A fada que o escreva escrita por Creeper


Capítulo 13
Uma carta de Gaspar


Notas iniciais do capítulo

Postando um pouco mais tarde do que costumo, porque essa semana foi corrida! Perdoem se houver algum errinho, foi feito com amor ♥

Nesse capítulo fiquei entre colocar o Gaspar ou outra personagem na imagem, mas votei pelo nosso inventor de cabelos brancos e olhos azuis. Agora sem mais delongas, uma boa leitura.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/804314/chapter/13

Havia algo que me chamava a atenção no caminho para a pousada: um grande quiosque onde corujas de todos os tamanhos e cores agitavam suas asas em seus poleiros ou dentro de suas gaiolas abertas, espalhando suas penas para todos os lados.

Reparei que algumas pessoas se reuniam em uma bancada que dava a volta no quiosque e compartilhavam tinta e pedaços de papel enquanto se acotovelavam e riam, então ousei me aproximar com alguns passos curtos e um ar tímido.

Não passei despercebido, pois uma senhora de longos cabelos grisalhos presos em uma trança recebeu-me com um sorriso gentil e perguntou em um tom sereno:

— Você precisa de ajuda, jovenzinho?

Olhei para o envelope em minha mão e assenti com um riso contido. Ela gesticulou para que eu a seguisse até a bancada e apontou para as letras pintadas em dourado na madeira escura da fachada, explicando:

— Esse é o Recanto das Cartas e Corujas, o melhor lugar para se enviar uma mensagem.

As corujas chirriaram alegres e a dona riu baixinho e pediu para que se acalmassem quando passou pela porta e caminhou por entre os poleiros e as gaiolas.

— Uma moeda por carta, por favor. – ela estendeu a mão enrugada.

Paguei-lhe com o dinheiro que recebi no bar e entreguei-lhe o envelope, o qual ela analisou por um instante.

— Se o seu destinatário em Hibisc for rápido, talvez receba uma resposta hoje. – a senhora deu a carta para uma de suas corujinhas.

— Os céus queiram que sim. – olhei para cima, apreensivo.

Gaspar não era muito de responder cartas, ele tinha preguiça de escrever.

A senhora acariciou a ave, sussurrou algo para ela e soltou-a por uma das janelas, permitindo que voasse para longe de nossas vistas carregando o envelope em suas garras.

Pensei em enviar uma carta para Úrsula e Leona a fim de saber como elas e seus pais estavam, além de convidar Sued para se juntar a guilda, todavia, resolvi deixar essa tarefa para um momento de calma.

— Você é um explorador, não? – a dona avaliou-me. – Júpiter Still, prazer. – mostrou-me a mão para um aperto.

Arregalei os olhos e congelei no lugar.

— Still? – engoli em seco.

— Pela sua reação, você já conheceu alguém da minha família. – Júpiter gargalhou. – Vejamos... – segurou seu queixo. – Meu neto Dereck?

Fiquei pasmo. Como Dereck podia ser neto de uma senhorinha tão fofa?

— É, foi ele. – soltei um longo suspiro de frustração e relaxei os ombros.

— Ah, aquele garoto. – ela revirou os olhos. – Se ele fizer alguma coisa com você, pode vir me falar. Se bem que eu soube que um explorador o colocou para trabalhar e... – seu olhar caiu sobre mim e suas sobrancelhas se ergueram.

O que ela faria se soubesse que o ameacei de morte no bar?

— Hã, nos vemos depois! – falei prontamente dando um breve aceno.

Antes que Júpiter se desse conta do que aconteceu, outro cliente a chamou e eu aproveitei a chance para me sentar em um dos degraus mais afastados e dar início a minha espera.

Passaram-se algumas horas e eu encontrava-me entediado com os cotovelos apoiados nos joelhos e as mãos sustentando o rosto. Bocejei e encarei o céu na esperança de encontrar a tal coruja, entretanto, nenhum sinal dela.

Talvez eu devesse arranjar outro trabalho e voltar ali mais tarde. Bufei e fiz menção de me levantar, entretanto, avistei uma figura conhecida vindo em minha direção.

— Quer dizer que era isso que você tanto escrevia.

Era um dia mais caloroso, o que fez Dante abandonar o sobretudo e usar apenas sua blusa preta de gola alta sem mangas. Ele segurava Sybelle na altura do peito, pouco importando-se com os olhares curiosos que os outros exorcistas lhe lançavam.

— Deixa eu adivinhar, é para a pessoa que está no final do seu fio vermelho? – chutou.

Sem querer, uma risada esganiçada escapou e eu abanei a mão em frente ao rosto.

