Dear Mr. Nemesis escrita por Nekoclair


Capítulo 4
Capítulo 4




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Idiot’s Neverending Silliness Ends Causing Trouble.

 

Quarta-feira. Um final de manhã no centro, nas proximidades da Torre de São Petersburgo.

O céu estava limpo, havendo não mais do que um punhado de nuvens a vagar pelo vasto azul claro que cobria a cidade — uma visão que muitos estiveram ansiosos por ver e que, finalmente, havia deixado a prisão dos pensamentos e aparecido diante dos olhos de todos. No mês anterior, o mau tempo pairou sobre as cabeças dos habitantes da cidade, desagradável como um arrepio gélido que parecia insistente em não dar trégua tão cedo; agora, ao que o clima finalmente mostrava sinais de melhora, era difícil para as pessoas conterem um suspiro de alívio, o qual parecia fugir de seus lábios assim que elas eram banhadas pela luz suave de um Sol que finalmente se via livre de amarras.

Um homem loiro saiu de dentro de um táxi. Suas pernas eram longas, seu rosto magro e os sapatos que encontraram o chão quando ele pisou fora do veículo eram elegantes e feitos de couro marrom-avermelhado. Seus braços estavam lotados com sacolas que pareciam pesar tanto quanto ele, mas o homem as carregava com facilidade, confiança presente em cada um de seus passos. Um homem alto, de cabelos castanhos e olhos muito gentis caminhava logo atrás dele, carregando as sacolas remanescentes, que o outro deixara propositalmente no banco de trás do táxi junto de um pedido silencioso para que ele o ajudasse a levá-las para dentro.

Eles conversavam animadamente, suas vozes alcançando cada canto dos arredores, e não demorou muito para que seus passos caíssem em um ritmo familiar ao longo do caminho.

Eles caminharam em direção a uma loja em específico, uma fachada extravagante os cumprimentando quando pararam junto à entrada. Na vitrine, em uma caligrafia sofisticada e com muitas voltas e decorações desnecessárias, lia-se: "Eros"

Equilibrando as muitas sacolas em uma mão só, o homem loiro destrancou a porta e a abriu, empurrando-a para fora do caminho.

O som de suas vozes logo sumiu atrás da porta, a qual foi fechada uma vez mais assim que eles adentraram a loja. Agora, eles se viam com um pouco de privacidade para continuar com a conversa anterior, que havia sido interrompida durante o trajeto de táxi, mas que vinha se estendendo desde o início da manhã.

Eles deixaram as sacolas em uma grande mesa no meio da loja e sorriram um para o outro.

Eles tinham uma missão muito especial em mãos, uma que enchia seus peitos de emoção: escolher a roupa perfeita para o primeiro encontro de uma certa pessoa.

 

—--

 

O celular estremeceu, uma vez apenas.

Uma luz piscou, azul e suave, minúscula e insignificante, mas impossível de ignorar.

Um coração se apertou, expectativas crescendo exponencialmente na brevidade de alguns segundos.

Uma mão se estendeu, dedos envolvendo o celular com um cuidado que não condizia com a ansiedade por trás do gesto.

O Whatsapp foi aberto com um toque.

Na mensagem se lia: "Então... Na próxima sexta às duas, certo? Encontro você na frente de Yu-Topia."

Um sorriso se abriu, como flores florescendo na Primavera.

 

—--

 

Naquela tarde, as coisas estavam caóticas na residência de Victor.

Dois homens vasculhavam um número incontável de sacolas, uma busca que não mostrava sinais de terminar tão cedo. Eles pareciam determinados a considerar cuidadosamente cada uma das opções em mãos antes de se decidir por qualquer uma delas. Eles tinham uma decisão muito importante a tomar e não havia lugar para erros, não desta vez. Na próxima sexta-feira, Victor tinha de usar a roupa perfeita para seu encontro com Yuuri — o tão aguardado e muitas vezes adiado primeiro encontro — e isso não era algo que estivesse aberto para debate.

Ele tem esperado ansiosamente por esse dia há muito tempo; tempo demais para estragar tudo justamente agora.

No entanto, Victor tinha um grande problema em mãos.

Victor era, bem, como dizer... bonito. Muito bonito. Isso não era algo que alguém pudesse refutar, e ninguém jamais tentou. O homem era como um cristal precioso, cujo brilho podia deslumbrar as pessoas apenas por ficar parado junto ao sol. Olhos sempre se voltavam para ele quando ele andava nas ruas, e ser constantemente encarado onde quer que fosse havia se tornado uma ocorrência rotineira para ele há muito tempo.

Ele estava acostumado a ser o centro das atenções.

Sendo o possuidor de tamanha beleza também significava que ele ficava bem em praticamente qualquer coisa. De sobretudos longos e vibrantes a simples suéteres listrados, não havia nenhuma peça de roupa que ficasse mal nele. Dito isso, escolher a roupa perfeita estava sendo bastante difícil, já que tudo lhe caía tão bem.

— Que tal esta aqui? — Chris perguntou, pescando uma camisa amarela de gola alta em uma pilha de roupas.

Victor considerou a opção por alguns segundos, e então suspirou e balançou a cabeça em uma recusa silenciosa. Essa cor não era bem o que ele tinha em mente... Não que ele realmente tivesse alguma ideia do que estava procurando, sinceramente.

Depois que Victor contou a Chris as novidades sobre o encontro, seu amigo tomou para si a responsabilidade de ajudar em tudo que fosse possível.

— O encontro vai finalmente acontecer! Como posso não me envolver?! — ele falou ao telefone na noite passada, logo após proferir um alto e satisfeito "Aleluia" que fez Victor sobressaltar de leve.

E então hoje, pouco depois do meio-dia, Chris e Masumi apareceram em sua porta. Junto deles havia um monte de sacolas, além de uma pilha de revistas para o caso de precisarem considerar ainda mais opções fora as que eles haviam trazido.

— Talvez algo mais... discreto? — Victor disse, mas não havia certeza em sua voz. 

Victor olhou para baixo, em direção às mãos, cujos dedos se esfregavam uns contra os outros.

— Não sei... Yuuri não é alguém chamativo. Ele é mais o tipo de pessoa que se mistura ao ambiente. Não acho que ele gostaria de ser o alvo dos olhares das pessoas. Então... Talvez algo que me faça atrair menos atenção?

— Querido, isso é impossível — respondeu Chris prontamente, suas expressões impassíveis. — Você sabe disso.

Victor suspirou alto e se escondeu atrás das mãos por alguns instantes. Então, ele coçou a nuca, pensativo.

— Eu sei... Eu só não quero parecer deslocado ao lado dele. Ou deixá-lo desconfortável. — Victor suspirou uma vez mais e se virou. — Yurio, o que você acha?

Yurio, que estava fazendo sua lição de casa na mesa de jantar, olhou em sua direção com uma expressão entediada estampada no rosto. Obviamente, a única razão dele não estar isolado dentro de seu quarto era porque não lhe foi dada a opção de não participar da escolha da roupa de Victor.

— Eu não podia me importar menos — o garoto resmungou, impaciente. Ele tinha uma carranca na cara quando pousou a caneta na mesa e se voltou apropriadamente na direção deles. — Por que sequer estou aqui? Posso ir para o meu quarto agora? 

— Não, você não pode — respondeu Victor, com firmeza, colocando as mãos nos quadris e girando o corpo completamente a fim de encarar seu aprendiz. — Você não é meu assistente? Precisa me ajudar!

