Prenúncio escrita por isa


Capítulo 1
Anunciação


Notas iniciais do capítulo

Então, eu não tenho certeza se gostei dessa one - comecei muito empolgada e depois fui concluindo meio "que que tô fazendo?" hahaha, mas como de fato cheguei ao fim e não tenho nenhuma vergonha na cara, aqui está.
Mais uma oneshot com meu casal preferido. Não sei o que dizer: eu só não consigo evitar.

Espero que gostem.



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Draco deslizou a mão pelas costas de Astoria até enroscar uma mechinha do cabelo escuro em seu dedo indicador. Ele vivia por momentos assim: observá-la à meia luz, no meio da noite, em silêncio. A força da presença de Astoria, ainda que perdida nos próprios pensamentos como agora, tinha o poder de espantar todos os seus demônios pessoais.

Era estranho como, mesmo com o passar dos anos, ela ainda o comovia com a mesma intensidade. Ele havia trabalhado – ele ainda vinha trabalhando – incessantemente para se perceber como uma pessoa razoável. O peso era quase sempre insuportável. Mas então ela o olhava, e, mais do que isso, o via de verdade.

E isso era o suficiente para que ele continuasse tentando pelo resto da vida. Nada do que ele pudesse fazer o isentaria de tudo que ele havia feito - de tudo que sua família havia feito. No entanto, ele gostaria de se certificar de que o que quer que viesse pela frente, fosse sempre margeado pelo que ele nunca mais gostaria de repetir ou reviver fora de seus pesadelos.

A construção daquela casa em Wiltshire, por exemplo, nas propriedades Malfoy, mas longe o suficiente da mansão de seus pais, era o maior e mais importante símbolo do seu estamento. No entanto, nada lhe enchia tanto de orgulho quanto o seu próprio casamento.

Quando a sua história com Greengrass havia começado, Draco ainda estava quebrado em mais sentidos do que ele tinha capacidade de entender. Gradualmente ele pôde perceber melhor quem era, quem havia sido, mas mais importante, quem ele gostaria de ser. Astoria havia lhe mostrado – em palavras, em gestos e as vezes apenas permitindo que ele desfrutasse de sua companhia - que ninguém se encerrava em uma única característica. E que estar vivo por si só era estar em uma dolorosa e contínua construção.

Ele havia adotado a perspectiva dela, por fim. E agora colhia os pequenos frutos de um relacionamento que havia dado um jeito de crescer e prosperar ainda que em um solo árido: a intimidade de enrolar uma mecha do cabelo dela distraidamente no dedo enquanto a observava.

— Acho que estou grávida. - ela sussurrou devagar, num fio de voz que quebrou o silêncio.

Draco sentiu uma vertigem. Toda a sua conjectura quase otimista sobre o que o levara até ali ruiu rapidamente enquanto ele se sentia abraçado pelo terror.

— Astoria...

— Eu sei. - Murmurou, ainda sem encará-lo.

Eles eram meticulosos. Eram cuidados ao extremo. E haviam decidido, antes mesmo de morarem juntos que não estavam dispostos a passar para frente o sobrenome Malfoy. Aquele era um peso que Astoria decidira voluntariamente sustentar e que, a duras penas, Draco concordara em aceitar.

Ela não havia adotado seu sobrenome pela tradição, mas sim porque não se importava em dividir com ele – as coisas boas e as muito ruins. Mas uma criança... Nenhum dos dois se sentia particularmente compelido à parentalidade, para início de conversa. Eles haviam crescido, cada um à sua maneira, com péssimos exemplares a quem amavam e odiavam quase em mesma medida.

Colocar uma criança inocente naquele emaranhado de sombras era exatamente o tipo de coisa que Draco daria a própria vida para evitar. E Astoria estava na mesma página que ele. Por mais que as vezes se considerasse corajosa, por mais que tivesse os dois pés firmes em cima de convicções distintas da classe social bruxa sob à qual havia crescido e pertencia - a princípio por petulância, mas em seguida por coração -, ela não sabia se queria e nem se era possível assumir uma responsabilidade como essa.

Era arriscado demais. E ainda assim... agora era uma possibilidade.

Astoria constatou que não havia alívio no fato de que as palavras, por fim, tinham saído de sua boca pela primeira vez. Ela vinha remoendo a possibilidade há algum tempo – rebatendo-a com a racionalidade de quem sabia que era muito improvável que sua intuição-medo estivesse certa. Mas então, naquela manhã, uma poção caseira havia confirmado suas suspeitas.

Ainda poderia ser um equívoco – ela precisava checar de verdade com um medibruxo. Mas de algum modo ela já sabia. E agora Draco sabia também: ele só precisou encarar os olhos verdes obscurecidos de preocupação dela para ter certeza. A certeza que se materializou sobre eles como se fosse uma presença já nascida.

Primeiro a respiração faltou. Toda as frases prontas e autodepreciativas que ele guardava em uma gaveta especial no fundo de sua mente jorraram aos borbotões sem que ele pudesse ter o menor controle sobre o estado febril delas, sobre o ódio que sentiu de si mesmo.

Mas depois... Depois ele se concentrou em Astoria. E no quanto nada importava mais do que o modo como ela estava se sentindo. Foi assim que, de maneira torta, ele conseguiu frear o princípio de pânico e atravessou de volta os limites da própria sanidade, se obrigando a respirar, se obrigando a olhar para ela.

— O que você quer fazer? – perguntou do jeito mais gentil que conhecia antes de segurar sua mão. E aquela delicadeza atingiu Astoria como um soco. Porque ali estava a pessoa que havia sido a criança mais problemática da qual ela tinha notícia, o adolescente mais odioso de Hogwarts por anos consecutivos... E agora o homem que guardava os próprios sentimentos no bolso por conta dos dela.

Astoria sabia que Draco achava que ela era uma espécie de síntese do que esperança deveria significar. Mas ela não poderia discordar mais dele do que naquele instante. Porque era ele quem efetivamente simbolizava o que era o sentimento: a possibilidade de coisas melhores nascendo de contextos muito ruins.

E foi quando ela soube que iria em frente com o incidente. Que queria. Porque quem quer que estivesse sendo gestado dentro dela – se é que havia de fato alguém como intuía – provinha, de fato, de linhas complexas e embaraçosas. Mas mais do que isso, provinha de algo que era o oposto da má fé, como o sobrenome supunha.

E essa era uma marca que valia a pena se perpetuar.

O tipo de prenúncio pelo qual lutar.


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