mas um segundo depois ela sumiu de seus olhos.

– Wendigo? – Perguntou Mason confuso.

Então, de repente, como se eu estivesse lendo algum livro mentalmente, comecei a dizer:

– É um criatura que faz parte da mitologia do América do Norte... os Ojíbuas. – Falei calmamente, tentando ignorar o olhar surpreso de Mason. – De acordo com a mitologia, o Wendigo é formado a partir de um humano qualquer... hã... que passou muita fome durante um inverno rigoroso, e para se alimentar, comeu seus próprios companheiros. – Em meu cérebro eu tinha a visão clara do livro que lera sobre Wendigos. Como se eu estivesse com ele em minhas mãos agora. Eu citava palavra por palavra idêntica as do livro, como se eu o tivesse decorado. – Após cometer atos canibais por muito tempo, acabou se tornando esse monstro e ganhou muitas vantagens para caçar e se alimentar. Como, por exemplo, poder imitar a voz humana, escalar árvores, suportar cargas muito pesadas, e além disso tem uma inteligência sobre-humana. O Wendigo também tem a capacidade de hibernar por anos, e para suportar os invernos, estoca suas vítimas em cavernas subterrâneas onde as devora lentamente. – Mason fez uma careta de desgosto – De acordo com a mitologia indígena, para destruir um Wendigo é preciso queimá-lo, pois segundo os indígenas, o Wendigo tem um corpo sobre-humano também que lhe permite sobreviver a qualquer tipo de ferimento inconstante.

Seguiu-se um silêncio constrangedor depois disso. Um silêncio em que Megan sorria de orelha a orelha, toda orgulhosa, para mim. Seus olhos brilhavam intensamente. Robert tinha um sorrisinho torto – bem parecido com aquele do Mason – nos lábios. E Mason... bem, ele parecia derrotado, deprimido e potencialmente problemático.

– Parece que ela está tendo uma ótima professora, hein? – Riu-se Robert dando um soco amigo no ombro esquerdo de minha mãe. Então olhou para mim e piscou. – Parabéns, garota! Está provando ser mesmo um membro da família Nerd... quer dizer, Clein.

Minha mãe mostrou a língua para seu companheiro de caça e me abraçou apertado, quase me impedindo de respirar. Depois afagou minhas bochechas e bagunçou meus cabelos.

– Eu ainda não entendi por que quebrar o prato. – Disse Mason, apontando para a porcelana quebrada no chão.

Minha mãe deu de ombros.

– Eu precisava manifestar a minha raiva. – Disse ela com naturalidade.

Nós nos entreolhamos e então Mason deu de ombros com desdém.

– A questão, Robert, é que precisamos investigar esse silêncio súbito dos monstros. – Continuou minha mãe, mordendo de leve o lábio inferior. – Só Deus sabe o que eles podem estar tramando!

– Exatamente! – Tornou Robert. – Deixe que só Ele saiba por enquanto. – Então suspirou, encarando o olhar destinado de Megan. – Megan, se nós nos intrometermos, vamos morrer. Nós não temos mais força suficiente para lidar com isso. – Robert estava ficando visivelmente irritado com a situação.

Minha mãe colocou uma das mãos na curvatura da cintura e apontou o indicador da outra mão na direção em que eu e Mason permanecíamos. Ela começou a bater um dos pés com força no chão e me lembrou vagamente de um de meus ataques adolescentes quando descobri que minha banda preferida estaria fazendo um show por perto.

– Nós, não. – Disse ela. – Mas eles sim.

Robert ficou boquiaberto.

– Eles não estão nem treinados direito, pelo amor de Deus!

Foi a minha vez de colocar as mãos na curvatura da cintura e bater o pé, mas quando abri a boca para protestar, Mason levantou uma das mãos, pedindo atenção. Quando viu que todos nós estávamos olhando, enraivecidos, para ele, disse:

– Uma aula prática seria bom para testarmos nossas habilidades, pai.

