— Todo mundo tá sabendo o que tem que fazer? — perguntei e recebi acenos de cabeça como confirmação, enquanto Kentin e Mica cada um tomava uma colherada dos seus sorvetes, quase em sincronia.

— Só não garanto conseguir muito, porque o Dajan nunca parece estar a fim de conversa — Kentin disse.

— E quando aquele lá tá com cara de quem quer conversar com alguém? Exceto quando é pra ficar com alguma modelo. — Micalina riu, no que o russo balançou a cabeça. — Eu falo com o Jade até você chegar no estúdio, Mari.

Encarei os dois, esquecendo meu sorvete derretendo enquanto eu brincava com a colher no pote.

Okay, contexto? Todo mundo se lembra das descobertas que eu e Júlia fizemos após a conversa com Nathaniel, e que agora Mica e Kentin também sabiam, e da operação da qual resolveram fazer parte junto comigo.

Kentin viria para a agência de qualquer jeito, já que ele iria participar da segunda fase do casting para o desfile da Gavieira — e eu torcia para não esbarrar com Castiel, já que ele também estaria lá — e falaria com Dajan. Já eu e Mica não tínhamos nada de importante reservado para aquela semana, então resolvemos participar do primeiro casting que aparecesse na nossa frente e aproveitar para conversar com Jade e Alexy. A única coisa que eu sabia era que seria para um comercial, mas Mica dizia ter certeza que Jade estaria lá...

— Quem quer batizar a nossa investigação? — puxei do nada, surpreendendo ambos, que estavam mais ocupados em discutir detalhes do nosso maravilhoso e simples plano.

Os dois se encararam e depois fizeram o mesmo comigo.

— Toda investigação que se preze tem um nome, ué. — Cruzei os braços, já que meu sorvete tinha virado totalmente água. E eu gastei dinheiro com aquilo.

— Mari... — Kentin começou.

— Que tal Operação Paparazzi? — Micalina interrompeu. — Você e a Júlia meio que deram uma de paparazzi aquele dia, a Debrah trabalha pra uma revista de fofocas...

— Isso não faz muito sentido — o modelo rebateu.

— E tem a música da Gaga com esse nome. — Ela deu de ombros, como se esse fosse o argumento final, que só fazia sentido na cabeça dele. Mica e seu amor pela Lady Gaga... Eu não podia falar nada, já que não era tão diferente com a Taylor Swift.

— Eu amei! — exclamei e estendi a mão com a palma pra baixo. Os dois me encararam sem entender nada. — Nunca viram esse tipo de coisa em filme? A gente põe as mãos em cima da outra e dá um grito.

É, ninguém além de mim pareceu aderir...

...

Entramos arrasando na agência, quase igual aquelas imagens de trio chegando com tudo em filmes. Exceto que eu quase me enrosquei na porta tentando entrar ao mesmo tempo em que os dois e todo mundo pareceu nos ignorar. Mas detalhes, detalhes.

Bem, todos nos ignoraram, inclusive Castiel, que estava mais uma vez com a cara no seu celular. Ele ira acabar tendo problemas no pescoço...

— Eu vou pedir pra Chani preparar uma senha pra você, Mari — Mica comentou.

Talvez ouvindo meu nome — e provando que não estava totalmente alheio assim —, Castiel ergueu os olhos do aparelho e me encarou, ainda perto da porta. Sim, bem aquela coisa de filme. Exceto que eu ainda podia ver a raiva nos seus olhos. Talvez sequer querendo ver minha cara na frente dele, o modelo saiu e sumiu por um dos corredores.

— Não liga pra ele, Mari — Mica tentou me consolar, passando um braço pelo meu ombro. — A gente vai provar a verdade e você vai esfregar na cara dele, pra ele ver o que perdeu.

Sorri fraco, tentando achar graça do que ela falou. Ao mesmo tempo em que eu também estava com raiva do Castiel, também não tinha vontade de fazer coisa do tipo. A verdade é que eu ainda gostava dele, mesmo estando extremamente chateada. Com ele e comigo mesma. Principalmente por ser culpa minha tudo o que aconteceu com a Júlia.

— E nós vamos sempre ajudar você — Kentin inteirou, passando o braço pelo meu outro ombro, fazendo com que déssemos um abraço triplo meio torto bem na entrada da agência.

— Vocês não me façam chorar agora, porque tenho que manter a maquiagem inteira pro casting — disse, tentando rir pra disfarçar.

— Veja pelo lado bom, pelo menos você vai ter mais motivos pra ir falar com o Alexy — Mica brincou, fazendo-nos rir antes de nos separar, para cada um cumprir sua parte na investigação.

Operação Paparazzi estava no ar!

