Brincadeiras do destino escrita por Phoenix


Capítulo 2
Pequenos Enganos


Notas iniciais do capítulo

A personalidade de Catarine vai aparecer.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/749299/chapter/2

Tum tum, tum tum, tum tum...

Cada vez mais rápidos meus batimentos cardíacos ficavam. A cada passo que ele dava, meu coração se ritmava, sincronia perfeita.

Ele olhou para mim, eu olhei para ele, quando fui acenar com a mão... IGNORADA! COMPLETAMENTE IGNORADA. O único conforto que tive foi ver que todas as outras meninas eram ignoradas também. Mas sinceramente, não sei se isso é realmente um conforto.

Eu escutei algumas meninas do Ensino Fundamental falarem dele e fiquei com muita dó e raiva. Dó, pois descobri que ele não tinha pai, e raiva por saber que essas grosseiras o discriminavam por isso. Onde já se viu ficar anunciando pelos quatro cantos que a pessoa não tem pai, ficar chamando ele assim pela escola, poxa, que invasão de privacidade. Mas isso me fez entender um pouco o porquê dele ser tão frio. Mas até agora estou perplexa pela falta de vergonha em chama-lo de "Irie sem pai".

Chegou a minha vez, eu mal entrei nessa escola e vou para a diretoria, as coisas não mudam mesmo. Deus me ajuda!

—  Ohayou, Sr. Araia-San, pod... – Disse o diretor, antes de interrompe-lo.

— ONDE? – Falei alto.

— Onde o que Araia-San? – Arregalando o olho falou o diretor.

— É só Araia mesmo, mas cadê o raio?

— Raio? – O diretor estava começando a ficar vermelho nessa hora.

— Sim, o raio que o senhor mesmo me falou.

— Eu te falei de raio?

— Sim, eu entrei e o senhor disse “o raio”. Eu tenho medo, então prefiro ficar de pé.

— Araia-San, a senhorita leu as normas básicas de comportamento da escola para brasileiros?

— Sim, mas estava estranho, não fazia sentido, então eu desisti.

— A senhorita leu de acordo com a sequência japonesa?

— Qual é a sequência japonesa? Não é igual?

Nessa hora ele soltou um suspiro longo, parecia aborrecido, mas eu não entendia porque, então ele começou a me explicar. O tal do raio na verdade é “Ohayou”, que significa bom dia em japonês e eu preciso cumprimentar as pessoas assim na escola. Depois ele me explicou que “San” é um dos títulos honoríficos japoneses que devemos usar também, tudo isso contém no manual, que por sinal devemos ler de trás para frente da direita para a esquerda.

Percebi que eu estava mais perdida que bala em tiroteio, e que eu precisava me inteirar mais dos assuntos.

— Então foi isso o que aconteceu, Araia-San? – O diretor perguntou após a minha explicação da situação na sala.

— Sim, eu só quis dizer que ele era bacana, foi a primeira palavra que aprendi.

— Acontece que “baka” significa idiota, estúpido e não bacana.

Nessa hora, a minha cara estava no chão. Eu queria sumir dali. No meu primeiro dia já causei essa impressão, eu preciso tomar cuidado com as coisas que eu falo.

— Bom, já está resolvido. Explique ao Sensei quando chegar na sala. Boa aula Araia-San.

— Arigatou, diretor... – comecei a procurar no regulamento novo que o Sr. Diretor me entregou o título honorífico que eu deveria chama-lo.

— Me chame de Akiharu-Sensei.

— Ah, sim. Arigatou, Ahikaru-Sensei.

— Akiharu.

— Akariru.

— AKIHARU.

— Ahuraki.

AKIHARU. — O Sensei soltou um suspiro profundo. – Repita comigo: A.

— A

— KI

— KI

— HA

— HA

— RU

— RU

— A-ki-ha-ru. Akiharu.

— A-hi-ka-ru. Ahiraku.

— Pense em alguma coisa rara. E fale “Ah que raro!”.

— Ah que raro.

— Agora me diga que é raro.

— Ah que raro Sensei. Akiharu-Senseiiiiii, consegui!!!!!

— Pronto. Vá antes que eu me arrependa.

Me direcionei até a porta, mas a minha curiosidade em relação a falta de pai de Irie Naoki-Kun (aprendi os títulos), estava me matando...

— É, Akiharu-Sensei, o senhor saberia informar o que aconteceu com o pai de Irie-Kun?

— Como assim, aconteceu alguma coisa com o Irie-San?

— Não o Irie-Kun está bem, ele fez a abertura da cerimônia, o senhor estava lá Sensei.

— Eu me refiro ao pai dele, Irie Shigeki-San. – Respondeu-me já sem muita paciência.

— Ah sim. É que eu escutei algumas meninas falarem que perdeu o pai dele, algo do tipo.

— O QUE? Então ele sofreu um acidente, ele estava na cerimônia de abertura!

— Nossa, coitado, por isso o humor dele estava péssimo! Aposto que foi isso que aconteceu.

— Precisamos fazer alguma coisa a respeito. Araia-San, pode voltar a sua sala, mas mantenha esse assunto em sigilo, preciso confirmar a informação primeiro.

— Hai!

***

— Então meninas, foi isso que aconteceu! Ele sofreu um grave acidente e morreu!

— O PAI DE IRIE-KUN MORREU? – Gritaram Jéssica e Samanta.

— O QUE? O PAI DE IRIE-KUN MORREU? – Gritaram a sala e o Sensei.

