segundo dia. 

Os dois acordaram bem cedo e assustados. Algum hóspede tinha decidido que seria uma ideia incrível ouvir uma música insuportavelmente chata bem alta em plena sete horas da manhã. 

Sirius ainda ficou minutos enrolando na cama, decidido a voltar a dormir, mas não teve sucesso nenhum na missão. Remus esperou, impacientemente e chamando-o toda hora até que ele se rendesse e se levantasse. Ainda se recusando a ir ao banheiro e correr o risco de esbarrar no rato, os dois pegaram a mala e voltaram pro carro. 

Levou alguns minutos dirigindo até que Remus finalmente encontrasse um posto com lanchonete e eles parassem. Sirius pulou do carro em segundos, correndo na direção que as placas indicavam que era o banheiro. O outro homem pegou a mala e saiu do veículo, seguindo na mesma direção, fazendo uma lista mental de tudo que precisavam comprar. 

Comida. Água. Roupas. Desodorante. Escovas de dente.

Os dois últimos eram os mais importantes, obviamente. Algumas horas de viagem e mais algumas de sono naquela pocilga definitivamente não fazia bem pro cheiro de ninguém. E a comida ingerida sem nenhum dos dois ter escovado os dentes depois de acordarem traria um bafo péssimo. Um chuveiro também seria de grande ajuda, mas Remus não contava com tanta sorte. 

— Sua vez, lobinho. 

Lupin revirou os olhos, se amaldiçoando por ter deixado Sirius descobrir o significado do seu nome e dar a possibilidade daquele apelido péssimo existir. Entregou a mala a ele e entrou no banheiro. 

Sirius ficou encostado na parede ao lado, esperando pacientemente o outro terminar. Olhou ao redor, notando alguns carros e caminhões no estacionamento do posto. Mal conseguia acreditar que Remus realmente tinha aceitado aquilo, pegar um carro e dirigir sem levar nada não era o tipo de loucura que Remus Lupin faria, nem que tivesse dinheiro envolvido. Era isso que dava a certeza a Sirius que, mesmo se não tivesse oferecido aquela quantia, Moony teria ido. A lealdade dele aos amigos era uma das coisas que Black mais gostava no amigo. 

Riu quando viu ele sair do banheiro com a camisa parcialmente molhada. 

— Se afogou na privada, Rem?

— Idiota. — Remus revirou os olhos, andando pra lanchonete. — Diferente de você, eu sou uma pessoa limpa e lavo o rosto depois que acordo. 

— Você sabe muito bem que eu sou higiênico, Lupin. — Foi a vez de Sirius revirar os olhos. — Ou você não lembra dos nossos banhos? — Sorriu malicioso, andando lado a lado com ele. 

— Banhos? Não lembro deles. — Remus deu de ombros, fingindo indiferença apesar das bochechas coradas entregarem que ele lembrava de tudo. — Adianta, eu tô com fome. 

Dito isso, Lupin segurou o braço de Sirius e o puxou em direção à lanchonete, andando com passos rápidos. Rindo, Black decidiu deixar aquela passar apenas porque também estava morrendo de fome. Os dois escolheram uma mesa na janela com vista pro estacionamento porque Remus queria ficar de olho em seu carro. Uma hora depois tinham comido um café da manhã completo, se entupido de cafeína e Remus tinha conseguido convencer o dono da lanchonete do posto a dar uma garrafa com café para eles levarem. 

Logo estavam no carro, dirigindo pelas ruas de Manchester na procura de uma loja de departamento. Ao lado de Remus, Sirius mexia no celular, digitando freneticamente. 

— O que você tá fazendo? — Lupin olhou pra ele rapidamente. 

— Falando com o James. — Tirou os olhos do celular e virou para Remus. — Contando o que aconteceu pra ele que tá contando pra Lily porque é um gado fofoqueiro. 

Riu, assentindo. James Potter era fofoqueiro antes, mas depois de começar a namorar com Lily Evans, eles viraram o casal da fofoca.

— Não me surpreende. — Sorriu. — E o que ele acha? 

— Que eu deveria pegar o dinheiro, ir pra Dubai e dar um jeito de ficar mais rico. 

— Ainda bem que você pediu ajuda pra mim e não pro James. — Riu, balançando a cabeça. — Prefiro nem tentar imaginar as loucuras que vocês iam inventar, Six. 

— Ia ser divertido. — Fez biquinho. — Mas prefiro você. 

