Modus Operandi: Dias Negros de Ocultgard escrita por Nemo, WSU


Capítulo 4
Convite ao Desespero


Notas iniciais do capítulo

Olá! E sim temos um capitulo novo! Agradeço muito aos que estão acompanhando, e pra quem começou agora, sinta-se em casa ♥



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/777242/chapter/4

Algumas escolhas nem sempre conduzem a um final feliz, e por vezes sequer há escolhas”. — Guardyhan, Deus protetor de Ocultgard.

 

 

509, nas profundezas do bosque

 

— Você está muito lenta hoje, leu até tarde foi? — indagou uma voz masculina

— Sim, princípios básicos da vida. — respondeu Hadyle com a guarda em alta.

— Achou enriquecedor?

— Um pouco, mas a hipótese que todos nós viemos da água é meio sem... — A garota foi interrompida com o avanço súbito de seu mestre.

Hadyle, treinava com Ling, desde os doze, essa oportunidade foi oferecida tanto por seu pai, quanto por Ling. O motivo dela ter aceito? Desconfio que gostasse da ideia de poder chutar os moleques que a incomodavam.

Desviou de um soco direto e contra-atacou puxando o punho do mestre, enquanto se preparava para dar uma joelhada na virilha, Ling, percebendo a intenção bloqueou virando um pouco a cintura e colocando sua perna na frente, logo depois da colisão, ele avançou novamente, Hadyle, saltou para trás.

— Tentando me pegar desprevenida, mestre? — indagou ela, enquanto fugia pela mata de pinheiros.

— Bom tempo de reação, mas você ainda pecou numa coisa.

— E no que seria?

— Você é previsível.

Quando a moça deu por si, algo a pegou e a levou para o alto, ficando suspensa em meio a folhas. Uma rede? Maldição.

— Você é fácil de ler, sabia que fugiria e ainda mais para este lado, você sempre foge para onde há visibilidade.

— O que posso dizer? Você me ensinou a me defender, bater e correr... sou ótima em correr. — respondeu ela sorrindo marota. — “Nunca lute contra um inimigo que não possa vencer”.

— Exato, mas se o inimigo souber te ler enquanto foge é algo totalmente inútil. — respondeu o homem baixinho e de olhos puxados. — Outro defeito que tem, é que não sente o ambiente enquanto corre.

— Mas você mesmo me disse que preciso de concentração, e eu não consigo fazer isso enquanto fujo de um perseguidor.

— Então pode se considerar morta. — Ele cortou a corda que a suspendia, logo tudo o que pode se ouvir foi um grito e um baque surdo.

— Você podia pelo menos ter deixado umas folhas para amortecer... — reclamou ela,  tentando se levantar.

— Através da dor o aprendizado se intensifica. — rebateu ele numa postura sábia.

— Pois eu acho que você está gostando disso... — disse ela colocando a mão sobre a dolorida coxa esquerda.

— Naturalmente. — Ele sorriu e lhe estendeu a mão. Ling, usava vestes de camponês, com um chapéu de palha trançada.

Hadyle, agora secava seus cabelos com um pano branco desbotado. Após tanto treino, decidiu se banhar num riacho ali por perto, tinha suado bastante em suas correrias pela mata.

— Mestre, o senhor acredita em qual Deus?

— Eu acredito em todos eles. — respondeu ele impassível.

— Digo, a qual deles o senhor devota mais fé? Eu creio que todos nós temos algum favorito…

— Warny, a protetora do meu povo.

— Deusa dos ventos? O que pode me dizer sobre ela?

— Bem, ela rege as grandes montanhas do norte, é um ser iluminado e gentil... Ao menos é o que dizem as lendas, nunca fui muito religioso ou estudioso nessas partes. — respondeu ele pensativo. — Você crê em Karn?

— Não, não recebi uma educação religiosa como os outros, meus pais nunca me disseram em quem deveria acreditar, hoje me questiono se deveria acreditar em algum deles... ou, se realmente existem.

— Tome cuidado com esses pensamentos. São perigosos, especialmente para os Karnadyanos, eles te enforcariam ou marcariam por dizer algo assim, mesmo que seja, apenas uma opinião.

A garota concordou com a cabeça, chateada e ao mesmo amedrontada.

— Tudo bem, você não precisa acreditar, ou ter uma fé. — tranquilizou ele, colocando a mão sobre seu ombro, em um gesto de conforto, queria seu bem como uma filha. — Mas acredite pelo menos nisso, monstros são reais e surgem em todos os formatos, tome cuidado.

