Protocolo - Bebê Aranha escrita por Pixel


Capítulo 20
Nem Tudo é Perfeito


Notas iniciais do capítulo

Atenção: Essa capítulo vai abranger temas fortes, que você talvez tenha alguma sensibilidade. Se esse for o caso, eu realmente recomendo que não leia. Ou leia por sua própria conta e risco

Obrigada;

O caso de Catherine White é completamente fictício.

~~ Boa Leitura



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 O sol estava brilhando a cima da sua cabeça; tornava a camiseta preta simplesmente insuportável, e apesar de Peter estar se sentindo um pouco cansado e nojento, ele ainda tinha isso pra fazer. 

 Olhar para o prédio a cima da sua cabeça o deixou levemente desconfortável. É claro que ele sabia que Gwen era de uma classe mais elevada, mas ele não esperava seguir o endereço no papel e acabar em frente a um condomínio de luxo em Manhattan. Particularmente, Peter não estava se sentindo muito confortável com isso — era diferente de estar na casa de Ned, por mais que Gwen ainda fosse uma grande amiga.

 Se tudo isso estivesse acontecendo a alguns anos atrás, ele diria que ambos são de classes diferentes demais para sequer pensarem em andar juntos — ele provavelmente ficaria extremamente desconfortável em apenas estar no mesmo cômodo que Gwen —, mas hoje isso seria uma mentira. Pelo menos em parte.

 Não foi até o momento que Peter percebeu que ele é um filho de um bilionário, e nem ao menos age como um. Ele estava completamente desconexo com esse mundo.

 Seu dia tinha começado cedo demais para um adolescente normal em um sábado. Peter tinha ficado até tarde com seu pai, Pepper e Rhodey na sala de estar apenas jogando conversa fora — e também tirando um monte de fotos sem sentidos dos adultos enquanto eles estavam distraídos —, até que o sono o atingiu e ele precisou se despedir. Apesar disso, Peter ainda acordou muito cedo.

 Justamente com uma mensagem da Gwen:

 “Espero que possa vir antes do almoço. Tenho hora extra no laboratório hoje J”

 Se fosse em qualquer outra situação, Peter provavelmente não teria acordado com o simples tremor do celular, mas como era uma mensagem relativamente importante, ele acabou de pé antes mesmo das oito da manhã. Ele estava com sono, mas se viu incapaz de voltar para a cama depois disso.

 Quando eram nove horas, ele já estava pronto para sair — optou pela roupa mais simples que ele poderia encontrar, achando que talvez Gwen não fosse se importar com a forma como ele se vestia —, mas antes passou na cozinha para cumprimentar Tony e Pepper.

 Apenas para encontrar ambos sentados no sofá, parecendo a espera de alguém.

 — É algo a ver com Thor? — Peter perguntou pouco antes do elevador se abrir. Ele estava preocupado com a forma como os ombros de Tony estavam tensos, mesmo que Pepper estivesse logo ali do seu lado, apertando sua mão com carinho evidente. Essa não era uma visão muito normal do bilionário.

 Sua voz pareceu capitar a atenção de Tony, que apenas franziu os lábios em resposta.

 — Não precisa se preocupar — Pepper foi quem respondeu, chamando a atenção de Peter para si. Ela não parecia tão tensa quanto Tony, mas estava igualmente apreensiva. Apenas a forma como ela apertava a mão do bilionário era uma dica de que o dia não estava indo muito bem. Isso fez a garganta de Peter fechar em preocupação. — Tony e eu só estamos esperando uma pessoa

 Peter se sentiu levemente doente com essa frase, por algum motivo — havia algo estranho no ar, como um peso a mais. Seu sentido aranha zumbiu levemente na base do pescoço, fazendo os pelos do seu corpo se arrepiarem, e no mesmo instante ele considerou enviar uma mensagem para Gwen e adiar esse encontro de estudos. Parecia que era mais importante que ele ficasse ali em vez de sair.

 Peter se lembrou do vídeo que viu ontem, da reportagem, e se sentiu doente. Ele realmente não queria que Tony passasse por mais nenhum tipo de problema, mas não era uma coisa que ele pudesse controlar. E ele também não tinha certeza se apenas a sua presença seria capaz de ajudar.

 Além do mais, Gwen ficaria chateada. Peter não se importa tanto assim com as notas, e nem mesmo Tony colocou uma meta, então contanto que ele não ganhe um “F” tudo bem. Mas Gwen não é ele; Peter já a viu ficando maluca por causa de uma resenha. Bem... seu maior sonho também é ir pra Oxford, então um currículo perfeito é indispensável. É compreensível.

 Peter não podia simplesmente larga-la, era um trabalho em dois. Ele podia fazer esse sacrifício.

 As portas do elevador se abriram, mas Peter não entrou nele de imediato. Em vez disso, ele deu meia volta, se esgueirando por trás do sofá apenas para abraçar Tony superficialmente. Foi um ato feito no impulso, e ele nem se deu conta do que estava fazendo até que sentiu os ombros do mais velho relaxarem com a sua presença. Peter fingiu não notar. Tony estava claramente precisando disso.

 Não foi o melhor abraço do mundo — nem chegou a ser um abraço de verdade —, mas foi o suficiente para elevar o ânimo do seu pai, e isso já foi uma conquista.

 Peter fez a mesma coisa com Pepper, que não se contentou com algo superficial e se levantou do sofá apenas para enrola-lo em seus braços. Ele precisou combater contra um sorriso, justamente porque tudo isso ainda era um pouco surreal.

 Peter nem ao menos sentia que merecia isso.

 — Volto antes das quatro — Foi o que ele disse antes de respirar fundo e se virar para o elevador.

 Happy não o trouxe até esse condomínio em Manhattan. Em vez disso, Peter simplesmente tomou o caminho mais longo; por diversos motivos. Ele ousou vestir o traje e sair em uma breve e rápida patrulha — o que deveria ser uma breve e rápida patrulha —, aproveitando a liberdade para testar sua mais nova câmera. Ele tirou fotos do Central Park do alto, do Carrossel e até mesmo daquele museu estranho.

 Não era o melhor jeito de se aventurar como fotografo, mas ele não se importou. A nova câmera que Rhodey lhe deu era incrível, e ele provavelmente a usaria durante um bom tempo.

 Peter ainda teve a oportunidade de fazer algo de útil. Como Homem-Aranha, claro. Quando finalmente se deu conta, já eram 11 horas.

