Destinos Improváveis escrita por Nara


Capítulo 95
Futuro - Amanhecer




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/809277/chapter/95

 

“Acabou” – Shara internalizou, pela milésima vez desde que ela chegou, seus olhos ainda fechados, enquanto tentava sem sucesso dormir, naquela usual porém desconfortável cama da enfermaria, ela estava exausta, mas nem todo o cansaço do mundo seria capaz de faze-la parar, não com todo o êxtase que ainda corria em suas veias e não com todas aquelas cenas, sendo revividas e assistidas em sua mente como se fosse um loop sem fim, ela havia passado a noite em claro, vendo seu pai morrer, inúmeras e inúmeras vezes, aquela certamente havia sido a noite mais longa de toda a sua vida, o tempo parecia ter parado ali... parado naquele exato instante em que ela sentiu que a morte a estava rondando, sim... aquela sensação era inexplicável, algo inexplorável até mesmo por alguém como Shara que costumava oscilar tanto em suas emoções a ponto de desejar um encontro com ela... talvez a morte fosse mesmo um ser, como descrito no conto dos três irmãos... um espirito, um fantasma, uma alma, enfim... seja lá qual fosse a descrição mais apropriada para ela, mas a morte era real, e sua presença podia ser sentida por aqueles que estavam próximos a encara-la, e Shara havia estado ao lado dela essa noite, ela sabia.

Acontece que Shara não queria morrer, era estranho e confuso ao mesmo tempo, mas a verdade é que pela primeira vez depois de tanto ela desejou de todo o coração não morrer, e digamos que seu desejo tenha sido atendido, da pior forma possível, uma troca havia sido feita e alguém teve que ir em seu lugar, a morte não voltaria sozinha... ela havia vindo buscar alguém ali, e Shara sabia… na verdade ela sempre soube… e nada mais precisava ser dito, quando ao ouvir o barulho do corpo cair sobre o chão, por Merlin, ela sabia que a partir daquele momento, nada mais seria o mesmo, ela sabia que seu pai faria a troca, sim ele havia feito, se sacrificando em seu lugar, a morte não retrocedia, não havia simplesmente como desfaze-la, a morte era objetiva, era cruel e era fria, ela fazia o seu trabalho, Shara sentiu uma lagrima escorrer pela sua bochecha... tudo aquilo ainda era tão vivo e real, aquela dor... não havia como esquecer o que ela havia sentido ali, Shara deixou a lagrima deslizar e molhar a fronha do travesseiro, ela podia sentir o novo dia chegando, sim estava quase amanhecendo... um novo dia de fato para todos.

 “Acabou” Shara repetiu tentando convencer a si mesma de que uma parte, pelo menos uma grande parte daquilo havia mesmo acabado, e a tempestade ganhado um novo significado para ela naquela noite, e numa fração tão pequena do tempo, segundos talvez, a tempestade havia sido ignorada, deixada de lado, nenhum trovão, raio a paralisaria diante da morte, a morte o havia levado, seu peito doía... algo havia sido arrancado de dentro dela, havia apenas o vazio agora, sim aquilo era sobre todo o vazio que ela havia sentido, o vazio da perda de algo tão importante para ela, o vazio doía, Elza... mais uma vez havia sido ela... mas Shara não se importava mais com Elza, nem com a tempestade, talvez não se importasse com mais nada, afinal a vida não teria sentido algum… sem ele, Shara havia se jogado contra o seu corpo frio e imóvel, aquilo foi intenso... ela havia perdido tudo ali... e ela chorou, como nunca antes, ela o acusou, gritou com ele, alegou que ele não havia cumprido sua promessa, o chamou de mentiroso, sim ela precisava culpa-lo, não era justo, não depois de tudo, não depois de tanto… e foi ali que ela entendeu sobre os níveis de sofrer, afinal a dor do desconhecido, a dor de não ter uma família, crescer num lar, era diferente, muito diferente da dor de perdê-lo, havia um rosto agora, uma identidade, havia afeto, sim havia amor... ela o reconhecia como uma figura paterna, ele era o seu pai... o melhor pai que alguém como ela poderia ter.

Mas era imensuravelmente incrível como tanta coisa podia mudar em tão pouco espaço de tempo, da morte a vida, havia uma chance afinal... a borboleta azul... era improvável que um ser como aqueles estivesse ali numa noite como aquelas... Shara parecia se lembrar dela, sim aquela borboleta… ela era tão parecida com a borboleta que estava com ela no banheiro da escola depois da aula de geografia quando Shara tentou tirar a vida pela primeira vez naquele dia... a borboleta azul era o único ser que havia visto o que ela havia feito ali, sua dor e suas lagrimas e agora a borboleta estava ali outra vez para ela, e havia pousado sobre as vestes dele, bem à altura do coração... chamando sua atenção para o sangue, as vestes estavam rasgadas e a adaga ainda cravada em seu peito... ele havia tirado a vida, antes mesmo de Elza faze-lo, e então tudo fez sentido, e de uma forma estranha Antony parecia compreender aquilo também, eles sabiam exatamente o que precisava ser feito, havia de fato uma chance, eles já haviam feito algo similar antes com Catie na ala hospitalar… feito aquilo que Elza havia prometido e deveria ter feito pela sua mãe.