Chris acenou com a cabeça ao lado de Victor, em concordância, e Masumi desviou o olhar, claramente tentando esconder um sorriso da visão alheia. Yurio ficou ainda mais tenso, seu rosto parecendo um pouco avermelhado devido à raiva acumulada.

Então, o garoto estalou a língua.

— Apenas escolhe qualquer coisa. O que você veste normalmente já não está bom? Por que passar por toda essa dor de cabeça? — Yurio disse, por fim.

Victor suspirou e balançou a cabeça lentamente.

— Não devia ter esperado que uma criança entendesse esse tipo de coisa — Victor sussurrou, falando consigo mesmo.

Essa foi a gota d’água. 

Irritado, Yurio agarrou suas coisas e se encaminhou ao seu quarto, impiedosamente chutando o chão por todo o percurso até a porta.

— Vai se fuder! Espero que ele te dê um chute na bunda — ele xingou antes de bater a porta.

Chris riu um pouco e Masumi coçou a cabeça, não estando tão acostumado com as habituais explosões do jovem quanto seu parceiro. Enquanto isso, Victor se limitou a dar de ombros, prontamente voltando ao trabalho. Havia muitas roupas que ele ainda não havia experimentado, e um outro tanto ainda à espera para serem checadas. Chris e Masumi se juntaram a ele e os três deram continuidade à busca.

Eles persistiram por mais uma hora e então, finalmente, conseguiram chegar a uma decisão: um suéter listrado e jeans pretos justos.

Em seguida, eles se sentaram ao redor da mesa para um lanche da tarde.

Atraído pelo cheiro de doces e café fresco, Yurio saiu novamente para fora de sua toca e se juntou a eles na mesa da cozinha. Ao que eles começaram a conversar e o clima no cômodo se tornou mais animado, Makkachin também se levantou de seu canto e sentou-se ao lado de Victor, ainda bocejando e se espreguiçando depois de uma boa soneca.

Os dias têm ficado mais frios ultimamente e Makka tem ficado mais sonolenta a cada dia, como acontecia todos os anos. Com o inverno já na metade, a temporada das chuvas se aproximava rapidamente do fim e, graças a isso, Victor e Yuuri finalmente iam poder ir àquele parque que eles vinham tentando ir há mais de um mês.

Um pequeno sorriso brotou nos lábios de Victor quando percebeu que seu encontro com Yuuri realmente ia acontecer, e seu sorriso de contentamento não passou despercebido.

— Então, conte-nos mais sobre o seu queridinho — disse Chris, balançando as sobrancelhas e sorrindo abertamente.

Victor não tinha problemas em compartilhar, então ele contou a eles tudo sobre os seus planos para o grande dia, e sobre como ele estava planejando comprar uma adorável gravata borboleta para Makka — afinal, ela também ia ao encontro e precisava estar arrasando!

Chris e Masumi ouviram cada uma de suas palavras, expressões felizes estampadas em seus rostos e um pequeno sorriso repousando em seus  lábios. Enquanto isso, Yurio parecia entediado enquanto devorava mais um cupcake.

Entre uma garfada e outra, eles conversavam sem parar.

Victor perguntou a Chris sobre a loja, se estava correndo tudo bem com a nova marca, e ficou feliz em saber que não haviam aparecido problemas até então.

Chris então compartilhou algumas fotos de seu gato, um tópico do qual Yurio se mostrou mais interessado em participar. O garoto chegou inclusive a pegar seu celular e mostrar as fotos que tinha salvas em sua galeria.

Quanto ao Masumi, ele contou sobre alguns programas de TV que assistiu com Chris esses dias, e sobre um filme que eles pretendiam assistir assim que estivesse em cartaz nos cinemas. Chris disse ao Victor que eles deveriam ter um encontro duplo algum dia, e Victor prontamente respondeu com um talvez, dizendo que isso dependeria de Yuuri aceitar sair com ele uma segunda vez.

Chris imediatamente ergueu uma de suas sobrancelhas.

— Eu duvido que haja alguém que não toparia ir em um segundo encontro com você; ou em um terceiro, ou um quarto... — disse Chris, inclinando ligeiramente a cabeça e apoiando o queixo na mão.

Victor fez o que pôde para mostrar uma expressão despreocupada, sabendo que seu amigo tivera boas intenções em sua fala, mas seu sorriso torto não foi capaz de convencer ninguém e ele sabia disso só de olhar no rosto deles.

Então, ele decidiu parar de fingir.

A verdade é que ele estava preocupado. Geralmente, não costumava pensar demais nas coisas, mas não conseguia parar de se preocupar e de se convencer de que o encontro deles seria um desastre, que Yuuri o odiaria para sempre e que ele nunca mais iria querer olhar na cara dele.

Ele envolveu o estômago com um dos braços e olhou para baixo. Masumi, percebendo o comportamento estranho e repentino de Victor, perguntou se estava tudo bem. Chris também virou em sua direção, seus olhos repentinamente cheios de preocupação.

— Estou bem. É só que... Ultimamente, sinto meu estômago inquieto de vez em quando, como se algo estivesse borbulhando por dentro.

— Talvez sejam gases — Yurio falou, impassível, e então sorriu diabolicamente. — Talvez piore e você tenha a pior dor de barriga da sua vida durante o encontro. Tão ruim que você não vai conseguir sair do banheiro.

Victor franziu a testa e tentou ignorar o garoto que parecia se divertir ao atormentá-lo. No entanto, foi incapaz de deixar suas preocupações de lado. Talvez Yurio estivesse certo. Afinal, algo sempre se colocava entre Yuuri e ele. Não ficaria surpreso se isso acontecesse mais uma vez.

Chris balançou uma de suas mãos e riu brevemente.

— Não se preocupe, querido. Você só tem borboletas no estômago.

Victor engoliu em seco e imediatamente ficou tenso, pois ele não tinha ideia do que isso poderia significar. Entretanto, Chris estava rindo e não mostrava nenhum sinal de preocupação, então provavelmente não era nada que ele precisasse se preocupar, ele disse a si mesmo.

Victor sorriu o mais honestamente que conseguiu e acenou com a cabeça. Então, ele se virou de volta ao prato de cupcakes no meio da mesa.

O assunto mudou, partindo tão rápido quanto surgiu, mas Victor não conseguia acompanhar o que eles estavam falando por mais que tentasse. Ele simplesmente não conseguia prestar atenção no que os outros diziam, os pensamentos em sua cabeça por demais barulhentos.

Ele olhou para seu prato, para seu cupcake inacabado e respirou fundo.

Tudo ficaria bem, ele disse a si mesmo.

Entretanto, apesar de estar dando o melhor de si para manter a cabeça erguida e os pensamentos otimistas, foi incapaz de afastar a dúvida que surgiu imediatamente, que dava sequência aos seus pensamentos como uma espécie de pontuação inevitável para o trágico cenário que Victor não conseguia parar de orquestrar em sua mente.

 

—--

 

Quinta-feira. Uma manhã na Torre de São Petersburgo.

Era cedo, muito cedo, tão cedo que a luz do sol nem havia ainda começado a invadir o interior do quarto através das frestas da cortina.

Um homem olhava para o teto, seu corpo ainda deitado preguiçosamente na cama, sentindo nenhuma vontade de deixar a maciez e o conforto do colchão. Ele encarava o teto sobre sua cabeça, observando sem interesse como a usual brancura da tinta havia sido tingida de preto pelas sombras que ainda tomavam conta do cômodo.

O homem havia acabado de acordar, mas ainda se encontrava cansado, muito cansado, seus olhos pesados ​​como se estivessem cheios de areia. Cansado como se não tivesse pregado o olho a noite toda, que era exatamente o caso.

