Oblivion escrita por Camélia Bardon


Capítulo 13
Capítulo 12, ano dois


Notas iniciais do capítulo

E esse é oficialmente o fim do ano dois. Aproveitem o mindblowing xD



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Louna me intriga.

De certa forma, é como se tivesse a sensação de que já a conheço. Sei que isso é impossível. Mesmo assim, não posso deixar de me questionar o porquê de ela ter ficado tão melancólica com a minha partida. Talvez fosse só impressão. Mal nos conhecemos, pode ter sido só o clima geral que a afetou. Certo...?

Não é como se eu não fosse vê-la nos feriados. E, também, não é como se eu estivesse afetado por isso.

— A quem estou tentando enganar? Claro que me importo... — murmuro, pegando a curva mais suave que consigo em Heritage, para as malas atrás não chacoalharem tanto no processo.

É incrível como uma cidade consegue ser tão grande. Uma hora e meia de distância me separam de casa e da UT, e ainda estamos em Austin! Mal vejo o tempo passando por entre a seleção de músicas aleatória do celular. Entretanto, quando vejo o prédio se aproximar, sinto minhas mãos suando de nervosismo.

Parece um obelisco. Ou talvez uma miniatura do Empire State.

Não consigo evitar o pensamento clichê ao estacionar a velha caminhonete no campus. Pelo menos, há várias como ela junto à minha, então me sinto mais consolado. É uma universidade pública, não sei o porquê de estar tão afobado com tudo isso.

Talvez por você ter esperado isso desde a conclusão do ensino médio, Adrien?

Bem... pode ser um fator considerável.

Deixo as malas no carro e atravesso o gramado, religando os fones de ouvido no meio do processo. Aposto que meu rosto se contraiu em uma careta pela música. Pumped up Kicks, agora, não seja a melhor das ideias. Não com o tiroteio que a UT sofreu, há sete anos, em "lembrança" ao de 66. De algum modo, parece desrespeitoso na minha cabeça, então troco para a próxima – Radio Ga Ga. Bem melhor.

Da série de coisas que não fazem sentido mas insistimos em fazer: uma boa trilha sonora pode até influenciar a nossa confiança.

Vamos nessa.

 

Foi com certa dificuldade que realizei minha matrícula, pois era o último dia de inscrições e a secretaria estava lotada. Por sorte, foi só eu dizer a palavrinha mágica – vulgo, professor-coordenador Beau Dalton – e lá estava eu, o novo senhor universitário, arrastando malas e me atrapalhando com a chave do quarto compartilhado.

Parecia melhor nos filmes... quer dizer, para alguém que estava contando com o poder da música, Freddie Mercury estaria desapontado com o meu amadorismo com portas.

— Ei, amigo, quer uma ajuda aí?

Graças a Deus. Mal procuro identificar o rosto do meu novo (e primeiro/único) colega de quarto, apenas repasso uma mala para ele enquanto abro a porta empurrando-a com o quadril.

— Fica tranquilo. Essa porta é assim mesmo. O Warren quebrou o trinco dela quando foi o trote dele, desde então ela precisa desse empurrão para abrir.

Ok.

Quem é você?

Quem é Warren?

Finalmente, reorganizo meus pensamentos e foco o olhar na pessoa à minha frente. Trata-se de alguém de idade próxima à minha, com cabelos ruivos gritantes e sardas mais chamativas ainda. Ao fazer o reconhecimento facial em mim também, a nova figura arregala os olhos.

— Adrien?

— É... sim — pisquei, confuso. — Já te deram minha ficha?

Foi a vez dele de aparentar confusão. Após fechar a porta com cuidado – afinal, o Warren quebrou o trinco dela quando foi o trote dele –, o ruivo alegre... aparentemente não estava mais tão alegre. Observei-o franzir as sobrancelhas e gaguejar:

— Foi! Foi, quer saber? A... recepção ligou há uns dez minutos, me informando que viria. Desculpa se te assustei — então, ele estende uma mão para mim e volta a sorrir. — Pietr. Química, quinto período, e não fabrico metanfetamina.

Não consigo evitar a risada. O cara é uma figura.

— Muito prazer, Pietr — respondo, apertando a mão dele.

— Vai cursar o que mesmo?

— Astronomia.

Pietr solta um muxoxo, fingindo decepção.

— Eu faria uma piadinha amigável, mas o primeiro astrônomo que eu pensei foi o Stephen Hawking, e as piadinhas com ele são... horríveis...

— Ah, cara. Devo te decepcionar em dizer que o Stephen Hawking era físico, não astrônomo — gargalho.

— Aí, ó. Não dá!

Em menos de cinco minutos, estamos rindo como velhos conhecidos. Ao menos, meu colega de quarto não é o babaca. Acho que esse é o maior pesadelo de quem entra para uma universidade.