Contudo dessa vez Shara não estava com o colar, pois o colar estava com Elza, e Elza estava aparentemente congelada, foi quando Antony ofereceu o cajado... era inusitado e improvável, mas havia magia ancestral ali, de que forma Antony havia conseguido aquilo, ela não sabia, mas não havia espaço e nem tempo para perguntas, se aquilo servia, era o bastante, mas ainda assim, faltava algo... ela precisava chamar a atenção do seu pai, mas de que maneira? Já que a música não funcionaria nesse caso... afinal ele não era como Catie e não era dado a esse tipo de sentimentalismo, então de forma alternativa Shara começou recitando alguns ingredientes de poções, poções que eles já haviam trabalhado e feito juntos em algum momento, ele que era tão habilidoso nisso, não lhe restava dúvidas de que em vida a arte de fermentar era a sua maior vocação e paixão, então aquilo deveria simplesmente funcionar, mas por alguma razão não havia funcionado, por que não estava funcionando? Seu coração acelerou, não havia muito tempo e ela estava sem ideias, foi quando Shara desistiu de procurar por alternativas e suplicou... ela estava implorando para que ele voltasse para ela, chorando... afinal foi usando a voz que ele a havia resgatado do seu coma aquela vez na enfermaria, não que ele tenha suplicado ou coisa do tipo… obviamente ele não faria, mas ele havia usado a voz e havia funcionado, claro que a situação era outra ela não estava morta... mas ainda assim ela tentou, ela o chamou com toda a sua força, ela desejou que ele a ouvisse seja lá onde ele estivesse... e ele fez, ele a ouviu e ele voltou para ela... e quando que ouvir sua voz, havia se tornado algo mais importante do que a arte de fermentar? Shara não sabia, mas a magia não mentia, ele havia voltado para ela, ouvindo a sua voz... eles haviam driblado a morte.

“Acabou” ela sussurrou dessa vez, se lembrando de como Antony havia sido ágil, ele possuía uma chave de portal e foi com ela que eles retornaram a escola, seu pai precisava de cuidados especiais e eles precisavam trazê-lo de volta imediatamente, a chave de portal os levou até a ala hospitalar, onde o diretor Dumbledore, a professora Mcgonagal e Madame Pomfrey os aguardavam, era estranho, mas eles pareciam estar cientes principalmente de que alguém precisaria de ajuda, afinal por qual razão mais eles haveriam regressado justamente ali? seu pai havia desmaiado logo após abrir os olhos, ele a havia confundido com sua mãe, e de alguma forma Shara apreciou isso… mas ele estava machucado, muito machucado, a magia ancestral o havia resgatado da morte, mas a magia não podia curá-lo, seja lá quais fossem os ferimentos... ainda assim Madame Pomfrey havia sido rápida e Shara sabia, sabia como seria a partir dali e sabia também que não dependeria mais dela e que o melhor a se fazer era sair do caminho e esperar, esperar até que ele se recuperasse, algo similar com o que tinha acontecido com Catie daquela vez.

Shara havia mesmo quebrado o braço, além de alguns outros ferimentos pontuais, e sendo assim essa foi a única razão pela qual ela foi autorizada a passar aquela noite na ala Hospitalar, o que foi um alivio já que ela não queria deixa-lo, ela queria ficar com ele, a professora de transfiguração a havia liberado das aulas do dia seguinte, com o intuito de que ela descansasse o suficiente e pudesse passar o restante do próximo dia com ele, ela era de uma sensibilidade sem tamanho, ela sabia o quanto isso podia significar para Shara, e Shara agradeceu, já o diretor Dumbledore, havia dito muito pouco, mas a forma como ele havia colocado a sua mão sobre o ombro de Antony e as trocas de olhares que tiveram, os tornavam cúmplices de algo, algo que Shara não deixou passar, enfim de alguma forma aquilo havia acabado… por Merlin, sim eles haviam conseguido

Shara abriu os olhos lentamente, tentando se acostumar com a iluminação, seus olhos imediatamente se voltaram para a cama onde ele repousava, mas as cortinas estavam fechadas e ela não podia vê-lo dali, aquilo era uma forma de preservá-lo de olhares curiosos, Pomfrey havia dito, não vamos expô-lo, e aquilo fazia sentido… haviam outras cortinas fechadas também, dos alunos petrificados, a enfermaria nunca esteve tão movimentada antes.

—Ele está bem – Shara ouviu a voz...  era cedo, muito cedo para visitas... por que ela estava ali? E desde quando ela estava ali?

—Catie – Shara disse surpresa, a presença inusitada dela a havia assustado, Catie se levantou da cadeira onde estava se aproximando dela, seus olhos estavam vermelhos, ela havia chorado? – você... é... – Fazia semanas que elas não trocavam uma palavra, e Shara não sabia muito bem como começar aquilo – tudo bem? – ela se viu perguntando.

—Não, na verdade… não está tudo bem – ela respondeu, seus olhos marejaram... Shara se sentou, para poder encara-la melhor – eu sinto muito... sinto tanto – ela começou a chorar – Shara se sentiu perdida ali.

—Aconteceu alguma coisa? – ela perguntou, sentindo um aperto no peito pela dor da amiga.

—Aconteceu... acontece que eu fui uma tola – ela enfatizou a última palavra – me perdoe Shara... eu vou entender se não puder, mas precisava que soubesse... que eu sinto muito – ela limpou o rosto com a manga do casaco, elas eram tão parecidas ao mesmo tempo que também eram diferentes.

—Do que está falando? – Shara estava confusa.

—Do que eu disse aquele dia... e da forma como reagi... a nossa última conversa aqui – ela apontou para a enfermaria – esse lugar... eu não deveria ter dito aquilo... Shara eu sinto muito… eu sequer pensei sobre, apenas a julguei… justo você, eu não deveria… não deveria… você passou por tanto, eu fui... eu piorei tudo... – ela soluçou – sinto muito...

—Não – Shara a interrompeu – eu... se alguém aqui é culpado de algo Catie, sou eu... eu estraguei sua vida... Como pode dizer que não deveria? foi minha culpa, minha culpa... o seu pai, você sabe... minha culpa... 

—Por favor Shara não... você era apenas um bebe, um bebezinho tirada da sua família... você foi tão ou mais vítima do que eu... isso não é sua culpa, como poderia? – Catie segurou sua mão com força, a surpreendendo, Catie era sua melhor amiga, mais que isso, uma irmã, antes de qualquer um... ela era sua família, Shara sentiu tanto a falta dela, aquele toque... - me perdoe… eu retiro tudo que disse Shara, foi um erro… você foi tão honesta aquele dia, eu deveria ter sido mais sensível… racional, eu estava perdida... eu queria poder voltar no tempo e apagar aquilo... mas não é assim que as coisas funcionam, não é mesmo? nem com magia – ela sorriu discretamente - e agora, esse lugar... você está aqui, e esta ferida...