 Felizmente, achar o endereço de Gwen não foi tão difícil.

 Ele passou pelo porteiro, tentando ignorar o fato de que estava em um prédio de luxo que definitivamente não era a Torre — ele já tinha se acostumado com aquele ambiente, e com os Vingadores ao redor as coisas não eram tão difíceis assim.

 Assim que o viu, o porteiro lhe lançou uma sobrancelha arqueada. Ele claramente estava cético. Peter esperava que não estivesse parecendo muito deslocado com o ambiente, mas ainda assim o jeans rasgado com uma aparência abatida e o cabelo bagunçado não lhe ajudavam em nada.

 Sua aventura também o deixou soado e com um cheiro levemente desagradável. Ele já fez uma nota mental para pegar um desodorante na próxima vez.

 — Eu estou subindo pro apartamento 2016 — Peter disse, tímido demais para seus próprios ouvidos. Ele passou os dedos pelos cabelos apenas para tentar arruma-los um pouco, mas não percebeu que isso apenas bagunçou as madeixas mais ainda.

 — Ah certo — O porteiro exclamou, a ruga em sua testa desaparecendo quando ele acenou em concordância. — Você deve ser o Parker, Gwen me avisou que você viria. Pode subir, vigésimo andar

 Peter exalou em puro alivio, acenando um pouco freneticamente. Ele se virou e praticamente correu para o elevador, entrando nele com um suspiro. Foi somente quando as portas se fecharam que ele tomou coragem para se olhar no espelho, percebendo o quanto sua pequena aventura tinha lhe deixado desgrenhado.

 Bem, não é como se ele pudesse fazer muita coisa. A máscara acabava com o seu cabelo.

 Ele teve alguns segundos para tentar se deixar um pouco mais apresentável antes das portas se abrirem e ele ser forçado a sair do elevador. Depois disso, encontrar o aparamento de Gwen não foi tão difícil e logo ele se viu apertando a campainha.

 Por quase 10 segundos Peter se encontrou apenas encarando seus tênis, que naquele momento pareciam ser a única coisa limpa e em ordem nele.

 Ele nem ao menos prestou atenção nos passos apresados dentro do apartamento; foi só quando a porta se abriu de uma forma um pouco abrupta demais que Peter levantou o olhar num pulo.

 Gwen foi quem abriu a porta, parecendo tão radiante como nunca. Ela ainda parecia a mesma, com aquele pequeno arco nos cabelos e um sorriso enorme no rosto. Peter nunca viu alguém tão feliz em vê-lo — talvez Tony já tivesse esse sentimento, mas ele certamente não sabe demonstra-lo como Gwen.

 — Pete! — Ela o cumprimentou, instantaneamente abrindo espaço para que ele entrasse no apartamento. Peter sorriu pra ela, acenando levemente sem ao menos perceber o quão tensos estavam seus ombros.

 Porém, somente a presença de uma amiga o fez relaxar.

 — Oi Gwen — Foi a única coisa que saiu da sua boca, ainda soando extremamente acanhado. Peter não sabia da onde vinha esse sentimento.

 Ele resolveu se aventurar para dentro com passos tímidos, deixando que Gwen fechasse a trás dele.

 Assim como todo o resto do prédio, o apartamento era limpo, bem arrumado e elegante. Por um momento Peter não pode desviar o olhar da decoração da sala de estar; tão simples, mas ainda assim a pessoa que decorou se importou em fazer com que as cortinas combinassem com os tapetes e os vasos de flores. Era luxuoso, mas ainda tinha um toque casual.

 O lugar não era excêntrico como Torre, em vez disso trazia um charme acolhedor.

 Peter soltou um suspiro, percebendo que talvez isso não fosse tão ruim.

 — Gwen? Seu amigo chegou? — Uma voz feminina perguntou, e Peter julgou que essa fosse a voz da mãe de Gwen. Para confirmar isso, a loira se virou para ele e sorriu, alcançando sua mão para puxa-lo para frente e para o resto do apartamento. Peter não a afastou, em vez disso a deixou guia-lo.

 — Sim, mãe!

 Apenas para lhe cumprimentar, a mãe de Gwen saiu de uma porta que Peter julgou ser a cozinha. Ela era loira assim como a filha, talvez em um tom um pouco mais escuro, mas seu sorriso e o tom dos seus olhos eram os mesmos que o da amiga — esboçavam hospitalidade.

 Peter sorriu involuntariamente, todo o ambiente o lembrando vagamente de casa — não a Torre, mas a sua outra casa, quando ainda era pequeno e morava com Mary e Richard.

 — Oi Peter — A mãe de Gwen não teve nenhum problema em invadir seu espaço pessoal e abraça-lo levemente. Peter apenas sorriu para isso, tentando combater a sensação de vergonha que rastejou pelo seu corpo.

 Ele não estava necessariamente cheiroso.

 — Seja bem-vindo — Ela sorriu pra ele, seus olhos então vagando brevemente para baixo para onde Gwen ainda estava agarrando sua mão. Isso só fez seu rubor se aprofundar, mas Peter não teve coragem de soltar a mão da loira.

 Essa não era uma boa primeira impressão, mas ele assumiu que Gwen já tinha falado um monte sobre ele para os pais. Peter não sabia se podia considerar isso como algo bom ou ruim.

 — Pode me chamar de Helen — Sra. Stacy disse, oferecendo mais um dos seus sorrisos acolhedores.

 Sua personalidade era bem parecida com a da May, e isso enviou uma onda de saudade para o seu corpo. Fazia algumas semanas que Peter não visitava seus tios, talvez ele pudesse passar lá para cumprimenta-los hoje.

 Sim, essa era definitivamente uma boa ideia.

 Houve um pequeno batuque na cozinha e Peter percebeu instantaneamente que havia mais uma pessoa no apartamento; o pai de Gwen, ele supôs, já que até hoje a loira nunca mencionou um irmão ou irmã.

 Peter ignorou a movimentação, em vez disso, ele simplesmente sorriu e acenou, parecendo tímido demais até mesmo para o seu próprio bem.

 — Prazer em conhece-la — Ele respondeu com um encolher de ombros e um breve aceno, soando um pouco educado demais para seus próprios ouvidos.

 — Fico feliz que Gwen finalmente tenha trazido um amigo pra casa — Sra. Stacy disse, lançando uma piscadela para ambos. Ela deu uma grande ênfase na palavra “Finalmente”.

