34.

Rachel e o seu time se abraçaram. Algumas até derramavam lágrimas de alegria, como Ciça, que só então se deu conta de que seu nariz estava doendo, mas preferiu ficar na sua. Rachel sentiu as meninas se afastando do abraço. Não por que a animação acabara, mas por que uma música incrível foi acionada por Heath no lugar da narração.

As garotas começaram a fazer uma dancinha da vitória que Rachel só se deu conta segundos depois. Era a dancinha que ela mesma fazia, mas só quando estavam entre as amigas, no treino do jogo, nunca em público assim... Geral. Porém, naquele momento, nem ela resistiu e acabou assumindo seus passos junto com as meninas.

E foi pezinho pra frente e mexida na cintura. Depois caminharam para o lado marchando e pararam mexendo os braços e os quadris. Quase como em Baby When The Light do David Guetta.

Não dava tempo para reiniciar o jogo. Era intervalo realmente. As meninas do time adversário se recolheram contrariadas e foram para o vestiário dos homens, que hoje ra usado por elas, já que o feminino estava com o time da casa.

Rachel desfilou em direção ao vestiário seguida das demais garotas. Elas se jogaram nos bancos ou mesmo no chão, cansadas. Cic correu até um armário e tirou um lenço de papel. Passou no nariz e notou o sangue. O professor de educação física e treinador das meninas apareceu.

— Parabéns, garotas! Muito bem Vanessa e... Muito bem Rachel. Continuem assim, mas tentem mais... Cecília? – O senhor Roque parou e todas as atenções se viraram para a jogadora de rabo-de-cavalo loiro que estava num canto.

— Senhor? – Ela respondeu com força.

O treinador chegou perto dela e a fez tirar a mão de cima do nariz.

— Uh... Isso é uma fratura. Pequena, mas ainda assim é fratura. Como continuou jogando...? – Ele se refreou para não dar uma bronca nela.

— Ciça, você fica aqui neste tempo. A... Isabela entra no seu lugar! – Rachel tomou as rédeas e o treinador aprovou.

Uma garota aparentemente delicada deu um salto ao descer da mesinha no canto e se apresentar.

— Isabela ao seu dispor!

— Muito bem. Repassem as técnicas e, como eu ia dizendo, - Roque prosseguiu, — tenham mais voracidade, meninas. Vocês estão boas, mas estão escassas. Se fortifiquem. Vou levar a mocinha pra enfermaria. A água está naquele isopor.

E então as meninas caíram de pau na pobre da caixa de isopor, secas de sede, coitadas. Rachel as esperou uns minutos e então começou a repassar as táticas. Todas elas iam entendendo e assentindo.

— Bels e Jéss, vocês duas vão trabalhar juntas. Aquelas garotas vão manter a atenção em mim e na Vanessa agora. Se aproveitem disso, entenderam? – Rachel falou e Jéssica e Isabela balançaram a cabeça, se entreolhando cúmplices. — Parabéns, Paty, pelas defesas, mas não se esqueça, proteja esses seus dedinhos! – Patrícia sorriu para a capitã e tratou de enrolar seus dedos num pedaço de esparadrapo. Do jeito que as bolas vinham para ela, era mais que necessário. — Estão todas prontas?

— Falta eu! – Uma das meninas apareceu saindo do boxe do banheiro. — Desculpa. Eu tive que trocar a camisa. — Apareceu Suelen com o mesmo uniforme, só que limpo e seco. — Aquele estava um nojo, capitã! – Justificou-se.

Rachel não resistiu e riu da colega. Ela era assim: a senhorita melindre e limpeza!

— Ok. Tudo certo agora? – Rachel inquiriu. Elas assentiram. — Bola em campo garotas!

***

Luana olhava para Jam e sentiu uma leve pontada no peito. Finalmente parecia que ele somara A mais B e conseguira ver o que estava acontecendo ao seu redor. Finalmente parecia que ele estava deixando de ser tão tonto.

— Anda, Luana! Você sabe que Alanis não estava jogando limpo, não é? Diz! Explica isso! – Jam ainda segurava o pulso dela.

Luana hesitou, mas decidiu que era melhor lavar suas mãos. Não conseguia mais fazer o rapaz de besta. Se ele decidir se entender com Alanis depois, isso seria problema dela.

