Voltamos para casa rapidamente. Falamos com Marie e Carl, que ficaram muito felizes pelos poderes raros. Eu, mais do que tudo, queria testar o meu poder. Queria ver se eu podia fazer maremotos e tsunamis... Era tão mágico. Sem falar que eu tinha acabado de descobrir que existia uma bruxa do destino, não que eu devesse ficar pasma com isso. O mundo em que eu vivia era uma farsa, como era tudo tão escondido? Como eu sempre vivi achando que o Maximo de magia que podia existir era viajar pelo mundo inteiro? Além do mais, ninguém viajou o mundo inteiro, porque se esqueceram de Harvel, o reino de Colibri. Como era estranho ver que eu vivi tão presa a uma tediosa e chata realidade que só passava de mentiras? Lembrar que um dia você disse a alguém que fadas não existem, sendo que elas moram no reino de Arpis? Um imenso mundo estava lá fora, e não falo da Terra, falo do mundo das fadas, das sereias e dos vampiros. E eu iria explorá-lo.

      Naquela noite, a casa estava muito vazia e silenciosa. Marie e Carl haviam ido caçar. Só estava Jaden, Hill e eu. Sentados ao sofá, assistindo uma série que nunca ouvimos falar. Na verdade riamos das situações estranhas do cotidiano dos atores. Na verdade eles riam, eu os acompanhava quando achava necessário. Minha mente num lugar longe dali, levando tudo de novo a aquela realidade chata.

      Eu nunca fui a principal, ninguém antes pensou em mim com tanta importância. Eu não sabia direito se eu era a culpada disso. Não me misturava, em festas ficava no canto. Ninguém da minha família me dava presentes, algumas vezes minha mãe me dava. Eu sempre me virei muito bem sozinha. E, para dizer a verdade, minha mãe nunca viu meus primeiros passos. Ela não tem nenhuma foto comigo bebê. Sarah sempre foi a estrela. Para mim era demais ter alguém que se importasse com o que eu pensasse, que tivesse que fazer alguns sacrificios para viver comigo.

      Jaden virou para mim bruscamente.

      -O que foi Alice? Está meio inquieta... – Observou ele.

      Hillary olhou para mim com entusiasmo.

      -Isso que vocês estão fazendo... Eu não estou acostumada a ter alguém que se lembre que eu estou por perto. Eu acho tão ridículo Colibri ficar se desgastando para me fazer mal. Eu não quero ser importante. Não é da minha natureza... – Disse. Eles me olharam bobos. Como se eu tivesse falado um monte de besteiras. – O que foi?

      -Ah Alice... Vai ter que se acostumar a ser a queridinha daqui. – Sorriu Hillary. – Hei, faz bastante tempo que essa família não tem ninguém novo. Nós adoramos você, você é uma de nós agora.

      -É isso que é o difícil de entender. – Disse. – Eu também adoro vocês. – Dei um abraço leve em Hillary.

      -Bom, tenho que dizer que você está muito sentimental hoje Alice. – Eles riram. Eu os olhei fingindo estar ofendida. – Vamos mudar de assunto... Podemos começar amanhã o treino com os seus novos poderes. O que acham?

      -Fan-tás-ti-co. – Eu e Hillary falamos sincronizadas.

      -Bem... Mas se é fantástico começar amanhã, por que não nesta noite? – Disse Hillary.

      -Perfeito. – Disse.

      Então saímos da casa e adentramos na floresta escura.

      Jaden parou antes de chegarmos ao riacho – que seria perfeito para minhas primeiras lições – Nós o olhamos confuso.

      -Tem alguém conosco. – Ele disse, olhando para todos os lados.

      -“Alguém” não.  – Respondeu uma voz grave na escuridão que eu logo reconheci.

      -Alguns. – Disse outra voz. Os dois deuses saíram da escuridão do outro lado do rio, e pararam na margem. Olhavam-nos com interesse e certa ironia.

      -Posso saber o que estão fazendo aqui? – Perguntou rígido Jaden, com uma certa ameaça na voz. Os dois desapareceram num piscar de olhos e ressurgiram na nossa frente. Hillary e eu demos rápidos passos para trás, assustadas.

      -Seria mais do que perfeito treinar nossas alunas, não acha Sr. Phillper? – Disse Arpis, sua voz era afiada. Um sussurro um pouco irritante, mortal.

      -Elas são suas alunas? – Disse Jaden, um sorrisinho sarcástico aparecendo nos lábios. Mas foi tão rápido... Num momento Jaden estava no ar, levitado. Arpis com as mãos erguidas e simulando estar com as mãos no pescoço de alguém. Jaden se retorcia de agonia. Parecia que eu ia dar um soco em Arpis, eu estava fervendo em raiva.

