Um mar de distância escrita por Kacchako Project


Capítulo 1
Capítulo 1 - Sereias


Notas iniciais do capítulo

* Fanfic postada no Spirit e no Wattpad



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Qualquer mudança parece grande demais aos seis anos, principalmente quando se tem um caminhão enorme estacionado na sua porta, levando todas as coisas que ajudou a encaixotar durante uma semana inteira. Apesar da pouca idade, Katsuki sabia que essa mudança repentina tinha a ver com a ausência do seu pai e com as noites de choro de sua mãe, por isso ele decidiu ser o mais bonzinho possível e ajudar durante todo o processo, mesmo não gostando da ideia de deixar sua casa para trás.

Ele estava se esforçando mais do que era esperado para uma criança que acabara de perder o pai, e isso deixava Mitsuki inevitavelmente preocupada. Não que estivesse reclamando ou achando inadequado o comportamento civilizado do filho, mas sentia falta dos gritos, das travessuras e das respostas malcriadas de Katsuki. Tinha ciência que a morte do marido lhe afetava tanto quanto a ela, porém, desejava mais do que tudo que a normalidade voltasse a imperar em suas vidas, e talvez o pequeno paraíso na Região de Tohoku, fosse o lugar perfeito para isso.

E não podia ter tomado uma decisão mais acertada. A ensolarada praia de Joudagahama parecia ser o lugar ideal para criar seu filho, bem como um elixir revigorador para suas almas tristes e cansadas; pôde notar o brilho sapeca no olhar do filho assim que vislumbrara a praia paradisíaca, com águas límpidas e cristalinas, uma enseada calma e digna de ser uma cartão postal na região, talvez até fosse, mas isso não importava tanto no final das contas, o que ela realmente queria era um recomeço, e a empolgação de Katsuki a deixava otimista quanto a esse objetivo.

Para a sorte deles, chegaram no início do verão, e o pequeno Bakugou não via a hora de poder mergulhar naquele mar. Só que eles não estavam de férias, e sim de mudança, logo, teriam uma longa arrumação pela frente. Uma arrumação chata e demorada, que ele não tinha a mínima vontade de começar hoje. Por esse motivo, após o almoço e depois de terem desencaixotando algumas coisas básicas para dormirem, ele começou a importunar para irem à praia, a importunou tanto que por fim ela cedeu. 

Claro, não sem antes fazer um tour entediante pela casa nova. Tudo bem que seu novo quarto era muito maior que seu antigo, e que a sala tinha até uma escada que ele podia descer pelo corrimão, mas nada disso era mais atrativo que a praia. Katsuki queria dar um mergulho já! E foi entre gritos e euforias que, no meado da tarde, a família fora conhecer a praia.

— Me promete que não vai pro fundo! — ordenou enquanto enfiava as boias nos braços pequenos do filho.

— Tsk… tá — resmungou.

— E que vai ficar onde eu possa te ver!

— Tá bom… — disse revirando os olhos. Mitsuki quase riu, era um alívio vê-lo irritadinho.

— Só mais uma coisa… — falou, pegando o protetor solar comprado a cinco minutos atrás.

— Chega, velinha... — reclamou, tentando desvincular-se dos braços da mulher. — Já sou um homem, não preciso dessa coisa!

— Ok, homenzinho! — debochou. Mais quanta petulância em um ser tão pequeno, já estava começando a ficar impaciente de novo. — Só não reclama quando estiver ardendo igual ao satanás no inferno! 

— Não deve tão ruim, já que você é de lá! — Mostrou a língua e saiu correndo.

— Volta aqui, seu filho da…

E eles estavam brigando novamente… Graças aos céus! A atmosfera daquele lugar realmente tinha um efeito terapêutico, por isso Mitsuki não pôde deixar de esboçar um sorriso satisfeito ao vê-lo tão irreverente. Brigar fazia parte da dinâmica familiar, eles não poderiam ser mãe e filho se não trocassem algumas farpas ocasionalmente, então sim… ela estava contente com a atitude do pequeno Bakugou, ao menos por enquanto.

