Quando o juiz apitou o fim da partida e a bola quicou contra o gramado, Naruto soube que tinha sido um touchdown perfeito. Os seis pontos garantiram uma vitória com folga para o time dos Leões Vermelhos, que, com o mascote tatuado em seus bíceps, saíram gritando e correndo para um abraço em grupo. O capitão e quarterback arrancou seu capacete, atirando-o aos seus pés e balançando o punho no ar. A arquibancada vibrava em uma onda de cores quentes, e quase toda a escola tinha ido torcer para eles na final.

Sasuke o puxou pelos ombros, ou talvez tenha sido Gaara – honestamente, ele não estava vendo mais nada. Abraçou seus colegas e acompanhou o grito de guerra do time. Deram início a uma festa generalizada no campo, com confetes e seus amigos descendo pelas escadas, a fim de cumprimentá-los. Naruto se desvencilhou ligeiramente para procurar pelas verdadeiras campeãs daquele dia – o show do intervalo que entreteve os espectadores foi simplesmente incrível. As líderes de torcida dos Leões eram as melhores. Avistou um amontoado de saias e pompons, sorrindo para as garotas. O cabelo rosa de Sakura foi a primeira coisa que o atingiu, em um abraço animado e gritos histéricos.

Distraído, ele procurou por ela. Especificamente por ela. Seu coração sempre falhava uma batida quando seus olhos pousavam sobre o rosto alvo de bochechas coradas. Mesmo menor que a maioria das outras líderes, ela se destacava na multidão. Ali estava, com o cabelo negro preso no alto e fitas vermelhas contornando. Embora apenas um pequeno sorriso bruxuleasse em seus lábios finos, ele sabia que ela estava tão feliz quanto eles. Comemorava de longe, cumprimentando os outros com tapinhas, afastada da bagunça. Naruto só queria meio segundo de coragem insana para falar com ela.

Mas, como sempre, seus devaneios foram interrompidos por Kiba, dependurado em seu braço e molhado de alguma coisa suspeita. O loiro desistiu de admirá-la – de longe – e se voltou para o running back, sorrindo involuntariamente ao se lembrar dos passes que garantiram a vitória.

— Você arrasou hoje, parceiro! – gritou, se fazendo ouvir através do barulho.

— Obrigado, capitão! – ele gritou de volta – Festa da vitória na minha casa! – falou, não especificamente para ele, e os que estavam ao redor rugirem em euforia. Naruto riu, dessa vez para si mesmo. A festa da vitória seria uma boa maneira de se distrair.

Como capitão, aplacou os ânimos o suficiente para se despedirem da equipe convidada. Cumprimentou cada um dos jogadores e seu técnico, recebendo elogios. Como time da casa, poderiam ir direto para os vestiários – Naruto estava morrendo para um banho. Tinha grama grudada em lugares que ele não imaginava ser possível.

Em uma comissão particularmente barulhenta, atravessaram os corredores largos da Academia de Konoha. Batiam nos armários e cantavam hinos sujos. Alguém, mais a frente, levava a taça no alto, exibindo-a com orgulho. As luzes estavam parcas, mas o sol mal se pusera ainda, e todas as portas estavam abertas. Naruto seguiu a comitiva do time, carregando seu capacete e ostentando o uniforme. Sorria para todos os lados, regozijando a doce glória. Enquanto cruzavam os corredores, sentiu-se aliviado por saber que estavam, definitivamente, de férias. Os jogos colegiais atrasaram um pouco, e as aulas tinham terminado algumas semanas antes. Agora, seu feriado preferido se aproximava, e, fora do ginásio coberto, a neve caía como algodão gelado.

Os estudantes se dispersaram, enquanto Naruto guiou o time para os chuveiros, preparando um discurso. A emoção bloqueava sua garganta, e ele sentia envaidecido de seus atletas. Entraram batendo os capacetes nos bancos e armários. Retirou todos os equipamentos e a roupa de malha, esticando o corpo. Gaara, que estava mais perto, o cumprimentou com um soco.

— Foi incrível, cara. Achei que não fosse conseguir aquele touchdown nos últimos segundos. – sua voz estava espantada, e o loiro jogou a cabeça para trás, com falsa modéstia.

— Bom, o que posso fazer? Eu sou fabuloso. – gabou-se, ouvindo algumas vaias e rindo. Gaara revirou os olhos, entrando na brincadeira – Mas, falando sério, pessoal. Vocês arrasaram. Essa temporada foi ótima, e conseguimos nosso segundo troféu! – gritos e assovios.

Não era preciso falar mais. Exaustos, porém felizes, um a um os garotos foram para as duchas. O clima do lado de dentro já estava frio, e ninguém queria demorar no banho de água morna. Enquanto corriam, o suor e a adrenalina eram suficiente para aquecê-los. Cercados de armários de metal e um aquecedor meia-boca, o álgido de dezembro começava a maltratar. Naruto se despiu tão rápido quanto a velocidade da luz, sentindo a água arrepiar seus braços. Bastava relaxar um pouco para sentir os músculos repuxarem em uma dor agradável e compensadora.

Secou e vestiu sua velha jaqueta do grupo, cuja qual exibia com demasiada honra. Sonhava em ser um Leão desde criança, quando ouvia as histórias da juventude de seu pai. Finalmente, sentia que aquele era o seu momento.

Foi atraído pelo som de vozes vindas do corredor de acesso. Se virou, sorrindo para receber as líderes de torcida, que ainda vestiam as saias curtas e as blusas curtas de mangas longas. Sakura vinha na frente, e Naruto a cumprimentou com um forte abraço. A coreografia foi perfeita, e ele se lembrou das vezes em que elas treinaram fora do ginásio coberto, no frio e na neve, apenas para incentivá-los durante o jogo.

