Shadow Kiss por Dimitri Belikov escrita por shadowangel


Capítulo 8
Capítulo 8




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O final de semana chegou e eu passei o sábado trabalhando. Como acontecia corriqueiramente, sempre tinha um guardião me pedindo para cobrir um plantão dele para que pudesse aproveitar o dia, se divertindo. Eu não tinha problemas com isso e sempre aceitava.

No domingo, acordei cedo e fui à missa, como de costume. Rose estava lá, mas a sua presença nem sempre era algo constante, ela não era religiosa. Para ser sincero, eu realmente duvidava que ela acreditasse em Deus. Mas hoje, tinha uma boa razão para estar ali. Ela teria que prestar serviços comunitários. Era ali, na capela, que estes serviços seriam realizados. Quando a missa terminou, todos rapidamente se dispersaram, a maioria seguindo para algum encontro social. Eu permaneci por lá, deixando Rose surpresa. Eu não tinha nada para fazer o dia inteiro, então resolvi ajudá-la no trabalho e, além do mais, era uma boa desculpa de passar um tempo com ela, sem compromissos.

“O quê você está fazendo aqui?” ela perguntou.

“Pensei que você poderia precisar de alguma ajuda. Eu ouvi dizer que o padre tem muita coisa para limpar.”

“Sim, mas não é você que está sendo punido. E esse também é o seu dia de folga. Nós – bem, todos os outros – passaram a semana batalhando, mas são vocês os caras que apanham nas lutas o tempo todo.” Ela falou olhando para os poucos ferimentos que eu tinha do meu rosto. Dentre todos os guardiões, eu era o que tinha menos machucados.

“O que mais eu poderia fazer hoje?” perguntei simplesmente.

“Eu poderia pensar em um monte de coisas. Provavelmente existe um filme do John Waynes, em algum lugar, que você não viu.” Ela tentou fazer uma piada, mas sua voz soou seca.

“Não, não tem” falei negando com a cabeça “ eu vi todos eles. Olha – o padre está esperando por nós”. Eu tinha visto o padre Andrew se aproximar. Ela se virou desanimada e fomos até ele.

“Agradeço a vocês dois por se oferecerem voluntariamente para me ajudar.” O padre falou sorrido e eu tive que me controlar para não sorrir também da expressão de Rose. Só eu era voluntário ali. “Nós não vamos fazer nada complexo hoje, mas realmente é um pouco chato. Nós vamos fazer a limpeza regular, é claro, e depois eu gostaria de organizar em caixas alguns materiais velhos que tenho no sótão.”

“Estamos felizes em lhe ajudar em tudo que precisar” falei solenemente, na intenção de deixar o padre à vontade diante da cara feia de Rose.

Como o padre tinha orientado, começamos o nosso trabalho limpando a parte central do templo. Rose ficou como chão e eu fui limpar e polir o móveis. Eu me concentrei no meu trabalho, tenanto fazer o melhor, não só por ser um trabalho em uma igreja, mas para dar exemplo a Rose. Ela limpava tudo, mas vez por outra me olhava de forma intrigada. Quando terminamos com a limpeza, o padre Andrew nos levou para s segunda etapa da tarefa que era a arrumação do sótão. Nós três nos sentamos no chão e o ele começou a jogar fora o que não queria. Foi quando Rose soltou uma pergunta ao padre que me deixou curioso.

“Ei, você acredita em fantasmas? Quero dizer, existe alguma menção deles” ela girou o dedo, apontando em volta para a igreja “nesse negócio?”

O padre Andrew ficou surpreso eu também, mas não demonstrei nada, ao contrário, fiquei quieto, aguardando o que mais viria dela. Ele  parou o trabalho que estava fazendo e ficou pensativo.

“Bem... isso depende de como você define ‘fantasmas’, eu suponho”

“O ponto de tudo isso é que quando você morre, você vai para o céu ou para o inferno. Isso faz dos fantasmas apenas lendas, certo? Eles não estão na Bíblia ou algo parecido?”

