Depois da aula escrita por nje


Capítulo 1
Fica entre nós




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/800542/chapter/1

Uma jovem parada na rua observava a placa na qual estava escrito "ONG Vontade do Fogo". Ela carregava uma pilha de livros entre os braços, e sentia um intenso frio na barriga.

A construção à sua frente assemelhava-se bastante à um colégio. Entretanto, se tratava de uma instituição sem fins lucrativos que oferecia variados serviços e atividades para o bairro (constituído em sua maioria por famílias pobres).

 

— Sakura! O que faz aí, imóvel como uma estátua?! — tais palavras foram ditas por um homem mais velho e bastante simpático, que Sakura conhecera no dia do processo seletivo para a vaga de voluntária na enfermaria da ONG.

— Senhor Iruka, boa tarde! — ela cumprimentou o administrador do local. Sentia-se nervosa, insegura. Era a sua primeira experiência profissional, ainda que não remunerada.

— Vamos. Vou te apresentar a médica responsável pela enfermaria e também os outros ambientes da ONG. — Iruka anunciou, sorrindo.

— Obrigada. — Sakura se forçou a sorrir de volta, embora fosse forte a sensação de que a qualquer momento explodiria de tanta tensão acumulada em cada pedacinho do seu corpo, dos fios de cabelo cor-de-rosa até o dedinho do pé.

O homem pôs-se a caminhar e ela o acompanhou. O velho prédio cinza da instituição era cercado por um muro grafitado com desenhos variados e frases escritas em diferentes tipos de letras, e nele havia também um grande portão azul.

Por dentro desse muro, Sakura se deparou com mais do que um prédio... Uma quadra, um pátio com algumas árvores e mesinhas rodeadas por cadeiras. Ainda pôde encontrar ali uma sala anexa ao lado do prédio, e foi justamente ate ela que Iruka a conduziu.

A jovem gostou do que viu. Apesar da simplicidade, realmente tinha tudo o que uma enfermaria precisava: macas, remédios, dois computadores, um refrigerador e todo tipo de insumo necessário para os cuidados com a saúde dos moradores do bairro.

Foram recepcionados por uma mulher loira e alta que usava um jaleco por cima da roupa. Ela não sorriu nem por um segundo que fosse. Pelo contrário, sua testa estava franzida, as sobrancelhas juntas. E encarava Sakura.

— Quem é essa?! — a mulher questionou. Tinha uma voz grossa.

Apesar de ficar sempre um tanto intimidado na presença da médica temperamental, Iruka se manteve firme ao responder:

— Doutora Tsunade, essa é a Sakura Haruno, que escolhi para ser a sua nova auxiliar. Ela concluiu esse ano um curso técnico de enfermagem.

— E nem me comunicou antes, Iruka? Eu é que devia ter feito a entrevista. Não é qualquer uma que pode ficar no lugar da Shizune.

— Bom, cuidei de tudo sozinho exatamente pra evitar esse tipo de comparação. Sakura não é como a Shizune, e nem precisa. Cada um tem seu jeito de ser. — pontuou Iruka, nitidamente encerrando aquela discussão.

Tsunade respirou fundo, resmungou um pouco, e por fim direcionou o olhar para Sakura novamente.

A jovem fez uma reverência, e disse:

— Estou aos seus cuidados, senhora Tsunade. Darei o meu melhor.

— Senhora nada! Eu devo ter quase a sua idade! Me chame de Tsunade. Iruka riu discretamente da fala da médica.

Após prometer que logo devolveria Sakura para que ela pudesse iniciar as orientações à sua aprendiz, o administrador da ONG levou a jovem para um passeio pelo edifício, com o intuito de que ela conhecesse mais do trabalho deles e também dos outros voluntários em outras áreas.

Passaram pela sala de vídeo, pela de música, também por uma de artes e outra com um padrão tradicional de sala de aula. Havia ainda uma de informática, e um refeitório. Além disso tudo, Sakura observou um cômodo que parecia com um escritório, outro com um consultório.

Algumas salas estavam ocupadas e contavam com pessoas realizando atividades, outras estavam vazias.

Conforme percorriam cada espaço, Iruka ia fornecendo informações para Sakura, explicando sobre como funcionavam os cursos e os serviços oferecidos gratuitamente à população. Tinham aulas que variavam de administração à violão. E além disso, forneciam ainda orientações com advogados e também com psicólogos.