—Eu... bem, Catie... não quero que se sinta incumbida de me pedir desculpas, pelo fato de me encontrar na ala hospitalar... estou bem, e sabe… eu meio que costumo frequentar esse lugar com uma certa assiduidade, verá que é inevitável... pra mim, não me envolver em problemas – Shara também tentou sorrir, mas a verdade era que ela não queria que a amiga se sensibilizasse com o fato de encontrá-la naquele estado ali.

—Não Shara... eu queria ter dito antes, pedido desculpas... mas minha nova rotina, está um pouco difícil conciliar as coisas – Shara a analisou, ela tinha uma rotina? Ocupações no castelo? Shara sabia tão pouco sobre a amiga agora – eu decidi que faria... sim na sexta à noite, mas você... você sumiu... eu a procurei em todos os lugares do castelo, fui até suas amigas... Antony havia me falado sobre elas certo dia, Gina e Roberta... mas elas também não sabiam, elas disseram que você costuma desaparecer com alguma frequência... – Catie explicou, bem aquilo era de fato uma verdade… claro que ela não ia mencionar que havia ficado presa nos aposentos do professor Snape, simplesmente não iria cair bem… Catie não sabia sobre eles, ninguém deveria saber sobre eles, não era justo quando ela era sua melhor amiga, mas Dumbledore havia exposto as consequências, e agora mais do que nunca ela entendia, ela não arriscaria.

—Bem sim... é complicado – ela disse, desviando o olhar para a maca ao lado, pensando em falar algo sobre as mentorias, aquilo afastaria qualquer desconfiança, afinal era para isso que as mentorias haviam sido estabelecidas.

—Ele é o professor que você mencionou aquele dia, não é? – Catie perguntou, interrompendo seus pensamentos – aquele que você disse que estava aprendendo a confiar – Shara assentiu... sim Catie estava certa, Shara confiava nele, a muito tempo, desde o primeiro momento talvez, e isso antes mesmo de saber quem ele era de verdade.

—Eu o vi na biblioteca certa vez... – ela informou, biblioteca? – confesso que ele me causa um certo medo – ela admitiu, Shara sorriu, medo era uma palavra relativamente amena, para tudo que ele causava nos alunos.

—Digamos que ele não seja lá muito carismático – ela devolveu para a amiga.

—Nem sociável... e tão pouco gentil, um tanto quanto rabugento eu diria, ou talvez hostil... além de ofensivo, muito ofensivo... enfim... – Catie estava sendo sincera, e Shara teve que se controlar para não rir daquilo, a amiga era sempre muito observadora, e ela havia feito uma descrição completa dele ali – ainda assim ele se importa com você... devo admitir – Shara arqueou a sobrancelha, sim Shara sabia o quanto ele se importava, principalmente depois daquilo que ele fez por ela... mas não havia como Catie saber sobre... sem que ele tenha dito ou algo assim, e ele não diria… diria? – Ah digo isso por que ele me abordou, foi uma única vez, mas posso me lembrar perfeitamente bem das palavras que ele usou… foi mais ou menos assim “Srta. Cortez, se pudesse usar o cérebro, teria notado sua falta de escrúpulos, ao vomitar seus inúteis e totalmente desqualificados julgamentos sobre a Srta. Epson, é evidente que a falta de massa pensante seja o motivo pelo qual não possa perceber, que na verdade você deveria agradecê-la já que ela não apenas a salvou naquele dia, implorando a mim pela sua pobre e infeliz vida, como também a resgatou de um futuro miserável, onde você não passava de um mero elfo doméstico sem proposito algum” - aparentemente Catie havia mesmo decorado a fala dele, Shara engoliu seco.

—É... eu sinto muito por isso – ela corou, envergonhada,  afinal aquilo soava mesmo bastante ofensivo, nenhuma novidade afinal, já que era assim que ele agia, sendo aquele o tipo de comentário carregado de insultos que ele distribuía gratuitamente por ai - tem razão ele é meio desprezível as vezes… - Shara tentou… desprezível ainda era pouco, ela sabia.

—Não sinta... Honestamente, pode não ter sido delicado, mas ele tem razão – ela disse – razão sobre tudo, eu sei sobre os elfos domésticos agora e nada nunca fez tanto sentido - Catie sorriu – e acho que não usei meu cérebro adequadamente, então... me desculpe Shara - ela disse carregada de emoção – de coração... eu sinto muito – ela apertou sua mão – eu não a culpo, saiba disso não a culpo por nada... eu odiava aquele lugar, você a nossa amizade, era a única coisa boa lá... e agora podemos ficar juntas outra vez... aqui, e esse lugar, tem sido bom pra mim... então eu sou grata, grata por não ter desistido de mim naquele dia, e ter implorado pela minha vida – ela enxugou as lágrimas outra vez - você me salvou, e eu devo minha vida a você.

—Catie... eu faria qualquer coisa por você e eu faria novamente, quantas vezes fossem necessárias... e não há nada para perdoar, honestamente e seus julgamentos não estavam tão desqualificados assim... você sabe… - Shara retribuiu o toque da amiga, repousando sua própria mão sobre a dela.