Robert fez uma careta tão estranha que seria engraçada se eu não estivesse tão irritada.

– E se for exatamente isso que eles queiram que façamos? – Perguntou enquanto passava uma das mãos pelos cabelos parcialmente grisalhos. – Seria como cair numa armadilha. – Então olhou diretamente para mim. – Você e sua irritante mania de se pôr a frente desencadeou uma verdadeira guerra entre nós e eles, Jennyfer. – Fiquei tão surpresa com sua fala que não encontrei ar para falar. O mesmo acontecia com minha mãe e Mason. Robert balançou a cabeça. – E pelo que sabemos, eles estão possivelmente trabalhando juntos. Todos eles. Ir até a floresta para “pesquisar” seria o mesmo que pendurar um cartaz com os dizeres “EI, MEDROSOS, NÓS QUEREMOS GUERRA. VENHAM TODOS VOCÊS NOS MATAR. COMIDA GRÁTIS!” em neon nos nossos corpos!

Continuamos quietos por alguns segundos de surpresa. Mason se aproximou com demasiada cautela de seu pai e tocou em um de seus braços. Eles trocaram um olhar que pareceu deixar Robert um pouco mais calmo.

– Desculpe se eu quis ser uma caçadora de verdade! – Exclamei de repente, com a voz embargada. Estava fazendo força para não começar a chorar. – Desculpe se eu não quis continuar presa na gaiola de vocês!

Robert continuava olhando para os próprios pés, tentando controlar sua respiração. Minha mãe tentou se aproximar de mim, mas eu me afastei e comecei a correr. Não estava aguentando segurar mais as minhas lágrimas e não queria que ninguém, além de Beliscão, me visse chorar.

Corri até minha casa, quando sendo atropelada por um carro ao atravessar a rua. Quando entrei, corri para meu quarto e tranquei a porta.

Beliscão entrou pela janela segundos depois de eu abri-la. Ele se empoleirou dentro de sua gaiola e tomou um gole de sua água. Seus olhinhos brilhantes estavam marejados, como se ele estivesse com a mesma vontade de chorar que eu estava. E acredito que era isso mesmo.

Joguei-me em minha cama e não impedi as lágrimas de descerem.

Robert estava me acusando diretamente de ter iniciado a guerra? Sim, estava. E sim, eu realmente havia iniciado, mas eu o culpava por isso. O culpava por não querer nos treinar, por impedir que minha mãe o fizesse. Era ridículo! Se ele houvesse permitido nos treinar, nada disso teria acontecido. Se ele houvesse permitido sabermos tudo sobre os monstros, nós saberíamos sobre a trégua, e assim não a teríamos quebrado.

E pelo modo como todos haviam ficado em silêncio depois que recuperaram suas habilidades de fala, eles concordavam com Robert. Até Mason concordava com Robert! Santo Deus, ele também queria estar lá, não queria?

Soquei meu travesseiro diversas vezes, para dispersar a raiva, mas não estava adiantando. Então peguei as duas lâminas que agora carregava comigo por todos os lados. Elas eram feitas de bronze e tinham o cabo vermelho sangue. Eram chamadas de “Armadeira”, pois a dor que seu corte causava era semelhante a de uma Armadeira. E, bem, com três a quatro cortes, o monstro começava a ter alucinações devido a dor. Ai se tornava extremamente mais fácil acha-lo e mata-lo.

Eu gostava das lâminas Armadeira.

Desci as escadas, com Beliscão voando baixinho atrás de mim, e segui até a área do galpão, onde os alvos usados por mim mais cedo ainda permaneciam. Não fiquei surpresa com o fato de ninguém ter me seguido. Os três sabiam como eu ficava quando estava triste e com raiva daquele jeito. Eu não era considerada boa companhia nessas horas.

