Ninguém disse nada além do necessário pelo restante daquele dia. 

Wanda se dirigiu para o jardim e treinou com Natasha até próximo da hora do almoço, ao tempo que Steve e Visão discutiam estratégias para evitarem de ser vistos. A refeição do meio-dia ficou sob responsabilidade do talentoso cozinheiro Sam, o qual fez questão de preparar saladas e ovos cozidos para a futura mamãe do grupo. 

Durante a tarde, Wanda puxou uma coberta e um travesseiro para deitar em um colchão no quarto improvisado do filho. A tinta da parede já estava seca, porém, usou dos seus poderes para abrir uma janela no todo da parede e deixar o ar circular, desta forma, tirando mais um pouco do cheiro impregnado no cômodo. Ela não demorou a cair no sono, observando as paredes amareladas e a cômoda com as flores de Visão dentro do pote com água. Ela lembrou do sintozóide falando sobre muitas flores em um vaso serem sinônimo de amor ao fechar os olhos e ter o sono mais tranquilo das últimas semanas, como se aquele local fosse sagrado e a protegesse dos sonhos ruins que costumeiramente possuía. 

Visão tornou-se intangível para atravessar o piso e encontrar sua amada dormindo na metade da tarde. Deitou-se na cama ao lado dela, acariciando lentamente suas bochechas e lábios enquanto lentamente colocava mechas do cabelo sedoso atrás da sua orelha. Sua expressão era tão serena que seria um verdadeiro crime acordá-la, por isso, apenas se manteve em silêncio eventualmente pondo a mão sobre sua barriga para buscar sentir a vida debaixo da ponta de seus dedos. Aquela fora uma das vezes em que mais sentira vontade de ser humano e ter um ciclo normal de sono para descansar ao lado dela. 

Quando Wanda acordou, o sol já iluminando uma porção menor do quarto devido à hora da tarde, não havia ninguém ao seu lado; porém, ela sentia ao seu redor uma aura de cuidado e proteção que apenas Visão poderia emanar. Por isso, exibiu um sorriso para si mesma enquanto afagava o pedaço deles que crescia nela. 

~.~ 

— Todos prontos? 

Steve proferiu essas palavras na porta da residência, um pé na varanda e outro dentro de casa, ao tempo que Sam codificava seu drone e Natasha aguardava ao lado de fora. Wanda desceu as escadas em um pulo, com as botas ainda desamarradas, e Visão, apoiado no corrimão, esticou a mão para ela se segurar e não cair.  

— Prontos!  

Ela vestia uma blusa larga que cobria completamente a barriga por baixo do seu casaco vermelho original, bem como calças um pouco mais largas e botas as quais apertavam seus pés por se encontrarem um pouco inchados. Pacientemente, Visão ficou ajoelhado de frente para ela e amarrou o cadarço do sapato de cano alto, deixando-a um pouco sem graça pelas respostas ácidas que proferira mais cedo. Ele, porém, aparentava não se lembrar – ou não se importar – a respeito dos comentários, oferecendo seu braço para ela se apoiar e saírem dali. 

Visão parecia confiante em seu uniforme de vibranium preso ao corpo, e a capa dourada descendo por suas costas da mesma maneira que água de uma nascente. O frio da noite, juntamente com o vento, balançava o tecido maleável da capa assim como os cabelos de Wanda. 

— Fique próximo. – Ele gentilmente ordenou ao passar um braço ao redor dos seus ombros, mantendo-a junto de seu corpo. – Vamos alçar voo daqui a pouco. 

— Eu consigo voar também, Vizh. 

— Tenho plena noção do alcance de seus poderes, Wanda. – Visão respondeu de maneira tão suave que nem parecia ser uma resposta grosseira. – Porém, gostaria que se segurasse em mim. 

Wanda assentiu e passou um braço ao redor da sua cintura, segurando firme com a ponta dos dedos ao que Visão tomou impulso para flutuar, e ela fez o mesmo com a mão oposta, uma névoa avermelhada ajudando-os a manter o equilíbrio no ar. Steve, Natasha e Sam seguiram pela floresta, correndo por lados opostos para tangenciar toda a cidade.  

O casal voou lentamente, mantendo os olhos fixos nos colegas ao seguirem em linha reta na direção das luzes da cidade. Após um longo período em silêncio, Wanda enfim vocalizou: 

— Vizh? 

— Sim, Wanda? 

— Desculpe pelo meu... Mau humor. 

Visão deu uma risada contida. Apesar de voarem, e a fricção do ar impedir de ouvir perfeitamente, porém compreendia através da sua audição amplificada. 

— Você não precisa pedir desculpas. Sabia que é normal mulheres grávidas possuírem significativas alterações de humor, principalmente quando se encaminham para o final da gestação? 

Final da gestação. Aquelas três palavras deixavam Wanda ansiosa, por ela saber que os próximos meses seriam ainda piores, com mais mudanças em seu corpo, e o nascimento de uma criança que ela não sabia dizer ser menino ou menina. Sem sabe  o quão seguro seria para aquela criança ter uma vida normal. Ao notar sua inquietação, Visão questionou: 

— Wanda... Está tudo bem? 

Ela engoliu em seco. 

— Sim. Só pensando em como vai ser o futuro. 

