Cerca de uma hora mais tarde, Wanda e Visão estavam em um pequeno café nos arredores da cidade, sendo que Wanda estava sentada na beirada de uma cadeira com uma toalha sobre a cabeça e outra ao redor dos ombros; ainda que o clima estivesse ameno, não tão quente quanto era para estar e nem tão frio quanto deveria estar devido à roupa molhada colando em seu corpo, ela ainda sentia alguns arrepios quando gostas de água insistentes caíam do cabelo molhado e desciam por sua nuca.

Visão se aproximou por trás, trazendo mais uma toalha e irritantemente seco. Talvez ele possuísse alguma função autolimpante que Wanda desconhecia até então, mas, apesar de toda a água que eventualmente os encontrou, não havia uma única gota em seu corpo ou roupas. Todavia, quando ele sentou em uma cadeira em frente a ela, os olhos azuis brilhantes como os de um filhote de cachorro prestes a dar seu primeiro passeio na rua, Wanda titubeou, e toda a irritação presente na ponta de seus dedos se tornou carinho à medida que ela esticou o braço para tocar o rosto de Visão, sentindo suas bochechas por baixo da pele humana.

No início, Visão tinha alguma dificuldade de compreender os gestos de Wanda. Era comum que ele virasse a cabeça em direção às suas mãos com uma expressão confusa, até que, pouco a pouco, deixou que ela se aproximasse, e passou a fazer investidas tímidas sucedendo a carícia no rosto de Wanda para secar as suas lágrimas alguns anos antes. Ele lentamente se deixou florescer, ajeitando mechas soltas dos cabelos de Wanda quando ela não estivesse olhando, ou simplesmente a admirando quando esta lia ou preparava o jantar para a equipe.

Atualmente, Visão sempre se encaixava no pescoço e no colo de Wanda, quando a barriga ainda deixava, procurando os gentis toques desta que o faziam se sentir tão bem e feliz, tão amado; e era aquele conforto que Wanda buscava naquele instante, ao tempo em que procurava, no âmago de seu coração, palavras para descrever o que escondera por tanto tempo.

A xícara de café ao lado deles estava esfriando e, com a ponta dos dedos, Wanda buscou uma colher para mexer no conteúdo da xícara. Visão geralmente a repreendia por tomar café durante a gravidez, porém, provavelmente estava tão intrigado com o plano astral visitado que não se lembrara de adverti-la dos riscos da cafeína em grávidas, apenas fazendo Wanda prometer que seria a última vez que tomaria café por um longo tempo, e que sempre iria preferir tomar um chá. Lentamente, ela abarcou a xícara pela asa, e bebeu um pouco até ouvir Visão dizer:

— Então... Nós vamos ter uma DR?

A mínima quantidade de café inalada foi suficiente para fazê-la se engasgar, um sorriso permanecendo nos lábios enquanto tossia sentindo a quentura restante do líquido entre sua garganta e seu nariz. Visão parecia preocupado, contudo, Wanda levou as mãos na frente do rosto, uma tentativa de indicar que estava tudo bem, e emendou o gesto com uma risada, ainda impressionada com o que ele havia dito.

— DR? É sério? – Ela tossiu algumas vezes. – Quem ensinou isso para você? Vou apostar dinheiro que foi a Natasha.

— Por mais que sim, a Natasha tenha ensinado algumas coisas... Lembro do Sam ter mencionado mais recentemente.

— Claro. – Wanda balançou a cabeça e observou o chão. – Mas não, Vizh, não é uma DR. Isso envolve brigas, discussões, defeitos... De modo algum é uma DR. É só uma conversa.

As linhas do chão por vezes se escondiam atrás da barriga de Wanda, e sua mente retornou a um tempo que, apesar de complicado, possuía uma lembrança calorosa: quando tentou contar a Visão sobre sua gravidez, e foi interrompida primeiramente por ele ao questionar sobre a vontade de ter filhos, e posteriormente por um enjoo repentino que fê-la desmaiar. A primeira aparição dos pesadelos. A primeira vez que tinha sua conexão com Visão exposta.

