Hidden escrita por jduarte


Capítulo 45
Apurada


Notas iniciais do capítulo

mais um, gente!
Beijooos,
Ju!



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- Que tal, se eu te emprestar uma blusa? – perguntou. Eu já ia reclamar, e dizer que não precisava, porém ele me cortou. – Só para não deixar você com essa blusa manchada de azul.

   Azul. Pois é. Meu sangue é azul.

- Ok. – concordei tirando a blusa, e deixando que Bernardo me emprestasse outra.

   Ele correu sem fazer quase nenhum barulho até o armário, e remexeu em algumas gavetas, até achar o que queria.

   Bernardo veio até mim, pegou a maleta com as coisas de primeiros-socorros, e tirou da cama. Notei que ele carregava uma blusa azul, e comprida o suficiente para cobrir a calça que eu usava.

- Pode ser esta? – perguntou.

- Claro. – respondi coçando o braço vagamente.       

   Bocejei quando ele me entregou a blusa para colocar. Vesti a camiseta, sentindo-me observada o tempo todo. Quando terminei, Bernardo me deu um beijo na testa, e se levantou para guardar a maleta.

   Quando ele voltou, eu já havia me espalhado por toda sua cama de casal – muito confortável – e praticamente dormia. Ele deitou ao meu lado, e ficou brincando com meu cabelo.

- Sabe o que é fantástico? – perguntou.

   Respirei fundo, sonolenta e respondi que não.

- Estar em meu quarto, com a pessoa que eu gosto, sem ter um bando de gorilas atrapalhando. – disse Bernardo enrolando uma mecha de meu cabelo em seu dedo.

   Sorri desejando profundamente dormir. Inclinei-me, e beijei seu rosto.

- Boa noite. – sussurrei.

- Boa noite.

   Ele abraçou minha cintura, deixando minhas costas de encontro com seu abdômen quente e forte.

   Apaguei sentindo sua respiração rápida em minha nuca.

   Abri os olhos, saboreando o gostoso silêncio, mas ao mesmo tempo esquecendo de que estava nos braços de Bernardo. Aconcheguei-me mais um pouco em seus braços, virando, e deitando a cabeça em seu peito.

   Então percebi que os braços de Bernardo não me enlaçavam, e onde eu deitava nada mais era do que um travesseiro duro, e que me encontrava sozinha no quarto.

   Levantei assustada, e quase caí da cama quando fui me apoiar na beirada da cama. Cocei os olhos, e os abri, levando mais um susto quando percebi que havia um par de olhos acinzentados, que se punham a me encarar.

- Oi! – disse a pessoa com a voz animada.

   Arregalei os olhos.

- Eu te conheço. – continuou a menina.

   Peguei a parte do edredom que – eu não sei como – fora parar em cima de meu corpo, e puxei-o para mais para cima, para tapar a camiseta de Bernardo.

- Não precisa ficar com medo. Eu não vou lhe fazer mal algum. – murmurou ela.

   Rosnei alto, mostrando literalmente todos os meus dentes, quando a reconheci.

- Hey! Eu vim em paz, okay? Só seja simpática. Eu tô tentando me controlar! – exclamou novamente.

   Vitória me olhou esperando que eu falasse algo, ou pelo menos piscasse, porém estava sem nenhum tipo de reação.

- Camila, eu sou uma amiga!

   Rosnei novamente, afastando-me.

 - Para de falar. – sussurrei colocando um tênis de velcro que estava ao lado da cama.

   Ela riu.

- Você não tá me reconhecendo, né?

- Não. Se você não se importa...

   Minha frase ficou inacabada, pois queria produzir uma saída dramática.

- Olha na cabeceira da cama.

- Ahñ? – perguntei estragando minha saída tipo: “Drama Queen”.

- Na cabeceira.

   Revirei os olhos, e dei uma olhada na cabeceira.

   Ali havia o que parecia ser uma carta. Peguei-a, e abri. Meus dedos se embolavam de tanta curiosidade. A letra era um pouco garranchada, e tipicamente masculina.

   Desculpe por não estar aí quando você acordar. Tive que ir cuidar dos mutantes novos que chegaram. Eu te amo. Quando acabar de acompanhar os especiais, sou todo seu.

Somente seu,

Bernardo.

   Meu coração parecia que iria sair voando de meu peito. Eu dançava dentro da minha cabeça. Porém, por fora mantive a expressão de “Tô Pouco Me Lixando”.

- Então o que diz? – perguntou Vitória.

