Na manhã seguinte à entrevista de Luka, mais uma vez, a casa dos Vocaloid amanheceu rodeada de fotógrafos, repórteres e telejornais. Desta vez, porém, as notícias não eram boas e o tipo de entrevista que eles procuravam pouco tinham a ver com as músicas do grupo.

            - RIIN!! Levanta garota! Levanta agoraaa!! Você tem que ver isso!! – Gritava Miku espalhafatosamente, talvez pela primeira vez na vida, enquanto subia correndo as escadas, logo em seguida tratando de chacoalhar a companheira de quarto.

            - Ahh!! Mikuu!! Enlouqueceu?! Quer me matar do coração me acordando assim?!  - gritou em resposta a loira que caíra da cama de susto, levando com isso as cobertas em que se enrolava.

            - Mas é urgente Rin...!

            - O que é tão urgente afinal? – Perguntou ainda tonta. A garota de longos cabelos verdes entregou um jornal nas mãos da amiga com os dedos trêmulos, levando a mais nova a hesitar por um momento. O que poderia estar acontecendo para deixar à outra neste estado? Ela nunca a vira dessa forma antes, com exceção da vez em que a mais velha beijara Kaito no incidente de Mikuo.

            Ainda relutante, vislumbrou a manchete da primeira página e surpreendeu-se ao perceber que a foto que a cobria era, nada mais nada menos, sua e de seu irmão. Em letras garrafais, lia-se o seguinte letreiro:

“IRMÃOR KAGAMINE DO GRUPO VOCALOID POSSUEM CASO INCESTUOSO.

Será este o tipo de influência que procuramos para nossas crianças?”

            Os olhos da loira arregalaram-se em choque, enquanto levava uma das mãos à boca que tomava o formato de um “o”, a vista já começava a ficar embaçada quando Miku a abraçou apertado, dizendo que ela haveria de ser forte e seu irmão entrou no quarto, batendo a porta com um semblante chocado.

            - Rin eu... Eu... Desculpe-me Rin. – O mais novo fechou os olhos cheios de desgosto enquanto virava o rosto e retirava-se do quarto pesaroso. Logo ele que amava tanto a irmã e só lhe deseja o bem, como ele pudera ter coragem de a fazer chorar? Mesmo que não fosse um ato proposital, a culpa ainda era dele.

            - LEN! – O garoto sentiu a delicada mão da namorada a segurar-lhe firmemente o pulso, voltou-se para trás, a fitando de cima a baixo. As lágrimas pareciam secar e o rosto antes retorcido de angústia demonstrava raiva. Ela o puxou para mais perto de si e desferiu um tapa na cara do irmão. – Do que você pensa estar se desculpando? Se arrepende de alguma coisa? Porque se a resposta for não este é o momento de nos unirmos e não de se fazer de vítima Kagamine Len!

            Desta vez foi ele quem arregalou os olhos. A irmã estava ali, de pijama, cabelos despenteados e sentimentos fragilizados, mas ainda assim encontrara forças para lhe dar um sermão. O loiro sorriu, puxou-a pela cintura e beijou apaixonadamente seus lábios.

            - Tem razão Rin... Você sempre tem razão. – Murmurou quando se separaram por falta de ar. Distanciando-se um pouco mais, a fim de poder ver melhor o rosto da garota, continuou – Vá lá e se vista, teremos uma reunião de emergência na gravadora!

            - Heeh?! Mas e a escola? – indagou enquanto era empurrada para seu quarto.

            - Sem escola hoje, temos assuntos mais importantes a resolver.

8:30 da manhã, gravadora VOCALOID

            - Muito bem, acho que estamos todos aqui. – começou Meiko séria, de braços e pernas cruzadas, sentada em cima da própria mesa. Kaito escorava-se na parede mais ao fundo, Miku se apoiava com uma das mãos numa das cadeiras da sala enquanto Rin e Len permaneciam estáticos, de mãos dadas, no meio do escritório. O clima estava tenso, pesado, e podiam-se ouvir os gritos e flashs de fotógrafos e fãs do lado de fora. – Muito bem, agora alguém pode me explicar o que esta acontecendo aqui? Rin, Len, isso que esta nos jornais é verdade?