Além do mais, ou estavam tentando convencer Robert de nossa ida a floresta como aula de campo ou ainda permaneciam me acusando.

Eu não me importava.

O vento gelado bagunçou meus cabelos enquanto eu preparava os alvos. Os alvos – já perfurados e rasgados e amassados em vários lugares devido ao meu treinamento – consistiam em desenhos de monstros de papelão. Eu os espalhei pelo quintal, em todos os ângulos possíveis. Depois fui até o galpão e entrei, aspirando a poeira dos grandes livros que viviam lá, e acionei um dos botões da parede. O botão que daria vida aos meus alvos.

Fui para o quintal novamente e caminhei uma distância aceitável do alvo mais próximo.

Megan dizia que eu precisava sentir todos os músculos de meu corpo. Que eu precisava senti-los enquanto se fundiam com meus dons. Que eu precisava ter plena consciência deles.

Fechei meus olhos e senti as lâminas em minhas mãos. Senti a força que enviavam para dentro de mim, e senti o poder em estar segurando-as.

Então voltei a abrir meus olhos e tudo começou a passar em câmera lenta. O vento, o coaxar das rãs, o barulho dos carros e o canto das cigarras. O besouro a minha frente, o pardal solitário no céu e até mesmo Beliscão.

O primeiro monstro era um Metamorfo, e assim que me concentrei nele a sensação de câmera lenta passou, e todo o barulho ao meu redor pareceu ficar mais alto, me dando certa sensação de dor de cabeça, mas ignorei.

O ar a minha volta passava devagar enquanto eu corria de encontro ao primeiro alvo. Lhe dei um soco de esquerda e cravei uma das Armadeira em suas costas, cravando rapidamente a outra em seu estômago.

Passei rapidamente para o segundo alvo, um vampiro com presas sanguinolentas e um olhar assassino de arrepiar. Enquanto o perfurava no pescoço, atirei uma das lâminas na direção do Coringa mais próximo, que caiu no gramado com um baque surdo.

Parecia que eu acabara de começar, mas quando dei por mim já havia dizimado todos os alvos possíveis.

Resmunguei algo inteligível e comecei a juntar os alvos para amontoa-los devidamente dentro do galpão. Desliguei o botão que lhes dava vida e fechei as portas. Coloquei as Armadeiras presas corretamente no meu cinto especial e respirei fundo, caminhando de volta para dentro de casa enquanto Beliscão voava ao meu redor.

Ao entrar na cozinha, me deparei com Mason, Robert e Megan olhando para mim boquiabertos.

– Quê? – Perguntei grosseiramente.

Minha mãe apontou para onde eu estivera treinando.

– Você... você teve um condicionamento físico excepcional, filha. – Disse minha mãe. – Você pareceu se tornar uma extensão lâmina do mesmo modo que a lâmina se tornava uma extensão de seu corpo! – Ela bateu palmas, feliz. Então virou-se para Robert e fez cara feia. – Veja, Hyles, ela sabe o que está fazendo.

Robert pareceu lutar consigo mesmo por alguns segundos, então olhou para mim.

– Desculpe por ter dito aquilo. Foi indelicado.

Lhe fiz um gesto de desdém com uma das mãos e abri a geladeira, pegando uma garrafinha de água e dando um bom e demorado gole de seu líquido.

– Jenny. – Disse Mason. – Nós vamos para a floresta.

Fiquei tão absurdamente feliz de ouvir aquilo que acabei me engasgando com a água e tive de ser acudida pelo meu melhor amigo.

– Tudo bem, - Falei, tossindo debilmente. – Estou bem. – Sorri para Mason e ele pareceu um pouco confuso. Estava usando óculos escuros enormes por algum motivo que decidi ignorar. Mas ficou meio difícil fazê-lo quando Megan entregou um idêntico à mim. – Nós... – olhei para Mason por um segundo e então fiz uma careta. – Nós não nos tornaremos membros de um grupinho supersecreto de pais e filhos chamado “Os Insetos”, vamos? Porque, realmente...