— O futuro? 

Wanda sentiu o vento em seu rosto, e observou as árvores balançando abaixo de seus pés simbolizando seus colegas correndo em direção ao seu objetivo. Estavam próximos. Antes de chegarem e prosseguirem com a missão, ela respondeu: 

— Ainda não sabemos como eu engravidei de alguém aparentemente estéril. Os motivos dessa gravidez ocorrer da maneira que ocorreu. Não fiz nem um pré-natal! – Ela deu uma risada amarga. – E parece que o tempo está acabando, o bebê vai nascer e eu me sinto confusa, e... 

Ainda que a brisa da noite oferecesse certa resistência, Visão diminuiu sua velocidade devagar até parar completamente e se manter equilibrado no ar com Wanda em seus braços. Segundo seus cálculos, estavam com dois minutos de vantagem sobre seus colegas, portanto, ao invés de seguir em frente, subiu mais um pouco na atmosfera, a fim de mostrar as estrelas e dizer: 

— Vê o brilho dessas estrelas? 

— Sim. 

— Eu estarei com você até as estrelas pararem de queimar, Wanda. – Ele a aninhou em um abraço. – Cuidarei de você e da criança que esperamos, ainda que você fique irritada ou não me queira por perto. E nós vamos descobrir as respostas para isso juntos, tudo bem? 

Wanda assentiu e passou os braços ao redor do pescoço de Visão, observando as estrelas por cima do antebraço com a voz embargada demais para dizer alguma coisa.  

— Vamos procurar um pré-Natal, e eu vou meditar com você. Mas agora a gente precisa salvar uma cidade, lembra? 

Devagar, ele aumentou a velocidade, carregando Wanda em seu colo para irem até a cidade.  

~.~ 

— Algum sinal de problema, Vis? 

A voz de Natasha ecoava através do drone de Sam, Asa Vermelha, o qual se encontrava na mesma altura deles. Após uma rápida patrulha, eles se reuniram entre as construções na beirada da floresta e as árvores, pedindo para o sintozóide e sua amada avisarem a qualquer sinal de problema. 

— Negativo... Um momento. – Respondeu Visão com Wanda em seus braços, até que eles notaram uma pequena algazarra adiante na cidade. – Há indícios na parte noroeste da cidade. 

— Entendido. – Disse Steve. – Nat, venha comigo. Sam, suba no telhado e use as asas se necessário. 

Eles debandaram, e Visão aproximou-se do chão para Wanda conseguir notar se havia algo a seu alcance para fazer. Três pessoas usando máscaras as quais encobriam seus rostos fugiam sob os gritos de outras pessoas, visíveis pelo casal através de alguns arbustos onde se mantinham escondidos, e, na correria, uma vidraça se partiu em vários minúsculos pedaços, não machucando outras pessoas pela rápida intervenção de Wanda em usar dos seus poderes para segurar os cacos no ar e cuidadosamente colocá-los sobre o chão. 

Porém, aquilo deixava Wanda cansada, e ela arfou quando soltou o vidro, se encolhendo no chão para descansar um pouco. Visão a segurou em seus braços e seguiu observando a arruaça, enquanto Steve e Natasha prendiam dois dos arruaceiros. O último do trio, o qual corria na direção do casal, foi interceptado por Sam.  

Ele tirou a máscara para ver um rapaz comum, porém, que não parecia ser da região. 

— Por que vocês estão fazendo isso? 

— Eu não sei, eu não sei! Aqueles homens só mandaram fazer isso! – O rapaz estava assustado, respirando pesadamente entre as respostas.  

Wanda se levantou e foi na direção de Sam, sendo parada pela mão de Visão, o qual a impedia de seguir adiante antes que pudessem vê-la. Contudo, eles não notaram um dos arruaceiros presos se soltar e pegar um caco de vidro entre os estilhaços da janela, correndo na direção do casal. O Capitão América correu para segurá-lo, porém, antes de imobilizá-lo, e antes de Visão conseguir proteger Wanda, o homem fincou o pedaço de vidro no braço da moça, ocasionando um gemido alto de dor.  

— Wanda! – Visão exclamou em voz alta e a tomou novamente no colo, temendo ser algum machucado nas regiões vitais dela e do bebê.  

O sangue líquido se misturava com o vermelho do casaco, e os dedos opostos de Wanda tentavam puxar o vidro, sem sucesso. Lágrimas de dor escorreram por seus olhos. Steve havia conseguido segurar o agressor, e Visão pensou, por um instante, em socá-lo até o homem ficar inconsciente. Somente não levou o plano adiante por ouvir uma voz feminina atrás deles: 

— Wanda? Visão? 

Visão olhou para trás e viu uma bela mulher negra, a qual usava uma roupa com o mesmo símbolo que viram nos drones. Ele instintivamente protegeu Wanda, não a deixando ver a barriga ou o machucado. A moça complementou: 

— Só para constar, esse plano não foi meu, eu apenas... 

A voz de Visão soou secamente em resposta: 

— Não se aproxime de nós novamente. 

Ele ajeitou Wanda em seu colo e voou de volta para casa em silêncio, com os Vingadores Ocultos os seguindo pela floresta para fugir de eventuais Oficiais do Governo, deixando para trás somente os baderneiros amarrados no chão.