Um amor improvável escrita por Tianinha
No dia seguinte, Fabinho se atrasou. Passara a noite inteira assistindo aos documentários do Plínio, e acabou adormecendo. Teria de se apressar.
— Caramba, perdi a hora! — disse, tratando de desligar o notebook. — Caramba! Pelo amor de Deus! Pior que aquela perua tinha razão. É cada filme chato. Meu Deus do céu! Não é à toa que eu dormi desse jeito.
Realmente, filmes daquele gênero não em sua praia. Levantou-se.
— Tomara que o papai não seja chato que nem esses filmes.
Foi ao banheiro, lavou o rosto.
— Voar pra agência. — disse, enxugando o rosto com a toalha.
Chegou na agência já cumprimentando e querendo mostrar serviço:
— Bom dia! Bom dia! Bom dia! Estão precisando de alguma coisa?
— Bom dia. — disse Júlia, sem um pingo de entusiasmo.
Ela não fez uma cara muito boa. Mal sinal. Ele estava muito atrasado. Com certeza estava encrencado. Natan devia estar uma fera.
— Fabinho! — disse Natan. — Que bom que você chegou. Vem aqui um instante.
Fabinho achou que levaria uma bronca pelo atraso, então disse:
— Desculpa o atraso. Acabei estudando as coisas da campanha e perdi a hora.
— Queria agradecer pelo toque que você deu ontem. — murmurou Natan. — Sobre o lenço que a Bárbara botou no meu bolso.
Fabinho ficou aliviado. Então Natan não estava furioso com ele.
— Ah, era um lenço? Nem vi, imagina. — disse Fabinho, fingido.
— Mas foi uma besteira. — disse Natan. — Ela deixou cair por acaso. Eu queria te pedir pra não comentar nada com ninguém.
— Claro. — disse Fabinho.
— Não que isso tenha alguma importância, né? Mas você sabe como essa gente é fofoqueira. — disse Natan.
— Mesmo que estivesse acontecendo alguma coisa... Imagina, não está acontecendo, mas o que eu tenho a ver com a sua vida, né? Nada.
— É. É isso aí. Garoto esperto. — elogiou Natan. — Estou vendo que você vai fazer uma carreira linda aqui com a gente.
— Eu tô confiante. — disse Fabinho.
Fabinho sorriu, satisfeito. Sua estratégia funcionara. Conseguira conquistar a confiança do chefe. Fabinho sabia que Natan ficaria muito agradecido por tê-lo livrado de um grande problema. Se a esposa, Verônica, encontrasse o lenço em seu bolso, faria um escândalo e exigiria o divórcio. E Natan não pretendia se separar da esposa. Fabinho salvara seu casamento e consequentemente, sua imagem, porque um escândalo daquelas proporções não seria bom para sua imagem. Vendo que conseguira o que queria, Fabinho aproveitou para pedir para sair durante o expediente. Precisava resolver um assunto. Pouco importava o trabalho, o que interessava a Fabinho era ir atrás de sua história. Natan estava comendo na sua mão, logo, o deixaria sair. Daria uma desculpa qualquer:
— Natan, eu tô precisando dar uma saída. Questão de burocracia. Será que tudo bem? — disse o rapaz.
— Nenhum problema. — disse Natan, dando-lhe uns tapinhas no braço. — Pode tirar a tarde pra você.
— Obrigado. — disse Fabinho, colocando a mão no braço de Natan. — Você não vai se arrepender de apostar em mim.
— Tenho certeza que não. — disse Natan.
— Tchau, tchau! — disse Fabinho, despedindo-se.
Despediu-se também do restante da equipe:
— Até mais!
— Até mais! — disse uma moça.
Fabinho foi atrás de Plínio. Já se informara sobre o local onde ele trabalhava e foi até lá. Estacionou a moto na frente do prédio e ficou esperando. Viu quando o manobrista estacionou o carro de Plínio. Em seguida, viu o pai sair e caminhar em direção ao carro. Resolveu ir atrás. Aproximou-se quando Plínio já tinha entrado no carro.
— Plínio Campana? — disse, tirando os óculos escuros que usava. — Eu gostaria muito de falar com o senhor. Desculpa te abordar assim, mas é que eu sou um grande admirador da sua obra. Licença, Fábio Queiroz. — estendeu a mão.
— Como vai, Fábio? — disse Plínio, apertando-lhe a mão.
— Bem. — disse Fabinho. — Eu sei que o senhor deve ser uma pessoa muito ocupada, mas será que a gente pode conversar um pouquinho? Se não der agora, tudo bem. A gente marca outra data.
— Tenho uma reunião agora no MIS, Museu da Imagem e do Som, mas a gente pode tomar um cafezinho. — disse Plínio.
— Não sei nem como agradecer. — disse Fabinho.
Foram tomar um café em uma cafeteria.
— Quer dizer então que você gosta dos meus filmes? — perguntou Plínio.
— “Sob o Céu Pálido na Metrópole” é brilhante. — disse Fabinho. — Nunca vi um filme de favela tão duro e ao mesmo tempo tão poético. Eu gostei demais. Amei.
Plínio estranhou o jeito do rapaz. Tudo bem, o garoto podia até admirar seu trabalho, mas estava exagerando na dose. Além do mais, será que o garoto havia entendido sua intenção ao fazer o filme, a mensagem que quisera passar?
— Curioso você se referir a esse filme com tanto entusiasmo, porque eu não o fiz para as pessoas gostarem. — disse Plínio. — Mas pra ficarem incomodadas. A intenção foi fazer uma denúncia social.