 Peter sabia que Gwen não costumava ter muito amigos — ela ainda estava hesitante com os Perdedores —, então isso era compreensivo. Ao que tudo indica, Peter era seu primeiro amigo real.

 Gwen arfou ao seu lado, seu rosto se tornando vermelho como um tomate. Peter riu da sua reação, não entendo o porquê disso.

 Para a sua surpresa, Gwen avançou, se metendo entre ele e sua mãe, uma careta brava em seu rosto que fez com que os cantos dos seus olhos se enrugassem. Peter levantou uma sobrancelha para a reação tão abrupta.

 Era a primeira vez que Gwen mostrava o seu lado defensivo.

 — Mãe — Ele disse entre os dentes, puxando inconscientemente Peter para trás enquanto apertava sua mão um pouco mais forte. —  A gente já falou sobre isso

 Apesar da postura levemente agressiva, sra. Stacy não pareceu ser atingida por isso. Ela apenas riu e acenou, como se o estranha surto da filha não fosse grande coisa.

 — Que foi? Eu não posso ter esperanças? — Sra. Stacy perguntou, fingindo estar ofendida. Havia um brilho lúdico em seus olhos.

 Gwen não pareceu relaxar com isso, em vez disso, ela fez uma careta emburrada e se afastou, puxando Peter consigo. O jovem aranha não lutou, apenas deixou que Gwen o guiasse novamente pela casa.

 — A gente tem 3 páginas de exercícios pra resolver — Ela disse, não no seu tom animado usual, mas num tom irritado. Por algum motivo, ver Gwen assim fez Peter rir novamente. Não era todo dia que algo assim acontecia.

 Sem muitas opções, ele acenou para a sra. Stacy em uma breve despedida.

 — Devo colocar mais um lugar na mesa? — Uma voz masculina perguntou, tão lúdica quanto a voz da sra. Stacy; vinha diretamente da cozinha.

 Soou tão familiar que fez Peter arregalar os olhos, e então foi a sua vez de apertar a mão de Gwen, fazendo com que a loira parasse de andar e olhasse para ele um pouco apreensiva. Talvez Peter tivesse usado um pouco mais de força do que o necessário. Ele não conseguiu se importar com isso agora; seu coração pulou uma batida e ele se sentiu levemente em pânico.

 Peter sabia perfeitamente de quem era essa voz. Ele tinha uma boa memória para isso, ainda mais quando foi essa mesma voz que lhe deu um sermão enquanto ele estava algemado em uma cadeira fria em uma sala fria, praticamente faminto enquanto buscava uma forma de fugir e retornar as ruas.

 Peter gemeu internamente, admitindo pela primeira vez em messes que a Sorte dos Parker ainda estava nas suas costas. Quais eram as chances?

 Bem... 1 em 8 milhões.

 — Só se o Peter querer ficar — Gwen disse, se virando para ele um pouco rápido demais, o que fez com que os fios de cabelos loiros ricocheteassem pelos seus ombros. Ele engoliu em seco, sentindo seu coração começar a martelar no peito, tão alto que ele mesmo podia ouvir.

 Peter realmente queria soltar a mão de Gwen e correr para fora, talvez pular a janela e usar seus atiradores... ou a escada de incêndio. É, isso também servia.

 A única coisa que ele sabia é que não queria ficar aqui. Não agora.

 — Se tiver lugar... — Essa não era a resposta que ele queria a dar, e nem era mais prudente, mas ainda assim era a mais educada. Peter imaginou que a essa altura, isso era justamente o que importava.

 — Sempre tem lugar na Casa dos Stacy — A mesma voz de antes disse, e Peter teve chance apenas de endireitar os ombros; sua mochila praticamente se tornando um peso morto em suas costas.

 E então o capitão Stacy surgiu da cozinha.

 Peter nunca tinha visto um sorriso morrer tão rapidamente em toda a sua vida, sendo substituído instantaneamente por uma carranca profunda e que o deixou desconfortável. Não foi preciso muito além disso para fazer o jovem aranha ciente de que ele não era bem-vindo aqui, pelo menos não agora.

 — Parker — Capitão Stacy praticamente rosnou, fazendo Peter se encolher ao lado de Gwen. A amiga, por sua vez, lançou um olhar surpreso e irritado para o pai. Ela abriu a boca para responder, mas foi interrompida pelo próprio Peter.

 — Capitão Stacy — Peter acenou, oferecendo um pequeno e humilde sorriso. Não era muito, mas ele esperava que fosse o suficiente.

  A tensão no ar foi instantânea e pesava em seus ombros como chumbo; acabou completamente com a hospitalidade que antes enchia a sala e o humor de todos. Peter tentou se manter firme, mesmo quando Gwen começou a encara-lo com uma sobrancelha erguida; uma pergunta na ponta da língua.

 — Vocês se conhecem...?

 Talvez isso pudesse, sim, ser bem ruim.

...

 A assistente social chegou logo depois das 10 da manhã, quando Tony já estava começando lentamente a enlouquecer com a vista da sua própria sala de estar. Ele não tinha dormido muito bem por causa disso, já que as diversas possibilidades do que estava acontecendo passavam pela sua cabeça todas as vezes que ele fechava os olhos; era praticamente uma tortura.

 Se não fosse por Pepper, ele provavelmente teria passado a noite inteira acordado enfurnado no laboratório, tentando de todos as formas distrair a sua mente. Mas mesmo as pouquíssimas horas de sono não lhe ajudaram muito; Tony ainda estava ansioso e levemente assustado. A única coisa que ele podia fazer além de esperar era rezar internamente para que não fosse nada muito ruim.

 Mas esse não seria o caso, já que não havia motivos para a assistente social entrar em contato assim, do nada, se fosse algo pequeno. Tinha que ser importante.

 E esse era justamente o seu medo.

  — Se continuar fazendo essa careta, daqui a pouco você vai ter rugas — Pepper disse, dando um leve aperto reconfortante em suas mãos.

 Ambos tinham ficado um tempo ali no sofá depois do café da manhã, conversando. Pepper dando as atualizações sobre a Fundação Maria Stark; quem tinha confirmado presença, decoração e as instituições que se beneficiariam. Era um longo assunto, e apenas ouvi-la realmente acalmou seu coração.

 Ele estaria praticamente perdido senão fosse por Pepper ali, do seu lado, lhe dando um pouco de apoio em momentos como esse.

 Tony se encontrou rindo, um riso mais nasal do que vocal, mas ainda assim pareceu funcionar para aliviar a tensão em seu corpo. O dia mal tinha começado e ele já se sentia no limite.