—Shara... acontece que estavam... você me resgatou aquele dia, de verdade, me trouxe para esse lugar, tem sido incrível, obviamente… que eu não queria que as coisas fossem da maneira como foram... o lar, as meninas... Noah – ela disse o nome do pai de uma forma diferente, Shara notou - e até mesmo Mancha, mas você não planejou nada disso... eu posso ver isso agora, não é sua culpa – Shara estava emocionada com as colações da amiga, era inexplicável o quanto Shara a amava – você passou por tanto Shara… e quanto a mim, em tão pouco tempo, tanta coisa aconteceu aqui, eu mencionei a biblioteca né... – ela sorriu abertamente - pois bem o diretor, ele me fez uma oferta, sim ele me ofereceu uma vaga de trabalho efetivo, e agora estou auxiliando a madame Pince, e ela tem sido formidável comigo, mesmo eu não tendo magia, ela parece não se importar, e embora eu tenha trabalhado na biblioteca de Londres, nada se compara a esse lugar, os livros... as histórias... e estou sendo paga, um salário justo, tenho uma ala pra mim, só pra mim... um quarto, uma sala, uma pequena cozinha... o banheiro, tem uma banheira acredita?... e ainda posso fazer três refeições por dia, três! – ela disse animada com algo que era tão básico e simples – e tem o Antony... – ela corou – ele tem sido tão bom comigo – ela havia dito, e Shara se prendeu naquela última colocação, obviamente que Shara estava feliz pelas conquistas da amiga, ela parecia mesmo feliz com aqueles arranjos novos, mas Shara não podia se alegrar sobre Antony, não quando havia um ritual, não quando era esperado que ela o fizesse...

—Antony, ele é mesmo especial – Shara se viu dizendo, Catie a olhou nos olhos, aquele olhar comunicava tanto, Catie estava se apegando a ele.

—Eu sei que é prematuro dizer – Catie parecia procurar as palavras certas – mas Antony, ele me faz sentir, como se eu estivesse em casa... minha verdadeira casa – ela sorriu de forma discreta – talvez eu deva ser grata a você também... por isso, eu nunca o teria conhecido se não fosse por você – ela estava emocionada e Shara sentiu parte do seu coração sendo quebrado, moído ali – Shara, quando sair daqui, e estiver melhor... vamos passear pelo castelo, eu quero recuperar o tempo que perdemos, tem tanto pra te contar – ela disse esperançosa – quero ouvir as suas histórias também... ver sua magia, aqui você pode me mostrar não pode? – ela estava animada - Quero que as coisas voltem a ser como era antes... antes de tudo isso – seus olhos se encheram de lagrimas mais uma vez – apenas... se quiser é claro – ela baixou a cabeça.

—Sim... eu quero isso… nossa amizade, eu senti tanto a sua falta – Shara se jogou nos braços da amiga – eu amo você Catie – Shara disse para ela, era bom tê-la de volta – eu faria qualquer coisa para vê-la feliz – Sim, Shara de fato faria... ela estava certa disso.

—Eu amo você Shara – Catie devolveu e elas ficaram ali abraçadas por um certo tempo, tempo esse que Shara não queria que passasse.

—___

Antony caminhou a passos largos pelas ruas daquela vila deserta, o cenário era completamente diferente daquele que ele mantinha vivo em suas lembranças, aquele lugar parecia estar abandonado a anos, muitos anos por sinal, e isso denunciava Elza mais uma vez, principalmente pelo fato de que fazia menos de um ano que ele mesmo havia sobrevoado aquelas ruas, logo após ter sido despertado daquele sono profundo que ela o havia imposto, Elza o tirou do caminho, um maldito feitiço e a vida dele havia mudado completamente ao despertar... ele suspirou, a vila certamente havia sido apenas mais um dos truque de Elza, assim como todo o resto, era ainda pior imaginar o quanto ela havia impactado a vida de tantas outras pessoas, além da dele, além das pessoas de sua própria família, Antony suspeitava de que na altura do peito, ela possuísse uma pedra de gelo, ao invés de um coração, e por esse motivo que ele achou que seria conveniente congela-la, assim ela seria fria tanto por fora como ela já era por dentro.

A tempestade havia dado uma trégua ali e um sol tímido parecia querer surgir no horizonte, um novo dia, sim estava quase amanhecendo, ele segurava em uma das mãos o cajado, aquele instrumento que ele havia revelado na noite anterior, e que o havia elevado a um novo patamar, Antony podia sentir sua magia, agora cada vez mais forte e concentrada fluir a partir dali, era poderoso, muito poderoso... foi difícil aceitar aquela transição, ele precisou repensar sua história, o seu papel dentro daquele caos milenar, mas tanta coisa havia mudado nesses últimos meses, Antony parecia mesmo ter encontrado algum sentido na vida, um proposito libertador que o fez entender melhor seu papel, quem sabe fosse um recomeço, haviam se passado milhares de anos agora e Shara dentre tantas outras guardiãs havia tornado sua jornada especial, sim ela podia tocar seu coração como ninguém antes pode, ela era uma pestinha... ele tinha que concordar, mas ainda assim era uma pestinha adorável e ver como ela via a vida, a leveza apesar das duras penas, a forma como ela se sensibilizou com ele desde o princípio, o próprio perdão que ela havia liberado quando ele achava estar condenado e não merecer, tudo isso fez parte da sua mudança e sem falar que ele havia feito um amigo, alguém completamente improvável e inusitado, Severo Snape, aquele bruxo que o fez perceber que ele também possuía ressalvas, e que ao passar por cima de seus pré julgamentos, encontrou nele alguém fiel, Severo provou ter um coração quando o libertou de seu cativeiro, sem que houvesse uma intenção logica de fazê-lo, mas ele o havia resgatado de sua própria maldição, e o fato de não pertencer apenas ao corpo de uma ave, também o fez se sentir mais vivo, sim Severo, Shara... eles, ambos... eram os responsáveis por aquele recomeço, eles eram sua família agora, e Antony passou a ter um propósito pelo qual lutar, Shara... e agora ele precisava retribuir de alguma maneira, ele precisava ajudá-la a quebrar a maldição das guardiãs, ele segurou o cajado com ainda mais força fazendo com que pequenas faíscas azuis saíssem de dentro dele, ele era Antony o mago, ele sorriu, ao contemplar quem ele havia se tornado.

