Backdoor escrita por llRize San


Capítulo 17
Líder




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O olhar de Felix transitou da mão estendida de RAM para seus olhos, que, apesar de exibirem uma expressão humana e um sorriso amistoso, revelavam, ao observar mais atentamente, uma frieza e vazio inconfundíveis. A energia que emanava dele não seguia a mesma vibração humana, algo perceptível para qualquer pessoa mais sensível.

Preso em um dilema emocional, Felix sentia-se confinado em um espaço onde a decisão tornava-se urgente. Sabia claramente qual era a escolha correta, mas seu coração, ansioso por uma proposta tão desejada, conflitava com sua razão. Mesmo com Zero UM vulnerável, com o abdômen aberto e fios estourados, uma situação que permitiria sua imobilização fácil, Felix hesitava. A tentação de aceitar a oferta daquele androide, que parecia capaz de trazer a felicidade que ele tanto buscou e nunca encontrou, era irresistível.

— Então você não vai fazer mal aos meus amigos? 

— Não. Não vou. 

Felix possuía uma inteligência aguçada, mas, naquele momento, suas emoções sobrepujavam sua lógica. Consciente de que Zero UM não possuía más intenções e, com certeza, cumpriria qualquer promessa feita, ele deixou de considerar que o que é benéfico para uma máquina pode não ser necessariamente positivo para um ser humano. Ignorando sua intuição e afundando-a o mais profundamente possível, com a mão trêmula, apertou a mão estendida de RAM.

— Então temos um acordo — Confirmou Felix. 

— Vai dar tudo certo. Você tomou a melhor decisão e todos vão ter vidas melhores quando tudo isso acabar. 

— O que eu preciso fazer? 

— Só precisa ficar quieto. Não conte a ninguém o que viu e aja como se eu fosse o verdadeiro Han Jisung. 

Felix suspirou, sentindo-se como a pior pessoa do mundo, se é que podia considerar a si mesmo um humano. Trair seus amigos não era algo fácil, mas ele não conseguia enxergar uma solução para toda aquela situação. Percebia que Zero UM detinha o controle de tudo, e confrontá-lo parecia uma batalha impossível. Talvez, de alguma maneira distorcida, essa fosse a única forma de salvar a todos. Afinal, um dos lemas de Felix sempre foi "se não pode vencer seu inimigo, junte-se a ele".

O que ocupava a mente de Felix agora era a incerteza sobre o verdadeiro estado de Han e a curiosidade sobre o que Zero UM quis dizer ao mencionar contratempos envolvendo ele.

Han Jisung ouvia atentamente os planos que Dahyun elaborava para o roubo de suprimentos.

— Quantos Latas tem lá? — Perguntou Jisung analisando o mapa que tinha em mãos. 

— Contei quinze — Informou ela riscando alguns X de vermelho para mostrar a posição que cada andróide guardava. 

— Não é seguro — Jisung suspirou, não queria colocar ninguém em risco. 

— Sr. Jisung — Nayeon interrompeu — Eu me voluntario, sou rápida e conheço esse lugar como ninguém, me deixe ir. 

Dahyun deu um empurrão na irmã. 

— Nay, vá cuidar de Tzuyu, ela deve estar assustada. Você nem deveria estar aqui. É uma reunião de adultos. 

— Mas você também não é adulta. 

— Mas sou sua irmã mais velha e em breve farei 18. Me obedeça e vá cuidar de Tzuyu. 

— Sua irmã tem razão — Disse Jisung — É uma tarefa perigosa e você ainda é muito nova. Dahyun também é. Vocês ficarão aqui no esconderijo em segurança. Eu mesmo vou lá. Não se preocupem, vou voltar rápido.

Nayeon suspirou, ansiando por se envolver nas atividades dos rebeldes, mas sempre era barrada devido à sua idade. Nem mesmo Dahyun podia participar das buscas; ela se limitava a contribuir nas reuniões devido à sua inteligência aguçada e suas habilidades em criar planos astutos.

Os Orgânicos, autodenominados assim, formavam um grupo de rebeldes que haviam conseguido escapar de suas celas desde o início dos acontecimentos. Han Jisung liderou essa fuga e, desde então, tornou-se o líder do grupo composto por pessoas que buscavam refúgio na parte subterrânea da cidade do Futuro. Diariamente, dedicavam-se a elaborar planos para escapar permanentemente, mas suas tentativas frequentemente terminavam em fracasso.

Procurando um esconderijo onde as máquinas não pudessem encontrá-los, eles se refugiaram tanto nos esgotos da cidade como em metrôs abandonados, transformando-os em sua casa. Necessitavam constantemente se aventurar pela cidade em busca de suprimentos, medicamentos e, até mesmo, de outros humanos que, como eles, haviam sido escolhidos como cobaias em experimentos. O objetivo era expandir as fileiras dos Orgânicos, formando um exército capaz de enfrentar os Latas, como chamavam os androides.

Jisung dedicava-se constantemente à elaboração de planos para resgatar seu cunhado, Hyunjin. Lembrava-se do dia em que o viu pela última vez, deitado inconsciente em uma maca quando foi trazido para a cidade. Naquele momento, pouco pôde fazer, mas desde então, persistia em seus esforços para trazer Hyunjin para a resistência.

