Em exclusivo connosco, Kyoko desvenda o seu verdadeiro relacionamento com Tsuruga-san, dando fim aos mal-entendidos.

Ao ouvir a apresentação, Kyoko arrepiou-se.

Era a primeira vez que ia àquele programa e, apesar do estúdio de gravações estar mascarado de uma sala confortável, Kyoko tinha sido avisada que, aquela particular apresentadora, gostava de fazer os convidados encolherem-se em dor e tristeza.

No entanto, estava ali porque não queria mais desentendimentos em relação a Ren.

Depois de ele ter aberto o seu coração na noite passada, aquilo era o mínimo que podia fazer.

…

Cerca de 24 horas antes

Ren tinha acabado de contar a sua história e Kyoko estava sem palavras.

Apetecia-lhe chorar por ele mas sabia que não podia. Queria abraçá-lo mas também sabia que ele não precisava que tivessem pena dele agora. Ren estava inclinado para a frente, a olhar para as mãos pousadas nos joelhos. Não dizia nada. Talvez estivesse à espera que ela dissesse qualquer coisa.

Mas Ren estava apenas a antecipar que ela saísse a correr pela porta fora.

Com determinação, ela inspirou e depois expirou todo o ar que conseguiu juntar nos seus pulmões.

- Se eu conseguisse falar com o Kuon daquela época, certamente dar-lhe-ia um abraço forte e dir-lhe-ia que a culpa não tinha sido dele. – Kyoko inspirou novamente quando não obteve qualquer reação dele – Mas agora sei que não era disso que ele precisava e, provavelmente, muitas pessoas fizeram aquilo que eu queria fazer.

Kyoko franziu as sobrancelhas quando ouviu um “hm…” vindo dele, por isso, continuou.

- Ele não precisava de abraços nem que lhe dissessem que tinha sido apenas um acidente. – Kyoko ficou surpreendida quando o ouviu fungar, como se fosse um menino a tentar não chorar – A verdade é que ele foi um pirralho mimado e é verdade que o tal Rick provavelmente não teria morrido naquela noite mas não se pode voltar atrás. O Kuon teve uma infância difícil e não é o único culpado pela presença do Rick naquele lugar. – Kyoko fechou os olhos durante momentos – O Kuon daquela altura…eu gostava de abraçá-lo e consola-lo mas, se as coisas não tivessem acontecido da maneira que aconteceram, então eu não estaria aqui, contigo. Mais do que abraçar o pequeno Kuon, eu estou feliz por poder abraçar-te.

Fez-se silêncio durante alguns segundos…talvez um minuto.

Depois ela viu o corpo dele estremecer com um soluço e entrou em pânico; quase parou de respirar.

- Ren… - Kyoko esticou o braço para tocar no ombro dele mas ele levantou a mão para ela não o fazer – Desculpa.

- Não. – disse ele numa voz quebrada – A culpa não é tua. Eu só preciso de um momento a sós.

- Eu não te vou deixar sozinho! – protestou Kyoko já com as lágrimas nos olhos só por ouvir a voz chorosa dele. Inesperadamente, ela esticou os braços, assustando-o – Podes usar-me para desabafar!

- O quê? – Ren riu, quase histericamente, ignorou os braços dela e, em vez disso, pousou a cabeça nas suas pernas – Eu não quero que a minha namorada me veja a chorar, por isso não olhes, está bem?

Ela anuiu a cabeça com convicção e disse um “Sim!” exagerado quando percebeu que ele não estava a olhar para ela.

- Linda menina. – comentou ele depois de soltar outra gargalhada rápida e fraca – Obrigado por teres dito aquilo tudo. Foi muito importante para mim.

Agora foi a vez de ela começar a soluçar e, as lágrimas que ela tinha conseguido reprimir, começaram a escorrer pela sua face.

Ao sentir uma das lágrimas cair na sua cara, Ren sorriu abertamente.

- Parecemos dois idiotas, a chorar desta maneira.

…

Atualmente

Ele tinha adormecido no colo dela e ela tinha passado a maior parte da noite a observá-lo até ele acordar e obriga-la a ir para a cama.

Contrariada, ela tinha cedido depois de ele dizer que um namorado decente não devia deixar a namorada dormir no sofá.

Era assim que tinha ido ali parar.

Com a ajuda de um pouco de maquilhagem, as sombras por baixo dos seus olhos tinham sido disfarçadas tal como os inchaços que tinham sido o resultado de toda aquela choradeira na noite anterior.

Ren também não estava com melhor aspeto, lembrou-se Kyoko, sorrindo um pouco. Não tinha as sombras mas os olhos dele estavam ainda mais marcados pelas lágrimas do que os dela.