Antony abriu a porta daquela casa empregando alguma violência ali, e a atravessou com certa pressa, havia algo para ser resolvido, e pensar nas possibilidades e maneiras de fazê-lo o deixou sem dormir, Elza estava ali, exatamente onde ele a havia deixado, ela permanecia congelada, obviamente... e por mais forte e poderosa que ela pudesse ser, nada se comprava a magia dele, a magia do mago… e sem mencionar o fato de que agora ela estava mais vulnerável, muito vulnerável, Antony se aproximou dela, estendendo a palma da sua mão a altura do seu coração, apenas para se certificar... 3 dias, a magia revelou, Elza tinha apenas mais 3 dias de vida, em outras épocas ele a julgaria com sorte, afinal ela estava prestes a morrer, mas agora não... principalmente por que ela havia passado a vida correndo atrás do vento, destruindo tudo e todos por onde passou, para no fim, não existir nada, nenhum pote de ouro no final do arco íris, era patético... mas o futuro já não era o mesmo, Antony era o novo futuro, Severo Snape era o novo futuro, Shara era o novo futuro...

Antony lutou contra o desejo de simplesmente deixa-la ali, congelada até seu último suspiro de vida, já que ele havia tomado o cuidado de deixa-la suficientemente consciente, para que ela pudesse pensar e refletir sobre seus atos, não que ela o faria, mas por assim dizer, aquela seria uma morte terrivelmente lenta, algo que ela merecia, mas ainda havia algo para ser dito e esclarecido e com um leve soprar todo o gelo que a prendia se desmaterializou, a libertando.

—Antony – ela silvou assim que notou que podia se mover e falar outra vez, ela não passava de uma bruxa debilitada, à beira da sua morte – vejo que veio assistir – seus olhos brilharam – o meu fim... falta pouco agora, não falta? – ela perguntou – quanto?

—3 dias ele revelou – a encarando absorver aquela verdade, ela havia baixado os olhos...

—Sabe, Aurora adorava você – Elza disse, a voz um tanto quando rouca – eu nunca entendi muito bem o motivo, você era apenas um pássaro inútil... um animal de estimação como qualquer outro, quando na verdade você deveria ter sido um guia, alguma espécie de protetor, eu sempre me perguntei... mas guia de que exatamente? – ela o olhou – não havia nada demais ali, em você, mas eu posso ver agora, a sua magia... esse tempo todo... se tivesse usado sua magia, para nos proteger e guiar, como fez com a menina ontem à noite, talvez as coisas tivessem sido diferentes... talvez...

—Tem razão – ele admitiu, ela não estava mentindo – eu passei a vida acreditando em mentiras, confiei nas pessoas erradas, fantasiei algo e então perdi tudo, foi por esse motivo que reprimi a magia e por essa razão que falhei miseravelmente em minha missão – Elza o encarou confusa – veja que não tenho problema algum em admitir isso agora, pois recebi misericórdia e hoje a estendo a você, já que você também falhou e vem falhado esse tempo todo.

—Veio aqui... para me oferecer misericórdia? – ela questionou.

—Sim... apenas uma chance de se explicar e de se arrepender genuinamente... mas não se iluda – ele a encarou, suas feições duras – não se trata só disso, eu vim e estou aqui para matá-la. 

—Chama isso de misericórdia? – ela o analisou, ele sorriu de maneira sombria.

—Sim... você melhor do que ninguém, deve saber que o tempo é relativo... 3 dias de vida pode ser pouco, sim... mas não para quem está sofrendo e agonizando, não que você não merecesse isso é claro, mas pretendo poupa-la e isso é sobre misericórdia – ele havia deixado Elza sem palavras, então ele aproveitou aquele momento de silencio para se abaixar e pegar o vaso do chão, Antony se lembrava daquele vaso, da flor...  – Aurora, posso me lembrar bem dela agora, posso me lembrar de tudo… Aurora era mesmo adorável – ele disse com um teor de saudades – uma Ipomoea alba – ele encarou a flor novamente – A corde de Aurora era branca, branca como essa flor ao desabrochar noturno, se destacando na escuridão – ele disse ao se lembrar daquela borboleta em especifico, Antony havia se esquecido das borboletas  - você roubou minhas memórias Elza... mexeu com minha cabeça, e não satisfeita me pôs para dormir – ele a acusou, ela não se defendeu – essa estufa – Antony analisou o lugar, antes tão cheia de vida, agora completamente destruída, apenas mais um reflexo do que Elza era capaz de fazer - você a montou nessa casa, para se lembrar dela, não foi? – ele perguntou, ela assentiu brevemente – por que a matou Elza? – ele perguntou, ele precisava saber, era inconcebível... ela era a mãe dela, Aurora era sua filha.

—Não tive escolhas – ela disse, retirando um objeto do bolso, uma esfera dourada, completamente desenhada, ela a estendeu para que a Antony a pegasse, ele o fez, curioso – Atena me deu, certa vez... não tem mais utilidade pra mim – ela entregou.

—Isso deveria responder minha pergunta? – ele se viu olhando para aquela esfera sem entender, era bonita e ele podia sentir a magia daquele objeto se conectar com sua própria magia, magia ancestral.

—De certa forma sim – Elza disse – a esfera é encantada, foi com ela que vi fragmentos do futuro... um presente de Atena, e um erro, eu não deveria ter aceitado – Elza parecia arrependida, algo inédito até ali.

—O dom – ele a encarou - era isso então... um objeto - ela bufou.