A noite foi passada em claro, seus pensamentos o mantendo acordado a maior parte do tempo. Apesar de se revirar na cama a noite toda, ele não foi capaz de relaxar.

Ele se perguntava…

Ele nunca comeu nenhuma borboleta, então como poderia haver alguma dentro de seu estômago?

Por quê? Como? Qual poderia ser o significado disso? Quando isso aconteceu?

Havia algo que ele pudesse fazer?

… Sim, é claro. 

O homem empurrou seu corpo para longe da cama, seus olhos de repente bem abertos e despertos.

Como ele pôde ser tão estúpido?

 

—--

 

Naquele dia, Yurio se viu verdadeiramente confuso com a visão que o saudou quando saiu de seu quarto para tomar café da manhã.

Victor mostrava-se incapaz de permanecer parado por mais do que três segundos consecutivos. Yurio o encontrou zanzando pela casa sem parar, consultando alguns livros em várias prateleiras e carregando documentos de um lado para outro como se sua vida dependesse disso. Ele havia subido e descido as escadas que levavam ao laboratório tantas vezes que o jovem não ficaria surpreso se a madeira se encontrasse agora marcada pelos passos do caminhar incessável de seu mentor.

Mas o acontecimento mais surpreendente desta estranha quinta-feira foi que Victor começou a trabalhar em algo — um novo plano. Havia urgência em seu olhar, e ele provavelmente teria pulado suas refeições se Yurio não as tivesse levado para ele no laboratório.

Yurio desejava poder se sentir feliz por Victor estar, pela primeira vez, tão inspirado em fazer seu trabalho, mas não conseguia afastar a vaga impressão — um mau pressentimento — de que havia algo errado.

Victor nunca correu tanto para finalizar um projeto, qualquer que fosse, e o sorriso estúpido que ele carregava nos lábios estava tirando Yurio do sério por alguma razão desconhecida. Ele parecia orgulhoso de si mesmo, como se tivesse acabado de resolver o maior dilema da humanidade.

Yurio se perguntou se Victor ainda estava preocupado com toda aquela coisa de "borboletas no estômago" do outro dia. Mas não podia ser, certo?

Conforme as horas passavam e a noite começava a reinar no céu, o garoto se viu cada vez mais certo de que Victor havia se convencido de alguma bobagem — algo absurdamente estúpido — e de que ele estava fazendo algo completamente desnecessário.

Ele, porém, não tinha planos de se envolver nessa história, que parecia estar prestes a virar um circo a qualquer instante. Ao invés disso, ele preferia ver o caos se desenrolar do camarote, um balde de pipoca na mão e uma distância grande o suficiente o separando do desastre iminente que certamente se seguiria bem em breve.

 

—--

 

— Então, — Phichit sorriu, balançando as sobrancelhas enquanto encarava seu amigo — o grande dia está chegando, hum?

— Geez, você realmente tem que colocar as coisas desse jeito?

Yuuri pegou mais um salgadinho na tigela que sua mãe trouxera mais cedo e então a empurrou na direção de seu amigo, para que ele também pudesse se servir e, quem sabe, ocupar a boca de uma maneira mais útil. A essa altura, as mãos dos dois já se encontravam completamente manchadas, as pontas dos dedos tingidas de laranja brilhante.

— Ah, vamos! Você sabe que está ansioso por isso! — seu amigo afirmou, e Yuuri não pôde fazer nada além de balançar a cabeça enquanto lutava contra o impulso de prontamente responder com uma negativa.

— Bem…

Phichit se arrastou pelo chão e sentou-se ao seu lado. Eles estavam sentados bem diante da cama de Yuuri, suas costas apoiadas confortavelmente no colchão.

— O que foi? Ainda preocupado com o fato dele ser um vilão? — perguntou Phichit.

— Na verdade não. Quero dizer, se isso fosse algo que me incomodasse de verdade, então eu nem teria concordado com esse encontro para início de conversa.

Phichit perguntou qual era o problema então, o que o estava deixando tão pensativo. Yuuri suspirou e virou o rosto, seu corpo se retraindo e seus dedos se agarrando ao tecido de sua calça. Estava ciente de que não adiantava tentar esconder as coisas de Phichit, pois ele descobriria a verdade cedo ou tarde já que conseguia lê-lo tão facilmente quanto um livro aberto, mas admitir certas coisas nunca era fácil.

— É que faz um tempo, sabe. Faz um bom tempo desde que fiz algo assim.

— Se refere a ir a um encontro?

Yuuri anuiu a cabeça, suas bochechas ficando um tanto rosadas quando contou que a última vez foi no seu último ano do colegial. A garota havia sido legal com ele, uma companhia agradável, mas a experiência não foi especial o suficiente para que ele concordasse com um segundo encontro. Depois disso, ele simplesmente não tentou outra vez; nunca viu como uma necessidade.

— Bem, eu não acho que qualquer experiência que você pudesse ter seria realmente útil quando seu encontro é com alguém como Victor Nikiforov — Phichit disse e deu de ombros, agindo com indiferença.

Phichit tentou colocar algum juízo na cabeça de seu amigo, dizendo-lhe que não havia nenhuma maneira de este encontro ser comparável a qualquer outro que ele já tenha ido e que, portanto, o fato dele não ter muita experiência não significava nada. Yuuri podia ver certo sentido por trás de suas palavras encorajadoras, mas isso não significava que estavam ajudando a acalmar seu coração ansioso. Ele sabia que seu amigo não tinha nada além de boas intenções, no entanto.

— Além disso, vai ficar tudo bem! Vocês se dão muito bem quando estão lutando um contra o outro e são também, à própria maneira e indo contra todas as expectativas, amigos relativamente próximos.

— Sim, mas estou preocupado — Yuuri falou, suas palavras quase tão pesadas quanto a carga sobre seus ombros. — Ele não sabe que eu sou Katsudon... E se ele descobrir e as coisas ficarem estranhas entre nós? Não quero que nossa vida pessoal atrapalhe nossas atividades profissionais. Gosto de lutar contra o Treinador e não quero que isso mude. 

— Tem certeza de que ele não sabe?

Yuuri acenou com a cabeça. Phichit parecia querer perguntar "como", mas em vez disso não disse nada. Talvez ele tenha percebido que sua pergunta seria inútil, visto que ele mesmo já sabia a resposta.

Yuuri falou tanto sobre seu nêmesis nas usuais ligações noturnas entre ele e Phichit — na maioria das vezes sem nem perceber que estava fazendo isso e depois se desculpando por ter mudado de assunto repentinamente no meio da conversa — que Phichit se via agora com um entendimento consideravelmente bom sobre a personalidade de Victor, sendo capaz de compreendê-lo pelo menos um pouco. Mesmo que eles nunca tenham trocado uma palavra, o vilão não parecia mais ser realmente um estranho para Phichit.

— Bem, tenho certeza de que vai dar tudo certo no final. Afinal, vocês gostam um do outro.

— Eu, eu não... — Yuuri partiu em sua própria defesa, mas foi interrompido antes que pudesse falar qualquer coisa.

— Sim, você gosta — disse uma terceira voz.

Os dois amigos se viraram e encontraram Mari encostada na batente da porta, os seus braços cruzados na frente do peito. Ela estava sorrindo, obviamente se divertindo com a oportunidade de se intrometer na vida de seu irmão mais novo. Um cigarro descansava entre seus dedos, mas ainda se encontrava apagado — ela provavelmente estava indo fumar quando ouviu a conversa deles e decidiu fazer uma parada rápida.