Já Katsuki finalmente estava livre para explorar a praia. Ao sair correndo, notou como a areia era macia e quentinha, parecia tão branca como a neve de Tóquio, até mais devido aos raios de sol que brilhavam incessantemente naquele dia de verão. E a água era tão clarinha que mesmo batendo em seus joelhos conseguia ver seus pés; não tinha muitas ondas o que seria perfeito para construir um castelo de areia com seu pai. Eles adoravam fazer isso juntos e ali parecia ser o lugar ideal, se Masaru estivesse ali…

Não! Ele não iria pensar em coisas tristes outra vez. Prometera ao seu pai, no hospital, que seria um homem forte, que cuidaria de sua mãe, e Bakugou Katsuki não quebrava promessas, principalmente as que fazia a Masaru. Então, não choraria mais, nem construiria castelos bobos de areia, seria um explorador! Acharia conchas, estrelas-do-mar e alguns peixinhos fofos e os daria para sua velha, talvez assim ela também parasse de chorar. Até porque Joudagahama era um lugar lindo demais para eles ficarem tristes.

— KATSUKI! — Mitsuki gritou do ponto em que estava sentada, debaixo de um guarda-sol, a poucos metros de distância do filho. — NÃO SAIA DAÍ, VOU BUSCAR UMA ÁGUA GELADA NO QUIOSQUE! 

— TÁ, VELHINHA! — respondeu no mesmo tom.

Não faria mal deixá-lo sozinho por alguns minutinhos, né? Afinal, estavam no local mais reservado da praia, perto de uns rochedos que formavam uma baía, aparentemente, segura e localizada quase no final da praia; sem falar que havia poucos turistas por ali naquela hora. Seria uma ida rápida, nada de mais.

Mas foi exatamente quando Mitsuki virou as costas que o pequeno Bakugou resolveu intensificar sua exploração. Que coisas interessantes poderiam haver perto daquelas rochas? Ou melhor, que coisas magníficas ele poderia descobrir se escalasse algumas delas? Parecia fácil, já tinha uma trilha pronta, era só subir e explorar. E tem mais, ele não precisava das boias bobocas que sua mãe havia colocado nele, era um homem corajoso e destemido, não tinha medo de nada, se livrar daquele suporte infantil era a coisa mais óbvia a se fazer. Então, reunido toda essa coragem e determinação que Katsuki começou a subir a pedra.

Era mais alta do que ele imaginara, mas tinha umas florzinhas bem bonitinhas no caminho, talvez sua mãe gostasse. Encontrou uns caracóis e outros insetos estranhos também, da próxima vez ele com certeza traria um pote e levaria alguns para casa. Como todo aventureiro, Katsuki iria até o final da sua jornada e depois voltaria para a praia ao encontro de sua mãe, como se nada de extraordinário tivesse acontecido. 

Sendo assim, andou até o que parecia ser um buraco na rocha, em formato de meia lua; agachou-se e observou atentamente. O mar era bem mais escuro naquela parte e bem mais fundo também. Inclinando-se um pouco mais, pôde notar um tipo de caverna secreta, uma que qualquer explorador iria querer visitar… qualquer um menos ele. Porque, por mais corajoso que fosse, sabia que aquilo não era uma boa ideia. Era valente e destemido, mas não burro como as outras crianças da sua idade. 

Então, sentindo-se satisfeito com sua curta jornada, o pequeno Bakugou levantou-se, olhou mais uma vez o precipício — sentiu um arrepio em sua espinha —, e virou-se para retornar à praia. Porém, quando ia iniciar seu regresso, foi surpreendido por uma cobra. O susto foi tão grande que ele se desequilibrou, derrapou e caiu na caverna.

O desespero foi imediato. Ele não sabia nadar e, mesmo que soubesse, não teria ideia de pra que lado ficava a saída. Gritou, mas ninguém o ouvia. Estava escuro demais, frio demais, a água salgada era engolida sem sua permissão, e seus braços debatiam-se rapidamente. Os gritos eram desesperados, as pernas e os braços moviam-se freneticamente, havia uma busca incessante por oxigênio; mais gritos agonizantes, movimentos aflitos, escuridão assombrosa, pânico; cansaço… e por fim tudo se apagou. 