 

 

 

Mansão dos Selat, biblioteca

 

— O que está lendo? — questionou a jovem Rosye para sua irmã.

— É um livro sobre lendas, coisas do gosto popular. — respondeu Hadyle sem muito apreço — Mas eu gostaria de algo novo, estou cansada de ler as mesmas histórias.

— Por que não pede um novo ao papai? — questionou a menina se encostando em uma das várias estantes do cômodo, tinha crescido, seus loiros cabelos estavam tão grandes quanto os de sua mãe.

— Porque ele não me daria, não gosta de me ver lendo coisas assim. — respondeu ela pousando o livro sobre a escrivaninha.

Rosye, se aproximou e puxou a gaveta ao lado de sua irmã, e desta vez ela se abriu. Fato que Hadyle, a princípio estranhou, afinal seu pai guardava documentos de suma importância ali, sempre estava trancada.

Na certa, esqueceu de fechar quando saiu para ir à cidade. Ao fitar o conteúdo se deparou com muitos papéis, Rosye, remexeu-os em busca de algo interessante, mas tudo o que encontrou foi um livro pequeno, como um diário, sua capa era de couro preto. Ainda que soubesse ler, achou o livro sem gravuras muito sem graça, preferindo o estender a sua irmã, que em sua ânsia por conhecimento leu em voz alta:

— Lendas esquecidas de Ocultgard por Redav.

Vislumbrou o índice, desta vez lendo em pensamento: O Príncipe da Tormenta, O Deus Indigno, O Comandante da Luz, O Fantasma do Reino... O Guardião do Ermo, e Aquele que não jaz morto ou vivo.

Eu não imaginava que meu pai gostasse tanto de Ocultismo... se bem que alguns nomes são interessantes mesmo.

— Estou com sono. — disse a menor bocejando.

— Então vamos tirar um cochilo. — respondeu a mãe em tom alegre, adentrando no recinto.

Eu estou muito morta.  Pensou a garota ocultando o rosto por trás do livro. Cath, apenas olhou para ela, não xingou e nem esbravejou como outrora. Essa garota vive nos livros! Mas é melhor assim, ela será brilhante, tanto quanto o pai.

Cath deu um breve sorriso e levou Rosye nos braços, e balançando de um lado para o outro, a menina ria por aquela divertida situação

Hadyle, retomou: Vejamos, o príncipe da tormenta, Alveus.

“Sua data de nascimento é desconhecida, o que se sabe é que foi o mais poderoso guerreiro da ordem Guardiã. Os registros informam que atuou por uma década. Alveus detinha atributos anormais para um humano, tudo nele era aprimorado, sua força, sua velocidade, agilidade, resistência e recuperação. Ademais sabia utilizar boa parte das armas. Os relatos informam que ele matou uma dúzia de Gigantes de gelo. ”

Certo, agora o livro está fantasioso demais, todo mundo sabe que é impossível uma pessoa só bater de frente com um gigante, imagine uma dúzia.

“Alveus, foi o melhor de seu tempo, lutou em incontáveis batalhas, até desaparecer completamente, alguns dizem que foi morto em combate, outros que saiu da vida de Guardião, e há aqueles que acreditam que ele se desentendeu com a ordem, sendo punido com a morte”.

“Infelizmente, os registros e relatos que temos são escassos, imagino que a tendência é que este guerreiro que tanto lutou por nós caia no campo de lendas urbanas e até seja completamente esquecido. É quase como se ele fosse apagado da história, ou quem sabe a história queira se ver livre dele. ”

Os olhos de Hadyle, percorreram todos os títulos, alguns eram mais ricos do que outros em descrições e com certeza lhe chamavam atenção. A impressão de mera fantasia se esvaia aos poucos e a crença de que tudo aquilo estava interligado se fortificava:

“A mais de um século, foram criados os primeiros Deuses avulsos, Alayhin o caminhante, e ******, o justo. ”

““******, seduzido pelo poder e desacreditado de sua função, espalhou sangue e desgraça pelos mortais que supostamente deveria proteger. Outro, foi criado para proteger o mundo dele, Guardyhan. ”

Os nomes do Indigno, estão rasurados, porque o autor faria isso? Ela ficou intrigada.