— Por que ainda está em negação? Ele não é só legal, como gostoso também ainda por cima — ela disse, com naturalidade e sem se envergonhar nem um pouco das palavras que saíam de sua boca. Yuuri corou. — Existe algo que você não goste nele?

Yuuri ficou quieto por um tempo, sentindo-se desconfortável e consciente demais do calor presente em seu rosto. Ele cerrou os punhos com força, até sentir as unhas cravarem na pele.

— Não — ele admitiu, finalmente.

Verdade seja dita, ele tentou várias vezes encontrar algo — qualquer coisa — que o irritasse em Victor. Vasculhou suas memórias de cima a baixo, revisitando cada uma e permitindo que sua mente se voltasse em direção ao passado e fosse o mais longe possível. No entanto, no final, ele sempre se via alcançando a mesma conclusão: que até mesmo as falhas do Victor podiam ser cativantes, às vezes. Ele não podia fazer nada além de admitir a derrota.

Não havia nada para se odiar.

Isso era, de certa forma, meio frustrante... Como alguém podia ser tão perfeito e, ao mesmo tempo, tão estranho e exagerado?

Talvez seus sentimentos fossem mais profundos do que pensava, Yuuri lamentou dentro da privacidade de sua mente.

Yuuri podia fazer nada além de rosnar em frustração e esconder o rosto nas mãos; só assim ele conseguia escapar dos dois pares de olhos que o observavam tão atentamente.

Ugh. Isso era tão, tão frustrante...

— E ele tem um cachorro que é basicamente uma versão tamanho grande do Viichan — Mari acrescentou, levantando uma das sobrancelhas.

Havia um sorriso firme e provocativo nos lábios da mulher, o qual estava fazendo Yuuri franzir os lábios em um ato inútil de resistência e de claro descontentamento. Sua irmã estava não apenas tentando mostrar ter um ponto, como também estava fazendo de tudo para que Yuuri não fosse capaz de replicar em defesa própria. Estava funcionando.

— Não tinha como ele ser mais perfeito para você do que ele já é.

"Um buraco fundo seria útil agora", Yuuri pensou consigo mesmo. Ele desejava poder se esconder, refugiar-se em algum lugar que lhe permitisse ficar o mais longe possível do olhar penetrante que Mari estava direcionando a ele, o qual parecia enxergar através das barreiras que ele havia erguido ao seu redor. Por que sua irmã tinha que conhecê-lo tão bem?

Tão, tão constrangedor...

— Quem é Viichan? — Phichit perguntou, de repente sentindo que havia sido deixado para trás na conversa.

— O cachorro do Yuuri quando ele ainda era criança. Era seu melhor amigo. Tão pequeno e adorável. Muito fofo — explicou Mari.

— Mas isso não… — Yuuri começou. Mas, novamente, ele foi interrompido.

— Continue dizendo isso, se isso faz você se sentir melhor, irmãozinho — Mari falou, já antecipando o que Yuuri iria dizer. — Só estou dizendo que você não precisa negar tanto. Estranho teria sido se você não tivesse sentido nada por ele.

Ela levou o cigarro aos lábios, só então lembrando que ainda estava apagado. Mari suspirou e então se remexeu um pouco, ficando devidamente em pé após empurrar seu corpo para longe da porta na qual se apoiava até então. Ela estava realmente precisando de um pouco de nicotina.

Porém, ela não havia terminado ainda.

— Eu sabia que acabaríamos nessa situação mais cedo ou mais tarde, com você gostando dele e fazendo todo o possível para negar seus sentimentos. Você sempre foi assim. O que eu não esperava era que ele se apaixonasse primeiro. Ele está interessado em você desde a primeira vez que te viu, e tem sido quase insuportável assistir, honestamente.

— Oh, oh! Eu posso atestar quanto a isso! — Phichit, por algum motivo, achou que precisava colocar mais lenha naquela fogueira.

— Não é?! A coisa estava tão ruim que estava me deixando com vergonha alheia.

Ela revirou os olhos e, mais uma vez, levou o cigarro apagado aos lábios. Ela estalou a língua assim que percebeu seu erro, xingando internamente.

Yuuri escondeu as mãos nas costas, desejando ocultar o fato de seus dedos estarem inquietos e de suas palmas estarem doloridas. Todavia, visto que ele podia sentir seu rosto ficando cada vez mais quente, provavelmente seu gesto não adiantou de nada. Ele tinha certeza de que todas as suas emoções estavam escritas em seu rosto, exibidas para que todos vissem, transparentes como água límpida.

— Você disse que ele gosta de mim desde a primeira vez que nos vimos... Mas isso significaria que ele já gosta de mim há dois anos. Não pode ser.

— Estou dizendo que é exatamente isso. E é por essa razão que essa situação é tão inacreditável.

— Sim, eu sei o que você quer dizer — disse Phichit. — Levou dois anos inteiros para o Victor tomar algum tipo de iniciativa... Eu estava começando a me perguntar porque estava demorando tanto.

Yuuri estava prestes a explicar que a razão disso era devido ao fato de Victor se sentir tímido e inseguro, porque ele havia se convencido de alguma forma de que não era bom o suficiente, quando decidiu calar a boca. Ele tinha certeza de que isso apenas faria com que essa conversa se prolongasse ainda mais, e ele preferia evitar que isso acontecesse.

Mari o encarou fixamente por mais algum tempo, em silêncio.

— Apenas — ela começou a dizer — não o machuque, Yuuri, acho que ele realmente gosta de você.

Ela parecia estar falando sério, o que surpreendeu Yuuri.

Yuuri engoliu em seco e se viu anuindo a cabeça sem nem perceber. Mari sorriu brevemente em direção a ele e então se despediu, seu desejo por nicotina tendo ultrapassado seus limites há muito tempo.

Assim que os dois amigos foram deixados na companhia exclusiva um do outro, Phichit se voltou para Yuuri. Havia uma pergunta pendurada em seus lábios, uma que Yuuri sabia que seu amigo não pretendia conter por sequer mais um segundo.

— Então... Você realmente não está nem um pouco ansioso por esse encontro? — ele perguntou com um sorriso, que foi menos provocativo e mais gentil desta vez.

Yuuri desviou o olhar e coçou a cabeça.

 — Geez, por que você pergunta se já sabe a resposta? — Yuuri reclamou e então suspirou.  — Claro que estou! Estou preocupado, é só isso...

Uma mão bateu em suas costas, com força, e Yuuri se sobressaltou de leve em resposta. Ele olhou para Phichit com um olhar de soslaio, e tudo que ele queria naquele momento era entender porque seu amigo havia repentinamente decidido partir para a violência.

Phichit riu brevemente. Então, suas expressões se tornaram sóbrias.

— Você vai ver. Vai dar tudo certo.

Um sorriso brotou em seus lábios e Yuuri se acalmou um pouco. Ele ainda estava se sentindo constrangido, o que era de se esperar considerando sua personalidade, mas então ele se deu conta de algo importante: Ele e Phichit sempre falaram abertamente um com o outro, então por que ele estava com tanto medo de fazer isso agora? Eles compartilhavam de tudo, desde segredos a sentimentos, conquistas e derrotas, então era estranho que ele tivesse decidido esconder tudo desta vez.

Yuuri tomou uma decisão. Ele juntou sua coragem, toda que pôde encontrar.

— Espero que sim — Yuuri admitiu e respirou fundo. — Eu realmente gosto dele. Espero que nada fique entre nós. 

Já era hora de começar a falar seus sentimentos em voz alta, mesmo que para uma pessoa apenas.

