Dos ritos, das palavras e das magias escrita por Lyn Black, Indignado Secreto de Natal


Capítulo 1
Prólogo


Notas iniciais do capítulo

estar aqui significa que morgana!, já é natal.
lari querida, espero que você ame ler, como amei escrever.
aos demais tripulantes, boa leitura ♥



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PRÓLOGO

 

Um vento frio e cortante esgueirava-se pelas frestas da cabana, trazendo os resquícios de uma chuva há muito anunciada. A água prometida, contudo, não era feita da sua usual composição, mas de sangue diluído. Em meio àquela floresta, três adolescentes pareciam encarar para o que o céu anunciava com um misto de temor, ânsia e coragem. Não tinham muitas opções além de enfrentar as poças da água avermelhada que pareciam tingir os seus futuros. Naquela noite, porém, alguma amistosidade também havia encontrado seu caminho para dentro do recinto. 

Um garoto ruivo andava pelo interior da cabana, passos irrequietos e olhos inconstantes, cansaço marcando as linhas de sua testa. Seu nome, como muitos já devem ter adivinhado, era Ronald Weasley e, na sua irrequietude, ele começou a remexer na Bolsa de Contas que Hermione, a sua amiga e companheira de viagem, havia trazido consigo para a maldita caçada de horcruxes

Entediado e frustrado, Ronald começou a buscar por algo — o que quer que fosse capaz de distraí-lo — dentro da bolsa. Entre os kits emergenciais de curativos, roupas e elementos não-identificáveis, Rony enfim tateou algo que chamou a sua atenção. Parecia um bauzinho de madeira, com intrincados desenhos em sua superfície. Retirando-o da bolsa com pressa, Rony notou que aquilo não era, afinal, um baú, mas a capa de um livro que parecia cintilar sob a luz da cabana. Não era muito chegado em livros, porém, aquele certamente havia captado a sua atenção.

Olhando por cima de seu ombro, checou se Hermione estava prestando atenção nele e, ao verificar que a garota tinha a atenção voltada para outro mundo, abriu-o, um comichão invadindo a sua barriga dada às estranhas experiências com certos livros de Hogwarts.  Nada gritante aconteceu, e ele suspirou aliviado. O título, entretanto, e todo o resto, parecia embaralhado. Agora, com a sua curiosidade atiçada, Ronald retirou a varinha do bolso, e murmurou:

—   Liquefacio, liquefacio. 

Na medida em que a magia acontecia, e as palavras tomavam forma, o rapaz conseguiu distinguir o título. Surpreendido, levantou os olhos, encontrando as castanhas orbes da garota ainda distantes. Ela parecia bem aprofundada no seu próprio livro quando Ronald interpelou-a:

— Mione, qual é a desse livro? Magia pura e ancestral: contos e roubos?  — questionou, as orelhas avermelhando-se. — Essa baboseira puro-sangue não tem fundamento nenhum. 

A lombada nas mãos de Weasley refletia um brilho dourado sob as velas dispersas pela tenda onde o Trio de Ouro escondia-se. Ele segurava o livro com uma das mãos, ainda olhando com um vinco entre as sobrancelhas para a capa amarronzada com detalhes amarelos. Hermione levantou os olhos de sua leitura sobre horcruxes e outras artes proibidas, e desviou-os para a obra que o ruivo segurava.

A princípio, a garota soltou um muxoxo de descontentamento ao notar que a Bolsa de Contas havia sido revirada: teria de arrumar aquilo de novo! Deixando isso de lado, entretanto, optou por responder o amigo.  

— Não é um livro purista, Rony —  explicou em um tom calmo e pontuado —, Morrígan Adsumberg, a autora, pelo que pesquisei antes de deixarmos Hogwarts, era mestiça, e investigou contos mágicos sobre roubo de magia. Só Morgana sabe como encontrei esse livro, estava escondido no fundo da Sessão Proibida. Mas ainda não consegui parar para lê-lo. — Indicou com um suspiro a pilha de livros sobre magia das trevas que tentava devorar. 

O rapaz folheou a obra, ainda desconfiado. 

— Ainda parece lorota digna de Você-Sabe-Quem, nunca escutei histórias sobre isso —  comentou.

O pequeno sorriso que Hermione deu ao escutar a fala do amigo captou a sua atenção. 

— Se eu fosse ele —  colocou pausadamente —, odiaria a possibilidade disso ser verdade. Poder roubar magia, sabe? Significaria que a magia dele não seria tão absoluta assim, ainda mais com a alma fragmentada por aí. 