            Os gêmeos entreolharam-se e, após tomar fôlego, responderam em uníssono firmemente – É sim, nós estamos juntos.

            A morena pareceu suspirar, massageando de leve a têmpora – Muito bem, não cabe a eu julgar a vida pessoal e as escolhas de vocês, mas espero que estejam cientes de que isso afetará irreversivelmente a carreira artística não só de vocês, mas da VOCALOID como um grupo. Eu não quero ser injusta pestes amarelas, mas tenho que pensar na Miku e no Kaito que também serão envolvidos e terão suas carreiras abaladas. Então – ela fitou os dois mais velhos, um de cada vez – Vocês estão dispostos a superar esta crise como um grupo juntamente com eles?

            Miku olhou para trás, procurando nos olhos azuis noite de Kaito a confirmação da resposta que carregava na ponta da língua, bastando um aceno de sua cabeça para que ela se voltasse novamente para a diretora, desta vez com um sorriso no rosto.

            - Pode ter certeza!

            Os olhos dos gêmeos brilharam e no ápice da alegria brindaram a conquista com um hi-5. Meiko riu, enquanto os quatro cantores abraçavam-se em uma linha – É assim que eu gosto! Pois bem, como sabem ainda são uma banda iniciante, e com escândalo desses pode ser que fique difícil se reerguer, por isso teremos de trabalhar dobrado. Vou pedir que comecem já a pensar em novas letras de música, se possível começaremos a gravar já esta tarde. Vou chamar toda a ajuda possível, talvez com um grupo maior o foco se distancie dos gêmeos. Acham que podem fazer isso?

            - Hai, comandante!  - Responderam os quatro em posição de soldado, retirando-se rapidamente da sala, permanecendo assim apenas a morena, que se virou para a janela, tocando levemente seu vidro. –  E as coisas complicam-se ainda mais...

            Lá fora o grupo é obrigado a passar pela massa de pessoas que circundava o prédio. Até a polícia já fora chamada e tentava distanciar o povo dos quatro cantores, mas é praticamente impossível. No meio da confusão, Rin vislumbra longas madeixas rosas que logo identifica como sendo de Megurine Luka. Esta se encontrava também atacada por repórteres:

            - Soubemos que foste convidada a entrar para os VOCALOID, ainda tem pretensão de ingressar com este escândalo?

            - Você já tinha conhecimento do caso incestuoso do Kagamine? Em algum momento isso lhe foi informado?

            Eram algumas das perguntas que lhe atingiam de todos os lados. Confusa, tentando ao máximo manter a calma, respondeu timidamente, resposta que chegou aos ouvidos da loira – Bem, hã, sim, eu tinha conhecimento... E não sei se ingressarei na verdade, preciso de um tempo para pensar...

            - Você tinha pretensão de espalhar este fato pela mídia? – perguntou a moça do telejornal.

            - O quê? Hã... Sim?– Indagou Luka, respondendo qualquer coisa mesmo, já confusa com tantas perguntas. Estava mais preocupada em encontrar um modo de sair dali. Neste momento, entretanto um grito ecoou, chamando sua atenção.

            - FOI VOCÊ!?  Como pôde? – Rin descontrolou-se e partiu para cima da jovem de cabelos rosados, que se esquivou bem a tempo. Antes que a mais nova tivesse tempo de investir novamente foi segurada pelo irmão, que também estivera ouvindo a conversa.

            - Vamos Rin, não temos nada que nos envolver com este tipo de gente.

            - Você é cruel! Cruel! – continuava a gritar Rin com lágrimas a escorrer por sua face. Miku e kaito ajudaram Len e poucos minutos depois conseguiram sair da multidão, andando sem rumo por algumas ruas mais desertas a fim de chamar pouca atenção.