[...]

Quando finalmente parou de tossir e conseguiu abriu os olhos, deparou-se com grandes íris castanhas lhe observando. Parecia uma garota, mas tinha umas orelhas engraçadas e bochechas rosadas demais. Será que ela tinha pegado muito sol? Tomara que as suas não estivessem assim, se não Mitsuki gritaria horrores nos seus ouvidos.

— Quem… — engasgou com uma tosse — é você?

— Você não tem brânquias, era por isso que estava se afogando — falou sem responder a pergunta.

— Humanos não têm brânquias, sua idiota!  

— H-hu-humano? — perguntou, arregalando os olhos em espanto.

O menino assentiu e logo em seguida ouviu um grito de desespero. A garota mergulhou, deixando só os olhos pra fora d'água, foi então que Katsuki percebeu que não estava mais na caverna secreta, mas sim são e salvo em uma pedra muito menor que a que ele estava antes. Na verdade, parecia estar do lado oposto do que subiu, em uma parte mais reservada ainda da praia, uma que talvez só pudesse ser acessada de barco.

— Ei, garota! — chamou-a enquanto engatinhava até a beirada da pedra. — Como cheguei até aqui?

Meio receosa pela revelação assustadora do menino ser um humano, ela não se aproximou, apenas colocou toda a cabeça para fora e disse:

— Minha mãe falou que humanos são perigosos.

— Quê? — Katsuki estava confuso.

— Minha mãe disse que humanos são perigosos — repetiu pausadamente.

— Não sou burro, menina! Eu entendi da primeira vez… — retrucou, revirando os olhos — só não entendi por quê. 

— Não sei… ela disse que sereias deviam ficar longe de humanos.

— Sereias?! — perguntou, agora era sua vez de ficar surpreso.

— Sim! — respondeu, chegando mais perto e mostrando sua cauda. 

Ele a observou, admirado e espantado, não era pra menos, já que nunca tinha visto uma sereia na vida. Aquela era a descoberta mais fantástica de toda sua exploração! Mas ela era  bem diferente das sereias dos filmes, era rechonchuda, bochechuda e tinha uns olhos brilhantes demais.

— Não parece uma sereia — disse, depois de uma análise completa.

— Mas eu sou! — exclamou levemente irritada.

— Não… — provocou — parece mais um peixe-boi cor-de-rosa.

— E você é um humano boboca que é tão burro que pulou na Aonodokutsu sem saber nadar! — gritou irritadíssima, mais vermelha que um camarão.

Katsuki não pôde deixar de rir da reação da pequena sereia. Era bem fácil deixá-la brava, mas o que ela dissera não era verdade, ele não tinha pulado de propósito, foi um completo acidente.

— Eu não pulei nessa Aono-sei-lá-o-que, eu… caí.

Ela estava de braços cruzados e cara fechada, ainda estava chateada com o comentário anterior. Talvez fora isso que sua mãe queria dizer com os seres humanos serem "perigosos", eles machucavam o coração.

— Qual seu nome? — perguntou, mas ela apenas deu as costas. — O meu é Katsuki e… valeu por ter me ajudado.

— Ajudado? — Ela devolveu a pergunta ao virar-se para ele novamente.

Katsuki bufou. Não sabia que sereias eram tão chatas e tão emotivas, sendo bem sincero, não sabia nada sobre sereias, só por causa disso tentaria ser legal com essa. Revirou os olhos e respondeu:

— Obrigado por ter me salvado, Bochechas! — disse, enfático.

Ela ficou satisfeita com a mudança no discurso, por isso rompeu toda a distância imposta pelo mar e sentou-se perto dele. Era uma sereia ousada, certamente seus pais reprovariam tal atitude, mas eles não estavam ali, e Katsuki não parecia ser tão perigoso assim.

— Não é a melhor visão do mundo?! — Ela perguntou animadamente enquanto contemplava o pôr do sol.