 

—--

 

Em uma sexta-feira de manhã, um enxame de borboletas foi visto indo em direção ao centro da cidade.

— De onde vieram? — as pessoas se perguntavam, observando o show de cores trazido pelo enxame.

— Por quê? — Elas se perguntavam, e mesmo aqueles que negavam com tanta veemência a existência de um Aquecimento Global começaram a reconsiderar suas opiniões. Ou talvez fosse outra praga, uma maldição enviada pelos Céus... As opiniões estavam bem divididas.

Não havia certeza. Apenas pânico.

Para onde quer que se olhasse, o pequeno INSETO estava lá, voando despreocupadamente. Isso, é claro, trouxe caos para a cidade. Assistir a uma borboleta agitando suavemente suas asas em torno de um campo de flores era uma coisa, ter a cidade tomada por uma quantidade incontável delas era outra totalmente diferente.

Algumas pessoas tentaram se manter afastadas, um pouco assustadas e outro tanto enojadas. Algumas tentaram matar as inocentes criaturas pelos mesmos motivos. E uma minoria não parecia se importar muito com o que estava acontecendo. Apesar da prefeitura estar trabalhando loucamente, tentando pensar em como resolver o problema, ainda não haviam sido capazes de encontrar alguma solução que se mostrasse verdadeiramente útil. Nada parecia funcionar, e o número de insetos parecia aumentar a cada minuto.

Enquanto isso, o Treinador observava o resultado de seu trabalho da janela de seu laboratório, sorrindo com orgulho ao que seu plano mostrava progresso.

 

—--

 

Quando Yuuri olhou pela janela de seu quarto, ele duvidou de seus olhos por um breve instante. Ele havia acabado de acordar e ainda estava sonolento o bastante para que seus olhos fossem capazes de pregar uma peça nele — ou, ao menos, foi disso que ele tentou se convencer.

Não havia como a visão diante de seus olhos ser verdadeira.

De jeito nenhum aquilo estava realmente acontecendo.

Não hoje.

No entanto, por mais que ele desejasse continuar em negação e a desviar os olhos da verdade, no fundo ele sabia que não havia engano algum e que o que ele estava vendo era de fato a realidade, e não uma projeção de sua ansiedade no mundo real. Ele estava ciente disso, e mentir para si mesmo não ajudaria em nada.

Yuuri respirou fundo e então suspirou.

Rosa, azul, amarelo, roxo, vermelho... Havia tantas cores voando no céu que ele não conseguia nem contar quantas eram. Era colorido, como uma tela em branco salpicada de tinta.

À sua frente, bem do lado de fora de sua janela, encontrava-se um cenário digno do reino dos sonhos — lindo e cheio de magia, como algo que você esperaria encontrar em um livro de fantasia. Yuuri não teria problemas em viver cercado por aquela imensidão de cores, olhando para aquele cenário todos os dias, não fosse pelo fato de que tudo aquilo era devido a um enxame de borboletas, o qual tomou conta da cidade de manhã cedo. E isso, bem, não era boa coisa.

Yuuri suspirou e descansou a cabeça na moldura fria da janela, fios rebeldes de seu cabelo bagunçado grudando no vidro úmido. Ao conectar os pontos e começar a entender a situação, outro suspiro escapou de seus lábios, e ele nem mesmo tentou contê-lo.

Seu telefone apitou, como esperado.

Era o Celestino, como também lhe era esperado

Ainda olhando para o céu, para aquela imensidão colorida, Yuuri suspirou uma terceira vez.

"Por quê?", Yuuri se perguntou. Já que nenhuma resposta apareceu para rebater sua indagação, sua pergunta ecoou em sua mente de novo e de novo, como um mantra amaldiçoado seguindo atrás dele e o encurralando por todos os lados.

Por quê? Por que o Victor estava fazendo uma coisa dessas logo no dia do encontro?

Na maioria das vezes, entender seu nêmesis era difícil; às vezes, era impossível.

 

—--

        

Quando Katsudon foi confrontar o Treinador, ele se dirigiu ao elevador sem pensar duas vezes. Ele podia sentir o início de uma dor de cabeça pressionando a parte de trás de sua cabeça, e andar em meio àquelas borboletas por todo o caminho foi uma tortura. Ele não estava com humor para se dar ao trabalho de fazer acrobacias ou ser criativo com sua entrada — não hoje.

Estava um pouco zangado, ele tinha que admitir. Mas, acima de tudo, estava frustrado e consideravelmente confuso. O que ele mais queria era acabar com toda essa situação, sobre a qual não conseguia ver sentido algum, e talvez — se possível — entender que porra estava acontecendo. E o porquê.

"Por que hoje, de todos os dias?", Yuuri se pegou pensando, não tendo sido nem de perto a primeira vez que ele se perguntava isso.

Ele não conseguia parar de repetir a pergunta em sua mente, em um loop infinito e tortuoso, como um disco riscado. Como ele ainda não havia encontrado uma resposta, provavelmente não teria paz tão cedo.

Ele arrastou os pés pelo corredor e caminhou em direção à porta de aço na outra extremidade, seguindo a linha contínua que corria no meio do piso e que iluminava seu caminho.

Yurio o aguardava junto à porta, os braços cruzados sobre uma camisa com estampa de tigre. Estudando seu rosto de longe, Katsudon não sabia dizer se o jovem estava zangado com a situação ou se já havia simplesmente desistido, que eram suas reações habituais quanto aos planos do Treinador. Todavia, não importava o quanto Katsudon olhasse, suas expressões não estavam claras em meio às penumbras da sala mal iluminada; não daquela distância pelo menos.

No entanto, quando a distância entre eles decresceu e eles foram capazes de trocar olhares adequadamente, Katsudon percebeu que os dois pareciam compartilhar a mesma frustração. Os dois estavam confusos quanto à razão de Victor estar se sabotando. Encontrar qualquer tipo de explicação lógica para esta situação irreal parecia ser uma causa perdida, e eles aparentemente concordavam quanto a isso

Nenhum dos dois estava com vontade de lidar com quer o que fosse que estivesse acontecendo — os dois têm sido obrigados a lidar com várias coisas, cada um à sua maneira.

Os últimos meses foram longos, os dias parecendo se arrastar por uma eternidade enquanto Victor reclamava repetidamente sobre como as coisas nunca funcionaram em sua vida, sobre como ele queria ter um encontro com Yuuri, e por aí vai... Ele basicamente não falava de outra coisa, e essa também parecia ser a única coisa ocupando seus pensamentos.

Yurio, que morava com ele, foi submetido a tudo isso em doses diárias. Ele teve de ouvir seu mentor falar sobre seus sentimentos de novo e de novo, sendo também obrigado a assistir enquanto Victor permitia que seu coração apaixonado guiasse suas decisões como Treinador. Foi insuportável, um pesadelo que ganhou vida e o qual ele não aguentava mais. E agora Victor tinha feito algo tão estúpido no dia do maldito encontro! Dar um soco na cara dele uma vez só não bastaria para aliviar o mau humor que Yurio havia acumulado.

E para Katsudon — ou melhor, para Yuuri foi ainda pior.

Yuuri progrediu muito quando comparado a onde estava inicialmente, chegando ao ponto em que era inclusive capaz de reconhecer, e aceitar, seus sentimentos pelo Victor. Ele até mesmo os deu voz e os compartilhou com outra pessoa — Phichit. Mesmo que isso possa não parecer uma conquista muito incrível para os demais, não foi uma tarefa fácil para ele, considerando sua personalidade insegura e seu péssimo hábito de conter qualquer emoção que parecesse poder se tornar muito complicada e comprometedora ao longo prazo.