— Alanis não queria te aproximar da Vickie. Ela nem ligava se isso ia acontecer ou não. Ela só queria que você fizesse a Rachel parecer uma traíra para que o Danilo perdesse o interesse por ela!

— Mas por que isso?

— Você é anta garoto?

— Não. Eu só não costumo estar com pessoas que pensam no mal pros outros! – Respondeu ele cheio de honradez.

— Certo. Alanis quer se aproximar de Danilo e ela pensa que a Rachel é impedimento!

— Então ela gosta dele?

— Pelo que ela fala, parece que sim. Mas ela diz que não.

— Então por que tanto egoísmo?

— Por que, fala sério, você vê esse garoto dando atenção para mais alguma coisa quando essa tal de Rachel está por perto? – Luana rolou os olhos.

— Bem... Se eu reparasse nisso talvez eu tivesse notado! – Jam deu de ombros.

— Você é muito zeim garoto! – Luana disse juntando as sobrancelhas.

— Sou o que?

— Hippie!

— Hã?

— Deixa pra lá! – Luana riu e deu de ombros. — Mas até que você é legal assim mesmo!

***

“BOLA EM CAMPO MAIS UMA VEZ! O TIME DA CASA ESTÁ MAIS CONFIANTE? ACHO QUE SIM! E NOSSAS ADVERSÁRIAS? PREPARADAS? TOMARA HEIM!”.

E o jogo rolava...

“O QUE FOI ISSO, GALERA? ISSO FOI UM FOGUETE! E NOSSA PP PATRÍCIA ESTOUROU A BOLA CARA! HEHE... BRINCADEIRINHA! MAS FOI UMA BELA PEGADA. ESSA GAROTA AÍ É DAS BOAS!”.

Heath continuava tentando fazer alguma de suas piadas ter graça.

“CARACA, MEU! FUMOU TUDO! PONTO PARA AS ADVERSÁRIAS. E FOI AQUELA BARANG... JOGADORA QUE LEVOU UM CARTÃO AMARELO NO PRIMEIRO TEMPO. BEM, COMO O PROFISSIONALISMO OBRIGA: PARABÉNS TIME DA MDB!”.

O superior de Heath já desistira de repreendê-lo. O pior era que a galera lá em baixo gostava!

“E NOSSO TIME FAZ UMA RETIRADA. ENTRA AGORA NOSSA NÚMERO 14, QUE COMEÇOU O SEGUNDO TEMPO NO BANCO, SUELEN! MANDA VER GATINHA!”.

A bola não parava nem num time nem em outro. Como Rachel previu, a marcação ficou ainda mais intensa nela e em Vanessa. Várias vezes inclusive Vanessa foi atingida, mas nada de o árbitro acusar falta.

Bels conseguiu roubar a bola e, como planejado, deu um senhor chute para frente, quase cruzando o campo, e Jéssica interceptou. Três garotas caíram no ataque em cima da pobre, que, brava, chutou pra trás e voltou a tomar posse antes que roubassem a bola. A galera amou. Voltou então para Bels que, agora, estava perto do gol. A capitã do time adversário a perseguiu e ela driblou com uma caneta, mas mesmo assim o círculo estava se fechando para ela. Então, mandou um chute em direção a sua capitã.

“E É RACHEL DE NOVO NA PARADA, PESSOAL! VEM AÍ MAIS UM GOL?”.

— VAI LÁ RACHEL! – Danilo berrou desta vez. E até Stark e Vickie repararam nele.

— ELA É MEU ORGULHO! – Vickie já estava desfeita em lágrimas.

— Nosso! Vi! – Stark também disse emocionado e os dois se abraçaram, ansiosos.

Rachel parecia ter um elástico ligado de seu pé à bola, que toda a vez que ela chutava, a bola voltava para ela na direção certa. Ia ser ela de novo. Ou uma de suas garotas. Quem estivesse mais propício. Porém, em frente à linha precisa, perfeita, Rachel levou uma cortada, onde o pé da garota acertou em cheio sua canela. Rachel caiu de costas no chão.

“E NOSSA CAPITÃ FOI ACERTADA. MAS QUE FDP ESSA GAROTA! VAI TOMAR NO * (PIIIIIIII)... VAI TOMAR BANHO, CACETE! ACERTA A MÃE!” – Heath estava indignado e aflito, assim como toda a plateia.