—Dom... – ela repetiu – eu precisava inventar algo... então eu menti sobre possuir esse dom – ela afirmou – era viciante a sensação de saber o que iria acontecer... acredite foi assim que conquistei muitas coisas, bens matérias... deve se lembrar... eu não tinha nada – ela sorriu, sim ele se lembrava agora...  daquele pequeno chalé no bosque onde ela vivia com Aurora, para Antony aquilo era mais que o suficiente mas Elza tinha ambição – mas não só isso, eu vi o Simon... vi quando ele me deixou, ele estava indo embora... – seus olhos, Antony parecia ter visto alguma oscilação ali – claro, que me antecipei, e o deixei primeiro, eu parti com Aurora antes mesmo que ele pudesse entender o que havia acontecido  – ela devolveu, sim havia um lapso de tristeza naquele olhar – eu vi Aurora, vi seu futuro também, seu casamento... vi o nascimento de Maeva, a vi sofrer por amor, a morte prematura do pai de Maeva, então a vi se apaixonar novamente... vi tudo isso, anos antes de acontecer... mas o preço de tanta informação era alto demais para mim, alto demais para que eu pudesse sustentar... o preço era o tempo, sim o tempo é relativo – ela o encarou – mas era o meu tempo e isso me custou tudo... cada nova visita no futuro, alguns poucos minutos que fosse, isso me roubava anos de existência, havia apenas um jeito, uma forma para compensar essa perda, o sangue, eu precisava beber o sangue de uma guardiã para recuperar o tempo que me era descontado – ela revelou, o deixando atônito, Antony sentiu um arrepio percorrer sua espinha, ao encarar aquele objeto mais uma vez, aquilo havia feito um estrago em tanto, era quase demoníaco... Atena era cruel – eu a matei por que o seu sangue era minha única opção, eu precisava de vida, sem a vida eu não poderia cumprir meu propósito – ela admitiu – mas eu a recompensaria no futuro – Elza disse – eu faria qualquer coisa por Aurora, pela minha filha.

—Está tentando me sensibilizar? – ele perguntou incrédulo – não espera que eu caia nessa, não depois de ouvi-la, tudo isso... simplesmente aterrorizante, você a matou, matou sua própria filha, por ganancia, poder? Se sabia o preço e se sabia as consequências... se sabia de tudo isso, não deveria ter feito, e se fez… bem isso diz mais sobre você e sobre o seu coração do que possa imaginar.

—O colar – ela disse, o ignorando, enquanto tirava o colar de Shara do bolso – a poção no colar... é para necromancia, agora esqueça tudo que você sabe a respeito de necromancia, magia ancestral vai além de tudo isso, o que acha que poderia vir de um ritual de necromancia nessas condições? - ela sorriu, não havia limites para magia ancestral, ele sabia… já que ele a possuía - Sim... eu faria o ritual, Atena me explicou que eu poderia trazer a vida qualquer outra guardiã do passado... quem você acha que eu escolheria?

—Isso é impossível – Antony interveio – a morte está fadada a ser o que é... a morte é o fim... de todas as coisas…

—Não para os Deuses, não para seres imortais como eles – ela devolveu – achei que tivesse notado, a magia ancestral tem recursos que a magia tradicional jamais poderá ter ou alcançar... não foi isso que fizeram ontem, você e a menina, Severo usou a adaga… e vocês o resgataram – sim ele sabia... mas a adaga era encantada, apenas algumas horas, nada mais... não anos – eu traria Aurora... sim eu faria, não para me apropriar do corpo dela ou coisa assim, não... mas a traria de volta para mim – Elza revelou – por essa razão eu precisava da adaga e da menina, eu precisava de um corpo de qualquer forma, estou velha e Shara supriria essa finalidade... eu usaria a adaga, a mataria, expulsaria sua alma – Antony a encarou chocado – sabe, eu estudei sobre isso, me aprofundei sobre feitiços da mente, me tornei boa nisso, então fiz uma conexão com a mente da criança, estava tudo pronto, tudo planejado, devidamente preparado, esse tempo todo... - Se Antony achava que Elza havia ido longe demais, agora não lhe restavam dúvidas – então eu me apropriaria do corpo da menina, do seu vigor e da sua juventude, depois disso eu quebraria a maldição e nesse ponto eu traria Aurora de volta a vida, e então viveríamos... como nos velhos tempos, apenas nós duas... sem medo, sem precisar fugir... pelo contrário, os bruxos nos temeriam, seríamos fortes, poderosas, estaríamos no topo já que seríamos imortais, e sendo assim nos vingaremos de todos aqueles que um dia ousaram nos machucar, machucar nossa ancestralidade – então era isso? e por um breve momento ele sentiu pena dela, pena da maneira decadente como ela achava que estaria recuperando o tempo perdido, Aurora jamais aceitaria aquelas condições...

—Aurora sentiria vergonha do que fez e do que se tornou – Antony disse com repulsa, e aquelas palavras pareciam tê-la acertado em cheio.

—NÃO OUSE... VOCÊ NÃO SABE NADA SOBRE ELA, AURORA ME AMAVA, ELA SERIA GRATA, GRATA APENAS A MIM – Elza gritou

—Não Elza, você não entendeu... – ele a encarou – Aurora a amava sim, como toda criança ama sua família, mas ela não era mais uma criança, e ela não compactuaria com algo assim, você deveria saber, você era a mãe dela, você deveria tê-la amado, cuidado dela, a protegido… mas você... você a matou.

—EU A TRARIA DE VOLTA SEU IMBECIL... – Elza estava exaltada – mas então... Severo Snape estragou tudo, quando quebrou sua maldição... estragou tudo quando se afeiçoou a garota... isso é tudo culpa dele, e também é culpa sua... culpa da maldita menina – ela disse com dificuldade de respirar.

—A menina... é sua bisneta Elza, ela é filha de Maeva, a sua neta... que por sua vez é filha de Aurora... como acha que Aurora iria reagir a isso? Vamos pense um pouquinho, você quer sua filha de volta, quando você mesmo tirou a filha dela – Antony pressionou o cajado com força na mão, aquelas eram verdades difíceis de serem ditas – Aurora jamais entenderia algo assim... jamais, você destruiu vidas Elza, não apenas as delas, mas tantas outras vidas pelo caminho... famílias inteiras, Aurora sentiria tanta vergonha, repulsa, ela te odiaria – ele disse a vendo fragilizar… ela estava prestes a quebrar.

—Aurora... ela me deu a flor... ela me disse para enfrentar a escuridão, os momentos difíceis, e para descobrir a luz que existe dentro de mim e não desistir... eu foi o que fiz, eu fiz por ela... E pelo nosso futuro – Elza disse, agora confusa, ela finalmente parecia ter entendido o verdadeiro significado daquilo que Aurora havia dito, e aquilo não significava matar a todo custo, destruir e causar sofrimento.