— Parabéns, capitão! – a garota gritou, o soltando para cumprimentar os outros. Atrás dela, vinha Ino e Temari, também animadas, e ele abraçou a ambas.

— Vocês foram demais! – ele disse para ninguém.

Logo, o vestiário se tornou pequeno e abafado, com a pequena comemoração íntima da equipe dos Leões. Para Naruto, aquela era sua segunda família. Cortejou todas da fila, esperando, ansioso, até vê-la. Aquela seria a desculpa perfeita para poder abraçá-la. Contudo, suas expectativas foram novamente frustradas – ela veio com o rosto sério e os ombros altivos. Passou por ele rente ao seu corpo, sem fitá-lo, e se acomodou no canto da sala, quieta. Desconcertado, ele praguejou internamente.

Quer dizer, qual era o problema dela? Ele nunca tinha feito nada para que ela o tratasse com tamanha indiferença. Sequer tinha sido um babaca – como usualmente acontecia –, porque ela nunca tinha lhe dado chance de se aproximar. Chegava a ser ridículo ele continuar alimentando aquela queda, que já durava bons dois anos.

— Naruto! – ouviu Sakura o chamar, e virou o rosto rapidamente – Você me ouviu? – o falatório tinha diminuído consideravelmente, e formaram um círculo desajeitado.

— Não, o que? – perguntou, se aproximando, até parar na borda oposta, perto da saída. A Haruno revirou os olhos, com sua atitude sempre agradável.

— Idiota. Eu disse para tirarmos os nomes agora. Depois da festa vai ser impossível, e o ano novo é quase semana que vem. – Naruto deve ter feito uma ótima cara de interrogação, porque ela o fitou com as sobrancelhas arqueadas – Você não lembra, né?

— Estou meio confuso.

— Nomes. Sabe. – repetiu, como se explicasse para uma criança – Para o amigo secreto, idiota!

Sua memória clareou no mesmo instante em que ele soltou um longo gemido de desaprovação. Sim, a ideia estúpida de Sakura para brincarem de amigo secreto, e trocarem presentes no último dia do ano. Não se surpreendeu por ter esquecido – ele fora absolutamente contra a proposta.

— Não faz essa cara! Todo mundo concordou. – Sakura ralhou, enquanto ele cruzava os braços.

— Só porque são uns paus-mandados. – resmungou, tirando algumas risadas – É sério, eu odeio essa brincadeira! – continuou a tecer suas reclamações – Sempre ganho presentes ruins e gasto muito, nunca sei como descrever a pessoa e acabo falando quem é uma semana antes. – não conseguiu impedir que um biquinho se formasse, e Kiba, do seu lado, apertou uma de suas bochechas, irritando-o.

— Vamos, Naruto, vai ser legal! – foi Ino quem tentou convencê-lo – Pensa só, vai ser só nós! E você conhece todo mundo daqui muito bem, vai ser divertido! – ele conhecia quase todo mundo. Evitou desviar os olhos para a garota do canto. Com um suspiro, viu que não tinha como escapar; Sakura enfiaria o maldito papel pela sua garganta, caso recusasse.

— Tudo bem, eu participo dessa droga. – grunhiu, e houve uma nova onda de comemorações.

Sakura bateu palmas e puxou um saco com papéis cuidadosamente dobrados dentro – algo lhe dizia que ela tinha certeza que conseguiria convencê-lo –. Se somasse os titulares e os reservas do time, e todas as líderes, eram em torno de trinta pessoas, apertadas naquele cubículo. Ela sacudiu o plástico e abriu, passando de um em um e censurando os que não fechavam os olhos. Não tinha mesmo como escapar. Naruto ficou reparando na reação dos colegas e das outras líderes quando liam seus nomes. Riu sufocado com os que faziam careta – ele achou bem feito.

Quando a garota parou à sua frente, ele soltou um meio suspiro, meio choramingo. Apesar de ser um pouco menor que ele, Sakura conseguia ser bem ameaçadora. Naruto fechou os olhos com força e enfiou a mão, tentando não amassar todos os papéis com seus dedos gigantes. Mexeu, mexeu e mexeu, puxando um do fundo. Tornou a fitar a rosada, que o encarava com certo ar vitorioso. Reprimiu a vontade de lhe dar a língua de maneira bem madura.

Enquanto a garota passava para o outro lado, ele inclinou a cabeça e desdobrou três vezes. Uma caligrafia elegante e inclinada apareceu, mas, somente quando a folha estava inteiramente esticada, é que Naruto pôde ofegar apropriadamente.

Aquilo só podia ser uma piada.

Com os olhos arregalados e a boca seca, procurou desesperada e escancaradamente. Ela também já tinha pego seu papel, e o lia com serenidade e impassividade. Naruto engoliu em seco, se perguntando aos deuses do carma quais foram seus pecados – se bem que ele não queria mesmo saber –. É claro que ele tinha que tirar a líder de torcida mais bonita, com os movimentos mais graciosos. O cabelo mais longo e mais escuro, os olhos mais incomuns e a pele mais branca. O corpo mais curvilíneo, o andar mais sutil. E a expressão mais séria. Ele tinha que tirar a líder de torcida por quem tinha uma queda há anos, que nunca tinha lhe dado moral, nem uma vez.

Ele tinha mesmo que tirar Hinata Hyuuga no amigo secreto.