— Desculpa se eu vou ser um pouco indiscreta agora, mas quem é que financia tudo isso? — Sakura perguntou, cheia de curiosidade.

— Temos um doador, que inclusive também está aqui hoje e trabalha como voluntário. Venha, vou te levar pra conhecê-lo. Ele também tem 18 anos, assim como você. Acho que vão se dar bem.

Iruka a conduziu novamente ao lado de fora do prédio, até a quadra. Lá, crianças utilizando quimonos eram guiadas pelo professor a fazer movimentos de alguma arte marcial.

Sakura arregalou os olhos ao perceber que quem dava a aula era um colega de sala dela. E não qualquer um deles, mas justamente o delinquente da turma.

Notando a expressão de confusão na face da jovem, Iruka revelou:

— Esse rapaz ensinando karatê para as crianças se chama Naruto Uzumaki, e é quem sustenta a ONG. Os pais foram os fundadores, e também os políticos que cuidavam desse bairro. Inclusive por questões políticas foram assassinados quando o filho era ainda uma criança. Naruto foi criado pelo avô, Jiraiya, que também acabou partindo há um ano. Ele divide a grande herança entre os gastos para sobreviver e a manutenção da Vontade do Fogo. — o homem estava emocionado ao dizer tudo aquilo. — Naruto se mete em brigas constantemente e às vezes apronta na vizinhança, mas na verdade é bastante caloroso e generoso.

Sakura mal podia acreditar... Sabia bem sobre as brigas e os escândalos que o colega se envolvia, mas a parte da caridade não combinava em nada com a visão que tinha sobre ele.

Ela ficou observando, intrigada, aquele garoto de cabelo loiro espetado e grandes olhos azuis, que mostrava pacientemente aos alunos o que deviam fazer, repetindo quantas vezes fosse necessário ainda que em meio à resmungos.

Ele demorou a notar que tinha gente por ali a olhá-lo. Foi somente após dispensar as crianças é que percebeu. E ao fazê-lo, ficou desorientado.

"O que diabos a garota mais linda da turma tá fazendo aqui? Droga.", Naruto pensou. Não era costumeiro, mas se sentiu tímido. A admirava já havia algum tempo... Apreciava a forma como ela sempre entregava todo o dever e tirava as melhores notas, e ainda assim arrasava nos esportes. Tinha boas relações com os colegas e com os professores. Estava sempre com cara de brava, mas nunca arranjava confusão. Além disso, o par de olhos verdes também não passava despercebido por Naruto... Se pudesse considerar que tinha algo como a garota ideal para ele, Sakura receberia esse título.

Apesar de gostar de vê-la ali, ainda era um problema. Não podiam saber que ele estava trabalhando (mesmo que se tratasse de um serviço voluntário).

— Naruto, vem cá. Quero te apresentar a nova auxiliar da Tsunade. — Iruka anunciou.

Naruto se dirigiu até eles e foi logo direto ao ponto, voltando-se para Sakura:

— Oi. Você pode guardar esse segredo? — ele perguntou, todo sem jeito pela presença de sua paixão platônica.

— Não se preocupe. Não me importo com o que você faz da sua vida, não teria motivos pra ficar falando sobre isso por aí. — Sakura deu de ombros ao dizer tais palavras.

Pretendia se relacionar com Naruto tão pouco quanto fosse possível. Não dava para negar a beleza dele, não era em vão que ele saía com muitas garotas de diferentes turmas e escolas. Entretanto, Sakura zelava demais pela própria imagem e tudo o que não precisava em sua vida era um badboy pegador e briguento que fazia caridade nas horas vagas. Até uma amizade entre eles já seria o suficiente manchar sua reputação.

Naruto não gostou muito da indiferença por parte dela, ia até mesmo reclamar, mas foi interrompido por Iruka, que por um momento esteve focado em seu celular e não acompanhou o papo dos dois jovens.

— Naruto, a Tsunade saiu para almoçar e eu preciso ir resolver algo com urgência. Pode levar a Sakura novamente até a enfermaria e fazê-la companhia até a doutora voltar?! — o homem pediu, alheio ao clima pouco amistoso entre eles.

Sakura até tentou protestar, mas Iruka não aceitou não como resposta por parte de nenhum deles, e logo despediu-se, deixando-os sozinhos.