Minha mãe revirou os olhos dramaticamente.

– São para visão noturna. Ou minha filha é um lobisomem e eu não sabia disso?

***

Caminhamos até a guarita de Robert completamente armados.

Mason e Robert levavam um arsenal de flechas em suas aljavas, e minha mãe pareceu ter pego uma lâmina de cada e as prendido em seu sinto. Eu apenas levava minhas Armadeiras. Era como... Era como se eu não conseguisse confiar em nenhuma outra lâmina que tínhamos no galpão. E havia um monte delas. Trepadeiras, Noviças, Boomerangs, Labradoras, Mortíferas – as preferidas da minha mãe -, Marolas, Momentâneas, Descartáveis e, é claro, Armadeiras.

Por insistência de Megan, acabei pegando três lâminas descartáveis e duas Momentâneas. Francamente, não via diferença entre elas. As descartáveis, como o próprio nome diz, só serviriam para um lançamento a distância, e logo depois teriam que ser descartadas. Já as momentâneas, também teriam que ser descartadas depois de usadas, mas elas decidiam a hora que seriam usadas. Brilhavam intensamente quando achavam que era o momento certo.

– Certo. – Falou Rob, ofegante. Ele usava o uniforme de guarda florestal, mas não parecia nada inofensivo. Tinha um arco de prata tamanho família em mãos, e socos ingleses em ambas das mãos. Tinha o ósculos de visão noturna pendurado no colarinho da blusa e, por algum motivo, levava uma câmera. – Essa floresta não é tão pequena quanto parece...

– Ela não parece pequena... – Comentei com desdém, mas ninguém pareceu ouvir.

–... Aqui nós somos iscas. – Continuou Robert, sério. – Precisamos tomar o máximo de cuidado, e precisamos ficar juntos. Seremos como uma matilha, certo? Não nos separaremos em hipótese alguma. – Ele colocou os óculos e pediu para que seguíssemos seu exemplo. – Só mataremos em caso de urgência, pelo menos por enquanto... e, pelo amor de Deus, não os provoquem. – Ele me olhou durante alguns segundos ao dizer isso, embora soasse um pedido não só para mim. – Estamos aqui apenas para descobrir o que estão tramando. Não queremos ser vistos, entendido?

Minha mãe resmungou alguma coisa e se apoiou em um dos cotovelos de Robert.

– Fiquem com a gente e tentem não chamar atenção. – Ela piscou. Megan usava um par de calças de linho verde escura, e uma blusa cinzenta. Botas para caminhar e o cinto de mil e uma utilidades. Com os óculos, parecia uma verdadeira adolescente sapeca. – Só resumindo o que o velhote de cem anos aqui disse. – Acrescentou ela, num sussurro.

Robert revirou os olhos.

– Vamos logo com isso.

Robert seguia na frente, nos guiando, enquanto minha mãe ia atrás da gente, nos protegendo dos futuros perigos que talvez enfrentássemos. Eu e Mason seguíamos lado a lado, mas estávamos eufóricos demais para sequer olharmos um para o outro, embora eu achasse que Mason estava mais distante que o normal. Rigle andava trotando de leve ao seu lado, e parecia querer transmitir confiança. Quanto a Beliscão, este voava pelos céus escuros e me mandava constantes mensagens de segurança.

A madrugada havia esfriado rigorosamente, e eu fiquei me perguntando como Rob e Megan pareciam não sentir frio. Eu usava uma blusa de lã bem quente, botas e calças de moletom, mas ainda sentia bastante frio. Mason usava seu suéter azul de sempre, com calças caqui e tênis para corrida, e ele parecia estar tremendo.

Talvez estivéssemos só nervosos.

Talvez.