Ele, de alguma forma, foi capaz de romper as barreiras que ele mesmo havia erguido ao redor de seu coração e dar um passo à frente. À sua maneira, Yuuri estava ansioso pelo encontro deles, que era tudo em que ele conseguia pensar nos últimos dias. Agora, porém, ele não sabia o que era suposto de pensar.

Katsudon e Yurio se encararam por um momento, bocas fechadas e olhos repletos de emoções que eram complicadas demais para serem compreendidas apenas através de uma troca de olhares. O silêncio que pairava entre eles era pesado, pois carregava muitas palavras não ditas — palavras que eles desejavam dizer, mas que sabiam que, mesmo que fossem dadas vozes, não mudariam nada.

Só havia uma maneira de realmente resolver essa situação.

Dando um passo para o lado, Yurio deu passagem para que Katsudon entrasse. Satisfazendo as expectativas do garoto, o agente estendeu a mão em direção a maçaneta, girando-a com um movimento suave.

Antes que Katsudon pudesse dar mais do que três passos para dentro do laboratório, seus olhos pousaram na silhueta familiar que estava parada à frente das grandes janelas localizadas nos fundos da ampla sala aberta.

O Treinador — seu arqui-inimigo de dois anos, seu amigo e também, de certa forma, seu interesse romântico e a fonte da maioria de suas dores de cabeça ultimamente — estava parado ao lado de uma enorme flor colorida, a luz do sol reluzindo em seu rosto. Ele estava vestindo uma blusa de gola alta amarela e calças jeans, e essa foi provavelmente a roupa menos extravagante que ele já o viu vestindo desde que começaram a trabalhar juntos.

A flor ao lado dele era grande, exageradamente grande, sendo uma cabeça mais alta que o Treinador e possuindo pétalas que pareciam tentar alcançar o céu. Era óbvio que a planta havia sido submetida a aprimoramento genético.

"Existe algo que o Treinador não consegue fazer?", perguntou-se Katsudon.

Às vezes, a percepção de que seu nêmesis era alguém bastante impressionante o atingia em cheio, o golpe vindo tão repentinamente quanto um raio. Victor era uma pessoa inteligente como poucos, e possuía uma vasta gama de conhecimento ao seu alcance — um gênio, realmente.

Mas agora não era o momento de ficar admirado.

Como o Treinador ainda não o tinha avistado, Katsudon aproveitou a oportunidade para estudar a situação mais profundamente. Um pouco de cautela nunca era demais; muito pelo contrário, era sempre bem-vinda.

O Treinador estava de costas para Katsudon e sua atenção repousava exclusivamente na planta à sua frente, a qual ele estava regando com um cuidado memorável. Um bando de borboletas o faziam companhia, agitando-se em torno dele, provavelmente atraídas pelo cheiro doce da flor e pelo amarelo vibrante presente na camisa do vilão.

Katsudon se aproximou, seus passos tão silenciosos quanto a calada da noite. Yurio o seguiu, sempre se mantendo alguns passos atrás, mas suas expressões mostravam que ele não tinha absolutamente nenhuma intenção de se envolver nessa bagunça. Quando Katsudon chegou perto o suficiente para ter uma visão clara do rosto de seu nêmesis, ele percebeu que o Treinador parecia pensativo, como se algo o estivesse incomodando.

O Treinador murmurou algo enquanto falava consigo mesmo — a única pessoa no laboratório conforme seu entendimento. Sua voz encontrava-se tão suave que Katsudon levou alguns segundos para compreender o que ele estava resmungando.

— Por quê... Por que não está funcionando? — Katsudon o ouviu lamentar.

Katsudon redirecionou sua atenção em direção ao Yurio, de repente se sentindo mais confuso do que nunca. O garoto apenas balançou a cabeça e deu de ombros. Sem saber como interpretar a reação enigmática e nem um pouco esclarecedora do jovem, ele arriscou perguntar mais a fundo, entretanto, logo sentiu que havia dado um passo em falso em direção à verdade desejada, pois, ao invés de uma explicação, Yurio sentiu-se impelido a compartilhar com Katsudon uma fração de suas reclamações.

— Honestamente? Estou cansado dessa merda! Como alguém pode ser tão inteligente e, ao mesmo tempo, tão idiota? — o garoto disse, suspirando profundamente.

Katsudon fez uma careta. Sentia pena de seu nêmesis, achando lamentável que ele fosse visto de tal maneira por seu próprio aprendiz. Mas, ao mesmo tempo, não conseguia culpar Yurio por pensar assim.

— Deixo isso com você. Apenas... Faça alguma coisa.

Dito isso, Yurio se virou e partiu, não deixando para Katsudon opção além de vê-lo se afastar, sua pequena silhueta tornando-se menor conforme ele se distanciava. Mas, ao menos, sua partida trouxe o Treinador de volta ao planeta Terra; nem mesmo ele tinha como ignorar a saída barulhenta e enfurecida de Yurio. Por mais que o vilão estivesse feliz dentro no mundinho particular que havia criado para si mesmo — apenas ele, a flor e seus pensamentos —, foi forçado a reconhecer a presença de outras pessoas no cômodo.

Quando ele se virou e encontrou Katsudon parado alguns passos distante de si, observando-o silenciosamente e vestido em seu costumeiro terno preto e gravata azul feia, ele sobressaltou, seu cabelo se arrepiando visivelmente. De repente, o Treinador parecia estar agitado. Ele levou as mãos às calças, procurando por algo desesperadamente, mas se viu com os bolsos vazios.

Katsudon ergueu uma das sobrancelhas e deu um passo à frente, em sua direção. Quando o Treinador deu conta do que estava acontecendo, recuou um passo para trás e ergueu as mãos diante do corpo, posicionando-se entre a planta e seu nêmesis.

— Por favor! Espere!

Katsudon não disse nada em resposta nem parou de avançar em direção a ele, dando mais um passo à frente sem pestanejar uma vez sequer, a cabeça erguida. O Treinador olhava de seu nêmesis para a flor, incessavelmente. Ele parecia ansioso, conforme se notava em seus olhos arregalados e em suas mãos trêmulas.

— Não, por favor! Eu preciso que isso funcione! — ele implorou. O desespero em sua voz foi suficiente para interromper os passos de Katsudon.

Enquanto olhava para o homem à sua frente, Katsudon não podia fazer nada além de se sentir completamente confuso. Aquele... não era o Treinador, ele percebeu após observá-lo por alguns instantes. Katsudon ameaçou dar mais um passo adiante, apenas para ver como ele reagiria desta vez, mas as expressões no rosto de seu nêmesis simplesmente ficaram mais ansiosas, o que o fez parar uma vez mais.

— O que está acontecendo? — Katsudon perguntou ao Treinador; não, na verdade quem estava diante dele agora era claramente o Victor.

Victor encarou a flor mais uma vez, seus olhos demorando-se nela por um segundo, e então ele olhou para baixo, seu cabelo caindo sobre o rosto quando ele inclinou a cabeça para frente. O vilão suspirou, parecendo cansado como se não dormisse há uma semana.

— Victor, o que está acontecendo? — Katsudon se repetiu, sua voz carregando sua preocupação até o homem à sua frente.

Uma resposta não lhe foi dada de imediato, demorando uma eternidade para Victor dizer qualquer coisa. Talvez ele não tivesse certeza de como melhor expressar seus pensamentos; Yuuri sabia muito bem o quão difícil isso podia ser, e foi por isso que deu a ele todo o tempo de que precisava.