 — Você está pegando o dia de folga? — Ele perguntou, uma tentativa quase frustrada de mudar de assunto pelo menos por uns segundos.

 Não era tão comum que Pepper ainda estivesse na Torre nesse horário, já que ela geralmente tem tanto trabalho pra fazer que nunca tira um momento de folga; nem nos fins de semana. Não que Tony estivesse reclamando, ele realmente ama apenas a presença dela, mas quando ela disse que ficaria para ouvir o que a assistente social tinha para disser, ele estranhou.

 — Estou pegando a semana de folga — Ela respondeu, se aproximando um pouco mais para poder enrolar um braço com o seu. Tony agradeceu silenciosamente a proximidade. — Achei que seria bom parar um pouco

 Então ela ficou ali, com ele, apenas esperando e jogando conversa fora. Foi reconfortante e de fato ajudou Tony a encarar as coisas de um jeito mais positivo.

 Mas tudo pareceu ir pro ralo quando Sexta-Feira anunciou a chegada da srta. Willians, que segundos depois saiu do elevador.

 Ela não estava vestida de um jeito elegante, bem pelo contrário, parecia estar cansada para se preocupar com a aparência. Exibia a típica postura de quem passou a noite em claro trabalhando, e isso só ficou mais evidente por causa das olheiras embaixo dos seus olhos castanhos.

 Pepper foi a primeira a se levantar para cumprimenta-la, sendo seguida por Tony, só que bem menos animado. Sua mente estava perturbada demais para ele sequer pensar em ser hospitaleiro; por isso, mais uma vez, agradeceu a existência de Pepper.

 Eles optaram pelo sofá, um lugar bem mais casual e confortável do que o balcão. Depois de servir uma caneca de café fumegante e algumas bolachas industrializadas, eles se sentaram para conversar. Aparentemente, o pequeno gesto hospitaleiro fez maravilhas para o ânimo da srta. Willians, que ainda parecia cansada, mas agora estava mais relaxada com o ambiente.

 — Me desculpa chegar assim sem um aviso antecipado — Ela disse assim que sentou no sofá, seu olhar vagando entre Tony e Pepper, sem saber quem deveria encarar.

 Em suas mãos estava uma pasta amarela grossa, mas aparentemente com apenas três folhas dentro; seus dedos estavam apertando tanto a pobre pasta que a mesma estava começando a se dobrar.

 Ela claramente estava nervosa. Era possível ver isso através da sua postura cansada e desleixada. Tony franziu os lábios, tendo a sensação de que essa conversa não seria agradável para ela também; talvez fosse algo bem mais profundo do que ele imaginou.

 Isso o fez engolir em seco, desejando outra caneca de café... talvez algo mais forte.

 Tony apenas se ajeitou em seu lugar ao lado de Pepper, justamente de frente para a assistente social, e com isso tentou botar uma cara um pouco mais relaxada, mesmo que fosse praticamente impossível.

 — Tudo bem, não se preocupe com isso — Foi Pepper quem respondeu, fazendo uma pequena tentativa de deixar o ambiente um pouco mais leve e casual. Ela parecia bem mais disposta a conversar do que Tony.

Mas uma vez, ele ficou grato por tê-la ao seu lado, e inconscientemente, alcançou sua mão novamente. Pepper não o afastou, em vez disso, deu boas-vindas ao leve toque.

 — O que é tão importante que senhorita não podia falar por telefone? — Tony perguntou, direto e talvez um pouco seco. Talvez tivesse soado um pouco rabugento, mas ele realmente não conseguia se importar. Ele queria que tudo isso acabasse logo; queria descobrir o que estava acontecendo e em que sentido isso afeta Peter.

 Seu tom sério o fez ganhar um olhar de desaprovação de Pepper.

— Certo — A assistente social se ajeitou no sofá, puxando a saia para baixo como se isso uma boa fonte de distração. Sua postura era ereta e perfeita, quase como a de uma bailarina. — Eu peço desde já um pouco de calma. Não quero que tirem conclusões precipitadas... digamos que os fatos são mais importantes aqui, mesmo que não tenha muitos

 — O que quer dizer? — Tony perguntou no impulso. Ele não pode deixar de imaginar a mesa de reuniões dos Vingadores, com todos os membros da equipe sentados ao redor enquanto ouviam os relatórios. Até mesmo essas reuniões pareciam ser mais leves e descontraídas do que essa.

 — Eu vou precisar dar um contexto antes sr. Stark, espero que não se importe em ouvir uma pequena história — Ela disse com um encolher de ombros, fazendo o que pareceu ser um enorme esforço apenas parar encarar Tony por mais do que meio segundo.

 Tony assentiu, mesmo que ainda tivesse suas dúvidas.

 Srta. Willians abriu a pasta e de dentro tirou uma única folha, tão fina que a luz passava por ela, evidenciando um texto. Ela balançou a cabeça, um olhar perdido em seu rosto enquanto encarava a folha por pouco mais de um segundo, ante de entrega-la a Tony.

 O bilionário ignorou a forma como suas mãos estavam tremendo, fazendo assim com que a folha também tremesse.

 Era uma espécie de um relatório, uma cópia. A tinta tinha escorrido um pouco, mas o texto ainda era legível. No canto superior esquerdo estava a foto de uma garota, uma jovem de pelo menos 21 anos. Não dava para ver muito bem as suas feições, mas ela parecia doente de alguma forma.

 Tony respirou fundo e tentou se concentrar numa breve leitura, mas desistiu antes mesmo de terminar a primeira frase.

 — O Serviço Social sempre tenta colocar as crianças órfãs em um bom lar temporário, é o nosso dever — A assistente social começou, parecendo ter um pouco de dificuldade em falar. Sua voz estava dura, seca, e por um momento Tony considerou oferece-la um copo da água, mas então lembrou que pra isso teria que adiar, por míseros segundos, essa conversa. —... Quando não são adotadas, elas ficam com um guardião até completarem a maioridade. Peço por favor que entendam, esse não é um trabalho fácil

 Isso fez tanto Tony quanto Pepper desviarem o olhar do registro — mesmo que ambos não estivessem lendo — e encarar a srta. Willians, que não estava olhando para eles. Seus ombros estavam tensos, trêmulos, e ela estava apertando as mãos juntas tão fortemente que os nódulos dos dedos estavam brancos.

 Ela parecia acabada. De certa forma, triste.