Remus sorriu envergonhado, corando. 

— Achei a loja. — Disse, mudando de assunto rapidamente. 

Sirius riu, mas não disse nada. Ajeitou uma quantia em um bolso externo da mala, apenas para não precisar abrir a parte com o dinheiro toda hora. Saiu do carro assim que o outro estacionou e, agarrado a mala como sempre, entrou na loja. Em poucos minutos, Remus conseguiu colocar em um carrinho tudo que precisavam, inclusive duas mudas de roupas para si e três para Sirius. 

— Agora é com você. — Lupin empurrou o carrinho na direção dele.

— Por que? — Franziu o cenho. 

— Porque é você quem tem o dinheiro. — Deu de ombros. 

— Me sinto um sugar daddy. — Sirius riu, empurrando o carrinho pro caixa. 

— Se você quer chamar assim. — Encolheu os ombros, rindo e seguindo ele.

Chegaram no caixa, esperou a mulher passar as contas e pagou. Estava prestes a sair da loja quando Remus puxou seu braço bruscamente para um lado.

— Remus! — Reclamou. — Quase derrubei as sacolas. — Sirius suspirou, seguindo o amigo. — Pra onde tá me levando? 

— Banheiro. Seu bafo tá péssimo. — Fez uma careta. 

— E o seu tá incrível, bonitão. — Revirou os olhos. 

Remus não se deu ao trabalho de responder, apenas empurrou Sirius para dentro do banheiro. Trancou a porta, revirando os olhos pras sobrancelhas arqueadas de Black. 

— Prefere escovar os dentes e se trocar com o risco de alguém entrar? 

— Hmn… eu sou um pouco exibicionista, sabia? — Sorriu de lado. 

— Idiota. 

Remus jogou a sacola pra ele, revirando os olhos. Foi escovar os dentes, sem conseguir impedir os próprios olhos de observar Sirius se trocando pelo espelho. Suspirou baixinho, prestando atenção nas tatuagens. 

— Se continuar me olhando assim vou precisar te beijar, Lupin. — Black sorriu malicioso, olhando para ele pelo espelho. 

— O que? — Mordeu o lábio, subindo o olhar pros olhos dele. 

— Eu disse que… — Cruzou a distância que separava os dois. — Se você continuar me olhando assim… — Apoiou as mãos nos quadris dele, fazendo carinho com os dedões. — Vou precisar te beijar, Lupin. — Beijou o pescoço dele, agradecendo ao fato de ser alguns centímetros maior do que Remus. 

Lupin se amaldiçoou por se arrepiar tão fácil, mas manteve os olhos nos de Sirius. 

— Você deveria me beijar, Black. — Sorriu de lado. 

Não precisou de mais do que isso para que Sirius virasse Remus de frente pra si e, segurando o queixo dele, o beijou com vontade. Lupin colocou a mão na nuca do outro, puxando o cabelo levemente. Sirius pressionou seus corpos, passando a mão livre pelas costas. 

— Six… — Remus murmurou contra os lábios dele. 

— O que? — Murmurou de volta, beijando o queixo do outro. 

— Temos que parar. 

— Por que, Rem? — Sirius mordeu o pescoço dele, chupando a pele.

— Porque… — Fechou os olhos, gemendo baixinho e inclinando a cabeça pro lado. — Temos que… Liberar o… Esse lugar… — Remus respirou fundo, tentando se controlar.

— Certeza que quer que eu pare, Lupin? 

Remus precisou respirar fundo mais algumas vezes e focar no que eles precisavam fazer, na viagem que precisavam terminar e no que viria depois, a despedida. 

— Sim, Six. — Empurrou ele levemente. — Tenho que te deixar em Londres até amanhã e preciso voltar. 

— Tudo bem. — Sirius respirou fundo e se afastou dele. 

Deu uma olhada demorada em Remus antes de se virar e terminar de se vestir. Remus escovou os dentes rápido e se trocou ainda mais rápido enquanto era a vez de Sirius fazer a higiene bucal. Em poucos minutos os dois estavam saindo do banheiro, um silêncio pesado entre eles.  

[...]

Durante o período de quase duas horas e o percurso de Manchester para Birmingham, eles seguiram no mesmo silêncio e mal se olhavam. Pelo Remus mal olhava pra Sirius. Tinha até se oferecido para dirigir, mas Lupin tinha recusado com frases curtas. 