— DROGA! RAE! LEVANTA! LEVANTA! – Danilo se esgoelava quase todo inclinado para cima da proteção da arquibancada, angustiado e preocupado. Parecia até que ele esperava que Rachel conseguisse ouvi-lo sob todo aquele barulho.

Vickie havia praticamente engolido a língua e tudo que sabia fazer era chorar. Stark também parecia uma manteiga derretida, mas estava tentando se manter forte.

Rachel segurou a perna com força e virou de bruços. A tensão condensou o ar e o árbitro saiu correndo até o acidente.

— TÁ BEM AÍ? TÁ BEM AÍ? – Perguntava ele apreensivamente.

— RACHEL! – Vanessa e mais algumas meninas correram para ela. — Chamem os para-médicos, enfermeiros, sei lá! Alguém!

— N-não... – Rachel murmurou voltando a se virar de peito pra cima.

— Mas... Rae...

— Não, Vanessa, não. – A morena falou decidida e, sob um suspiro pesado, fez força e se pôs de pé.

“É isso aí minha Rae! Força!” – Danilo pedia em pensamento.

— AAAAAHHHHH! – Vickie gritou quase histericamente quando viu a amiga de pé.

— A Rae tá bem, Vi, a Rae tá bem! – Stark repetia alegremente.

“ISSO É QUE É FIBRA E FORÇA DE VONTADE! ESSA É NOSSA CAPITÃ PESSOAL: RACHEL MARIE FOX!”.

“Meu sobrenome inteiro não...” – Rachel se lamentou mentalmente. “Eu vou me acertar com você, Heath!”.

Dentro do bafafá que se formou, foi dado pênalti. Rachel decidiu que ela mesma o tiraria. E assim lhe foi permitido.

Mesmo que Vanessa e as demais garotas tentassem se manter confiantes, a preocupação com a perna de Rachel as fazia duvidar do gol do desempate. Rachel poderia ter dado a chance para alguma delas tentar. Não que elas não entendessem que, para Rachel, aquilo era mais que uma cobrança, era justiça, mas ela também não deveria arriscar sua perna machucada.

— O.que.é.isso? – Danilo falou se sentindo besta quando viu Rachel se direcionar a bola. — Ela perdeu o juízo!

Vickie e Stark estavam rezando de mãos dadas. Vickie não queria mais nem ver!

Alanis sentiu seus olhos marejarem. A tensão do momento estava mexendo com o sentimental dela. Sua consciência a acusava e a preocupação vigente de Danilo por Rachel a fazia se sentir um pouco menor do que já se sentia normalmente.

Rachel, então, se posicionou na frente da bola com firmeza num pé só. Bufou indignada, olhando pelo canto do olho para a garota que a acertara. Voltou-se para a goleira a alguns metros dela.

— Engole essa. – Murmurou e meteu um chute forte com o pé bom, o que a fez perder o equilíbrio e voltar a cair de costas.

O que aconteceu foi muito rápido. Rachel só teve tempo de se virar no chão pra ver sua bola bater na ponta da trave, fazendo a goleira cair de cara no chão sem tocar na bola, que, ainda com energia, quicou e voltou para o campo. Vanessa se desvencilhou da garota do time oposto e, por impulso, fez o que pôde para tocar na bola. Saltou e esticou a perna por instinto e...

“V-VOC-CÊS VIRAM...? VIRAM ISSO? FOI UMA, UMA... BICICLETA! FDP!”. – Heath parecia incrédulo. Na verdade, todos estavam.

— Anuncia, Heath! Anuncia garoto! – Seu chefe mandava apreensivamente, mas Heath estava paralisado.

“F-F-OI GOL! HAHA! GALERA ISSO FOI UM GOLASSO! TOMA ESSA MDB! ENFIA NO EGO! HAHA! DOIS A UM PRA GENTE! É NÓS! É NÓS!”. – Heath desenfreou e continuou narrando sem nenhum profissionalismo.

Na arquibancada, a torcida fazia o chão tremer de tanto barulho e pulos de alegria. Danilo não reprimia mais o entusiasmo e comemorava com abraços e gritos com Vickie e Stark.

— ÔLE-OLÊ-OLÊ-OLÁ! O NOSSO TIME É DE ARRAZAR! ÔLE-OLÊ-OLÊ-OLÁ! SÃO AS MENINAS QUE VÃO GANHAR!

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