 — São milhares de crianças — Ela suspirou, fazendo o que pareceu ser um enorme esforço para levantar o olhar e encara-los. — Só em janeiro desse ano tivemos mais de 30 crianças órfãs precisando de um lar, nem todas conseguiram um guardião. A maioria foi parar em algum orfanato. A demanda é muito grande, por isso nem sempre nós... investigamos de forma correta o guardião ou tutor

 Ela engoliu em seco, ficando pálida como se tivesse visto um fantasma.

 Essa reação fez algo para Tony; deixou sua garganta seca e ele se sentiu doente. É claro que existiam esse tipo de problemas, mas ele gostava de imaginar que essas crianças sempre acabavam em boas mãos. Bem, não era uma realidade que tinha o afetado, até então.

 — Essa garota no registro se chama Catherine White — Srta. Willians disse, quase citando uma espécie de discurso. Ela gesticulou brevemente para o papel, uma expressão triste gravada em seu rosto.

 Tony abaixou os olhos para o papel novamente, percebendo pela primeira vez que ele era a cópia de um registro médico. Um longo registro médico.

 No canto superior esquerdo estava uma foto de uma garota, não era uma das melhoras já que a impressão não ajudava em nada. Tony só podia identificar alguns detalhes de suas feições; como as olheiras embaixo dos olhos, o rosto pálido e esgueiro e o cansaço em seus ombros. Ela era jovem, mas a falta de brilho em seus olhos a deixava bem mais velha.

 Nem mesmo o cabelo ruivo parecia estar cuidado. Estava muito curto, feito de qualquer jeito, sem um corte em especifico. Isso fez com que os fios se espalhassem por todos os lados.

 — Ela ficou órfã em 2004, quando sua mãe se suicidou — Srta. Willians explicou e ficou mais do que claro em seus trejeitos que ela não estava confortável em contar essa história. Tony imaginou que ela uma vez conheceu a garota, e se esse fosse o caso, então essa conversa estava sendo mais pesada ainda. — Catherine tinha 10 anos na época. Como não haviam parentes vivos, então nós a acolhemos...

 Tony não sabia o que dizer. Em parte, ele queria perguntar o porquê de ela estar lhe contando tudo isso. Parecia tão distante da sua realidade, algo que ele nunca teve acessos, e foi preciso se lembrar de que Peter passou pelo Serviço Social para que ele mantivesse a boca fechada e apenas ouvisse.

 — Steven Westcott a levou sob sua guarda — Isso chamou sua atenção, e também enviou uma espécie de mal-estar para seu corpo. Era como um enjoou e o atingiu em cheio.

 Westcott era quem tinha ficado com Peter, e pelo rumo desta conversa, as coisas não terminaram muito bem para Catherine também.

 As palavras tinham saído de sua boca antes mesmo que ele pudesse notar:

 — O mesmo tutor do Peter — Tony murmurou, alto o suficiente para que as duas mulheres pudessem ouvir com clareza.

 A assistente social parou por um momento, levemente surpresa. Sua boca se contorceu em uma careta e seus olhos brilharam, quase como se estivessem cheios de lágrimas — ela parecia no limite, prestes a se derramar em lágrimas. Depois de alguns segundos encarando suas mãos, ela acenou em concordância.

 Seu olhar estava distante.

 — Exato — Ela respirou fundo, como se isso fosse algum tipo de apoio. Por fim, se reclinou no sofá, fazendo novamente um esforço para encarar Tony e Pepper sem vacilar. — Algumas pessoas fazem isso, levam mais de uma criança na esperança de ajudar o máximo que puder. Já conheci famílias que cuidavam até mesmo de 7 crianças em diferentes idades e ao mesmo tempo. Acontece, e é uma atitude louvável. Westcott não entra nessa lista, claro, mas ele já cuidou de cinco crianças desde 1980, fora Peter. Catherine foi a última criança antes dele

 — Eu sinto que algo grave aconteceu... — Pepper disse, botando para fora o mesmo pensamento que Tony estava tendo. Ela enrolou seus dedos com os de Tony. O ato foi reconfortante, forte o suficiente para servir de apoio.

 — Você está certa srta. Potts — Srta. Willians disse, perdendo completamente a postura ereta de antes. Ela deixou que seus ombros caíssem e desviou o olhar, parecendo triste.

 Não. Desolada. Talvez essa fosse a palavra para descreve-la.

 — Quando tinha 15 anos, em 2009, Catherine pulou de cima do terraço da escola na hora do almoço

 Tony sentiu como se tivesse levado um choque violento — como se Thor simplesmente decidisse tacar aquele martelo nele. Sua boca ficou seca e ele se encontrou completamente sem palavras, encarando agora o chão com firmeza. A sensação de enjoou se intensificou, e ele precisou engolir a bile de volta.

 O que tinha acontecido com essa pobre garota? O que tinha levado ela a fazer algo assim? Era terrível até mesmo imaginar.

 Tony se sentiu doente; ele realmente precisava de um pouco de ar agora.

 — Ela... morreu? — Pepper perguntou, completamente horrorizada. Tony apertou sua mão, tentando transmitir um pouco de conforto, mesmo quando ele estava assustado. Conhecendo Pepper, ela estava bem pior.

 — Não — A assistente social disse, franzindo os lábios em uma linha fina. Por algum motivo não teve nada de reconfortante em suas palavras. — Ela sobreviveu a queda, mas foi levada para um sanatório, diagnosticada com problemas mentais — Srta. Willians suspirou. — Vocês devem estar se perguntando o porquê de eu estar contando essa história, mas eu quero apenas que entendam o que veio a seguir. Catherine ainda está se recuperando de uma depressão profunda e só recentemente ela voltou a conversar sem ter nenhum tipo de ataque de pânico. Ela passou os últimos anos com mudez seletiva

 Srta. Willians batucou os dedos na pasta amarela, parecendo pensativa. Ela encarou a pasta com fervor, como se estivesse decidindo o que fazer a seguir. Por fim, a estendeu para Tony com as mãos trêmulas. Tony aceitou, mas não fez nenhum movimento para abrir a pasta, em vez disso a entregou para Pepper — que tinha mais coragem do que ele.