Era isso que fazia Sirius não investir em Remus. Definitivamente gostava dele, mas eles eram diferentes e queriam coisas diferentes demais. Remus queria um diploma, um trabalho bom e uma firmeza na vida, enquanto ele queria viver do jeito que fosse, em qualquer lugar que o destino o levasse. Gostava de ser livre e não conseguiria deixar isso de lado sem se condenar a uma vida infeliz. E toda vez que ficavam juntos se sentia culpado por fazer Remus criar esperanças e pelo clima esquisito que ficava depois. 

Suspirou pesadamente, desviando esses pensamentos e só então percebendo um barulho esquisito. 

— Remus? — Chamou, olhando pra ele. 

— Hmn? — O resmungo de Lupin, que sequer o olhou pelo canto do olho, fez Sirius bufar. 

— Tá ouvindo esse barulho? — Perguntou, ignorando a irritação. 

Remus franziu o cenho, prestando atenção. Xingou baixinho e foi pro acostamento, parando o carro. 

— Acho que é do carro. — Suspirou frustrado, saindo pra dar uma olhada. 

Sirius foi atrás, mas manteve uma distância. Ficou olhando Remus dar a volta no carro, tentando achar o problema. 

— Não é melhor seguir até chegar em Birmingham? — Sirius falou depois de alguns minutos. — Lá a gente acha um mecânico. 

— Não precisa, eu posso resolver. 

Remus abriu a porta e pegou uma caixa de ferramentas debaixo do banco da frente. Suspirando, Black sentou numa pedra na beira da estrada e ficou observando enquanto o amigo mexia nas coisas. 

— Rem… — Chamou depois de alguns minutos. — Vamos procurar um mecânico em Birmingham, por favor. Isso não vai dar certo. 

— Vai sim. — Remus revirou os olhos. — Sei o que tô fazendo. 

— Desde quando você trabalha como mecânico, Lupin? — Foi a vez de Sirius revirar os olhos. 

— Não trabalho, mas eu tenho um carro, logo eu sei mexer. 

— Eu tenho cabelo e nem por isso eu sei cortar. — Respondeu irônico, recebendo um olhar feio como resposta. 

— Só fica quieto e me deixa trabalhar, Padfoot. 

Suspirou, mas obedeceu. Passou os próximos - e longos - trinta minutos esperando ele enquanto tentava se distrair com um joguinho de celular. Remus passou todo o tempo murmurando consigo mesmo e mexendo em mil e uma coisas diferentes. 

— Consegui! — Remus gritou, assustando Sirius que quase deixou o celular cair. 

— Sério? — Levantou, olhando incrédulo pro amigo. 

— Sério, Sirius. — Sorriu convencido. — O que você tava dizendo antes? Que eu não sabia? 

Revirou os olhos, indo pro carro e sentando de novo no banco do carona. Remus murmurou um “ingrato”, mas entrou no carro depois de guardar a caixa de ferramentas. Ele deu partida, sorrindo ainda mais orgulhoso quando o carro não fez barulho nenhum. Sorriu vitorioso para Sirius que mostrou a língua. 

— Vamos ficar estranhos mesmo? — Sirius suspirou, olhando pra ele. 

— Não estamos estranhos. — De novo, Remus não o olhou quando respondeu. 

— Te conheço há muito tempo, Moony, sei quando está mentindo. 

— Não tô mentindo, Sirius. — Lupin revirou os olhos. 

Black suspirou, desistindo de tentar conversar. Fechou os olhos e se ajeitou no banco, decidido a dormir. Remus observou ele pelo canto do olho, se sentindo culpado. Levou alguns minutos para finalmente tomar coragem e falar.

— Desculpa, Six. — Suspirou. — Não sei porque fico assim… Eu só… Me desculpa, não queria estragar as coisas. 

— Tudo bem, você não estragou. — Black olhou pra ele e colocou a mão na perna, fazendo carinho. — Podemos fingir que não aconteceu. 

Remus assentiu e eles mudaram de assunto, passando para tópicos mais amenos. Pararam para almoçar quando chegaram em Birmingham e deram uma volta na cidade,  comprando mais algumas coisas antes de voltarem pra estrada. Sirius já estava planejando o que faria quando chegasse em Londres dali a algumas horas, agradecendo por Remus ter realmente conseguido consertar o carro. Enquanto isso, Lupin tentava não pensar no fim da viagem e na despedida que eles teriam. 

Eles só não sabiam que Remus não era um mecânico tão bom assim.