—Eu sinto muito, mas você entendeu errado – ele disse, a vendo soltar o colar no chão, ela parecia ter entendido, finalmente entendido que havia ido longe demais, ele viu lágrimas se formarem em seus olhos – você assim como eu acreditou nas pessoas erradas, aceitou a oferta errada, alimentou sentimentos errados, fantasiou e perdeu tudo – ele disse – o seu desejo de vingança, a ânsia pelo poder a todo custo a cegou.

—Então isso… isso nos torna iguais? – ela perguntou e aquela pergunta o fez pensar por um breve momento, ele sorriu ao se dar conta da resposta.

—Não... não nos torna, eu recebi a magia ancestral, o poder e a imortalidade e desde o primeiro momento eu os rejeitei, sim eu desprezei tudo aquilo que o seu coração busca e deseja... e tudo que eu fiz ou melhor deixei de fazer foi porque detestava estar vivo, eu queria morrer Elza, por que eu havia perdido tudo... sim eu perdi tudo naquele dia Elza, mas isso não fez de mim um assassino.

—Se não é um assassino, o que você é? – ela perguntou – já que você mesmo disse que me mataria.

—Bom... só lhe restam 3 dias de vida, não que faça alguma diferença para o mundo se você partir um pouquinho antes não é mesmo? – ele admitiu aquilo que o havia corroído a noite toda, ele desejava matá-la... mas ele não era como ela, não... ele percebeu que não haveria tortura melhor do que aquela onde Elza se dava conta de que tudo que ela havia feito em vida foi em vão, de que tudo que pensou e almejou estava errado, de que Aurora não a amaria daquela forma, nem ali e nem em lugar algum, ele viu as lagrimas descerem pelo rosto enrugado dela... ela havia entendido e ela estava sofrendo, e isso era o bastante para ele.

—Me permita... um último desejo – ela pediu, ele apenas a encarou, esperando que ela evoluísse aquilo – leve meu corpo, e o enterre junto ao túmulo de minha filha, Maeva também foi enterrada lá, já que alguns membros da ordem moravam naquela região, seus corpos estão no cemitério de Godric's Hollow, leve também a flor, Aurora apreciaria isso – ela disse enquanto tirava a varinha do bolso – a varinha de Medusa – ela estendeu para ele – faça o que achar melhor com ela – Antony assentiu.

—Concedo o seu pedido, se me prometer que levara um recado – Elza o encarou confusa – bom diga a Atena, quando a encontrar que ela estava errada, diga a ela que Medusa era na verdade filha de Poseidon e nada mais que isso, diga que o resto é apenas fantasia da sua cabeça– ele pediu, sentindo prazer em fazê-lo.

—Atena... acha mesmo que vou me encontrar com Atena? – Elza perguntou – a lenda fala de uma estação de trem e dois destinos...

—Sim… o inferno – ele disse sério – é pra lá que você irá, Hades a esperará no portão... e bem Atena era amante dele, ela vai aparecer algum dia, dê meu recado... é eu sei... hipocrisia que fala – Ele disse mais para si mesmo - Atena é uma vadia ardilosa e manipuladora, que se acha dona da razão e rainha de toda a sabedoria, a Deusa magnânima da justiça… mas a justiça é cega não é mesmo? – Antony riu daquele trocadilho, Severo tinha razão sobre os livros, não eram confiáveis – apenas diga... ela vai adorar saber que foi enganada esse tempo todo.

—Temos um acordo – Elza disse – seu recado será dado, Elza fechou os olhos... agora deixando as lagrimas fluírem livremente – faça o que tem que ser feito Antony – ela pediu – por favor não demore – ele não demoraria, ele ergueu o cajado, ele não precisava dizer, apenas pensar... uma nuvem preta a encobriu, foram apenas alguns segundos para que Elza fosse reduzida ao pó que ela era de fato. Ele a havia matado.

—----

Shara estava na torre de astronomia, não havia lugar melhor do que aquele para aplacar um pouco todo o ruído que sua mente estava produzindo, sim ela havia se apegado ao lugar mesmo com todas as lembranças que ele lhe trazia, foi ali que ela o chamou de pai pela primeira vez, não que houvesse ternura, ela estava com ódio naquele dia, mas muita coisa havia mudado desde então, eles eram uma família agora, uma família completamente improvável, desajustada e imperfeita e ainda assim, era bom, ela sorriu para o horizonte, sentindo o vento frio queimar sua pele e balançar seus cabelos, estava anoitecendo, Shara havia passado o resto daquele dia na enfermaria, seu pai ainda não havia despertado, não que ela esperasse que ele fosse faze-lo tão cedo, mas ainda assim ela esteve por perto, o tempo todo o assistindo, ele estava vivo e isso importava mais do que tudo, seus pensamentos foram interrompidos pelo pássaro negro e de porte mediano que havia pousado sobre o parapeito, ele a encarava de maneira familiar, assim como havia feito pela primeira vez naquele dia, na rua em Londres enquanto carregava a carta de sua mãe no bico.

—Antony – ela sussurrou para ele que imediatamente saltou, se transformando na sua versão humana, Shara preferia assim, ele tirou de dentro do bolso o colar da sua mãe e a sua varinha, quer dizer a varinha de Elza, ou melhor a varinha de Medusa... Shara encarou os objetos, Antony os havia buscado.

—Acredito que a varinha será útil para as aulas e o colar... – ele parou de falar... Shara sabia o que ele queria dizer ali, ele estava se referindo ao ritual, afinal não haviam mais empecilhos agora... não com Elza fora do caminho.