- Então, Kyoko-chan…

Surpreendida por se ter esquecido de onde estava, Kyoko olhou para a apresentadora na casa dos quarenta anos, cabelos curtos e pretos e um sorriso afável e extremamente falso.

A câmara estava suficientemente perto do si para conseguir pô-la desconfortável. Tinha a sensação que, se estivesse mais perto, conseguiria ver os poros da sua pele, mesmo por baixo da maquilhagem.

Ela olhou de lado para a câmara com um sorriso nervoso e depois para a apresentadora, outra vez.

- Estou feliz por estar aqui. – mentiu Kyoko preparando-se mentalmente para todo o tipo de perguntas.

- Estamos felizes por tê-la aqui. – aquilo não era mentira. A apresentadora, chamada Leila (o nome para o qual que tinha mudado para ter mais notoriedade naquele negócio) tinha visto estrelinhas quando soubera da participação de Kyoko no programa. Aquilo ia-lhe dar um aumento, definitivamente…até porque iria dizer ao chefe que tinha sido ela a convencer Kyoko a aceitar aparecer. Se conseguisse obter algum tipo de escândalo daquela conversa, ainda melhor – Então, como vai uma das mais famosas estrelas do Japão?

- Isso não sei…mas eu estou bem. – brincou Kyoko, tentando descontrair.

“Uma engraçadinha” pensou Leila nada satisfeita por ter que rir.

- E como vai o Tsuruga-san? – perguntou Leila.

- Ele está ótimo. – respondeu Kyoko simplesmente.

Leila analisou-a durante alguns momentos, determinando que perguntas faria para baixar a defesa dela, depois sorriu amigavelmente.

- Há alguns dias atrás, o Tsuruga-san anunciou que vocês estavam numa relação amorosa. – começou Leila de uma maneira simpática – No entanto, a sua hesitação levantou muitas dúvidas sobre o assunto. – lembrou Leila – Sabemos que houve muitas controversas envolvendo-a e a Brian e a Sho. Sendo seu sempai, seria apenas natural que o Tsuruga-san queira protege-la e talvez criar uma relação falsa…?

Kyoko olhou a apresentadora durante alguns segundos e sentiu a luz da câmara como se lhe estivesse a queimar a pele e a pressioná-la. Percebeu que devia ser mesmo esse o objetivo.

- Por onde devo começar…? – murmurou Kyoko – As tais “controvérsias” de que está a falar não são controvérsias de todo. Eu e o Brian somos apenas amigos e aquela fotografia que me tiraram no bar com ele foi exatamente isso: uma saída de amigos.

- O Brian parecia um tanto transtornado nessa fotografia. – comentou a apresentadora.

- As pessoas famosas também têm o direito de ficar transtornadas, certo? – perguntou Kyoko – O motivo do transtorno não é do interesse público e eu não vou partilhá-lo. Como amiga, eu só estava a apoiar o Brian.

Leila largou o assunto porque não havia motivos para continuar já que ela não mostrava nenhuma brecha naquele tópico.

- E sobre o Sho-kun? – perguntou Leila inclinando-se para a frente em expectativa – Esse rumor já tem mais de um par de anos. Talvez pudesse esclarecer tudo, agora.

- Mas é claro. – assegurou Kyoko olhando agora para a câmara – Com certeza toda a gente que está ou vai ver já foi ou ainda é adolescente. – continuando, Kyoko virou-se para Leila com um sorriso meigo – Os adolescentes apaixonam-se e desapaixonam-se em semanas como se fosse a coisa mais natural do mundo. Guardam paixões durante anos e depois, de um dia para o outro já gostam de outra pessoa. Sofrem desgostos e vivem alegrias. Eu fui igual.

- E isso quer dizer que…? – pressionou Leila.

- Olhe! – exclamou Kyoko, um bocado irritada – Eu apaixonei-me, parti o coração e segui em frente! – apesar de a última parte ter demorado mais tempo do que o normal – Não estou a culpar o Sho. Eu era apenas inocente demais e não sabia o que era estar apaixonada.

- Então, a verdade é que esteve apaixonada pelo Sho. – concluiu Leila – Ele magoou-a?

- Não se trata de ter magoado ou não. Foi sempre uma paixão não correspondida. – explicou Kyoko – E temos que perceber que estarmos apaixonados é diferente de amarmos alguém.

- Sim, a paixão é mais fogosa e o amor é mais calmo. – concordou Leila – E qual é a sua relação com o Tsuruga-san?

Ela suspirou e sorriu, surpreendendo a apresentadora.

- A relação que tenho com o Ren, agora, é uma mistura maravilhosa entre o amor e a paixão. – confessou Kyoko – Cada dia que passo com ele é simplesmente maravilhoso.