Tentávamos fazer o mínimo de barulho possível, mas era quase impossível. A cada passo que dávamos, todo aquele barulho mínimo que estávamos fazendo se tornava máximo naquela floresta estranhamente silenciosa.

Não conseguíamos ouvir som algum vindo de dentro dela, e isso só aumentou minhas suspeitas de que estávamos sendo observados de algum lugar. Eu lera que os animais perdiam a capacidade de se mover ou de produzir sons quando sentiam que um monstro estava por perto. Até mesmo os insetos.

Eu não fazia ideia para onde estávamos indo, mas algo lá dentro de mim me fez remeter-me aos meus sonhos. A Clareira, o homem de vestes negras com a flauta... O cheiro doce que havia ao seu redor... Por que eu estava conseguindo sentir aquele cheiro? Isso queria dizer que o homem que visivelmente estava comandando os monstros realmente existia e estava por perto?

Então, naquele momento, só naquele momento, ponderei contar sobre os sonhos que estava tendo. Mas então afastei a ideia... eram só... sonhos, certo? Nada daquilo existia de verdade, não era como se eu pudesse estar vendo o que estava acontecendo. Isso realmente parecia ridículo e infantil.

Decidi não pensar e apenas prestar atenção no que estávamos fazendo.

Já havíamos feito isso algumas vezes, mas hoje a pressão era inevitável. Nossas outras aulas de campo haviam sido de dia, e próximas a guarita. Agora estávamos nos aprofundando naquele lugar de madrugada, e realmente parecia que as árvores estavam se movendo apenas para nos encurralar.

Por sorte nossos tutores sabiam o que estavam fazendo.

Foi quando escutamos o primeiro barulho.

Alto e grave, solitário e perigoso.

Um uivo.

Um chamado.

Mason ficou paralisado imediatamente e sua respiração se tornou ofegante. Robert e Megan exclamaram um palavrão baixinho, em uníssono. Eu me afastei um pouco do grupo, procurando saber de onde viera o uivo.

Megan me puxou pela orelha ao me ver bisbilhotando por trás das árvores, e depois me deu um tapa bastante dolorido no ombro esquerdo.

– Ai! – Exclamei, e recebi outro tapa.

– Fique quieta, por favor, Jens. – Pediu ela.

Resmunguei alguma coisa e controlei minha respiração. Pelo visto havíamos entrado no domínio dos lobisomens... o que, numa visão geral, não era nada bom.

Robert se abaixou calmamente e retirou uma maleta de dentro de sua aljava, o que achei impressionante. Ele e a abriu e nos revelou quatro tubos prateados. Então olhou para onde estávamos e suspirou.

– Deus sabe que não queria que isso acontecesse. – Murmurou ele, então passou um tubo para cada um de nós. Notei que eram bem pesados e davam choques elétricos bem fortinhos se você tocasse em seu topo. – São tubos de Chamadas. São chamados assim porque eles lançam frequências agudíssimas que só os lobisomens podem ouvir, chamando-os, assim, para onde queremos.

– Isso não joga para o ventilador nosso propósito de “não sermos vistos”? – Perguntou Mason arqueando uma sobrancelha.

Robert mordeu o lábio inferior ao mesmo tempo em que escutávamos um pequeno volume de uivos em uníssono. Eles estavam se aproximando. E em bando.

Mason deixou escapar um gemido de horror.

Eu sabia como ele se sentia. Nossa última experiência com um lobisomem não fora muito amigável.

Eu e ele trocamos um olhar assustado e nos aproximamos dos adultos sorrateiramente.

– Droga. – Sussurrou Robert. – Precisamos nos separar, colocar os Chamadores e lugares opostos e voltar correndo para cá rezando para chegar inteiro e vivo.

Engoli em seco.

Megan me abraçou apertado enquanto Rob e May trocavam um tímido aperto de mãos.

– Agora! – Gritou minha mãe, e começamos a correr.