— Denúncia social não pode ser uma obra de arte? — disse o garoto. — Outro filme seu que eu adoro é aquele que você faz uma crítica sobre a vida das celebridades. Eu acho incrível você ter feito isso depois de ter sido casado com a Bárbara Ellen. Aliás, na casa de quem fui jantar ontem.
Fabinho um gole do café. Estava gostando de conhecer o pai. Queria ser muito amigo do pai. Parecia ser uma grande pessoa. E queria que o pai gostasse dele. Por isso tentara impressioná-lo, mostrando interesse e admiração pelo trabalho dele. E não podia deixar passar a oportunidade de saber um pouco mais sobre Bárbara Ellen. Precisava saber se ela fora realmente a responsável pela separação de seus pais. E quem sabe, saber um pouco mais sobre Irene. Queria também saber tudo sobre ela, conhecê-la, afinal, era sua mãe.
— Então você conhece a Bárbara? — perguntou Plínio.
— Eu trabalho na Class Midia. — disse Fabinho, tentando impressionar o pai. — Acabei ficando muito amigo do Natan, do Maurício. Amora me apresentou a eles.
— E você também conhece a Amora? — perguntou Plínio.
— Amora. Amora é minha amiga de infância, a gente se conheceu no lar do tio Gilson, só que Amora chegou lá com nove anos e eu cheguei com cinco dias de vida. A mulher que me deixou lá era minha mãe. — disse Fabinho.
— Tua história é praticamente uma telenovela. — disse Plínio.
Fabinho riu.
— Preferia que fosse um filme de Plínio Campana, só que com final feliz. — disse o rapaz. — Afinal, fui adotada por uma família rica de Ribeirão Bonito e a Amora pela Bárbara.
O rapaz bebeu mais um gole de café.
— Finais felizes são muito discutíveis, sabe? — disse Plínio.
Fabinho não entendeu nada. Como assim? Então ser adotado por uma família rica não era final feliz? Nem todo órfão tem esta sorte.
— Você diz isso por mim ou por causa da Amora? — perguntou Fabinho. — Eu te pergunto porque muita gente pensa que Amora é uma marionete da Bárbara. Mas desde criança ela sabe muito bem o que quer.
— E você? Também sabe o que quer? — perguntou Plínio.
Sim, sabia. Queria encontrar seu pai, sua mãe, ter a sua família. E ficar rico.
— Quero ser seu amigo. — disse Fabinho. — Aprender mais com você e conversar mais com você. Não é só porque você é o grande Plínio Campana, mas é porque eu tenho impressão de que conheço de uma vida inteira.
Plínio achou o papo muito esquisito. O que aquele rapaz queria com ele? Por que queria tanto se aproximar dele, ser seu amigo? E por que faz tanta questão de se aproximar de sua família?
— Eu tenho que ir. — disse Plínio, colocando os óculos escuros.
— Será que eu posso ir com você? — perguntou Fabinho. — Sempre tive vontade de conhecer o Museu da Imagem e do Som.
Queria a atenção do pai, passar mais tempo com ele. Plínio concordou, e acabaram indo ao museu. No museu, Fabinho continuou sondando o pai.
— Será que eles têm aquele filme com a Bárbara Ellen que acabou não sendo terminado porque ela deu piti? — perguntou o garoto.
— Se não foi finalizado, que interesse pode ter esse filme?
— Eu já vi que você não gosta muito de falar sobre a Bárbara Ellen — comentou Fabinho.
— Na verdade, eu pouco tenho a dizer sobre a Bárbara, além do fato de ela ser a mãe da minha única filha. — disse Plínio.
— Eu conheci a Malu. — disse Fabinho. — Ela tem muita personalidade, né?
— E beleza, inteligência e generosidade. — disse Plínio.
Deu para ver o quanto ele amava a filha. Fabinho esperava que Plínio também gostasse dele.
— É. Eu li que além disso tudo, a Irene Fiori também tinha muito talento.
Plínio achou ainda mais estranho o rapaz falar de Irene. Que interesse tinha ele no seu passado? O que tinha ele a ver com isso?
— Por que razão você citou Irene Fiori?
Fabinho achou que não era o momento de falar a verdadeira razão pela qual foi procurá-lo. Queria que Plínio o conhecesse e gostasse dele sem saber que era seu filho. E queria que Plínio lhe desse informações sobre Irene. Será que ele sabia alguma coisa a respeito do sumiço de sua mãe?
— Eu li que você foi noivo dela antes de se casar com a Bárbara. — disse o moço. — Minha mãe adotiva era muito fã da Irene Fiori, até foi numa peça dela em São José do Rio Preto. Fico me perguntando por que é que uma atriz tão bonita, tão talentosa desistiu da carreira e desapareceu daquele jeito?
— De fato, a Irene era uma ótima atriz, uma excelente pessoa e foi pena ela ter deixado a carreira. — disse Plínio.
Pelo visto, ele ainda gostava de Irene.
— Agora eu preciso ir. — disse Plínio.
Fabinho queria ter mais tempo com o pai. Queria que o pai lhe desse mais atenção. Se pudesse, passaria o dia todo com o pai.
— Mas passou tão rápido. Eu queria conversar mais com você. Será que a gente pode marcar outro encontro?
— Por que? Tem alguma coisa que você queira me dizer? — perguntou Plínio, desconfiado. O que aquele rapaz queria com ele, afinal? Seria algum fã maluco?
— Muitas, na verdade. Eu...
— Me manda um e-mail. — disse Plínio, entregando um cartão.
— Você não sabe o prazer que foi pra mim. — disse o rapaz, estendendo-lhe a mão. Plínio apertou a mão do garoto.
— Obrigado. — disse Fabinho, dando-lhe uns tapas nos ombros.
Fabinho ficou observando Plínio ir embora.
— Pai. — disse, emocionado.
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