 — Há alguns messes, Catherine conseguiu conversar com uma psicóloga sobre o que aconteceu — Ela engoliu em seco, desviando o olhar novamente.  — Ela disse muitas coisas. Está tudo aí nessa pasta, imaginei que vocês gostariam de ter algum tipo de prova. Quero que entendam que não foi algo fácil, levou anos até que ela resolvesse se abrir — Outra pausa, essa bem mais longa do que todas as anteriores. — Catherine revelou que... sofreu abusos sexuais de Westcott

 Pepper engasgou ao seu lado, soltando a pasta com se a mesma estivesse pegando fogo. Tony, diferente dela, precisou de mais alguns segundos para entender o que havia sido dito.

 — O quê? — Ambos, Pepper e Tony, perguntaram ao mesmo tempo. Tony num tom bem mais urgente e assustado.

 Em algum momento sua respiração engatou e sua visão ficou vermelha. Isso ofuscou todos os seus outros sentidos. A horrenda percepção disso tudo caiu sobre ele como um balde de água gelada, enviando arrepios por todo seu corpo.

 Tony podia jurar que o mundo ao seu redor simplesmente congelou. O silêncio doloroso pairou sob a sala, sem nenhum outro som além das respirações de seus ocupantes para quebra-lo.

 Pepper havia soltado sua mão no susto, cobrindo agora sua boca como se isso fosse impedi-la de gritar — mesmo que todos seu corpo estivesse tremendo, e Tony podia sentir isso. O bilionário não tinha esse autocontrole.

 — Esse filho da puta estava cuidando do Peter — Ele disse, uma realização dolorosa recaindo sobre ele.

 Não. Isso não poderia estar acontecendo. Tony não podia imaginar algo assim. Era... assustador.

 Seu filho tinha ficado com esse homem; dormido sob o mesmo teto, comendo na mesma mesa durante quase 2 anos até que... fugiu. Peter fugiu porque percebeu que aquele lugar não era saudável pra ele, fugiu porque alguma coisa deveria ter acontecido — alguma coisa aconteceu, e foi tão grave que Peter, com apenas 12 anos, preferiu as ruas.

 Seu corpo inteiro gelou com essa percepção; Peter esteve tão perto de um monstro, vulnerável, e Tony não pode fazer nada.

 Não pode fazer nada porque nem ao menos sabia que seu filho ainda estava vivo.

 Srta. Willians levantou ambas as mãos, um pedido fútil para que Tony se acalmasse. Naquele ponto, o desespero e a raiva deviam estar mais do que claro em sua expressão, já que até mesmo Pepper estava olhando pra ele com os olhos arregalados. Não havia autocontrole aqui, Tony não dominava essa virtude, por isso o pedido silencioso de ambas não teve nenhum resultado.

 — Nós não tínhamos como confirmar isso, é uma acusação muito forte e Catherine não estava sendo levada a sério. Ela ainda tem certos problemas — Srta. Willians suspirou mais uma vez, levantando uma mão para massagear as têmporas.

 De repente, Tony não podia mais ficar sentado, por isso ele se levantou com um sobressalto, seus olhos encarando qualquer coisa que não fosse Pepper e nem a assistente social. Ele estava perdido, assustado, seu coração martelando em seu peito desconfortavelmente. Ele se viu vagando pela sala, completamente sem rumo.

 — Então os oficiais não levaram as acusações a sério — Srta. Willians estava encarando o chão, não olhava nem para Tony e nem para Pepper. Ela parecia a beira das lágrimas, e se nada fosse feito, ela com certeza começaria a chorar ali mesmo. — Mas a psicóloga, Yasmin Hall, resolveu investigar por conta própria — Ela fungou, sua voz falhando mais uma vez. Foi preciso que pigarreasse para voltar a falar. — Ela entrou em contato comigo e pediu os nomes das outras 4 crianças que Westcott cuidou.

 Houve uma pausa, mas Tony sentiu que não haviam notícias boas aqui.

 Ele parrou se rondar ao redor da sala e parou atrás do sofá, se apoiando nas costas do mesmo. Seu olhar firmemente preso nas almofadas. Ele estava apenas vagamente consciente de que a assistente social estava falando.

 — Apenas um deles respondeu... e... ele confirmou que também sofreu abusos

 Tony se exaltou, perdendo qualquer tipo de vestígio de calma e autocontrole. Algo na sua mente clicou e ele se afastou do sofá, sentindo todos os nervos do seu corpo irem a mil. Ele estava a literalmente um passo de se virar e ir direto pro laboratório.

 Ele podia hackear as delegacias e encontrar o buraco onde esse sujeito tinha sido colocado — ele podia muito bem fazer isso, e ninguém o impediria —; ele procuraria até os confins da Terra por um Steven Westcott e quando acha-lo fazer com que ele se arrependa do dia em que nasceu.

 Esse parecia ser um bom plano, um plano perfeito. Tony podia fazer isso, nada o impedia... a não ser a mãos de Pepper em sua camisa o mantendo firme e parado a onde estava.

 Tony estava tão perdido em seus pensamentos homicidas que nem ao menos percebeu que Pepper havia se levantado e que agora estava ao seu lado, o segurando firmemente no lugar. Ela o conhecia bem o suficiente, provavelmente já sabia o que estava se passando na sua cabeça.

 — Alguma coisa está sendo feita sobre isso? — Pepper perguntou, segurando os ombros de Tony firmemente. Tanto que suas unhas cravaram em sua pele mesmo por cima de toda a roupa. Tony fechou os olhos e se forçou a contar até 10, uma tentativa fútil de se acalmar.

 — Certo... sobre isso — A assistente social fechou os olhos, parecendo precisar de alguns segundos para se acalmar. Ela então se levantou e se aproximou com passos lentos e cauteloso do casal. — A polícia pediu um mandado de prisão. Ele vai ser investigado e as outras 3 crianças estão sendo procuradas para dar testemunho. Não queremos envolveu Peter nisso, ele ainda é muito jovem e... falar sobre isso pode leva um tempo. Catherine demorou 8 anos

 Tony estreitou os olhos, odiando a forma como a assistente social estava falando. Como se fosse uma prova concreta que seu filho passou por isso.

 — Você está assumindo que... — Seu tom era sugestivo, e não foi preciso terminar a frase para que a ideia fosse transmitida.

 A assistente social ficou sem reação. Ela abraçou sua bolsa e encarou o chão por longos segundos antes de criar coragem e falar novamente.

 — As chances são bem grandes sr. Stark — Ela disse, um lampejo de dor passando pelos seus olhos. — Eu sei que isso pode ser um pouco assustador de se imaginar, mas pode muito bem acontecer. E tudo indica que seja verdade

 Tony se afastou de Pepper, literalmente arrancando seus ombros de seu aperto mortal.