Kentin sumiu para o casting da Gavieira e Micalina seguiu reto para o estúdio, enquanto eu entrei de fininho no camarim, torcendo para que Alexy estivesse lá. Todo dia tinha shooting naquela agência?

Enfim, a sala estava como toda vez que eu passei por lá, com modelos doidos por todos os lados, pegando suas roupas e indo se trocar, pessoas preparando cabelo, maquiagem, chorando de desespero... Pra minha sorte, Alexy era um dos únicos que nunca entrava pro time dos desesperados e apenas tirava suas coisas da maleta. Os modelos provavelmente ainda estavam todos se trocando.

— Olá — cantarolei, me escorando nas costas de uma das cadeiras e tentando piscar com simpatia. Provavelmente parecia que eu estava tendo um derrame, isso sim.

— Mari, o que você tá fazendo aqui? — Alexy questionou, surpreso pela minha presença. — Pensei que você não estivesse em trabalho nenhum.

Lysandre, que estava também preparando seu material de trabalho ao lado, pareceu acender um alerta vermelho assim que ouviu meu nome. Diferente do amigo, ele sabia disfarçar muito bem.

— Eu vim fazer um casting e resolvi passar pra dar um oi. — Continuei piscando e parecendo ter um derrame, no que Alexy me olhou estranho, talvez em dúvida se eu estava bem. — Preciso conversar com você — sussurrei.

O maquiador olhou pra trás, vendo que o cabeleireiro estava mais ocupado com o próprio trabalho. Alexy olhou pra mim, pra ele, pra mim de novo e suspirou.

— Vamos lá pra fora. — Me guiou para a porta e paramos a alguns metros de distância, com certa proximidade um do outro, já que pessoas passavam por lá a todo instante. — Você tem três minutos — disse no tom de voz normal.

— O que você sabe sobre Debrah Chapelle? — Joguei a pergunta na lata, fazendo-o erguer as sobrancelhas de surpresa.

— Por que você quer saber dela? — Ele baixou o tom de voz e percebi que eu deveria fazer o mesmo, caso não quisesse ouvidos espertos escutando nossa conversa, afinal, todo mundo que passava me encarava.

— Ela é editora da revista que publicou as fotos.

— E? — Continuou não entendendo onde eu queria chegar.

— E ela já trabalhou aqui na agência.

— O que não quer dizer muita coisa — rebateu, não totalmente ciente dos detalhes da investigação que eu e a Operação Paparazzi estávamos fazendo. — Tudo bem. — Ele suspirou, se dando por vencido. — Debrah foi modelo aqui por quase dois anos e namorou o Castiel por alguns meses. No começo ela conseguia poucos trabalhos, mas eles triplicaram quando ela começou a namorar o Castiel. Na época ele não era tão conhecido como hoje, mas já havia conseguido um contrato com uma empresa publicitária.

Assenti, atenta à história que contava.

— E o pessoal na agência gostava dela?

Alexy torceu o nariz com a minha pergunta.

— Debrah fazia aquele tipo do “ame ou odeie” — brincou com um sorriso.

— E você fazia parte do time do “odeie”? — questionei, deduzindo pela cara que ele fez antes.

— Digamos que aquela garota parecia ter o rei na barriga, como eu ouvi você falar uma vez — riu, recordando-se de uma expressão que usei pra descrever os modelos de cara azeda. — E piorou quando ela começou a namorar o Castiel.

— Mas era só isso? — insisti no questionário, percebendo que o que ele contava batia com alguns dos comentários que eu e Júlia achamos em nossa pesquisa. Alexy pareceu hesitar. — Por favor...

— Eu não posso acusá-la sem provas, mas... — O maquiador olhou para os lados e em seguida aproximou o rosto de mim, para falar mais baixo. — Naquela época, as fofocas da agência viviam vazando pra fora. Uma pessoa saía com outra e na semana seguinte virava notícia em nota de rodapé de revista.

— A Cèlèbritè? — Joguei o nome da revista em que as fotos de Júlia apareceram na conversa.

Alexy assentiu com a cabeça e continuou quase aos sussurros. 

— Ninguém sabia como isso acontecia, mas muita gente suspeitava que era alguém de dentro da agência passando informação pra fora — ele continuou. — Nessa época, a Debrah acabou pegando má fama por causa de confusões que aconteciam pela internet. Ela não aguentava ficar quieta e brigava com as fãs do Castiel e quem falava mal dela.

Ergui as sobrancelhas, surpresa por não ter visto nada do tipo. Talvez ela apagou todos os comentários antigos pra ninguém se lembrar? A internet esquecia rápido dos próprios cancelamentos...

— Ela foi conseguindo cada vez menos trabalhos, até que um dia simplesmente resolveu sair da agência. E menos de duas semanas depois, algumas pessoas ficaram sabendo que ela conseguiu um emprego na Cèlèbritè, mesmo nunca tendo cursado Jornalismo.

