Some More escrita por Deby Costa


Capítulo 2
Um pouco mais.


Notas iniciais do capítulo

Recordando que a história não esta sendo betada.
Boa leitura.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/808010/chapter/2

Ninguém pode ensinar a vida para outra pessoa. 

Paulinho da Viola

 

 

 

 

Ao longo dos seus vinte e três anos, Ino escutou histórias sobre quais tipos de pensamentos invadiam a mente de uma pessoa às portas da morte. Entre outras coisas, a maioria das narrativas falava de arrependimentos tardios, desejo de consertar erros cometidos no passado, saudade dos familiares, amigos, etc. Em nenhum dos relatos a respeito dos moribundos, ela ouviu dizer que os candidatos a defuntos pensassem em coisas como roupas sujas ou máquinas de lavar. Sim, era irônico, ridículo e totalmente fora da caixa, mas à medida que cada membro do seu corpo era acariciado por pedras, galhos secos e todo obstáculo que havia na descida daquela cachoeira, Ino só conseguia pensar em como as pobres peças de roupas deveriam se sentir mal dentro de um cesto híbrido de máquina de lavar, chacoalhadas em meio ao excesso de sabão em pó e amaciante.

“Pow!” 

O baque da garrafa térmica na sua testa a fez acordar do devaneio inoportuno. Surpreendendo até a si, Ino viu-se segurando firme no guidão da bicicleta e pedalando o veículo rumo às pedras que se mostravam pontiagudas ao final da queda d'água. 

— MERDA, MERDA, MERDA!

A ficha caiu e ela entendeu que se não agisse rápido passaria o resto da vida vivendo como uma abobrinha ou algum outro vegetal menos saboroso, e assim faria jus às profecias dos seres emocionados que tanto enalteciam os efeitos transformativos do caminho.

 

 

Alguns dias antes dos acontecimentos do prólogo.

 

 

— Por que não posso ir para a Vila da Folha com você? Sabe quantos séculos não vejo a civilização? 

— Não exagere otouto. Fomos a Vila da Pedra no trimestre passado. 

Vila da Pedra… Vila da Pedra… — Kiba resmungou entredentes, no entanto, ao perceber o olhar descrente da irmã sobre si, se retratou: — A Vila Oculta da Pedra é logo ali, não conta. A última vez que fui a Konohagakure a mamãe ainda estava com a gente. 

Hana sentiu o impacto do comentário. De fato, Kiba ainda era um garotinho na última vez que esteve em Konoha, agora era um adolescente de quase dezessete anos, louco para se aventurar em terras bem distantes da aldeia onde ambos cresceram.

— Desculpa.

—  Hã? O quê? — A Inuzuka aparentou confusão.

Hana parou de organizar a pequena carroça que dali alguns minutos seria puxada pelos seus companheiros caninos, os trigêmeos Haimaru, e voltou-se para o irmão. Às vezes, ela esquecia que Kiba pertencia à casta mais sensível na hierarquia shifter. Mesmo que disfarçasse muito bem, o garoto sempre lia o seu coração. 

— Se a mãe estivesse aqui, você estaria lá. — O adolescente disse tímido. 

— Ei, mocinho. Já conversamos sobre isso. — A mais velha não estava zangada, todavia falou com dureza. Aquele assunto havia sido debatido inúmeras vezes entre eles e Kiba sabia sua opinião. — Eu estou onde quero estar. Entendeu? 

Hana esperou pela resposta que veio meio a contragosto um segundo depois. 

— Entendi. 

Após a afirmativa do rapaz, Hana pegou o isopor que Kiba segurava nos braços e colocou o objeto na viatura. Os trigêmeos já estavam a postos, apenas à espera do comando da dona para seguir viagem. 

— Mas… — Kiba insistiu. 

Tal como Tsume, ele também achava que a irmã era grande demais para a aldeia onde eles viviam, no entanto, Hana o cortou: 

— Otouto, nem tudo na vida se resume a um pedaço de papel. Há coisas na vida que nenhuma formação acadêmica poderia ter me dado ao longo desses oito anos. — Hana se viu confessando. 

O Ômega suspirou e dessa vez a jovem foi quem sentiu a energia triste emanar do outro. Às vezes Kiba se sentia um fardo em sua vida, visto que ela trancou a faculdade no último ano após a morte de Tsume e retornou à aldeia para cuidar dele. 

— Ei! — Hana deu um soquinho no ombro do irmão. — Não ‘tô te reconhecendo, pirralho.

 A jovem abriu o sorriso e em reflexo Kiba lhe mostrou as presinhas salientes que ela tanto amava. O sorriso dele era a razão de sua felicidade e a fazia recordar tanto  o de Tsume. Era incrível ver o quanto seu irmão ficava mais e mais parecido com sua saudosa mãe com o passar dos anos, inclusive na teimosia. 

— Venha cá, seu moleque. — A Inuzuka puxou o rapaz para perto e bagunçou seus cabelos. 

— Para, Hananee! — Kiba chiou — Você está bagunçando meu cabelo. 