“Novamente, isso vai depender da sua definição. Nossa crença diz que, depois da morte, o espírito se separa do corpo e pode, de fato, demorar um pouco para deixar o mundo.”

“O quê?” ela exclamou, derrubando uma peça de madeira que segurava. Felizmente não quebrou. “Por quanto tempo? Para sempre?”

Eu permaneci no meu trabalho, limpando vários livros empoeirados e colocando em caixas, conforme as orientações do padre. Mas continuei atento a conversa deles.

“Não, não. Claro que não” ele prosseguiu, contente por estar ensinando algo a Rose “elas voam para a face da ressurreição e salvação, que é o que forma a base da nossa convicção. Mas acredita-se que as almas podem ficar na terra de três a quarenta dias após a morte. Eventualmente elas recebem um julgamento temporário que as mandam para o céu ou inferno – embora elas não conheçam o seu destino até o verdadeiro julgamento, quando a alma e o corpo se reúnem para viver como um só.”

Rose ficou completamente pensativa. Ela parecia realmente interessada naquela história. Era muito difícil vê-la interessada em um assunto assim. Principalmente se fosse um assunto religioso.

“Sim, mas isso é verdade ou não? Existem realmente espíritos andando pela terra até quarenta dias após a morte?”

“Ah, Rose. A pessoa que questiona sobre a veracidade da fé não pode entrar em questões sobre as quais ela ainda não está preparada.” O padre falou isso se dirigindo a própria atitude dela. Ela aceitou aquelas palavras, ficando calada.

“Mas,” ele acrescentou “se isso lhe ajudar, muitas destas histórias sobre fantasmas são parecidas com as convicções do povo do leste europeu, que existem antes da expansão do cristianismo. Estas tradições defendem a idéia de que os espíritos ficam aqui por um pequeno período, após a morte – principalmente se a pessoa em questão morreu jovem ou violentamente.”

“Por que?” ela perguntou baixo “porque eles ficariam? Seria por... seria por vingança?”

“Eu tenho certeza que algumas pessoas acreditam nisso, da mesma forma que outros acreditam que isso acontece porque a alma teve dificuldade em encontrar a paz, depois de algo tão perturbador.”

“No que você acredita?”

“Eu acredito que a alma se afasta do corpo, como nossos pais nos ensinaram. Mas eu duvido que o tempo que a alma passa na terra seja algo que qualquer ser vivo possa perceber. Não é como nos filmes, com fantasmas assombrando prédios, ou vindo visitar aqueles que eles conheciam. Eu acho que estes espíritos são como uma energia ao nosso redor, algo além da nossa percepção, enquanto eles esperam para encontrar a paz. No final das contas, o que importa é o que acontece além da terra, quando encontram a vida eterna que o nosso salvador nos deu pelo seu grande sacrifício. É isso que importa.”

A mudança de humor de Rose foi notável. Ela assumiu uma expressão muito preocupada e, eu poderia dizer, assustada. Não me pronunciei durante o diálogo dela com o padre, mas fiquei intrigado. O que teria feito com que ela despertasse o interesse por aquele assunto assim? O padre também pareceu sentir a mudança nela e tentou a distrair.

“Há pouco tempo eu consegui alguns livros novos, com um amigo meu, de outra paróquia. Histórias interessantes sobre St Vladmir. Você ainda se interessa por ele? E por Ana?”

Aparentemente Rose já tinha feito alguns questionamentos, sobre outros assuntos, ao padre. Mas uma vez, isso me surpreendeu. Eu não imaginava que ela fizesseconsultas justamente ao um padre.

“Sim, eu me interesso” sua voz era evasiva “mas eu acho que não vou conseguir ler isso tão cedo. Eu estou muito ocupada com tudo isso... você sabe, a experiência de campo.”

Depois daquelas palavras nenhum deles dois falou novamente. Eu, que já estava calado, permaneci calado, embora estivesse curioso para saber porque aquele interesse dela por fantasmas.


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