— Então era ela quem vazava as informações! — exclamei alto demais após ter ligado os pontos e me censurei quando vi olhares de quem passava para nós.

— Só não precisa anunciar isso pra todo mundo — Alexy brincou. — Apesar de que algumas pessoas que estavam aqui na época tenham certeza disso.

A porta do camarim se abriu e Lysandre apareceu, chamando por Alexy. Fiquei em dúvida se seu olhar frio fosse por estar incomodado por eu estar atrasando tudo ou apenas por eu ser eu.

— Obrigada, Alexy — agradeci com um beijo na bochecha e vi-o sorrir.

— Agora estou liberado do interrogatório? — Nós rimos e apenas assenti. — Ainda vou querer saber melhor do que a senhorita anda aprontando.

Fez-se de sério, fingindo que me dava um ultimato, e ri mais uma vez enquanto ele entrava de volta para o camarim após o cabelereiro, que voltou a me ignorar solenemente. 

Em posse das informações, saí do canto do corredor direto para o estúdio, onde algumas pessoas também se dirigiam.

Certo, a Debrah tinha inúmeros motivos pra odiar a B Agence e as pessoas que trabalham nela, mas será que ela também odiava o Castiel? Eu não sabia exatamente porque eles tinham terminado, mas vai que ela é do tipo rancorosa? E mais, qual era a ligação entre ela e Ambre? E por que Ambre iria querer vender as fotos pra revista? Dinheiro?

Só faltava sair fumaça da minha cabeça enquanto eu pensava em tudo isso e quase passei reto pela fileira de cadeiras em que Micalina estava sentada. Ela me trouxe de volta pra realidade e percebi que a sala estava lotada, com um modelo de cabelos coloridos sob a lente das câmeras na frente da sala. Eu sequer sabia de que era aquele comercial...

— O Jade é até bem simpático — ela comentou e sorriu e acenou para o modelo quando ele passou por nós, tendo terminado sua vez no casting.

— Deixa o Kentin saber disso — provoquei, no que a mexicana franziu as sobrancelhas, me fazendo rir.

— Para de graça. — Me deu um tapa de brincadeira e continuei rindo. — Voltando ao assunto que importa... O Jade me disse que quase a agência toda odiava a Debrah e que ela era arrogante demais. E ela era ex do Castiel, mas dessa parte você já sabe.

— Alexy acabou me contando que...

— Estão chamando seu número — Micalina me interrompeu, colocando um papel na minha mão.

— O que?! — exclamei confusa, enquanto metade da sala me encarava.

Ficava em dúvida se por eu ser eu, por falar alto ou o que. Chani chamou um número outra vez.

— Seu número é antes do meu, vai lá. — Micalina quase me empurrou e fui obrigada a me levantar, indo para a frente da sala.

Todos me encaravam enquanto eu passava e me arrependi de ter ido naquele casting assim que fiquei na frente da câmera. Havia uma mesa com uma jarra cheia de um líquido verde parecendo suco de clorofila e um copo limpo que acabaram de colocar ali.

— Que surpresa te ver por aqui, Mari! — Chani exclamou ao me ver e sorri amarelo para ela. — Já sabe as falas?

— Então... — Eu sequer sei o que estou fazendo aqui, meu bem! Mas é claro que eu não diria isso em voz alta.

Viktor pareceu ser o único a perceber isso e suspirou parado atrás da câmera. Chani, solícita como sempre, explicou tim-tim por tim-tim o que eu deveria fazer.

O produto que iria anunciar? Um shake natural de uma dessas marcas que dizem que você pode milagrosamente emagrecer enquanto ingere um monte de nutrientes. Por que resolveram procurar gente pra esse comercial justamente hoje? 

Após saber exatamente minhas falas e o que deveria fazer, me posicionei atrás da mesa, esperando pelo sinal para começar. Quando Chani autorizou, peguei a jarra pela alça.

— O suco NutriShaken é rico em vitaminas C, B1, B12 e Ômega 3, com ingredientes totalmente naturais. 

Despejei o líquido verde dentro do copo, vendo-o descer lentamente, quase como uma lava feita de clorofila batida no liquidificador. Pobres plantas.

Vendo aquele troço que parecia vômito me encarar dentro do copo, bebi, contendo a vontade de cuspir.

— Hummmm... — Imitei a Ana Maria Braga, mesmo com o gosto de samambaia com mel e terra na boca. Não que eu tivesse provado o primeiro e o último. — É uma delícia!

Sorri amarelo. Ou verde, tendo certeza que a coisa ficou nos meus dentes.

Por que você me odeia tanto, Universo?