A apresentadora quase suspirou também. – E o Tsuruga-san também deve ter muita experiência.

O sorriso de Kyoko desapareceu imediatamente. – Tenho consciência do passado dele. Já falamos sobre isso e não há qualquer problema. – disse ela adivinhando a direção daquela conversa – O passado é passado. Mais nada.

- E há quanto tempo é que mantêm este tipo de relação? – perguntou Leila – Deve ter sido difícil confessar o seu amor a uma pessoa como o Tsuruga-san.

- Na verdade, foi ele que confessou. – Kyoko corou – Não sei se ele vai ficar chateado por eu contar isto. Não creio que a maioria dos rapazes fizesse isso mas, por outro lado, o Ren não é um rapaz qualquer. – ela sorriu – Acho que já passaram três anos desde que ele se confessou. – ela deu algumas risadas nervosas – Foi tão estranho! Não fazia a mínima ideia que ele se sentia assim. Fiquei a pensar “Como é que alguém como ele pode gostar de alguém como eu?” Foi tão complicado, na altura.

- Há três anos? – repetiu Leila – E só oficializaram a relação agora?

- Veja, normalmente as pessoas não iriam contar ao mundo que estão a namorar. – mencionou Kyoko – E, como eu disse, houveram alguns problemas e só agora chegamos a um consentimento. É difícil manter uma relação neste tipo de negócio, mesmo com os maiores sentimentos.

- E sobre aqueles problemas no tribunal? – perguntou a apresentadora – Disseram que o Tsuruga-san chegou a ser seu guardião.

- É verdade. – confessou Kyoko – Na altura o Ren estava a tentar ajudar-me mas não foi capaz de o fazer, no final. Isso é um assunto pessoal e não vou dizer mais do que isso.

- Muito bem. O tempo também está quase a acabar por isso só vou fazer mais duas perguntas. – informou Leila – Como é que estudou? Aposto que deve ter sido complicado estudar depois de Dark Moon. A maior parte das estrelas estuda em casa ou numa escola privada.

- Sim, acabei o 12º numa escola privada e, quando fui em digressão, tinha um professor privado comigo. – respondeu Kyoko – Mas também acho importante conhecer o que é andar numa escola normal…pública. Eu consegui fazê-lo, na minha terra natal, mas nem todos o conseguem.

- E quanto à universidade? – perguntou Leila – Deseja continuar?

- Isso é outro assunto privado. – Kyoko riu-se – Mesmo que eu andasse numa universidade, acha que eu lhe ia dizer onde era? Isso é ridículo.

- Ok, ok. Eu desisto…mas tem que me responder a uma pergunta antes de ir embora. – pediu Leila recebendo o consentimento dela – O que aconteceu com o seu cabelo!?

Kyoko desatou às gargalhadas, enquanto passava a mão pelo cabelo curto e de volta ao cor-de-laranja anterior.

- Isto dá-me um ar mais forte, não dá? – perguntou Kyoko meia envergonhada – Estava a precisar de recuperar isso.

- Oh, meu Deus, que desgraça! – lamentou-se a apresentadora fazendo Kyoko rir ainda mais – Tinha um cabelo tão bonito!

- Foi exatamente isso que o Brian disse antes de vir até aqui. – lembrou Kyoko limpando a lágrima do canto do olho, derramada de tanto rir – Ele gostava de brincar com o meu cabelo.

- E o que é que o Tsusuga-san pensa disso? – perguntou Leila com uma cara de extrema pena.

- Francamente, ele ainda não sabe disto. Só vou estar com ele daqui a algumas horas. – disse Kyoko – Mas, se ele está a ver isto… - ela olhou para a câmara e sorriu – Depois falamos, amor.

- Wow! – exclamou a apresentadora – Está mesmo determinada em mostrar que a vossa relação é seria.

- É melhor isto do que pôr em prática a ideia que ele teve. – Kyoko suspirou fundo.

- Imagino… - comentou Leila – Bem, Kyoko-chan, ficamos por aqui. Espero que possa visitar-nos de novo.

- Acabou por ser divertido. – concluiu Kyoko e depois acenou para a câmara – Obrigada por terem assistido.

E estava feito, pensou Kyoko enquanto se levantava e cumprimentava a apresentadora. Se não acreditassem nela, agora, ela não tinha culpa.

…

Entretanto, no conforto da sua casa, alguém assistia ao “Especial” com um grande sorriso de vitória, enquanto via Kyoko cantar “Good-Bye Days” para acabar a entrevista.

- Ora, ora. Vejam só quem é que se parece cada vez mais com a Marisa com o novo penteado? – murmurou o homem – Interessante.