A forte brisa batia em meu rosto e bagunçava meus cabelos. Fazia frio e eu pouco me importava em ir até as masmorras buscar minha capa. Sentar de frente ao Lago Negro e assistir o belo espetáculo (lêia-se: movimentos desengonçados) da Lula Gigante me relaxava.

Não havia ninguém ali a essa hora, menos ele. Todos deviam estar no Salão Principal jantando ou em seus salões comunais fazendo os deveres, menos ele. Sei que me observa. Sinto seu olhar queimando minhas costas, mas nada faço a respeito. Não sei em que lugar ele está, a distância que tem de mim, se está sentado, de pé... Apenas sei que me olha atenciosamente. Não ouso me movimentar, ele notaria meu desconforto na certa.

A quanto tempo estaria ali? Quanto tempo mais ficariamos assim?

Minutos passaram e eu ja estava me cansando disso.

– Seus amiguinhos devem estar te procurando. - falei num tom suficientemente alto para que ele escutasse.

Escutei seus passos sobre a grama vindo até mim.

– Então você sabia que eu estava aqui? - perguntou se sentando ao meu lado.

Confirmei com a cabeça.

– Por que não foi jantar?

– Precisava de um tempo pra por meus pensamentos no lugar, relaxar, sozinha.

– Se é assim, não vou te atrapalhar. Você deve estar certa: meus amigos devem estar me procurando. - ele ia se levantar, quando segurei seu pulso

– Não! Pode ficar, tá tudo bem.

– Você parece tensa... - comentou

– E estou. Recebi uma carta, de minha avó. Não vou poder passar o Natal em casa. Ela não me falou o por que... Só disse que ela e minha mãe precisavam resolver alguns problemas... Viajar pra não sei onde. Meu primeiro Natal em Hogwarts. Como é?

– Como é o que?

– Como é o Natal em Hogwarts? Você ja ficou aqui, certo?

– Ah! Bom, como poucas pessoas passam o Natal aqui, não é muito intessante, sabe? Mas o almoço do dia 25 é sempre o melhor! Me parece que os Elfos adoram cozinhar nessa época, porque a comida fica divina! Um almoço típico trouxa: Peru assado, lasanha, tortas... Não tortar iguais as nossas. Tortas trouxas, deliciosas! De frango, um ingrediente estranho, branco, e mole.. Qual o nome mesmo? Ah, sim! Palamito.

Segurei um pouco o riso. Vê-lo falar de comida é engraçado. Não é novidade que os Weasleys adoram comer, mas Ron supera todos.

Se você botar a Weasley-Fêmea ao lado dele, em uma mesa farta de comidas deliciosas, vai pensar que eles nem de longe são irmãos. A falta de educação de Ron perante a mesa me surpreende.

"Ôh bichinho que come, viu?"

Não consegui segurar mais e deitei no chão de tanto dar risada

– Do que está rindo?

Fui me recuperando aos poucos e me sentei novamente

– Como consegue? Como você consegue falar tanto de comida?

– Oras...

– Ok, já entendi. "É de comidas que estamos falando. Não tem como não tagarelar!" - engrossei a voz e tentei imitar ele

– Ei! Eu não tagarelo!

– Não mesmo. Só fala mais que a boca e mais rápido do que a Firebolt voando.

– Como mudamos de assunto tão rápido? Comentar sobre comidas é tão interessante.

– Ai meu Santo Merlin!

Silêncio. Ficamos observando a Lula Gigante por mais um tempo até que um movimento brusco dela me assustou.

Ela mergulhou e veio nadando até mais a frente, mais perto de nós, e como uma baleia - sem ofensas, Sra. Lula Gigante - ela pulou pra superficie e ao mergulhar de volta, uma grande porção de água caiu sobre mim e Ron, molhando uma grande parte de nós.

– Argh! Sua... Sua Lula Miserável! - ele gritou em meio a risadas

Sua resposta foi mais um pouco de água. A Lula levantou um de seus maiores tentaculos e chocou-o contra a a agua, assim, mais gostas voaram sobre nós.

Se antes eu estava com frio, agora eu iria pegar uma Hipotermia. Abaixei as mangas da minha camisa, mas nada me aqueci. Minhas roupas todas estavam molhadas.

Ron, percebendo minha situação, tirou sua capa e botou sobre meus ombros.

– Obrigada, mas você não vai ficar com frio?

– Shiu. Isso não importa. Se contente com o meu cavalheirismo - disse com um sorriso de canto

– Desde quando você é cavalheiro?

– Desde... Desd..Ah, fique quieta!

Soltei um riso fraco

– Melhor entrarmos.

– Ah, não. O jantar já deve estar acabando agora.

– E por isso mesmo devemos ir! Eu ainda estou com frio. Imagine você ent...

Parece que ele esperava por essa fala. Assim que disse, ele envolveu seu braço esquerdo em torno dos meus ombros me aconchegando junto a si.

Não esperava isso dele.

– O que você pensa que está fazendo? - não era pra ser, mas meu tom saiu um pouco rude. Ele, surpreso, me soltou logo em seguida

– Eu... Er.. Você disse que estava com frio e... Eu..

Ele parou assim que eu me reencostei nele novamente. Pousei minha cabeça em seu peito e ele me abraçou de lado.

Nada dissemos.

Fiquei inalando seu cheiro. Uva. Ele cheirava à uva.

Sorri disfarçadamente e soltei um pequeno suspiro quase inaudivel

– O que foi?

– Você, hum, cheira à uva.

– Deve ter sido a geléia que tinha de sobremesa hoje. Eu meio que, derrubei uma grande parte dela na minha roupa e, o cheiro deve ter impregnado.

– Isso é bom

– Derramar geléia?

– Não, o cheiro. Eu gosto de uva.

Olhei pra cima e vi sua expressão. Um misto de surpresa e felicidade.

– Tem muita coisa que você não sabe sobre mim, Ronald Weasley. - concluí

– Ôh se tem! - murmurou

– Ôh se tem...

– Eu prefiro uva verde á uva roxa, e você?

– Elas tem diferença?

– Tem muita coisa que você não sabe sobre uvas, Pansy Parkinson.

Tirei seu braço de mim e deitei em seu colo. Olhando pro céu. O céu profundo de seus olhos. Uma imensidão inigualável.

Ele também parecia me analisar atentamente. Via em seus olhos tudo o que sentia.

Entreabri minha boca em um pedido mudo. Ele entendeu o recado e se curvou em mim. Puxei-o pela nuca e encostei nossos lábios. Começou calmo até que ele pediu passagem com sua lingua.

Um beijo intenso, voraz e cheio de sentimentos desconhecidos.

Doces e macios lábios.

Culpa da mísera geléia de uva.