 — Onde Westcott está agora? — Ele perguntou, com um rosnado no fundo da garganta. Suas mãos estavam coçando com a necessidade de socar alguém.

 A pergunta a fez congelar, ombros voltando a se tornarem rígidos como uma rocha. Seu rosto ficou branco, extinto de qualquer expressão. Srta. Willians molhou os lábios, hesitando em responde-lo.

 Tony percebeu instantaneamente que isso não era algo bom.

 — Desculpa dizer isso sr. Stark, mas Steven Westcott está foragido desde de quinta-feira — As palavras sairam dos seus lábios e o atingiram como um soco. Tony encarou a assistente social com os olhos arregalados, buscando em sua postura qualquer indicio de que isso era mentira.

 Não podia ser verdade! Como os policiais de Nova York poderiam ser tão incompetentes assim?

 — O quê? — Ele perguntou, soando ofegante.

 Novamente, Pepper o puxou para o lado, agora o prendendo pelo braço. Ela estava claramente tentando colocar um pouco de juízo em sua cabeça, mas tudo que Tony podia ver era vermelho — raiva ardente e penetrante, como fogo.

 — Não sabemos como, mas ele soube sobre a investigação e desapareceu — Srta. Willians disse, soando desesperada. Ela parecia derrotada, mas nem mesmo sua postura e desespero atingiram Tony. — Ninguém sabe se ele sequer está em Nova York. Mas não se preocupe — Ela deu um passo à frente, ganhando totalmente a sua atenção. Havia um olhar suplicante em suas feições, e a frase seguinte veio carregada com uma onda de emoções. — A polícia está procurando por ele em todo o país, logo, logo ele estará atrás das grades sr. Stark

 Tony exalou, sentindo a raiva se contorcer em seu corpo.

 — Isso não ajuda em nada

 A polícia não trouxe Peter de volta para ele, bem pelo contrário, deixou o garoto escapar e fugir para longe uma segunda vez. Tony teve que procura-lo; Tony criou forçar para vasculhar a cidade atrás do seu menino.

 Ao que tudo indica, ele teria que refazer isso, só que com um proposito bem diferente.

 — Tony... — Pepper chamou a sua atenção, percebendo que algo sombrio passava pela sua mente. — Nem pense nisso. Não é algo que os Vingadores devam lidar, deixe isso com a polícia — Seu tom era de alarme, mas Tony a ignorou.

 Ele já sabia o que ia fazer.

 — Eu sei que é difícil — A assistente social disse, dando um passo para trás e colocando uma certa distância entre eles. Seu olhar parecia perdido, e Tony soube naquele momento que ela não podia fazer nada para ajuda-los. — Nem todos os pais lidam muito bem com isso. E isso é algo que as crianças levam para o resto da vida — Ela fechou os olhos e engoliu em seco. — Peço para que tenham paciência com o Peter... e perguntar diretamente a ele sobre isso não vai ajudar... pressionar nunca é o caminho

 Tony queria correr. Peter nunca iria se abrir sobre isso com ele, o garoto mal fala sobre seus pesadelos.

 O bilionário arregalados os olhos diante desse pensamento, uma realização recaindo sobre ele. Os pesadelos. Eles devem ser sobre Westcott. E eles aterrorizam seu bambino; Tony viu isso de perto, viu a forma como Peter chorou e soluçou em seus braços enquanto ele estava ali, completamente impotente.

 Isso tinha sido causado por um filho da puta que agora estava solto em algum lugar da cidade.

 Tony precisava fazer alguma coisa, qualquer coisa.

 — Nós vamos cuidar dele — Pepper disse, soando um pouco distante, perdida em pensamentos. Ela estendeu a mão de Tony e enrolou seus dedos com os dele, deixando claro que ambos estavam juntos nisso. Foi reconfortante, enviou uma onda de calor para o seu corpo, mas Tony não podia sorrir para ela; não com essa nova informação em mente. — Juntos

 — Prometo mantê-los atualizados sobre isso — Srta. Willians disse, enfiando a mão no bolso da calça para tirar um papel. — Esse é o número da dra. Harley, ela é a melhor psicóloga do estado. Eu recomendo que vocês marquem algumas consultas, isso pode ajudar o Peter. Ele pode não falar abertamente sobre os abusos, mas uma ajuda indireta sempre é bem-vinda

 — Obrigada... por nos avisar e por tentar ajudar — Foi Pepper quem agradeceu, Tony ainda estava incapaz de falar qualquer coisa que não fosse uma avalanche de xingamentos.

 — De nada... eu só quero ajudar, e peço desculpas por tudo — Não havia mais nada a ser dito, não havia nenhuma informação útil que pudesse ajudá-lo a encontrar Westcott. Nada.

 Mas Tony podia trabalhar com o nada. Ele tinha Sexta-Feira, ela o ajudaria.

 Srta. Willians saiu da cobertura com os ombros caídos, parecendo abatida. Tony foi deixado para trás com Pepper, que assim que as portas do elevador se fecharam se virou para ele com uma expressão séria e profunda.

 — Nem pense nisso — Ela rosnou, um aviso claro em suas palavras.

 Tony não foi atingido.

 — Já pensei — Ele conseguiu, novamente, se afastar do seu aperto. Tony se virou e olhou diretamente para o celular abandonado em cima do balcão.

 Quanto mais cedo ele começasse melhor seria. Sexta-Feira não teria problemas em vasculhar a cidade atrás de um Steven Westcott; poderia levar um bom tempo, entretanto.

 — Tony — Pepper avançou na sua frente, alcançando o celular antes dele, o tirando do seu alcance. Tony precisou reprimir um rosnado; Pepper só estava tentando ajudar, mas ele não precisava de ajuda, ele podia lidar com isso. Ele podia resolver isso. — Não estamos falando do Loki ou de Ultron ou de qualquer outro vilão que você lutou, isso é um homem comum

 Tony respirou fundo. A última coisa que ele queria agora era uma briga com Pepper, mas isso parecia ser inevitável agora.

 — Não, isso é um monstro — Ele exclamou, tentando futilmente alcançar seu celular novamente, apenas para Pepper esconde-lo atrás das costas. — Um monstro solto na sociedade

 Ela se afastou, dando dois passos para trás e criando uma grande distância entre eles. Tony fechou os olhos e respirou fundo, tentando se acalmar.