Hana torceu o nariz de um jeito engraçado e perguntou:

 — Mais? Isso é possível? 

Ambos fizeram um segundo de silêncio antes de gargalharem juntos, chamando a atenção de alguns vizinhos que os observavam das varandinhas de suas casas. Os irmãos riram ainda mais alto, fazendo seus espectadores rirem também. 

Motivada pelo som gostoso das risadas de Kiba, Hana teve uma ideia: 

— Pirralho, vá arrumar suas coisas e aprontar o Akamaru para ajudar os trigêmeos a puxar a carroça. — A moça disse e Kiba arregalou os olhos. — Vocês irão com a gente para Konoha. 

 Após determinar, Hana fingiu que chutaria o traseiro do irmão se ele continuasse ali. Ela não sabia se teria mais sorte agora do que  teve no passado com os cientistas do centro de pesquisa da universidade de Konohagakure, afinal, a Inuzuka fazia parte do clã selvagem, embora seu grau de formação, trejeitos e aparência não deixasse suas raízes evidentes. Se outra vez suas descobertas fossem ignoradas, a jovem sacudiria a poeira dos pés, retornaria para casa e continuaria fazendo o que sempre fez: seguiria cuidando de sua gente com todo amor e carinho. 

— Você não está brincando, né?

— O que você acha? — Hana ergueu uma das sobrancelhas como se desafiasse o irmão caçula. 

Prontamente, Kiba correu para casa, mandando seu cachorro se arrumar bem ligeiro e fazendo o mesmo.

Após o Ômega lhe dar as costas, Hana respirou fundo. Ela estava cansada, pois, havia passado dias sem dormir manipulando as fórmulas que levaria para o laboratório no País do Fogo. Levar consigo aquele Ômega cheio de energia, seria um desafio, no entanto, aquele pirralho tinha razão. Ver a civilização outra vez, não faria mal a nenhum dos dois.

 

 

******

 

 

— Suas coisas já estão prontas? 

— Tcs! Às vezes eu tenho que concordar com a Ino. Shino, tu te preocupas demais com a gente. — Kankuro reclamou após colocar os cantis de água na mochila. 

Era cinco horas da manhã do quinto dia e os dois Alphas ainda não tinham tido notícias da loira rabugenta. O Sabaku sabia que a preocupação do Aburame com ele era um meio dele se distrair da apreensão que ambos estavam sentindo e que sentiriam até chegarem ao acampamento de peregrinos, localizado em Kumogakure. 

— Vamos! — Shino ignorou o comentário do outro Alpha e subiu na bicicleta, pedalando logo em seguida. 

O Aburame queria pegar a estrada o quanto antes. A chuva do dia anterior atrasou a partida dos dois Alphas e do grupo de peregrinos, com certeza o temporal também deveria ter impedido o deslocamento de Ino, independente de onde a Alpha estivesse. Se ele e Kankuro pedalassem um pouco mais rápido do que fizeram nos primeiros dias, talvez encontrassem a amiga antes dela chegar a próxima parada.

— Me espere, apressadinho! — Kankuro implicou e passou a pedalar na mesma velocidade. Ambos tinham pressa para encontrar a Yamanaka. — Vamos achar a nossa Alpha marrentinha.

 

 

*******

 

— Aí! — Um doloroso e involuntário gemido escapou dos seus lábios, assim que seu corpo parou e foi acolhido por um imenso bolsão de água em meio às pedras. 

Ino não estava morta. Estava fodida, mas não morta. Quanto a virar um legume, ainda estava avaliando o estrago. A bicicleta e também a mochila que trazia nas costas, estavam sobre si. Com muito esforço, a Alpha empurrou a bike para o lado e tentou erguer-se do chão, todavia, uma dor lacerante surgiu imediatamente após o movimento brusco, obrigando-a a se deitar de novo. A calça esportiva estava rasgada na altura da panturrilha esquerda, sangue começava a molhar o tecido e um corte podia ser notado no local. Em todo braço direito havia consideráveis arranhões e a pele estava em carne viva.

“Está mesmo decidida a não ir com o grupo dos senpais?”

— Inferno! — Ino exclamou ao recordar-se de Shino e daquela pergunta infeliz. A estudante se sentia tão tonta, que mal podia erguer a cabeça, quanto mais sair daquela situação sozinha. Naquele momento, ela só desejava cruzar com alguns peregrinos lobotomizados dos quais tanto quis fugir quando deixou Shino e Kankuro para trás no templo budista.

— O quê!? — A Alpha se agitou ao perceber um líquido quente descer por sua testa. — Isso é... sangue? 

Sim, era. Em abundância tal, que começava a encobrir sua visão. Derrotada, Ino se deitou novamente e só não blasfemou contra os deuses, pois tudo escureceu logo em seguida.