- Não te interessa. – respondi de mau gosto, lhe lançando um olhar maligno e mortal, desejando que ela virasse pó.

   Ela levantou uma das sobrancelhas, olhando-me como se não me reconhecesse, e realmente, eu não me reconhecia.

- Desculpe.

- Tudo bem. Você não me conhece, mesmo. E tem todo o direito de ficar brava comigo. – murmurou Vitória com a cabeça baixa.

   Como assim, criatura? Eu não tenho nenhum direito de ficar brava contigo! Nem te conheço direito, sua tonta! A única coisa que eu sei é que você gosta de Bernardo, e que você vive um grande amor secreto com ele! Então, fique quieta!

- O que é você? – perguntei.

- Uma pessoa.

   Revirei os olhos, colocando os braços, cruzados, em cima do peito.

- Eu sei que você é um especial.

   Ela congelou.

- Olha... Você... O que... Isso é uma calúnia! – gaguejou Vitória.

   Caminhei até a porta que se encontrava atrás dela, e a abri, dizendo:

- Se fosse alguma calúnia, você não gaguejaria feito idiota. Nem preciso acrescentar que não gosto de você, não é? – perguntei.

- Não. Dá pra ver no seu olhar o quanto ciumenta e inconseqüente você é. Não preciso de explicações. Você simplesmente não sabe guardar suas emoções, nem se isso fosse salvar sua vida.

   Estanquei na porta, encarando a com as veias dos olhos saltando com a raiva:

- Virou leitora de cartas de tarô? Você não me conhece. – disse baixo, e ameaçadoramente.

   Vitória riu.

- Te conheço bem mais do que você própria.

   Bufei e sai do quarto, me escondendo nos cantos da parede, e abaixando a cabeça.

   Alguém pegou meus ombros, e puxou-me para trás. Senti a vontade de gritar, porém nada fiz.

- Shh! – sussurrou alguém, quando fiz a menção de gritar.

   Virei de frente para a pessoa, e sorri de orelha a orelha.

- Adam! – murmurei abraçando seu pescoço, e apoiando meu queixo em sua clavícula. Ele me abraçou, e respirou por entre meus cabelos.

   Liberei seus ombros, e fiquei olhando para seu rosto.

- Uau! Quero dizer, você está ótimo!

   Ele estava ótimo. Realmente um pedaço de mau caminho. Seu cabelo estava curto, e mais enrolado, seus olhos estavam âmbar, e a barba recém-crescida dava impressão que ele era mais velho.

   Adam riu.

- Obrigado. – disse ele.

   Ficamos sem assunto, e eu até pensei em virar e ir embora, porém percebi que a raiva que havia sentido por ele, havia se dissipado completamente, e tudo o que eu sentia por ele era compaixão.

- Er, bem, por onde andou? – perguntei no mesmo momento que ele perguntou:

- Onde estava?

   Rimos.

- Você primeiro. – disse eu.

- Onde estava? – tornou a perguntar.

- Em um lugar, ai.

- Hmm... Vou fingir que acredito.

   Fiquei corada.

- Por onde andou? – perguntei tentando ignorar as borboletas azuis que voavam em meu estômago, quando me lembrava de Bernardo perto de mim ontem.

   Ele coçou o queixo, e o farfalhar de seus dedos em contato com a barba fez com que um arrepio nada legal passasse por mim.

- Tentando mudar um pouco, indo até a cidade...

- A cidade?

   Ele assentiu e prosseguiu.

- Passei a páscoa em casa...

   Gelei.

- Páscoa? – perguntei estática.

- Sim.

- Há quanto tempo estou aqui? – tornei a perguntar.

- Ah, isso... Bem, alguns meses.

- Alguns meses, quantos? – praticamente gritei.

- Quatro! – respondeu.

   Botei as mãos na cabeça.

- Quatro? Quatro. Oh, meu Deus! – exclamei me distanciando dele.

- O que?

- O que? – retruquei. – Isso significa que eu estou confinada nesta droga há quatro meses.

   Adam se calou.

- Acho que você precisa ver King, ele poderá lhe explicar melhor o porquê está aqui.

   Assenti. Estava mesmo na hora de sabermos o que anda acontecendo aqui.

   Depois de algum tempo sendo empurrada pelos ombros por Adam, chegamos numa sala cinza e triste, e fomos atendidos por King.

- Ah, olá! – disse ele naquele humor característico dele.

   Aproximei-me de sua mesa, e percebi que havia nela, algumas fotos. Numa delas, a imagem vívida e velha de dois meninos, um bem ruivinho e outro bem loiro, se abraçavam, e riam.