— Lembra da cafeteria em Edimburgo?

O rosto de Visão se iluminou com um sorriso.

— No último inverno, sim. Perfeitamente.

Wanda assentiu, pousando uma das mãos sobre a parte superior da barriga. No inverno seguinte, eles teriam não um, mas dois bebês para cuidar. Talvez pelo fato de estar sempre rodeada de amor e carinho, de Visão e dos colegas, ela não parasse tanto para pensar no fato que poderia não estar presente no próximo inverno, vindo a falecer se o parto fosse complicado e não conseguissem socorro médico suficientemente a tempo; um frio estranho percorreu sua espinha com o pensamento, que ela rapidamente afastou quando pôs a xícara de volta na mesa e olhou para Visão.

— Foi depois daquele desmaio que eu comecei a ter pesadelos. Que também eram uma espécie de premonição.

Ela moveu os dedos para cima da mesa de madeira, notando que a cafeteria não estava cheia; ainda assim, mantinha a voz um tom abaixo.

— Eu sonhei com o nome das nossas crianças. Que seriam gêmeos. Que seriam... Aberrações.

Visão esticou o braço e segurou os dedos de Wanda, apertando-os levemente em uma tentativa de confortá-la. Os olhos de Visão irradiavam aconchego, e ela quase se sentia mal por não ter contado anteriormente sobre aqueles sonhos.

— Eu sempre me via em uma casa em Sokovia, uma casa que não era a minha, e havia duas crianças na mesa da cozinha tomando café da manhã. Primeiro, como eram muito pequenas e difícil de distinguir os gêneros, imaginei que fossem eu e o Pietro, mas, depois que descobri estar grávida de gêmeos, vi que eram nossos filhos. Aparecia um demônio, também, e...

Subitamente, Visão jogou os braços ao redor dos ombros de Wanda, segurando firmemente seus ombros e trazendo para frente a porção superior de seu corpo, o quanto era permitido pela enorme barriga gemelar dela.

— Não precisa se forçar a dizer tudo agora, Wanda. – Os dedos de Visão entravam pelo cabelo de Wanda e afagavam seu couro cabeludo, fazendo com que ela fechasse os olhos e sentisse uma lágrima correndo pela bochecha. – Você... Nós... Vamos ter tempo de destrinchar esses pesadelos. Eu apenas sinto muito que você tenha passado por isso sozinha.

Wanda balançou a cabeça em negação, sentindo a testa roçar no casaco de Visão e novas lágrimas se formaram no canto de seus olhos.

— Eu que não tinha contado, Vizh. Tinha medo...

— Tudo bem. É muito para assimilar de uma vez. Eu estou aqui para ajudar. – Visão afastou-a e beijou sua testa, em seguida encostando a própria testa sobre a dela. – Eu vou proteger você, o Billy e o Tommy. Tudo bem?

Wanda sussurrou uma afirmação, afundando no abraço de Visão e sentindo como se vivera toda a sua vida para aquele momento. Cada momento, cada pequena decisão a levara para um futuro lar com Visão e seus filhos, ainda que a situação não parecesse tão favorável a princípio; em verdade, nunca parecera favorável, porque efetivamente não era. Engravidar enquanto fugia dos Tratados de Sokovia, viver escondida em uma casa com outros Vingadores igualmente fugitivos, nada era favorável para aquela vida – contudo, por algum motivo, ela sabia que deveria vivê-la, como se não houvesse outro destino.

Algum tempo depois, ao saírem da cafeteria, Wanda sussurrou:

— Visão, nós parecemos dois passarinhos.

Curioso, o sintozóide virou a cabeça em sua direção.

— Passarinhos?

Wanda sorriu sem mostrar os dentes, esticando a mão para acariciar a bochecha dele.

— Criamos um ninho de amor em qualquer cantinho que achamos.

Visão sentiu a respiração dificultar com aquela menção, e sorriu.

— Exatamente. – Ele responde e beija o topo da cabeça de Wanda. – Somos como dois passarinhos.