 — Não. É um homem comum — Ela disse com força — uma pessoa comum como qualquer outra nessa Terra. Ele não tem duas cabeças e nem três braços. Você não pode jogar toda essa armada em cima dele

 Tony desistiu de tentar recuperar seu celular. A frustação começou a tomar conta do seu corpo, fazendo com que suas mãos começassem a tremer.

 — Posso e vou — Ele cuspiu, sentindo a ira dentro de si falar por ele. Pepper não tinha culpa, mas ela estava testando-o, e as coisas nunca acabam bem quando isso acontece. — Pepper, ele machucou o meu filho. O Peter. Só um monstro poderia fazer algo de ruim pro Peter, você o conhece, Peter é tão...

 — Precioso. Sim eu sei, ele é — Pepper concordou com um aceno frustrado. Ela claramente queria se aproximar de Tony; queria envolve-lo em um abraço e ser compreensiva, mas ambos sabiam que as coisas não estavam bem. Essa situação era avassaladora, e Tony podia explodir um míssil na cabeça de Westcott se ela não fizesse alguma coisa. — Um doce de criança. Mas Tony, tenha consciência e use esse seu cérebro gigante. Você acha que o Peter gostaria de descobrir que o pai dele, o único que resta, está caçando e tentando matar Westcott? Deixe isso com a policia

 — A polícia não trouxe o Peter pra mim, eu mesmo o achei — Tony exclamou, a raiva agora se dissipando e sendo transformada em outra coisa; uma espécie de agonia, um medo avassalador. Ele não podia descrever com palavras, apenas sentia que tudo ao seu redor estava desmoronando.

 E tudo que ele queria era que seu filho estivesse aqui agora.

 — Depois que a polícia entrou em contato! — Pepper argumentou. — Tony, por favor, não pense só em si mesmo, pense no Peter

 — É nele que eu estou pensando

 — Então pense de novo — A paciência tinha ido embora, até mesmo Pepper tinha um limite, e Tony havia acabado de cruza-lo. — Isso não vai ser bom pra ninguém, nem pra você e nem pra ele. Você tem muitas coisas para se preocupar agora

 De fato, ele tinha, muitas e muitas outras coisas, mas Peter era o ser mais importante para ele no universo. Tony só queria que ele estivesse protegido, mas ele falhou antes, e tinha a sensação doentia de que iria falhar novamente.

 — Meu filho vem em primeiro lugar, Pep... — Tony disse. Sua voz não estava mais carregada pela raiva, e sim pelo desespero e pela agonia.

 — Eu sei — Sua voz também se suavizou, e Pepper encontrou uma brecha para se aproximar dele e envolve-lo em um abraço. Tony não retribuiu de imediato, seus olhos vagando por todo lugar antes que ele criasse coragem e apertasse Pepper em retribuição. — Mas não é saudável. Leve ele em um psiquiatra, se quiser se mantenha atualizado no caso, mas não se envolva. Por favor, Tony

 Ele não respondeu, porque não queria que isso acontecesse. Ele queria Westcott preso, mas tinha a sensação de que isso só iria acontecer se ele se movesse, se ele fosse atrás e fizesse alguma coisa.

 Tony deixou que o silêncio dominasse a sala, a tensão e os gritos de antes caindo no esquecimento. Sua mente ainda estava vagando a milhas de distância; bolando planos, ideias e formas de garantir que Westcott nunca mais fosse ver nem mesmo a sombra de outra criança na sua vida.

 Foi então que o telefone de Pepper quebrou o silêncio, tocando com um toque suave e que ecoou na sala. Ela quebrou o abraço apenas para atende-lo, entregando enfim o celular de Tony de volta.

 O bilionário apenas encarou o aparelho, uma expressão perdida em seu rosto.

 — Sim...? Desculpa, não posso agora. Minha assistente pode lidar com isso — Pepper suspirou, massageando a têmpora com a mãos livre. — Certo... bordo então... sem flores... podemos falar sobre isso depois, eu passo aí. Tá bom

 Ela desligou, mas Tony não disse nada por um longo tempo. Isso fez com que ambos apenas ficassem se encarando, sem saber o que dizer em seguida.

 Ele se sentiu obrigado a quebrar o silêncio.

 — Decoração?

 — As coisas tem que ser perfeitas semana que vêm... — Ela disse, forçando um sorriso para seu rosto.

 Semana que vem. A Fundação Maria Stark é semana que vem e Tony ainda tem tantas coisas para cuidar. Ele tem que lidar com Thor, os Vingadores e com Westcott. Tudo recaia sobre seus ombros de um jeito ou de outro.

 Ele pode fazer isso. Não tem problemas, ele é o Homem de Ferro; forte o suficiente para sobreviver ao próximo mês e fazer todas as coisas do jeito certo.

 — Eu sei, estaremos ajudando milhares de pessoas com isso — Disse, se inclinando para frente apenas para encostar sua testa com a de Pepper. Ela se inclinou em resposta, fechando os olhos.

 Tony poderia curtir a proximidade, mas a sua mente ainda estava trabalhando a mil. Ele não tinha tempo para descansar; precisava se mexer o mais rápido possível.

 — Sim, pense nisso também — Ela disse, se afastando apenas para dar um leve e rápido beijo em sua têmpora. Quando se afastou, havia um sorriso triste e melancólico em seu rosto. — Eu preciso ir, mas antes eu quero que me prometa que não vai pegar nenhuma das armaduras e sair pela cidade caçando uma pessoa como um assassino de aluguel

 Tony hesitou, desviando o olhar de Pepper por dois segundos antes de concordar com um aceno relutante.

 — Prometo...

 Ele nunca foi bom em cumprir promessas; não é necessariamente conhecido por isso, e Pepper sabe disso. Mas Tony pode ver o exato momento em que ela decidiu acreditar nele.

 — Tudo bem — Ela suspirou. — Vou pedir pro Rhodey subir e cuidar de você... não faça nenhuma burrice

 Isso fez Tony rir, justamente pela ironia da situação. Ele estava prestes a fazer uma burrice, e nem mesmo Pepper podia impedi-lo desta vez.


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Notas finais do capítulo

Eu realmente considerei revisar esse capitulo uma quarta vez para poder acrescentar mais coisas e corrigir os erros que com certeza estão espalhados por ai (sério, deve ter um monte, 8K de palavras bicho), mas então percebi que isso iria gerar um ciclo infinito e resolvi quebra-lo antes que iniciasse.

Tenso, eu sei, mas todos nós sabíamos que uma hora isso iria chegar.

~~ See Ya Later



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