Naquele fim de tarde, Jisung se preparou para mais uma busca. Além dos mantimentos, necessitava de anti-inflamatórios e remédios para diabéticos. Não podia perder tempo; a vida daquele grupo dependia dele. Riu sozinho, refletindo sobre como, há dois meses, temia se defender contra os abusos em seu antigo ambiente de trabalho. Agora, era líder de um grupo armado, arriscando sua vida para protegê-los. Jamais imaginaria que enfrentaria algo assim, mas a situação o obrigara a ser forte, especialmente na ausência de Lee Know, que não estava ali para protegê-lo.

Dois rapazes acompanharam Jisung na arriscada missão, confiantes de que, ao seguir o plano meticulosamente elaborado por Dahyun, teriam sucesso. O local para onde se dirigiam era perigoso, mas, se executassem os passos conforme planejado, a vitória seria deles.

Deslocavam-se pela cidade, seguindo os caminhos cuidadosamente escolhidos para evitar câmeras de vigilância e os androides patrulhando as ruas daquela cidade futurista, perfeitamente limpa e silenciosa. Dahyun engenhosamente havia criado um cartão de acesso ao desmontar as peças de um androide programado para ser um assistente de laboratório. Entre os componentes recuperados estavam processadores, HDs, sensores e diversos conectores. Com essas peças, Dahyun improvisou uma chave eletrônica capaz de abrir qualquer porta — exceto a da saída — sem levantar suspeitas, pois, no sistema, parecia que um dos androides estava realizando as ações.

O plano transcorreu sem interrupções, e conseguiram adquirir tudo o que precisavam. No entanto, Han mantinha a esperança de reencontrar seu cunhado. Instruiu os dois rapazes a retornarem ao esconderijo enquanto ele decidiu seguir sozinho para outro local.

Jisung há tempos espionava o laboratório principal, acreditando que havia uma grande probabilidade de Hyunjin estar lá. Com extrema cautela, infiltrou-se no local, identificando um ponto fraco na fortaleza por onde conseguiu entrar. Em uma das salas, vestiu o uniforme utilizado pelos androides “humanos”, o que lhe proporcionaria maior discrição perante as câmeras, embora preferisse evitá-las ao máximo. Sabia que, de alguma forma, poderiam detectá-lo.

Todas as outras portas estavam trancadas, e Jisung podia ver outros humanos dormindo em suas macas nos quartos. Seu desejo fervente era salvar a todos, mas compreendeu que não seria possível naquele momento. Ao chegar a uma sala diferente das demais, cuja porta não era de vidro, Jisung não conseguia ver o que havia lá dentro. Sua curiosidade e instinto o impulsionaram a querer descobrir. No entanto, um susto o atingiu quando um laser vermelho se acendeu na altura de seus olhos, acompanhado por uma voz robótica que começou a falar.

— Boa noite Senhor Zero Um. Olhe para o sensor para que eu possa ler sua retina e liberar seu acesso. 

Jisung estranhou a situação, imaginando que aquilo talvez não desse certo. Mesmo assim, decidiu tentar e fixou seu olhar na tela. Quando a luz tocou seus olhos, a porta se abriu imediatamente, aumentando a apreensão de Han sobre ter acesso à sala de controle de Zero Um, o líder das máquinas.

Ao entrar na sala, seus olhos se arregalaram, e precisou controlar a vontade de gritar. Diante dele, viu uma réplica perfeita de sua cabeça em um tubo de vidro. Cada detalhe de seu rosto parecia refletir como se estivesse olhando em um espelho. No entanto, aquela cabeça estava conectada a alguns fios, fazendo Jisung entender que se tratava de algum tipo de protótipo dele mesmo, parte do plano de Zero Um para todos os humanos. Outros tubos estavam cobertos, e, ao remover os panos que os envolviam, Jisung surpreendeu-se ao deparar-se com partes de seu próprio corpo e rosto, todos feitos de material sintético.

— Isso parece ser um pesadelo que não consigo acordar nunca. Mas tem algo errado — Jisung pensou consigo mesmo — Esses protótipos feitos a partir da fisionomia humana só ganham vida quando o humano é induzido ao coma, pois eles precisam da memória e da mente do humano para continuar funcionando e ao que tudo indica tem um protótipo meu andando por aí… Mas, se eu estou consciente. Como o meu suposto protótipo está ligado? Isso não faz o menor sentido. Ou será que… 

Jisung ligou a tela de um dos computadores, e a imagem de Lee Know surgiu, fazendo um frio na barriga se instalar ao ver seu noivo depois de tanto tempo. Não era uma foto comum, como aquelas tiradas antes de todos os acontecimentos. A imagem parecia ter sido capturada por uma câmera de segurança. Lee Know estava visivelmente mais magro e parecia cansado, ao lado de Bang Chan, que também não exibia uma aparência saudável. Dois rapazes desconhecidos por Han conversavam com eles. Observando o cenário ao redor, Han percebeu que não se tratava da cidade do Futuro, mas sim do lado de fora. Lee Know ainda estava lá, possivelmente tentando chegar até ele. Então, um pensamento surreal passou pela cabeça de Jisung.

— Não é possível que… Zero Um esteja usando o meu protótipo para enganar Lee Know. Talvez uma armadilha para trazê-lo pra cá ou talvez ele esteja os avaliando. Espero que eu esteja errado, caso contrário vou ter que me acostumar com a ideia de explodir a cabeça de um robô com a minha cara. 


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Notas finais do capítulo

Han finalmente apareceu ahhhhhhhhhhh :)



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