Rony empertigou a coluna e aproximou-se de Hermione. 

— Então podemos usar isso contra ele, não? —  Sua voz já se mostrava mais animada.

Balançando a cabeça negativamente, ela levantou-se e pegou o livro das mãos dele, segurando-o com um cuidado especial. A lombada amadeirada já estava puída, e as páginas amareladas evidenciavam que era um exemplar já antigo. Um selo com o brasão de Hogwarts, escrito “Sessão Proibida” revelava que aquele era um furto da bruxa, que tomara medidas drásticas no final do último ano letivo, frente à possibilidade de não retornar para a escola tão cedo. Ela folheou as páginas, passando os dedos pelas várias ilustrações presentes pelas páginas.

— Acho que Morrígan não ensina o passo a passo para retirar a magia de um bruxo, Rony —  elucidou —, ela aparenta discutir contos e relatos, não é um manual de instruções. 

Ele coçou os cabelos ruivos e esfregou as mãos, e mergulhou no silêncio da esperança despedaçada. O frio entrava, mesmo que discretamente, com cada vez mais força por uma fresta da entrada. Era o turno de vigia de Harry, e seus passos largos e frenéticos ecoavam dentro da cabana provisória. A floresta era silenciosa demais quando a noite caía e a tensão aumentava. Hermione mirou, momentaneamente, a sombra do Escolhido, visível através do tecido que constituía o abrigo. 

— Não acho que ninguém, nem mesmo o Harry, estaria disposto a tentar isso com alguém como você-sabe-quem. Deve ser uma dispersão muito grande de magia para se conduzir —  concluiu, após um momento de silêncio. 

Ronald indicou o livro com o dedo, o rosto menos esperançoso. 

— Mas alguém tentou, não? Tirar a magia de alguém? —  sondou, ainda interessado — Seria bom saber, pelo menos para nos prevenirmos nesses tempos...

Granger assentiu e colocou uma mecha de seus cabelos, que teimava em atrapalhar a sua visão, atrás da orelha. 

— Morrígan é uma contadora, aposto que são boas histórias. — Seu rosto iluminou-se com uma ideia. — Me dê uma mão aqui com a sopa, que depois de comermos, podemos ler juntos. Nós precisamos de uma distração, Merlin sabe que sim.

A barriga dele roncou, causando um riso na menina.

— O que eu não daria pelo caldo de abóbora de mamãe, o que eu não daria… —  falou com drama, no intuito de causar mais risadas em Hermione. 

A fala, de fato, surtiu efeito, e Mione, inclinando a cabeça, os olhos curiosos e um sorriso tranquilo e cansado, apoiou uma das mãos no ombro dele, apertando-o levemente.

— Sopa de batatas, lamento informar — disse com displicência. — E muitas batatas para cortamos...

 

          

 

 

Os três seguravam cumbucas quentes, de onde saía uma fumaça que aquecia e fazia os rostos ficarem corados. O cabelo de Harry estava levemente colado em sua testa, e ele demonstrava aflição, o pé irrequieto em uma batida constante. Tomavam a comida em silêncio, apenas escutando o barulho do vento que se infiltrava, apesar dos feitiços de isolamento.  

— A sopa está boa — comentou Potter, sorrindo para os amigos. 

Ronald já estava se servindo de novo, e murmurou algo ininteligível. 

— Não melhor do que a que você fez semana passada com aquelas folhas — retrucou Hermione, dando uma piscadela para Harry, que deixou um sorriso escapar em retribuição. 

Já o ruivo parecia discordar.

— Não sei como não acabamos envenenados com aquelas plantas, Harry — disse com uma dose de acidez mesclada com humor. 

— Eu fiz muitas sopas nos Dursley. Se quer saber, sei diferenciar algumas folhas. — Harry não parecia estar tão dentro da brincadeira assim. 

Guardando um suspiro que queria escapar, Hermione lamentou internamente por ter de agir como mediadora entre os dois mais uma vez no mesmo dia, mas forçou uma voz alegre. 

— Me ocorreu que podíamos ler juntos esse livro  — começou a dizer, mas se corrigiu —, bem, na verdade Rony perguntou sobre o livro e aí tive a ideia. 

Harry assentiu levemente, os olhos mais despertos.

—  É como Os contos de Beedle, O Bardo*? —  perguntou.

— Não exatamente. — Ela pegou o livro do banco que havia conjurado mais cedo. — Aqui dentro há dois casos de roubo de magia, histórias antigas que a escritora resgatou. Pelo menos, foi esse o resumo que encontrei antes de pegá-lo. 