      -Sim, pelo menos uma delas. – Disse sorrindo Arpis.

      -Hei! Coloque ele no chão! Pare com isso! – Gritei sem saber o que fazer.

      Arpis só olhou para Cerinus, que assentiu com a cabeça. E jaden caiu no chão. Hillary e eu corremos para ajudá-lo – como se precisasse -. Num segundo ele já estava de pé.

      -Bem...Como Arpis estava dizendo...Hillary e Alice são nossas alunas por direito. Na verdade elas não pertencem a dimensão de vocês. Como eu digo? Ah! Já sei, se elas entrarem no reino de Colibri, ficarão presas como você achou que elas iam ficar se entrassem nos nossos. – Disse Cerinus. Com sua voz grave, mas gentil.

      -Quer dizer que... – Começou Jaden. O rosto desiludido, confuso e triste.

      -Exatamente. Lamento meu jovem. – Disse Cerinus, e abaixou a cabeça com, pesar.

      -Quer dizer que...? – Perguntei.

      -Que você e Hillary não podem ficar aqui. Sabe por quê? – Perguntou Jaden. Eu sacudi a cabeça negativamente. – Porque só criaturas do reino de Colibri podem viver com os humanos.

      -Entendo...Eu e Alice não somos totalmente vampiras porque possuímos poderes que, segundo a lei, criaturas de Heidi não poderiam ter. Logo somos criaturas dos reinos de Cerinus e Arpis. – Esclareceu Hillary. Eu pensava em todas as formas de contrariar essa afirmação. Se isso fosse verdade, eu e Jaden não poderíamos nunca mais nos ver por pertencer a mundos diferentes.  Mas havia um porém.

      -Esperem um pouco. – Disse. Minha voz linda e perfeita soava como um eco no meio da escuridão. Eu ainda não acreditava em como eu estava tão perfeita com a mudança. – Hillary disse que não somos totalmente vampiras. Mas somos o bastante para sermos consideradas criaturas de Heidi. Pensem, nós corremos super rápido, somos pálidas, temos desejo por sangue... E só o poder que combina com os seus mundos. Por que não fazemos o seguinte? – Agora todos me olhavam pensativos. Jaden sorria triunfante. – Eu posso entrar no seu mundo a vontade, Cerinus. Os outros não. E Hillary pode entrar no seu, Arpis. E nós duas podemos também entrar neste mundo e no de Colibri. Eu só não posso entrar no de Hillary e vice-versa. – Olhei para os dois deuses.

      -Vejo que terá uma ótima aprendiza meu caro amigo. – Disse Arpis para Cerinus, sorrindo um pouco. – Não vejo nada de errado com esse pequeno acordo.

      -Nós não. Mas Colibri com certeza vai discordar. – Respondeu Cerinus. – Ela odeia que suas criaturas tenham liberdade. Que não tenham que ficar necessariamente no reino dela. Ela gosta de ter o controle de tudo. – Disse Cerinus. Colibri, a única que podia arruinar tudo. Olhei automaticamente por todos os lugares. Talvez eu senti a presença de uma alma negra e cheia de ódio. Mas perto de todos nós, numa arvore. Um beija-flor desfrutava das flores dela. Talvez despreocupado. Mas quando eu o olhei, ele se virou rapidamente. E eu tinha certeza que se ela estivesse na forma humana ia sorrir, mas como não estava, só voou para longe.

      -Bem, eu acho que ela concordou. – Disse inocentemente, pensando sobre Colibri não ter virado humana e acabado com tudo naquele mesmo instante. Todos me olhavam curiosos, lembrei que eles não a viram. – Bem...É...Quer dizer, acho que ela concordaria.

      -Vejo que tem uma ótima visão minha cara. – Disse Cerinus com um sorriso confortante. Com certeza pelo menos ele tinha visto Colibri. Todos nos olhavam estranhamente. – Nada com que devam se preocupar. – Disse ele para os outros.

      -Então, acho que está resolvido esta questão. Hillary e Alice, apareçam em nossos reinos todo o dia, a partir de amanhã, ás seis horas da manhã. Ficaram até ás cinco da tarde. Menos aos sábados. Vamos treiná-las para um dia enfrentarem Colibri e salvarem toda a dimensão mágica. – Disse Arpis pesaroso.

      -Lutar? Com Colibri? – Disse Hillary.

      -Sim. – concordou Cerinus. E os dois evaporaram na escuridão.

      E tudo se baseava a isso, a como eu era estranhamente especial.