Pelo resto do dia, Pietr me apresenta o campus. Aprendo que, a cada setor, há sempre uma piada. Ele deveria ser do tipo popular por ali, pelo tanto de pessoas que me apresentou no meio do caminho. Me sinto andando com um vereador, no entanto não é ruim. É assustador, de certa forma, mas não ruim. Nunca fui do tipo amigável, então é sempre uma boa hora para aprender a ser.

Depois de um bom jantar na cantina, retornamos aos dormitórios prontos para um banho e cama. É também a hora de desfazer malas, então estralo os dedos para iniciar o trabalho árduo. Pietr me mostra onde posso colocar as roupas e pertences nas divisórias dos armários. Em seguida, ele busca o celular no bolso e sinaliza para mim que irá usá-lo para telefonar. Entendo o recado e já procuro meus fones de ouvido – de qualquer forma, já faria isso para desfazer as malas.

Infelizmente, acabo ouvindo o começo da conversa. Ergo uma sobrancelha ante o comentário inicial do ruivo alegre:

— Você não vai acreditar no que aconteceu. Tudo que me disse, ano passado... era verdade. Aconteceu de novo, no mesmo dia.

Engulo em seco, finalmente entendendo que aquela conversa não é para mim. No entanto, não posso deixar de evitar ficar com a pulga atrás da orelha. Separo minhas roupas, itens de higiene, cadernos de anotação antigos e o notebook, espalho-os em cima da cama e suspiro.

Daí, algo no lado oposto do quarto me chama a atenção. Trata-se de um varal de fotografias. Discretamente, enquanto Pietr ainda está distraído com o telefone, caminho até lá para dar uma espiada no conteúdo.

Fotos estão expostas para serem vistas, não estou? Não estou fazendo tão errado.

Acompanho a trajetória das fotos, que parecem estar organizadas em ordem cronológica. A primeira trata-se de uma composta de três pessoas – Pietr, um idoso e uma garota de cabelos cacheados de idade próxima a sua. Os dois devem ter por volta de sete anos, e todos eles ostentam sorrisos sinceros e sorvetes. O pôr-do-sol é lindo e torna a paisagem mais bonita ainda. Estranhamente, o lugar me parece familiar.

A segunda é uma gatinha branca enroscada num novelo de lã. Adorável.

Da terceira até a sexta trata-se de fotos do período escolar. Mas a sétima...

Vamos com calma. É uma foto dupla. Estamos em um café, fora do expediente. Sei disso porque as integrantes da foto ainda usam seu uniforme, mas não há mais nenhum cliente visível. É possível distinguir Pietr, que enlaça duas garotas pelos ombros, com uma cara cômica em tentativa de galanteio. Uma delas é loira e parece apreciar o gesto dele. Uma namorada, talvez? Já a outra, a mesma garota de cabelos cacheados da primeira foto, tem seu revirar de olhos capturado. Uma terceira garota, de ascendência japonesa, abre um sorriso amarelo – como um cachorro arreganhando os dentes. Já a próxima, quase igual à anterior, me permite distinguir melhor os rostos que estou vendo. Nela, os três sorriem, como se a foto anterior fosse só um teste.

E aí, consigo associar a foto à pessoa.

A garota de cabelos cacheados não é qualquer garota.

Trata-se de Louna. Em carne e osso.

Automaticamente, me afasto das fotos com o coração acelerado, e lanço um olhar desconfiado para Pietr, que ainda está andando de um lado para o outro, no telefone.

Algo me diz que algo muito complicado está acontecendo por aqui. E não tenho certeza se quero ficar para descobrir.


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Notas finais do capítulo

Essa notinha vai ficar grande porque temos muitas referências paralelas KKKK

1. Em 1 de agosto de 1966, depois de esfaquear sua mãe e sua esposa até a morte na noite anterior, Charles Whitman, ex-fuzileiro naval, levou rifles e outras armas para o deck de observação no topo da torre do edifício principal da Universidade do Texas em Austin, e abriu fogo indiscriminadamente nas pessoas no campus e nas ruas circundantes. Nos 96 minutos seguintes, ele atirou e matou mais 14 pessoas (incluindo um nascituro) e feriu outras 31.
Em 2010, um estudante disfarçado com uma máscara de esqui e armado com um fuzil aterrorizou a Universidade do Texas em Austin, disparando vários tiros no campus antes de se matar no sexto andar da biblioteca principal. As autoridades especulam que tenha sido uma maneira de "homenagear" o crime ocorrido em 66.
De maneira alguma incentivo a violência, trouxe mais como um fato triste do que como outra coisa. Inclusive, o Adrien troca de música justamente pela letra também ser relacionada a tiroteios em escolas.

2. E, por falar em música, as de hoje mencionadas foram:
"Pumped up Kicks", do Foster the People: https://www.youtube.com/watch?v=YKBw6CikgzA
"Radio Ga Ga", do Queen: https://www.youtube.com/watch?v=lWxQ55EsOVs

É isso. Agora Adrien e Pietr vão ficar amiguinhos, será que isso muda em alguma coisa pro ano que vem? Hihihi, até mais!



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