— Ah, não, essa pessoa pode ter o mesmo karma que eu, mas com certeza não é o final do meu fio.

— Então é para sua mãe? – Dante sentou-se ao meu lado no degrau.

De repente, senti um frio no estômago e meu peito se apertou com as memórias que piscaram em minha mente. Balancei a cabeça lentamente conforme meu sorriso diminuiu e meu olhar se perdeu por entre as pessoas que transitavam por ali.

— Minha mãe morreu quando eu tinha cinco anos. – encolhi os ombros.

— Sinto muito. – Dante murmurou sem jeito. – Não devia ter tocado no assunto. – abaixou a cabeça e massageou sua nuca.

— Não tinha como você saber. – fitei minhas botas. – A maior dor já passou. Gaspar me ajudou bastante, na verdade, me ajuda em quase tudo até hoje. É para quem escrevi. – soltei um riso abafado.

Naquela hora, tive saudade da nossa casa e saber que estava tão próximo de Hibisc fez eu me sentir ansioso. O cheiro da fuligem e da fumaça voltaram a minha memória juntamente com as cantorias desafinadas, brigas pelo maior espaço do quarto e experimentos na cozinha.

— E você? Não envia cartas para ninguém? – passei o antebraço pelos olhos e observei o rapaz.

Ele colocou Sybelle em seu colo, esticou os braços para trás e deixou seu peso sobre eles.

— Não. Minha família não costuma trocar cartas, somos muito individuais, cada um está sempre focado em seu trabalho. – desviou o olhar.

— E eles trabalham com o quê? – inclinei a cabeça para o lado e abracei meus joelhos.

— Exorcismos. – Dante olhou-me de soslaio. – Minha mãe, meu pai e minha irmã mais nova.

— Então você seguiu o ramo da família. – sorri travesso.

— Bem, é a única coisa que sabemos fazer. – deu de ombros. 

Ficamos em um silêncio amigável durante um tempo, somente vendo as pessoas que subiam e desciam os degraus, a maioria exibindo suas insígnias em formato de cruz prateada com uma pedra roxa no centro. Alguns exorcistas possuíam cicatrizes a mostra e outros me faziam pensar se tinham alguma por debaixo das roupas. Queria perguntar a Dante sobre as suas, mas me contive.

— E? – Dante pigarreou. – Qual o nosso próximo destino? – analisou Sybelle.

Mordi o lábio inferior e levantei a cabeça para o céu.

— Será que você pode esperar um pouquinho pela resposta?

E como se estivesse me ouvindo, uma coruja cortou o ar sobre o quiosque e subitamente pousou em meu ombro parecendo me conhecer há anos. Prendi um gritinho de surpresa e peguei a carta em seu bico, agradecendo-a e vendo-a retornar para sua dona.

Sem tempo a perder, abri o envelope chamuscado e retirei de lá um papel completamente manchado de graxa. Fiz uma careta e comecei a ler os garranchos que se espalhavam pela folha.

 

“Querido melhor amigo que me enche de preocupação,

Não faz nem um mês que você saiu de casa e já quase morreu mais vezes do que posso contar. Apenas espero que você consiga voltar para casa, porque digamos que tenho uma novidade. Uma novidade nomeada de: meu pai deixou o filho bastardo do marido da minha tia aqui para ser meu aprendiz. Mais especificamente, um garoto de 17 anos chamado Oliver Valentine. Aparentemente, não somos parentes de sangue?

Bem, ele definitivamente não leva jeito para ser inventor. Ou eu que não levo jeito para ser mestre? É desajeitado, talvez até mais que você, pois vivo colocando curativos nele. Porém, ele se mostrou bem talentoso na construção de caixinhas de música, faz de todos os tamanhos e formatos. De qualquer forma, é uma boa companhia, já que meu Suichiro foi se meter em confusões mundo afora e Alicat prefere seus amigos felinos.

Antes que eu me esqueça, chegaram algumas cartas para você aqui em casa e você com certeza sabe de quem são e provavelmente não a avisou sobre a viagem que faria. Ainda vai deixar essa mulher maluca, estou avisando.

E fico feliz de saber que você fica se jogando em rapazes nas plataformas e pedindo para te fazerem favores, céus, não foi assim que eu te criei. Mas tudo depende, ele é bonito? 

Ah, quantos parafusos eu vou precisar colocar em você ainda, Suichiro? Se esqueceu mesmo do melhor médico e mago que você conhece? Sério? Pelo visto sim, então deixe-me refrescar sua memória: Dr. Tama.

Boa sorte, você vai precisar. Volte para casa logo. E inteiro, de preferência.

Amo você.

Atenciosamente,

O melhor amigo do mundo.