— Há algo de errado comigo — Victor explicou, enfim. Sua voz apresentava-se baixa e abatida.

Victor envolveu sua barriga com os braços, uma ação que não passou despercebida aos olhos atentos de Katsudon. Seu nêmesis estava franzindo, como se estivesse com dor, e agarrava-se ao tecido de sua blusa com um desespero claramente visível na tensão presente em suas expressões. Katsudon acompanhava de perto cada um de seus movimentos, parte preocupado, parte curioso.

— Há borboletas... aqui — ele explicou, sua voz se arrastando a cada sílaba.

Inicialmente, ele se perguntou se Victor estava doente, porém, não teve sequer tempo de levar essa linha de raciocínio adiante, pois as palavras que seu nêmesis dissera logo a seguir atropelaram todos os seus pensamentos anteriores. As palavras que Victor havia acabado de dizer martelavam em sua mente, barulhentas, e Katsudon estava se esforçando a fim de tentar entendê-las.

Victor continuava encarando o chão, em completo silêncio. Um suspiro profundo escapou de seus lábios — pesado e angustiado.

— Não sei como elas foram parar aí dentro — acrescentou.

Os olhos de Katsudon se arregalaram quando as peças começaram a se encaixar.

— É horrível... Não tem como eu ir no meu encontro com o Yuuri enquanto me sinto assim! — A voz do Victor ficou mais alta e mais desesperada. Ele ainda não tinha tirado as mãos da barriga, assim como Katsudon não tinha tirado os olhos dele.

Victor fechou os olhos e inclinou a cabeça ainda mais para baixo, seu rosto se escondendo quase que completamente atrás de uma cortina de fios de cabelo prateado. Katsudon o encarava sem saber o que falar e, quando terminou de conectar os pontos, finalmente foi capaz de entender o que Yurio quis dizer antes, e o porquê dele estar tão estressado.

Era exatamente como ele havia dito — inteligente, mas também estúpido...

No entanto, Katsudon sabia que não devia desprezar as preocupações dos demais, quaisquer que fossem. Assim como ele nunca zombou das motivações incomuns que o Treinador tinha por trás de seus planos, ele também não tinha intenções de zombar de Victor por causa de suas inseguranças, ou pela sua surpreendente ignorância sobre algumas expressões populares. Yuuri não era esse tipo de pessoa, não era alguém insensível.

— Victor — ele chamou e o homem olhou para cima, finalmente. — Eu vou até você, okay? Vamos conversar, apenas conversar.

Victor considerou aquelas palavras por um momento e então anuiu a cabeça após o que pareceu ser uma vida inteira, mas que na verdade não haviam sido mais do que alguns breves segundos. Katsudon caminhou até ele, seus passos lentos e seus olhos atentos a cada uma das reações de Victor. Ao alcançá- lo, Katsudon pousou uma mão no ombro de Victor e o ofereceu um sorriso caloroso.

— Escuta — ele começou — não tem nenhuma borboleta realmente dentro do seu estômago. É apenas uma figura de linguagem, uma expressão que as pessoas usam quando alguém está nervoso. Você só está ansioso por causa do encontro.

— Mas... Não pode ser só isso. — Victor desviou o olhar por um segundo. — Não é como se eu nunca tivesse ficado ansioso antes! Não era tão ruim assim!

Victor deu um passo para trás, fugindo do toque de Katsudon.

— Não é a mesma coisa!

Katsudon não sabia o que dizer. Ele suspirou. Apesar de estar se sentindo frustrado, desistir não era uma opção. Ele tinha que continuar tentando, tinha que colocar juízo na cabeça do Victor.

— Bem, é claro que não ia ser a mesma coisa — falou, cruzando os braços e tentando se manter o mais calmo possível. — É o seu primeiro encontro com o Yuuri.

Por um segundo, Katsudon reteve as palavras que pretendia dizer; quando permitiu que elas saíssem de sua boca, estavam contaminadas pelo seu próprio constrangimento.

— Você não o ama?

— Mais do que qualquer coisa! — A resposta de Victor foi imediata.

Katsudon sentiu suas bochechas ficarem quentes. Foi sua vez de desviar os olhos.

— Então? — Katsudon indagou, esforçando-se para ignorar a estranha sensação deixada por seu coração, que agora batia mais forte e mais rápido do que nunca. — Como poderia comparar? Claro que você vai ficar mais nervoso por causa do encontro do que por qualquer outra coisa! Suas experiências anteriores não importam!

Victor ficou pensativo, talvez vendo algum sentido nas palavras de seu nêmesis.

— Tem certeza?

— Sim, tenho. — Katsudon agarrou as mãos de Victor e, enquanto olhava no fundo de seus olhos azuis, sorriu para ele. 

E então ele percebeu o que havia acabado de fazer.

Envergonhado, ele estava prestes a se afastar quando as mãos de Victor se fecharam em torno das suas — tão maiores e mais quentes que as dele. Seu coração deu um salto e Katsudon se viu com vontade de olhar para baixo, mas resistiu, mantendo a cabeça erguida e os olhos fixos nos de Victor.

Katsudon sentiu que precisava continuar falando, pois o silêncio quieto e confortável que se instalou entre eles era não apenas demais para seu coração, mas também perigoso já que não tinha certeza de que conseguiria se impedir de dizer coisas que não devia.

— É normal se sentir assim. Eu...  Tenho certeza de que o Yuuri também está se sentindo nervoso — ele disse, timidamente; ou talvez “admitir” fosse uma maneira melhor de expressar o que ele havia acabado de fazer. — Você não é o único.

Um sorriso brotou nos lábios de Victor — parte feliz, parte tímido.

Katsudon, Yuuri, ele nem sabia mais quem ele era suposto de ser... Sua cabeça estava tão leve que ele temia que seus pés saíssem do chão.

Ele já estava se sentindo excessivamente consciente por causa de suas mãos, que ainda se encontravam entrelaçadas com as de Victor, então ter que também se preocupar com as expressões que carregava no rosto era pedir demais dele. Ele não era um ator bom o bastante para conseguir lidar com tudo isso; não ao mesmo tempo.

— Posso ter minhas mãos de volta? — ele perguntou, enfim.

Victor imediatamente o soltou. Ele parecia surpreso consigo mesmo, como se tivesse esquecido completamente das mãos que estivera segurando com tanta força até poucos segundos atrás. Katsudon olhou em direção aos pés, sentindo que seu rosto ainda estava quente.

Depois de fazer com que a conversa retomasse com sucesso, os dois nêmesis conversaram um pouco mais. Katsudon garantiu a Victor que ele ficaria bem durante o encontro e que tudo daria certo — repetindo em voz alta o que Phichit havia falado para ele alguns dias atrás — e então ele se despediu.

Victor matou a enorme flor com a ajuda de alguns produtos químicos, e logo as borboletas estavam voando para longe, dispersando-se.

O vilão observou a planta murchar lentamente, as folhas ficando mais escuras e as cores drenando das pétalas até que sua vitalidade anterior desaparecesse por completo. Victor suspirou. Seu estômago ainda o incomodava, mas ele decidiu que acreditaria em seu nêmesis.

Tudo ficaria bem.

 

—--

 

Apesar de Yuuri estar tentando se mostrar calmo e não deixar transparecer quão excessivamente animado ele estava por conta do encontro, ele ainda assim se viu vestido e pronto para sair meia hora antes do horário combinado. Sem mais nada para fazer e precisando se ocupar, Yuuri se contentou em observar a paisagem através da janela de seu quarto, que foi como ele viu Victor chegando assim que ele dobrou a esquina. Yuuri estava descendo as escadas antes mesmo da mensagem de Victor alcançar seu celular.