            Nas noites seguintes ao incidente Rin e Len passaram a dormirem juntos em uma cama improvisada na salinha do computador. Durante o dia se mostravam fortes, receptivos, sorridentes, trabalhando ao lado de Miku e Kaito para reerguer os VOCALOID, à noite, no entanto, os seus verdadeiros sentimentos eram revelados, estavam confusos, machucados, cansados de serem alvos de críticas apenas pelo fato de se amarem.

(coloque a música para tocar)

“Karamiau yubi hodoite kuchibiru kara shitaeto

Yurusarenai kotonaraba naosara moeagaruno”.

            Seus lábios se uniram mais uma vez antes que adormecessem aquela noite, Rin escondeu o rosto no peito nu do irmão, que por sua vez a abraçou.

“Dakiyosete hoshii tashikamete hoshii

Machigai nado naindato omowasete

Kiss wo shite nurikaete hoshii”

            Eles sentiam falta de poder demonstrar como faziam todos os outros amantes o quanto se amavam. Eles queriam poder beijar-se, sair de mãos dadas, agir como um casal normal, sem serem seguidos por olhares reprovadores. Os gêmeos queriam ser felizes, sem preconceitos, queriam amar-se como um todo e queriam mostrar isso ao mundo. Ao mesmo tempo, entretanto, tinham de agir pelas sombras, ou os só piorariam as notícias e assim a situação do grupo.

“Sokubaku shite motto hitsuyouto shite

Itoshiinara shuuchakuwo misetsukete

"okashii" noga tamaranaku sukini naru”

            Não era, porém, algo que pudessem controlar. Dizer “basta”, e então voltar a ser como era antes. Não, o sentimento estava ali, e quanto mais tentavam disfarçar, maior era a necessidade que sentiam de esta perto um do outro.

“Kurikaeshitano wa ano yume janakute

Magiremo nai genjitsuno watashitachi

Furetekara modorenaito shiru sorede iino...

Dareyorimo taisetsuna anata”

            Ainda assim se preciso fosse estavam dispostos a jogar tudo para o alto. Não tinham que temor a reprovação da família, porque a verdade era que Kagamine Rin e Len eram órfãos e viviam com os tios antes de começar na carreira artística e, verdade seja dita, nunca realmente o consideraram. Eles lutariam assim mesmo, com tudo, não só pelo orgulho do que sentiam, mas pelo orgulho de cantar e pelo amor próprio que havia restado.

“Yoakega kuruto fuande naite shimau watashini

"daijoubu" to sasayaita anatamo naite itano?”

            Em uma das manhãs fatídicas, duas semanas depois de tudo ter se iniciado, houve diálogo que já se tornara rotina:

            - Você esta bem... – Consolou Len, tetando inutilmente esconder a voz embargada.

            - Len, isto não é um erro certo? E-eu não consigo me arrepender...

“Dakiyosete hoshii tashikamete hoshii

Machigai nado naindato omowasete

Kiss wo shite nurikaete hoshii”

            -Gente!! Já esta na hora do café!! Levantem aí ou o Kaito vai comer tudo! – chamou uma voz no corredor.

            - Eeeii!! Eu não como tanto assim! Você é pior que a Miku-chan, Luka-chan! – reclamou Kaito, em tom choroso.

            - O que disse BAKAITO?! – Indagaram as vozes femininas em uníssonos e logo sons de tapas e pontapés puderam ser ouvidos.

“Hikiyosete magnet no youni

Tatoe itsuka hanaretemo meguriau

Fureteite modorenakute ii

Sorede iino dareyorimo taisetsuna anata”

            Os gêmeos correram escada abaixo como sempre faziam, pulando os degraus, passando pelo jovem de cabelos azuis, cada um desferindo um “pedala” na cabeça do rapaz que resmungou inutilmente. Rin tratou de ir pegar sua laranja e, ao passar por Luka, aproveitou para lhe entregar a folha de papel que carregava.

            - O que é isso? – Perguntou ela, surpreendendo-se com o que lia.

            - É a nova música que eu e Rin escrevemos. – Respondeu Len, mordendo sua banana enquanto trocava um olhar cúmplice com a irmã. Quando ambos já haviam engolido o que tinham na boca, falaram em uníssono:

            - Seu nome é “Magnet”.