   Ele percebeu que eu havia me interessado pela foto, e a abaixou, deixando a imagem virada para baixo.

   King pigarreou, e ficou desconcertado pelo meu olhar de “Por Quê?”

- O que fazem aqui? – perguntou com a voz carregada demais na seriedade.

   Adam o olhou significativamente, e ele entendeu o recado.

- Acho que chegou a hora, não é?

   Estreitei os olhos.

- O que está acontecendo? Eu só quero ir para casa! – disse eu.

- E você irá. Só... Fique aqui. – King ordenou. Ele foi até uma bancada fechada com cadeados, e pegou uma chave, liberando a porta.

   Quando ele abriu a porta, tive uma síncope. Algo dentro de mim parecia explodir em fogos de artifício. Um barulho alto, fino e agudo parecia ecoar dentro de meu ouvido, deixando-me atordoada.

   King pegou o que parecia ser uma rocha, e a pôs perto da mesa. Meu corpo foi jogado para trás, e meus sentidos pareciam estar humanos. Minha visão embaçada, meu olfato menos apurado, e minha audição – um tanto aturdida, devo dizer – parecia estar em conflito fora de meu corpo.

   Ora minha audição se focava em uma estação de rádio, ora me aturdia com os barulhos finos e rudes.

- O que é isso? – perguntei pausadamente e com certa dificuldade, colocando as mãos em meus ouvidos.

- Um pedaço de asteróide. Caiu aqui há alguns anos. Meu filho estava aqui. Foi atingido, e quase morreu.

   Estaquei.

- Seu filho? – perguntei quando compreendi que ele tinha um filho, e que ele estava aqui.

   King assentiu, enquanto eu massageava meu ouvido direito que parecia estar entupido. Abria a boca sem sucesso, tentando fazer com que a sensação ruim de falta de audição parasse.

   Adam ajudou-me a sentar em uma cadeira fedorenta de cigarro, e consegui focar em algo. Minhas funções corporais voltaram, e senti-me melhor.

- Vocês estão aqui com somente um propósito. – anunciou King sentando na cadeira atrás de sua mesa forrada de jornais e papéis amarelados.

   Balancei a cabeça, assentindo.

- E qual é? – perguntei.

- Aniquilação total da raça Beta. – concluiu.

- E isso quer dizer...

- Uma possível Terceira Guerra Mundial. – disse King cruzando as mãos no colo, esperando por minha reação.

   A minha reação foi: Rir. É óbvio!

- Quem... Seria... Idiota de fazer... Isso? – perguntei entre o ataque de riso carregado que tinha.

   Barnabé bateu os dedos com um ritmo engraçado, fazendo com que eu me lembrasse de um cavalo correndo.

- O cara que fez tudo isso, talvez?! – ele disse.

   Parecia óbvio e bobo.

- Pra quê? A raça Beta é...?

- Os criadores dos mutantes. Seus pais.

   Engoli seco.

- Essa segunda demanda de mutantes que chegou... São meus pais? – perguntei apoiando as mãos nos braços da cadeira, pronta para sair daquele lugar.

- Acho que sim. Não tenho acesso a este tipo de informação. – disse Barnabé.

- É. – disse finalmente levantando.

- Camila, aonde você vai? – perguntou Adam.

   O olhei profundamente.

- Procurar certas respostas para minhas perguntas.

   King se levantou, vindo para meu lado.

- Eu posso lhe dar respostas! – tentou.

   Cruzei os braços.

- Ok. Porque não me lembro de minha infância?

- Os anos dos mutantes, ou “especiais”, tanto faz, são marcados de sete em sete anos. Você tem dezesseis anos. Ou seja...

- Cento e doze anos humanos. – terminei para ele.

   Ah, Deus, sou uma velha caquética, pensei.

- Eu sou velha! – gritei.

   Os dois explodiram em risos.

- O que? O que foi?

- Se você for velha, sou pré-histórico. Tenho trezentos e noventa e dois. – sussurrou King em meu ouvido.

   Sorri amargamente, saindo da sala com a desculpa de que iria ver meu irmão.

   Corri, escorando-me pelas paredes e portas entreabertas, até chegar ao hall onde os mutantes eram colocados enfileirados. Fiquei atrás de uma pilastra, longe de todo mundo, e só observando o movimento. Porque eu não havia visto nenhum mutante quando chegara, era um mistério não resolvido.

   Alguém pegou em minha cintura delicadamente, puxando-me para trás.


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Notas finais do capítulo

continua?