“Os poucos que viram a batalha, talvez a única luta entre Deuses em Ocultgard, a descrevem como monstruosa, ou mesmo titânica. Ao contrário do que se espera, Guardyhan foi sobrepujado, mas de alguma forma acabou vencendo e perfurando seu peito com uma espada misteriosa. O corpo do indigno caiu num abismo. Nunca foi encontrado”

Certo, apesar da falta de fontes, faz sentido. Esse foi o primeiro erro, começou a acreditar.

A medida que ia lendo, seus horizontes se abriam, ela começava a se questionar, se não haveria de fato algo divino ali? E algo abominável ao mesmo tempo. Chegando na última história, ela se defrontou com um mísero verso:

A todos os reinos ele visita

E a todas as almas ele devora.

Nem o audaz guerreiro e nem o mais rígido feiticeiro

Lhe causam o mínimo de desespero.

É Imortal e constante, por isso sempre existe conflitante.

Outrora o justo, agora injusto.

O horror de ****** vive.”

Hadyle, em sua curiosidade nem se deu ao trabalho de ler o resto, tinha uma suspeita. Ela esfregou as palavras censuradas por tinta, com cuidado, ao ponto da cor negra se desvanecer e o nome ser possível de ler.

— Imortus? Ele é o Deus Indigno?

Foi então que um calafrio gélido percorreu seu corpo, quando seus olhos bateram no restante do verso:

“Nunca use seu nome, seja o que estiver fazendo

Pois se o fizer, ele olhará para você.”

 

Ela fechou o livro de súbito e o engavetou em um frenético pensamento: É só uma história, é só uma história, não é real.

Era tarde demais, pois tinha acreditado, tinha dito esse nome com sentimentos no coração, e sabia disso inconscientemente, um sentimento de agonia foi se apossando da garota, tudo foi ficando mais escuro, e o ar abafado e quente.

Um fedor pútrido começou a emanar do cômodo, tão pestilento que o estômago da jovem embrulhou, mas o medo era maior do que o enjoo, correu como nunca, enquanto toda a luz a sua volta desaparecia mais e mais, até restar apenas uma atmosfera semivisível, ao chegar na sala, se aproximou da maçaneta e puxou, trancada. Tentou gritar, mas sua voz não saia, como se algo se fechasse em torno de sua garganta.

Eu deixei a minha janela aberta. Pensou ela, subindo freneticamente as escadas, mas ao perpassar o quarto de sua irmã, encontrou ela e sua mãe adormecidas na cama, seus semblantes estavam serenos, estavam abraçadas, a garota se aproximou e tentou acordá-las, chacoalhando ambas, chegou até mesmo a choramingar, e a implorar para que acordassem, até o assoalho da escada ranger, formando duas passadas de um ser grande e lento.

Uma mão retalhada se apoiou no batente da porta, ossos e carne se confundiam numa mistura podre, as botas pesadas e enlameadas por um líquido quente e viscoso avançavam e o coração de Hadyle parecia querer saltar para fora, a tontura a tomava aos poucos, assistindo o Indigno se aproximar de sua mãe e irmã, ambas alheias ao perigo. Ficou em frente ao chão da cama, local onde, ela se encontrava.

Se aproximou da cama e se inclinou em direção a mãe e filha colocando suas mãos sobre ambas, essa foi a impressão que Hadyle teve, mas talvez a realidade fosse mais mórbida, principalmente quando ouviu seus gritos de agonia e dor, e uma substância quente perpassou a cama caindo sobre o rosto da jovem, que prontamente reconheceu o cheiro férreo de sangue. Ao virar a cabeça para o lado, viu a mão cadavérica se abaixando até tocar o assoalho e rumar lentamente em sua direção, chegando a poucos centímetros de seu rosto.

— Guardyhan! — Ela gritou, um grito de desespero, permeado por medo e ódio. Em sua mente reclusa, buscou a única proteção que poderia dispor.

A mão começou a tremer, e então recuou. Todo o cenário parecia se desinfetar daquela presença infernal, mas não sem a odiosa promessa, da uma cavernosa voz enraivecida:

—  Pode ficar com os restos por hora, mas logo… será a sua vez, Hadyle Selat.

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Negócio ficou meio capirotico né? Ainda assim, espero que tenham gostado, tentei dar um toque de terror, mas não tenho muita experiência no gênero. Contudo, todavia e entretanto, se acham que posso melhorar, ou dar atenção a algum outro ponto, deem seu parecer ^ ^



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Modus Operandi: Dias Negros de Ocultgard" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.