 

 

******

 

Tenebrosos ladridos martelaram sua cabeça, fazendo-a despertar. Conforme seus olhos se abriam e o sol incomodava sua visão, Ino entendia que havia passado a noite no bolsão. Levou alguns segundos até que a Alpha tivesse certeza de realmente ouvir uivos e o quanto aquela proximidade era perigosa. Não era necessário muito para compreender que havia sobrevivido à queda do precipício, mas que não teria a menor chance contra lobos selvagens, principalmente estando naquele estado deplorável.  Na sua situação não havia muito o que fazer, a não ser aguardar a chegada de seus algozes. 

Ino se perguntou a quanto tempo não tirava um tempinho apenas para admirar o céu. A estudante  se surpreendeu com o que via à sua frente. 

Tão lindo. Diante de um azul tão belo e límpido, como numa pintura em aquarela, os rostos de Aimi e Inoichi foram se desenhando no céu. A saudade de sua mãe e de seu pai se fez presente em seu peito de um modo tão insuportável que ficou difícil respirar. Ino viu também os rostos de Shino e Kankuro se tingindo em tons de anil. Seus amigos de longa data e que a suportavam, mesmo com seu temperamento se tornando cada vez mais insuportável com o avançar dos anos, deviam estar tão preocupados com ela agora…

 Lágrimas começaram a rolar por suas bochechas e a Yamanaka  fechou os olhos, visto que não conseguiria nem mesmo enxugar a própria face. Diante do fim, tudo ficou claro. Naquele instante, Ino daria tudo por um pouco mais de tempo. Em seu interior, sua  Alpha sentia  que ainda havia tanto o que fazer, o que sentir, o que viver… 

 

— Au, au!

Quando os horrendos uivos chegaram até ela e, para sua surpresa, se transformaram em ganidos dóceis, a Alpha abriu primeiro o olho direito e em seguida o esquerdo.  Com os dois olhos bem abertos, a Yamanaka viu o momento exato em que uma bola de pelo gigante e branca colocou o focinho a milímetros de seu rosto, Ino sentiu a respiração quente e agitada, não de um lobo, mas de um cão, que nada tinha de selvagem. O animal passou a lamber seu rosto, em especial a testa ferida, aliviando imediatamente a dor. Outro cão chegou depois do primeiro, e em seguida outro, e mais outro. Quatro cães ao todo a rodearam.

— Ih! Akamaru! Pelo jeito essa daí deu perda total.

Ino virou o rosto o máximo que conseguiu para ver o rapaz que falava à sua direita, a poucos passos dela e dos cães. Pelos indícios deixados pelo chakra, logo percebeu que se tratava de um Ômega. Para revelar que não era uma defunta como o outro supôs, mexeu os pés.

— Óe! Falei cedo demais. Deu sinal de vida. — O rapaz correu até o bolsão e Ino não podia estar mais feliz em ver outro ser humano racional.

Assim que enxotou os cachorros, o Ômega tomou o lugar deles passando a lhe encarar  com curiosidade. Era um adolescente de pele trigueira e aspecto selvagem, como o dos cães. Em suas bochechas havia marcas vermelhas em forma de presas. O garoto revelou grandes dentes caninos ao sorrir. Suas características físicas lembravam a aparência dos membros do clã Inuzuka, um clã que vivia isolado nas montanhas, localizadas na divisa entre a Vila da Névoa e da Pedra.

— Ih! Você é a loira com cara de quem tinha acabado de comer ensopadinho de nariz de porco com jiló que estava no templo.  — O garoto com cara de cachorro inclinou o rosto para o lado como quem quer se certificar de algo.   — A que tinha um chakra tão encardido que nem toda a energia ômega do mundo conseguiria alvejar.

Ino ficaria ofendida com aquele comentário se não fosse um detalhe importantíssimo. O Ômega e os cachorros não estavam sozinhos, havia mais um shifter com eles. Um Shifter que possuía um chakra tão intenso que fez todos os instintos da Yamanaka entrarem em estado de alerta. 

Como aquilo era possível?

 O shifter recém-chegado não era um Beta, pois possuía uma presença marcante como nenhuma outra com a qual Ino tenha se deparado em toda sua vida. Seu chakra era delicado, característica muito comum aos Ômegas, mas, igualmente forte e altivo, um traço primordial dos poderosos Alphas.

— Otouto, afaste-se um pouco. Deixe-a respirar. Ei Moça…

A mente de Ino ficou ainda mais nublada, assim que ela ouviu a voz feminina. Desesperadamente ela tentou mover-se naquela direção, no entanto, todo o seu ímpeto foi drenado assim que a dona da voz ajoelhou-se a seu lado e tocou em seu rosto.

— Você está bem? — Uma mulher de aparência angelical, longos cabelos castanhos e grandes olhos negros, colocou o rosto diante do seu rosto.

Não, ela não estava nada bem.

— Ops! Acho que agora ela morreu de verdade, Hananee.

Ino ainda foi capaz de ouvir a fala agourenta do garoto ômega antes de ter outro apagão, e este a deixaria nocauteada por muito mais tempo.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Espero que a divisão dos tempos e de pontos de vistas não tenha ficado confusa para vocês, bem como os momentos em itálico, onde procuro expressar o pensamento de alguns personagens em algumas situações.

Espero que estejam gostando da história.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Some More" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.