—O que você fez... digo, o que fez com ela? – Shara perguntou, o vendo desviar o olhar e passar a encarar o lago a sua frente, ele não devia estar se sentindo confortável com aquilo, ainda que Elza merecesse seja lá o que fosse que ele havia feito com ela – Acabou... não acabou? – ela perguntou outra vez – quer dizer... eu sei que não acabou exatamente, não tudo – ela reformulou – mas... isso com Elza, acabou? – Antony se aproximou do parapeito, ele parecia com dificuldade de encontrar as palavras ali – olha... tudo bem, eu sei sobre ela... eu sei que ela está morta, eu posso sentir isso, sabe na minha mente... tinha algo dela aqui, uma ponte, um acesso... e eu simplesmente não o encontro mais e quer saber não importa como tenha feito, ela merecia... morrer – Shara concluiu, não que ela desejasse a morte das pessoas, mas de Elza, bem era um pouco reconfortante.

—Sim... – Antony se virou para ela - Elza merecia morrer – ele disse por fim, Shara fechou os olhos por alguns segundos se sentindo aliviada, ela sabia... mas ela queria ouvi-lo dizer, e ele havia dito, Elza se foi... havia mesmo acabado, pelo menos uma grande parte daquilo havia acabado... Shara ainda tinha que lidar com Lúcios Malfoy, com Louise Diaz... e sabe se lá quantos outros bruxos das trevas, ela ainda continuava sendo uma guardiã, seu sangue ainda era valioso, a maldição ainda era real... havia um ritual para ser feito por ela e uma Hidra morando na frente do castelo... sim, mas Elza se foi e Shara sorriu.

—O que você acha que acontece depois daqui? – Shara perguntou... – sabe sobre a morte – era inevitável não refletir sobre aquilo, Shara nunca havia caminhado tão perto da morte antes, como havia caminhado ali.

—Bom difícil dizer... mas durante essa longa jornada aqui, ouvi muitas histórias nesse sentido, algumas bem parecidas por sinal... me parece, que há uma espécie de estação de trem a nossa espera – ele disse.

—Uma estação? – ela perguntou curiosa.

—Sim... um embarque e dois destinos - ele se voltou para o lago.

—O céu e o inferno? – ela perguntou – bom, quer dizer... os trouxas acreditam assim – ela informou, não que fizesse alguma diferença.

—Sim... o céu e o inferno... mas quer saber, isso é apenas uma lenda e nós não acreditamos em lendas não é mesmo? – Shara não podia ver, mas ela podia jurar que ele estava sorrindo.

—Sim... não acreditamos em lendas – ela mesma sorriu daquele comentário, ele fez sinal para que ela se aproximasse dele, e então ele a puxou para um abraço tenro, passando seu braço pelo seu ombro e a mantendo por perto, Antony era de fato especial.

—Acredito que em breve, eu saberei a resposta – ela o ouviu dizer, soava esperançoso.

—Antony, sobre isso... tem algo que eu preciso te dizer – ela fechou os olhos, agora empregando alguma força ao fazê-lo e se lembrando do encontro com Catie essa manhã, sim ela faria de tudo para ver a amiga feliz, foi o que ela havia dito... Shara se virou para Antony, procurando seus olhos e assim que eles se encontraram, ela precisava dizer... – eu não vou fazer o ritual – ela afirmou com bastante convicção.

—Isso... não está em discussão Shara… você sabe, é preciso...– ele devolveu, numa tentativa desesperada de faze-la mudar reconsiderar o que havia dito.

—Não Antony – ela se afastou dele – eu não posso... eu não quero que isso dependa de mim… eu não sou a juíza aqui, portanto não me peça para decidir pela sua vida ou a minha, eu não posso... simplesmente não - ela afirmou.

—Já tivemos essa conversa antes... Shara apenas me escute... eu posso ver, entender que esteja sensível depois de tudo que aconteceu ontem, cansada talvez, mas você não pode fazer isso, não pode decidir isso sozinha, entende? – ele argumentou – por favor... – ele implorou.

—Eu sinto muito Antony, mas não posso… – ela se virou em direção a escada – eu sinto de verdade - então ela correu.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Esse é um capitulo mais simbólico, afinal depois da tempestade um pouco de calmaria.
Me emocionei escrevendo trechos aqui, como o fato de Shara entender agora de forma tão lucida o quanto Severo se importa mesmo com ela, isso acima de qualquer coisa, acima até mesmo daquilo que ela achava que ele mais amava aqui, que era fermentar poções. Ela vencendo o medo da tempestade, quando algo maior, toma grandes proporções ali, nesse caso a morte... e a própria percepção dela em relação a morte, a ponto dela perceber, que não, ela não desejava mais morrer, que Severo havia dado razões para ela viver.

E então temos uma conversa entre amigas, aquela reconciliação, e tudo parecendo entrar nos eixos mais uma vez.
Aquela vibração boba com a felicidade e sensação de pertencimento de Catie no castelo.
E então a comoção com aquilo que todos nós sabemos (mas Catie ainda não) sobre o destino de Antony quando Shara fizer o ritual, e mais uma vez Shara estaria tirando algo da amiga :(

E então vemos uma conversa mais profunda de Antony (que tem parte do capitulo só pra ele outra vez) com Elza, ele estabelecendo misericórdia, depois de faze-la perceber que tudo que fez foi em vão... ela amava Aurora, mas era extremamente possesivo, embora na mente dela, esse filme de terror parecia fazer algum sentido.
E então ele mata Elza, por que sim... ele merecia mata-la, e não temos uma cena de tortura aqui, Severo faria... certamente algo como ele fez com Noah, mas Antony não, e honestamente achei que foi ainda mais cruel.

E pra fechar com chave de ouro, ele mandando o recadinho pra Atena, massss báh se não é pra causar treta ele nem faz né... como será que a Deusa suprema da INjustiça vai reagir kkkkk

E encerramos com Shara se posicionando, vejam que mais uma vez ela não está pensando nela e no risco que é viver sobre aquela maldição, que sim, ela pode tranquilamente quebrar agora... mas ela está pensando na amiga, em Catarina!

Me contem o que acharam!!!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Destinos Improváveis" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.