Senti minhas bochechas queimarem, meu coração começar a bater tão rápido que iria sair pela boca. Senti uma vontade imensa de sair correndo e enterrar minha cabeça num buraco.

Ele não tinha, não mesmo, o direito de vir na minha direção sorrindo! Isso era golpe baixo com a minha pessoa!

- Cláudia! – Dona Marizete cumprimentou minha mãe e Seu Amarildo apertou as mãos do meu pai. – Helena você veio! – Ela veio e me deu um abraço.

- Mas é claro Dona... Quer dizer, Marizete! Você sabe como eu adoro seu bolo de cenoura né?

- O bolo da mamãe é mesmo o melhor. – Luan parou logo atrás de mim, ainda sorrindo. Não to dizendo? É golpe baixo! Quase tive uma síncope!

- Lu-Luan? – Tive dificuldade até de falar seu nome.

- Bom dia Dona Cláudia! – Ele me ignorou completamente me deixando com uma cara de tacho.

- Bom dia Luan! – Mamãe o abraçou como se não tivesse percebido o que ele havia acabado de fazer comigo. Coloquei minhas mãos na cintura enquanto ele abraçava papai. Enquanto os dois conversavam, perguntando como estava indo a carreira de Luan, avistei entrando pela porta o Mateus. Um grande amigo de infância que Luan só começou a gostar dele depois do 1º ano no Ensino Médio.

Luan se virou pra mim e iria falar alguma coisa quando dei alguns passos e chamei Mateus.

- Quanto tempo menino! Por onde cê anda? – Perguntei analisando-o.

- Nem me fale de tempo Helena... Isso só tá me trazendo problemas! Deixe-me ver o motivo da festa! – Nós dois demos uma gargalhada. Andei ao lado do Mateus até chegarmos ao Luan que estava parado ao lado de Dona Marizete.

- Fala Mateus! – Luan o cumprimentou. Percebi falsidade na sua voz e uma pontada de raiva por ter o deixado ali enquanto ia cumprimentar Mateus. Dei uma leve risada de satisfação.

- Então Luan, cadê a Brunéts? – Ele levantou uma de suas sobrancelhas. Nunca gostou do Mateus e eu tive uma leve impressão que Luan lhe daria um soco ali mesmo pela sua falta de vergonha na cara. – To brincando! Então Dona Marizete, teria algum copo de refrigerante por aqui?

Confesso que também não gostava muito de Mateus, esse cara me dava medo às vezes. Mas naquele momento, ele ter chegado à festa foi muito legal.

- Como foi seu show em Curitiba nesse último sábado? Cheio como sempre?

- Como sempre não né... A primeira vez foi só a metade. – E demos algumas risadas. – Foi ótimo. Minhas fãs sempre me surpreendem com a energia que elas passam.

Ele falou aquilo tão profissionalmente que pareceu que não se lembrava de mim. Eu tinha mudado tanto? Ou era só ceninha dele?

- João, por que não vamos pegar algumas bebidas? – Mamãe disse quebrando o silêncio de alguns segundos. Desejei que ela não fizesse isso...

- Eu acompanho vocês, por aqui! – Dona Marizete foi junto. Por queeeeeeeeeeee?

- Mãe! Espera ai! – Luan se virou pra ela e cochichou algo a Marizete que o olhou com uma cara incrédula. Virei meu rosto, eu estava ficando vermelha e percebi Dona Marizete olhando para mim também.

Fingi estar tossindo para chamar a atenção do Luan. Ele me olhou surpreso.

- Saúde. – Depois deu uma risada.

- Eu vi o Puff na cozinha... – Disse despreocupada com o mundo. Ele me olhou sério e depois começou a rir me levando a gargalhada também

- Você mudou Helena! Pra melhor... Quase não te reconheci quando entrou pela aquela porta. – Ele me olhou de cima abaixo me deixando roxa de vergonha.

- Brigada. – Disse tímida. – Você também mudou muito!

- To mais gostoso né? – Nós dois rimos de novo. – Quer alguma coisa? Água, refrigerante, comida...?

- Não, to bem assim! – E dei um meio sorriso pra ele. Algo rápido. Não percebi sua expressão.

Ficamos alguns segundos em silêncio e aquela timidez desapareceu como num piscar de olhos... Ele conseguia esses efeitos sobre mim.