Eu conseguia ver tudo normalmente, devido aos óculos, mas minha visão estava ficando embaçada. Talvez por causa do nervosismo e da pressão de morte que se instalara em meus ossos, talvez porque eu havia tropeçado e caído na lama.

É, provavelmente porque eu caíra na lama.

Mas isso não queria dizer que não havia nervosismo e pressão de morte dentro dos meus ossos.

Havia.

E muito.

Mais uivos. Um monte deles. E pareciam cada vez mais próximos.

Até que me vi em uma clareira. Mais fechada e mais sombria do que a que eu via em meus sonhos... causava extremos calafrios em mim, e eu estava tendo uma vontade insana de irromper em lágrimas.

Respira. Respira. Respira.

Vamos, Jenny, respire fundo.

Respire fundo e devagar.

Eu tentava desesperadamente controlar a tremedeira das minhas mãos e o medo que começava a me dominar. Era a primeira vez que eu me arrependia de vir a floresta caçar alguma coisa.

Então eu o ouvi.

Seus pelos arrastavam nas folhas das moitas, e suas patas pisavam com o máximo de leveza possível no solo.

Eu fiquei paralisada e não conseguia me lembrar de como mover as pernas.

O senti passando ao meu lado, para poder me olhar face a face antes de me matar. Seu pelo era de um negro esbranquiçado, se é que isso era possível, e os olhos eram... avermelhados e enigmáticos. Ele exalava perigo. Era um lobo de dois metros de altura tão negro que parecia uma sombra. Seu rosto tinha feições humanas e ele tentava andar nas patas traseiras, o que o deixava corcunda.

Me vi hipnotizada por seus olhos da cor do sangue, e comecei uma luta interna para me livrar do transe.

Enquanto isso, o lobisomem me rodeava, alongando o focinho e farejando o ar a minha volta.

Notei que eu não ficava hipnotizada quando ele não estava olhando para mim, e aproveitei o momento para pegar na lâmina mais próxima.

Contei até três mentalmente, de olhos fechados. E então... ataquei.

Infelizmente, lembrei tarde demais que lobisomens eram extremamente fortes e que geralmente meu clã os deixava com os arqueiros.

O lobisomem rosnou e arreganhou os dentes, deixando os caninos à mostra, então pegou-me pela cintura com uma só mãos e me jogou na árvore mais próxima. O impacto fez minha cabeça latejar, e senti algo quente descendo pela minha testa... e pela minha mão.

Só podia ser sangue.

Eu havia perfurado minha própria mão com uma das Armadeiras, e a dor era lancinante.

Meus óculos de visão noturno racharam-se ao meio e eu gemi de desgosto. Conseguia ver a forma escura do lobisomem, e algo me dizia que ele estava olhando para mim. Resfolegando, ele aproximou o rosto horrendo do meu e me olhou com intensidade.

Fechei os olhos antes que fosse hipnotizada novamente.

– Por favor, sua mãe não lhe ensinou que é feio brincar com a comida?

Ele resmungou algo na sua língua de monstro e virou-se de supetão para trás. Ele rosnava baixinho, de um jeito extremamente perigoso que me dava constantes calafrios na espinha.

A dor do corte de minha lâmina começava a embaçar a minha visão, mas eu sabia que havia mais lobisomens na área, e que provavelmente iam lutar pela comidinha Clein aqui.

Ah, eu estava muito ferrada.

Então tudo que eu podia escutar eram ganidos, gritos, mordidas, unhas batendo umas nas outras, unhas arranhando a carne, mais ganidos e alguns resmungos bastante humanos.

E de repente... silêncio.

Tentei me mexer, mas a dor que atingia minha cabeça e meu braço me atingiu em cheio e choraminguei. Eu estava começando a perder os sentidos.

A última coisa da qual me lembro foi de um par de mãos me arrastando pela floresta e uma dor aguda na lombar.

E então... escuridão.


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Notas finais do capítulo

E então?



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