O menino não pode discordar. O sol parecia estar sendo engolido pelo mar, ao mesmo tempo em que as nuvens assumiam tons laranjas, rosas e vermelhos; as gaivotas rasgavam os céus como se estivessem tristes pelo fim de mais um dia. Era uma visão de tirar o fôlego, porém, não justificava o fato da sereia bochechuda não responder nenhuma das suas perguntas, sem falar que estava tarde e Mitsuki devia estar um fera.

— Eu preciso ir embora... — falou, mais triste do que pretendia.

Ela riu e, com um sorriso radiante estampado na cara excessivamente redonda, declarou:

— Eu te ajudo, Katsuki!

Ela pulou de volta no mar e, depois de convencer o novo amigo que ficaria tudo bem — afinal, ela era uma sereia e nasceu sabendo nadar —, começou a contornar o grande rochedo, levando Katsuki nas costas. Não demorou muito para que chegassem à praia, já estava um pouco escuro, então não havia risco de uma sereia ser vista em águas claras. Enfim, era hora da famigerada despedida e ele odiava despedidas.

— Foi legal, Bochechas. — Deu de ombros, aquele era o fim de sua aventura fantástica, exceto pelo seu quase afogamento. 

— É Ochako! — disse já se afastando e acenando. — Até mais, Katsuki!

— Até, Bochechas! — Acenou de volta.

— É OCHAKO! — exclamou mais uma vez irritada.

Ele riu, pois era realmente fácil chatear um sereia. Quando finalmente não pôde mais vê-la, resolveu ir procurar sua mãe, que deveria estar furiosa com seu sumiço. Andou até chegar ao ponto em que havia começado sua aventura, suas boias não estavam mais lá, talvez Mitsuki as tivessem encontrado, talvez não... droga! Mais um motivo para ela poder brigar. A essa altura Katsuki tinha certeza que ficaria eternamente de castigo.

Entretanto, não foi uma mãe furiosa que encontrou após mais alguns minutos pela orla da praia, e sim uma visivelmente desesperada. Mitsuki chorava copiosamente enquanto abraçava o filho o mais forte que podia; a possibilidade de perder mais alguém em tão pouco tempo a deixou angustiada, e sua aflição foi tanta que quase roubou uma lancha da guarda costeira para iniciar suas buscas por conta própria, por sorte não fora necessário cometer tal infração.

— Tô bem, mãe! — Tentou acalmá-la, mas era em vão. — Desculpa… eu tô bem, mãe!

A mulher não conseguia conter as lágrimas, porém o alívio de ter o filho novamente em seus braços começava, aos poucos, a tomar conta de seu peito. Quando enfim acalmou-se e afrouxou o abraço, encarou o filho extremamente brava e gritou:

— Onde diabos você estava seu bastardo?!

É… ela já estava bem, por isso Katsuki revirou os olhos, cruzou os braços e, sem saber que tal declaração lhe custaria anos de terapia, gritou de volta:

— Tava conversando com uma sereia, sua velha maldita

 


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Notas finais do capítulo

Essa fanfic é um oferecimento do KacchakoProject! ♥

Eu estou muito contente de poder compartilhar essa história com vocês, apesar de estar bastante ansiosa e nervosa por ser uma short-fic, esse é um tema que sempre quis escrever, mas nunca tive o incetivo e a motivação necessária. Então, espero que gostem dela tanto quanto eu, e a acompanhem até o final. ♥

A Praia de Jodogahama é um lugar real, assim como a Região de Tohoku e a Gruta azul (Aonodokutsu), mas sofreram algumas alterações e sofrerão ainda mais para que se adaptem a história. É um lugar lindo! Se alguém quiser ver:

https://www.japaoemfoco.com/praia-de-joudogahama-cartao-postal-de-iwate/

Agradecimentos super especiais à @dilophosaurus_ pela betagem e pelo feedback, e à @kuriyama_nyah pela capa que ficou MARAVILHOSA! Vocês são uns anjos! Muitíssimo obrigada! ♥

Meu muito obrigada a você que leu e até breve! ♥



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