Ele pisou no andar térreo e, olhando em volta, encontrou o restaurante tão vazio quanto era esperado em uma tarde de sexta-feira. Sua mãe estava trabalhando atrás do balcão e Mari estava distraída com algum jogo em seu telefone, ambas parecendo estar completamente entediadas pela falta de coisas para fazer. Quando Yuuri adentrou o restaurante, elas se viraram para ele.

— Já está de saída? — sua mãe perguntou.

Yuuri se virou e anuiu. Mari sorriu de maneira provocativa, mas o que realmente o fez corar e se apressar em direção à porta foi o olhar astuto que Hiroko lançou na direção dele. Era como se ela tivesse arrancado suas barreiras e olhado fixamente dentro de sua alma, e, por mais que ele amasse e admirasse sua mãe, isso ainda assim era um pouco demais.

Ele murmurou um rápido e enrolado adeus e então estendeu a mão em direção à porta. Porém, foi incapaz de fugir rápido o suficiente. Mari o atiçou com um comentário provocativo antes que pudesse sair de vista, e seus ouvidos instantaneamente ficaram quentes devido ao seu constrangimento.

Era óbvio que não seria poupado das provocações da Mari; jamais devia ter criado esperanças de que escaparia ileso.

Do lado de fora, Victor aguardava por ele, vestido em um suéter listrado e mostrando-se bonito como sempre. Ele estava encarando o celular, provavelmente lendo a última mensagem que Yuuri o havia enviado, cuja única finalidade fora informar Victor de que já estava descendo para encontrá-lo. Quando ele olhou para cima e deu conta da presença de Yuuri, um rubor espalhou-se por seu rosto, o que Yuuri achou adorável.

Makkachin estava vestida com uma pequena gravata borboleta preta em torno do pescoço e estava mais fofa que nunca. Quando a cadela deu conta do recém-chegado, correu na direção de Yuuri e saltou sobre suas pernas, alcançando-o antes de Victor, que ainda não havia sequer conseguido retornar ao planeta Terra, sua boca entreaberta enquanto encarava o homem diante dele. Em resposta ao súbito impacto da cadela contra suas pernas, Yuuri cambaleou, mas não chegou a perder o equilíbrio.

Yuuri e Victor trocaram olhares e, após alguns segundos silenciosos, eles se viram rindo do entusiasmo exacerbado da cadela. Então, eles se cumprimentaram, ambos agindo de forma um tanto tímida. Lado a lado, eles caminharam em direção ao parque localizado nas proximidades.

Victor estava sorrindo largamente, seu rosto preenchido com felicidade. Ele falava sem parar, nunca lhe faltando assunto e, ao mesmo tempo, fazendo todo o possível para garantir que Yuuri estivesse se divertindo. A intensidade de seus sentimentos estava clara na maneira como ele estava agindo, e o brilho em seus olhos apenas tornava isso ainda mais evidente.

Olhando para trás, para os acontecimentos que se deram no dia de hoje, era difícil acreditar que tudo aquilo havia realmente acontecido há tão pouco tempo. Agora, tudo parecia não ter passado de um sonho distante, sobretudo ao se considerar as expressões de Victor, as quais não mais transpareciam qualquer resquício de nervosismo. Porém, Yuuri sabia por experiência própria que não era tão simples assim; se livrar da sensação de ter insetos rastejando dentro de seu estômago não era uma tarefa nem um pouco fácil e, certamente, Victor ainda estava lidando com as incômodas borboletas, mesmo que seu desconforto não mais estivesse se refletindo em seu rosto.

Enquanto olhava para Victor, Yuuri se sentiu sorrir, a mera visão do homem ao seu lado suficiente para aquecer seu peito por dentro. No entanto, olhar para Victor por tempo demais poderia cegá-lo, seu brilho tão intenso quanto o do Sol, então ele optou por desviar o olhar por um momento.

Inspecionando os arredores, seguindo atrás dos sons que preenchiam o ambiente, Yuuri observou as pessoas que caminhavam pelas ruas da cidade, muitas trilhando o mesmo caminho que eles e indo em direção ao parque. Yuuri não pôde deixar de notar que, contrário às suas expectativas, os demais só olhavam para eles em raras ocasiões, e nunca por muito tempo; apesar da inevitável curiosidade e estranheza que o par inusitado causava, as pessoas estavam ocupadas demais vivendo suas próprias vidas para se importarem verdadeiramente com qualquer outra coisa.

Ainda com um sorriso tomando seus lábios, Yuuri reclinou a cabeça para trás, admirando as nuvens brancas e macias que vagavam pelo céu azul. Então, olhou para Makka. A cadela caminhava logo à frente deles, seu rabo balançando sem parar em um sinal claro de que estava se sentindo muito feliz; uma alegria contagiante.

Por fim, Yuuri voltou-se novamente em direção ao Victor, que estava distraído enquanto compartilhava histórias que Yuuri nunca teria como conhecer, mas que para Katsudon, por outro lado, eram tão familiares quanto as linhas que cobriam as palmas de sua mão. Ainda assim, Yuuri escutava cada palavra atentamente, o fato de saber muito bem como cada uma daquelas histórias terminava não sendo nem de longe um empecilho.

A voz de Victor era agradável, a forma peculiar como ele pronunciava algumas palavras sendo hipnotizante de uma forma inesperada. Quando deu por si, seu foco já havia se dispersado e, exceto pelas palavras que dançavam no ar, nada mais era digno de sua atenção; isso é, até que seus olhos pousaram no topo do nariz de Victor.

Antes que pudesse perceber o que estava fazendo, Yuuri se viu analisando as linhas e formas presentes no rosto de Victor, seu olhar descendo em direção ao seu queixo, passando pelo pescoço até finalmente deslizar braço abaixo. Quando deu por si, já havia se movido. Sua mão se fechou em torno da de Victor, seus dedos se entrelaçando aos dele nem um segundo depois. Pego de surpresa pelo gesto inesperado, Victor se viu sem palavras por um breve momento, a história que ele contava sendo interrompida até que ele fosse capaz de se recompor e dar continuidade ao que estava dizendo. 

Embora estivesse se sentindo muito envergonhado pelo que havia acabado de fazer, Yuuri também ficou muito satisfeito com a visão que o aguardava quando voltou sua atenção de volta ao rosto de Victor. Ele estava corando fortemente, e o sorriso em seus lábios era tímido, mas também grande e facilmente perceptível. 

Quando seus olhos se encontraram novamente, o coração de Yuuri disparou, seu sorriso se alargando e o calor presente em seu peito voltando a arder, mais forte que antes.

Tomar a iniciativa acabou não sendo tão ruim, Yuuri pensou consigo mesmo enquanto observava o rubor se espalhar ainda mais pelo rosto de Victor. De certa forma, não conseguia deixar de se sentir orgulhoso.



 

 


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Notas finais do capítulo

Hii. Desculpa se o OOC estava meio demais esse capítulo. Honestamente, quando eu escrevi o começo dessa fic no final do ano passado eu não estava vivendo o melhor dos meus momentos, e a última coisa que eu precisava era mais drama. Essa fic toda na verdade foi o jeito que encontrei para desestressar, e como da pra ver o estresse era muito, vide que estamos no cap 4 de 10 e esses capítulos iniciais nem são os maiores lol
Mas anyway. Quem puder comentar, por favor. Tou precisando de estímulo tbh
BJJS e até mês que vem



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