(Aliás, Alicat mandou um ‘oi’).”

 

A carta terminava com um carimbo de graxa da pata gorda de Alicat. Dobrei o papel e pressionei-o no peito, fechando os olhos suavemente.

Por um lado, eu estava aliviado. Por outro, novamente em apuros.

— Já sei para onde nós vamos. – falei baixinho. – Para a ilha de Hasi.

 

***

 

— O quê?! – Lissa berrou incrédula quando lhe contei sobre a viagem que faríamos. – Me leva com você! – pulou em minha cama, fazendo a madeira ranger por misericórdia.

Dei um sorriso de canto, revirei os olhos e continuei a arrumar minha maleta e os bolsos do sobretudo, organizando minhas roupas e meu estoque de bugigangas que começava a diminuir.

— Aurora vai ficar com ciúmes. – cantarolei, provocando-a.

Lissa ruborizou fortemente, fez um biquinho e cruzou os braços. A exorcista era certamente seu ponto fraco, não o corte em sua cintura. 

— Na verdade, Aurora me mataria se eu ousasse viajar para longe com um ferimento recente. – ela suspirou. – Vou te esperar em Hibisc, mas pode deixar anotado que ainda viajaremos juntos algum dia para uma exploração, senhor Whitlock.

— Isso vai ser antes ou depois do seu casamento? – brinquei.

— Você é muito atrevido, não? – Lissa sorriu e bagunçou meus cabelos.

Ouviram-se breves batidas na madeira e a porta se abriu, revelando Dante que ajeitava a corrente em seu cinto.

— Tem um navio partindo daqui cinco horas no porto. Podemos pegá-lo se sairmos agora. – ele andou até sua cama e pegou sua bolsa. 

Concordei brevemente, fechei a maleta e pressionei suas trancas.

Dante estava mais quieto do que o normal e não me olhava nos olhos desde que deixamos o Recanto das Cartas e Corujas, ocupando-se apenas com Sybelle. Encolhi os ombros, encarei-o de soslaio e me perguntei se fiz algo de errado.

Claro, eu não dei muitos detalhes (sendo sincero, não dei nenhum) sobre o porquê “escolhi” um médico da ilha de Hasi, contudo, não acho que aquele fosse o motivo para ele estar estranho. Devia ser coisa da minha cabeça.

— Quer dizer que é um adeus? – Lissa choramingou.

— Por enquanto. – fiquei nas pontas dos pés para afagar seus volumosos cabelos.

E o que ela fez em seguida me surpreendeu. Seus braços rodearam minhas costas e ela puxou-me para um abraço tão apertado que eu achei que minhas costelas fossem quebrar.

— A-Ai, você é forte, né? – arfei ao ser liberto. 

Ela esboçou um sorriso sapeca, coçou a nuca e nos desejou uma boa viagem. Deixamos o quarto, encontrando Aurora encostada na parede do corredor com os braços cruzados atrás das costas. A exorcista ergueu a cabeça ao escutar nossos passos e fechou os olhos.

— Boa sorte. – resmungou. 

Dante murmurou alguma coisa em resposta e seguiu caminho de maneira apressada. Balbuciei um obrigado, pedi licença e corri atrás do rapaz. Do lado de fora da pousada, a noite caía e as estrelas brilhavam acima de nós.

— Vai ser uma longa caminhada até o porto. – coloquei a mão na cintura.

Um ar quente bateu em meu pescoço, acompanhado de um leve relincho. Girei nos calcanhares em um sobressalto, deparando-me com um cavalo de pelo marrom salpicado por manchas brancas.

— U-Uau. – arregalei os olhos e recuei um passo. 

— Essa é a Victória. – Dante acariciou a crina branca da égua. – Vai nos levar ao porto. 

— Parece que você a conhece bem. – rodeei Victória, impressionado com seu tamanho e ótimos cuidados.

— Cresci com ela. – ele me olhou brevemente, mas logo voltou-se para a égua. – É da minha família. 

— E é melhor você cuidar bem dela! – uma voz feminina gritou.

Procurei pela fonte do som, avistando uma moça de longos cabelos azuis escuros que caíam feito uma cascata de cachos por suas costas. Suas sobrancelhas estavam franzidas, a boca formava um biquinho emburrado e a mão apoiava-se sobre a bainha da espada.

— E essa é a Calíope. Minha irmã. – Dante suspirou derrotado. 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E olha só, aqui soubemos mais das famílias dos nossos rapazes! Será que vai dar bom ver esse Dr. Tama? Me contem nos comentários, isso me motiva muito ♥

Até semana que vem para ver o que vai rolar.
Beijos.
—Creeper.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A fada que o escreva" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.