Num primeiro momento, Naruto apenas foi caminhando em silêncio na direção da enfermaria, acompanhado por Sakura, que também seguiu sem dizer nada. Entretanto, ao entrarem e se acomodarem por lá, o garoto se manifestou... não conseguia ficar quieto diante de desconfortos.

— Mesmo que não se importe, vou te dizer porque pedi pra não contar pra ninguém. É porque é contra as regras da escola estudar e trabalhar. Se você conseguiu autorização, seus pais devem ser influentes. Apesar de que só de estarem vivos e lutarem por você já é de grande ajuda... No meu caso, tive que enfrentar o diretor sozinho, tá ligada?! E não rolou. Daí o prof Iruka foi lá por mim, e mesmo assim até ameaçaram me expulsar. Então tô fazendo em segredo. — Naruto falava alto e sem parar, a voz levemente rouca.

De início, Sakura considerou nem responder nada, e por alguns minutos de fato não o fez. Naruto ficou um tanto chateado, com um bico formado nos lábios, nitidamente aguardando que ela lhe dissesse algo.

Apesar da falta de uma reação imediata, as palavras dele conseguiram atingí-la. Ela realmente ficou pensando na situação dele. Até que, por fim, ligeiramente curiosa, Sakura perguntou:

— Se corre o risco até de ser expulso, por que faz tanta questão de trabalhar aqui?

Sem nenhum embaraço, ele logo respondeu:

— Porque eu tenho o sonho de ajudar as pessoas assim como meus pais ajudaram, e aqui é um começo. Foi meu pai que fundou essa ONG, e foi a partir disso que ele descobriu que queria seguir na política e fazer mais pelo bairro, pela cidade. — o orgulho era perceptível no rosto dele. Por um momento, os olhos azuis de Naruto brilharam ainda mais (o que parecia impossível até então), e um largo sorriso apareceu em sua face.

Ao olhar para ele naquele momento, Sakura sentiu um calor esquisito no peito. Que cena gostosa de ver! Um menino de cabelo descolorido todo mal cuidado e bagunçado, vestindo moletom, jaqueta de couro e calça jeans rasgada, que ia de moto a toda velocidade de um lado para o outro... e ainda assim tinha como sonho fazer algum bem pra humanidade e ficava todo emotivo ao falar dos pais.

— Certo. Eu guardo o seu segredo. Pode confiar em mim. — ela afirmou, sorrindo rapidamente.

Antes que ele reagisse, Sakura se levantou e foi dar uma olhadinha nos materiais. Para a sorte dela, que tentava manter uma distância, Tsunade chegou naquele momento, já lhe fornecendo orientações. E a médica apareceu inclusive acompanhada de algumas pessoas que aguardavam atendimento.

Antes de se retirar, Naruto puxou Sakura de canto e sussurrou:

— Cê pode me passar o seu número? Já que somos meio que colegas de trabalho, acho que é bom termos o contato um do outro. Sabe como é, né, pro caso de rolar alguma urgência...

— Não! Você se comporte, ok? E nem venha com esses papinhos pro meu lado, não vou ser mais uma das suas peguetes que ficam circulando por aí na moto com você sem se importar com nada. — Sakura esbravejou.

Naruto riu gostosamente.

— Tá bom, tá certo. Vou embora agora. Até amanhã. — ele avisou, mandando um beijinho para ela e direcionando‐lhe ainda uma piscadela .

Sakura corou um pouco, mas logo ouviu os gritos de Tsunade a chamá-la, ajudando-a a escapar com louvor de seus próprios pensamentos, que de maneira indesejada e persistente repetiam a memória de Naruto se despedindo.

Por fim, após as quatro horas de serviço estabelecidas com Iruka e Tsunade, Sakura encerrou o expediente.

Pegou o trem que a levaria até sua casa (localizada em outro bairro, um de classe média), e em menos de 20 minutos certamente chegaria.

Em partes sentia cansaço, já que nunca tinha vivido até então a experiência de estudar e trabalhar. Por outro lado, uma certa animação fervia em seu peito. A intenção inicial ao se candidatar para aquela vaga era apenas a de fortalecer o currículo com experiência e caridade. Todavia, depois de ver o trabalho realizado na ONG, Sakura começava a pensar que essa vivência tinha muito mais para lhe agregar do que apenas uma vantagem na carreira.

Por um instante, se lembrou de Naruto.

"Nem pense nisso, Sakura. Nem por um segundo que seja.", disse para si.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E então? Me contem o que acharam ;)
Beijos. Até mais.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Depois da aula" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.