- Pensei que já tivesse me esquecido. – Disse sincera.

- Até parece que esqueceria aquela garotinha que me fez mais feliz do que imaginava. – E ele sorriu aquele sorriso reconfortante. Aquele sorriso que te tira o ar, o chão, o mundo inteiro. Aquele sorriso de cinema que depois que o mocinho diz isso à mocinha se joga nos seus braços e tasca um beijo daqueles (tive vontade, muuuuuuuita vontade, de fazer isso). Aquele sorriso que foi capaz de despertar em mim, tudo aquilo que adormeceu há sete anos.

- Luan...

- Shiiiu! – Ele exclamou e chegou mais perto de mim. – Vem, exijo que você coma alguma coisa. Pelo menos os bolinhos de aipim que a Bruna fez. – Balancei minha cabeça. Enquanto íamos até a cozinha.

- Você ficou morto de vontade de bater no Mateus né?! – Ele deu uma gargalhada.

- Fiquei sim. Mas tenho que me controlar.

- Podia muito bem ter batido nele, seu imbecil! – Dei um soquinho no seu ombro.

- Só você pra me chamar de imbecil e eu não querer retrucar.

- Sou especial, beijos. – Disse ironicamente.

- E é mesmo. – Deu outra gargalhada. Parecia que ele havia dito aquilo quase automaticamente, como se não tivesse pensado antes. Apenas paralisei no lugar. Percebendo o que havia dito ele logo tentou concertar trocando de assunto. – Mas então... E a faculdade? Último ano né?

- Hm... É sim. – Me sentei no banquinho que havia ali e peguei um bolinho da tigela e o meu copo de refri.

Luan me olhou curioso, tomou um gole do seu e me perguntou:

- Que foi?

- Nada não. Continua ainda assanhado pra cima das suas fãs é?

- Eu já disse pra elas que estou casado com todas, tenho esse direito não? - Começamos a rir. – Eu sempre fui...

Lembrei daquele dia e ele parece ter lembrado também. Começou a tocar “A Verdade” – Fernando e Sorocaba.

- Perdeu sérios pontos comigo viu? – Fiz uma pausa tomando um gole do meu Guaraná e continuei. - Pensei que você tinha amadurecido também. – Fiz uma cara de desdém.

- Ok. Estou mais comportado... – Olhei pra ele com uma cara de “sério mesmo?” e demos uma gargalhada. - Só não conta que eu pirei, nem que eu fiquei louco. Não deixe ela saber que eu to morrendo aos poucos. Inventa a história que você quiser... Não conte a verdade. – Ele cantarolou junto com a música. Continuei:

- Eu só quero que ela se lembre dos momentos mais bonitos. Esse sofrimento é meu e não vai ser dividido. – Nos entreolhamos e soltamos sorrisos envergonhados, nessa hora Bruna entra rindo com um copo de refrigerante na mão. Mas logo ela para, ficando séria e olhando para nós como se estivesse em um transe.

- Helenaaaaaaaa! Cê veio! – Ela me abraçou. Nisso a música troca. – Opa, minha música! Sabe quando deseja algo que não tem? Imagina em sonho, quer ir mais além, mas você não tem.

- Falo ou não falo me dá um beijo? Falo ou não falo que te desejo? Falo ou não falo, eu falo agora, se não ficar comigo ser amigo só não rola. – Luan começou a dançar com Bruna e eu comecei a rir e bater palma de leve. Depois Luan me puxou também e começamos a dançar. E foi quando a música acabou que nós três nos demos conta daquele momento. Luan segurando minha cintura e eu segurando sua mão. Estávamos tão próximos que... Eu escutava sua respiração. Afastei-me rapidamente e prestei atenção na música que tocava naquele momento...

“Férias em Salvador”.

- Essa é pra chorar. – Bruna comentou pegando um de seus bolinhos de aipim e tentando distrair o ar tenso que havia ficado.

- Concordo. Essa é pra se torturar trancada no quarto...

- Vendo fotos antigas... – Ela continuou.

- Lembrando daqueles dias... – Eu continuei. Falei sem pensar. Falei automaticamente. Senti o olhar curioso de Luan sobre mim.

“A solidão não quer mais me deixar. Procuro em outros olhos encontrar o brilho seu (...). Simples detalhes de uma vida a dois. O amor ficou só que você se foi.”