Ronald, já munido de mais uma porção da sopa, sorriu. 

— Então comece logo, Mione, já estamos ficando curiosos.  

Harry também se aprumou para ficar mais confortável, e levitou algumas almofadas para perto deles. Ela remexeu-se um pouco no banco onde estava sentada e cruzou as pernas, abrindo o livro. Limpou a garganta com um pigarro, emergindo nas letras delineadas em preto. 

— Primeiro o prólogo, sim? — questionou, recebendo em retorno meneios das cabeças dos meninos. — A historiologia da possessão de magia envolve nomes de pesquisadores da natureza da mágica, de intelectuais da varinhologia e dos Inomináveis. É, no entanto, notável como os relatos dos processos de roubo mágico são repletos de lapsos de coerência e de falta de acurácia histórica.

— Novidade — resmungou Rony, recebendo um olhar crítico de Hermione pela interrupção. — Pode continuar, desculpa.

Ela voltou os olhos para a página e continuou a falar:

Contemporaneamente, apontam-se distorções metodológicas em razão dos interesse dos defensores da doutrina do sangue-purismo. — Pausou a leitura, arqueando uma sobrancelha para Rony. — Sou, antes de historiadora, uma contadora de estórias, tanto mágicas, como trouxas. Esse livro, assim, é uma singela contribuição para os relatos sobre magia partindo da base da comunidade mágica: as suas histórias fantásticas, que revelam as magias mais antigas, poderosas e secretas. 

— Será que Voldemort foi atrás dela, também? - murmurou Harry, levemente sombrio.

Os olhos de Hermione saltaram do livro, e ela pareceu pensativa.

—  Se eu tivesse acesso à biblioteca de Hogwarts, poderia descobrir, mas não duvido — respondeu, continuando a leitura. — Para que haja entendimento do tão falado “roubo de magia”, ou melhor “transferência”, da potência mágica será preciso, primeiramente, abraçar as naturezas da magia, da bruxaria e das suas manifestações. A existência de feitiçarias consideradas “artes das trevas” voltadas para a repressão da magia de bruxos e bruxas pode ser apontada como indício do desenvolvimento de técnicas para modulação da magia, mas isso é assunto para outro livro. Nos próximos capítulos, espero que possamos nos ater à dois contos potenciais de transferência mágica registrados pela comunidade bruxa e propagados pelas gerações de contadoras e contadores de histórias. Ao que tudo indica, entretanto, não existe embasamento nenhum que correlacione magia em indivíduos sem ligações diretas com bruxos com qualquer tipo de “roubo” de magia de outros bruxos. 

Um vinco apareceu na testa de Harry Potter.

— Reprimir a magia de alguém? Como assim? - Ele parecia impressionado. 

Hermione tentou resgatar alguma informação de sua mente.

— Pode ter sido na pior fase da Caça às Bruxas, para evitar que crianças sem controle da magia expusessem a comunidade. - Deu de ombros, incerta.

— Mais uma vez, magia das trevas dando as caras — apontou Ronald. 

Hermione não pareceu concordar, mas voltou-se para o livro.

Para além disso, as pesquisas antrobruxológicas cada vez mais demonstram que a história da manifestação da magia haveria de ter se iniciado através dos seres mágicos - distintos de bruxas e bruxos por serem essencialmente feitos da magia -, e que o gradual exercício da magia por humanos estaria diretamente relacionado a esses seres. A magia, quando nos afundamos nas histórias, é muito mais profunda do que o que aprendemos, mesmo nas escolas de feitiçaria. Espero que vocês possam viajar comigo, como se estivéssemos ao pé do meu caldeirão. Com amor, M. Adsumberg. 

Ela pausou a fala, e virou a página. Os três trocaram olhares, e Hermione engoliu em seco, mesmo já tendo folheado o livro antes. Parecia pressentir algo, mas o conteúdo de seu pressentimento lhe era desconhecido.

 — Primeiro capítulo: A Filha de Cailleach. 

 

 


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado! Me contem tudo aí embaixo nos comentários, viu?
CURIOSIDADES:
* Morrígan Adsumberg: o nome Morrígan vem da deusa celta/região da grã-bretanha considerada Senhora da Morte, Patrona das Bruxas e Grande Rainha. Já Adsumberg foi um sobrenome que inventei que é a junção de duas palavras que falho em me lembrar do signficado! Desculpa aê por isso!
* Os contos de Beedle, O Bardo é um livro de histórias infantis, deixado postumamente para Hermione por Dumbledore. É nele que O Conto dos Três Irmãos está, além de vários outros contos muito interessantes.



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