O QUE? O PAI DE IRIE-KUN MORREU?— E como um efeito dominó, todas as salas estavam gritando dessa forma.

 

(Sons de muitos cochichos pelos corredores)

— Algumas meninas do 9º ano disseram que o pai de Irie-Kun faleceu hoje após a cerimônia...

(Mais à frente no mesmo corredor)

— Parece que ele foi atravessar a rua, e por estar muito emocionado pelo filho, não viu que o farol estava vermelho.

(Em outro corredor)

— Sua morte foi fatal, mal dava para reconhecer o rosto.

(Mais à frente)

— Irie-Kun está tão arrasado que sua personalidade mudou completamente.

(No corredor da sala de Irie Naoki)

— Parece que a mãe de Naoki-San descobriu hoje na cerimônia que seu marido a estava traindo, então quando eles estavam voltando para casa, ela o empurrou na frente do caminhão. Não dava para reconhecer seu corpo. Parece que ela está foragida.

— Quem está foragida?

— NAOKI-SAN!

Então os alunos começaram a explicar tudo o que eles ouviram. A expressão no rosto de Irie-Kun era uma mistura de raiva com susto, mas com certeza, mais raiva. Então ele se dirigiu até a sala de Akiharu-Sensei para colocar um ponto final nesse telefone sem fio.

Chegando lá, o diretor contou toda a história para Irie-Kun, que não ficou NADA FELIZ.

— Araia Catarine-San?

— Sim, foi ela quem escutou algumas meninas do 9º ano dizerem.

— Arigatou, Sensei.

— GANBATTE!

Ganbatte?? (Pensou Naoki)

***

Estava na minha sala, quando de repente um Deus japonês apareceu na porta. Tudo se movia em câmera lenta, seus cabelos, seus passos e enfim escutei o que eu sempre sonhei.

— Araia Catarine-San!?

Levantei-me tão abruptamente que a cadeira caiu.

HAI!— Gritei tão alto, que meus colegas não sabiam se riam da cadeira no chão ou do grito.

— Você é barulhenta! – Irie-Kun disse seco. – Gostaria que você respondesse uma pergunta.

— Antes de tudo, eu sinto muito pelo falecimento do seu pai, algo assim tão repentino, meus sentimentos a você Irie-Kun.

— É exatamente disso que eu quero falar. Quem te falou que meu pai faleceu?

— Algumas meninas do 9º ano estavam zombando pelo fato de você não ter pai. Pensando nisso, foi muito rude da parte delas falar desse tipo de coisa, assim tão recente ao acidente.

— Mas o que EXATAMENTE elas falaram?

— Elas disseram: “Naoki não tem pai”, algo assim.

Nesse momento todos estavam em silêncio nos olhando. Mas os olhares eram estranhos, especialmente o de Irie-Kun, parecia meio nervoso, seu rosto estava gradativamente ficando vermelho.

— Quais foram EXATAMENTE AS PALAVRAS? – Dessa vez ele foi realmente muito rude.

— Hum, deixe-me pensar... Ah, lembrei! Irie sem pai, eu achei um absurdo...

A cabeça de Naoki parecia um furacão de ódio, enquanto ele só entendia blá, blá, blá, enquanto na realidade eu estava falando:

— ... eu achei um absurdo umas meninas naquela idade, sem respeito algum por alguém que não tem pai, ainda mais no seu caso que estava tão recente assim, se fosse elas eu teria vergonha, não sei como elas conseguem andar pelos corredores depois de tanta confusão que elas causaram a você Irie-Kun. Mas na minha opinião, você deveria estar em casa, consolando sua mãe...

, a porta bate com tudo. Irie-Kun a empurrou com tanta força, que pensei que ela quebraria. Nesse momento que consegui parar de falar igual uma louca, pude notar que meus colegas de classe estavam de olhos arregalados olhando para mim. Quando eu menos esperava, TODOS caíram da gargalha.

Minha mente ficou muito confusa, eu não estava entendendo nada, aquela era uma situação delicada, porque todos estão rindo? ALGUÉM ME EXPLIQUE POR FAVOR!!!!

Então um aviso sonoro foi dado pelo Akiharu-Sensei. Sua voz estava um tanto quanto tremula.

Ohayou alunos do Colégio Nipo-Brasileiro, venho através desse informar que os boatos em relação a morte do pai do aluno Irie-san foram um engano. Já ligamos para a casa da família Irie e está tudo bem. Gostaria de pedir aos alunos que não estão acostumados com a cultura japonesa que LEIAM O MANUAL PELO AMOR DE BUDA ANTES DE ESPALHAR BOATOS OU ARRUMAR CONFUSÃO. FUI CLARO SENHORITA ARAIA CATARINE-SAN? Arigatou, boa aula.

 

Eu realmente estava confusa, fiquei com vergonha, o que estava acontecendo? Então Jéssica e Samanta sentaram ao meu lado e começaram a me explicar.

— O QUE? SENPAI SIGNIFICA VETERANO?

Não sabia onde enfiar a minha cara, que primeira impressão eu passei para Irie-Kun? E ainda ouvi um chamado.

Aluna Araia Catarine-San, favor comparecer a diretoria.

Pronto, lasquei-me.

***

— Acho que dois grandes mal-entendidos foram o suficiente pelo mês, então como expliquei a senhorita, volte a frequentar a escola após um mês e com conhecimento dos costumes básicos japoneses. Você não ficará com falta, e suas matérias serão enviadas diariamente por seus professores na plataforma online. Não deixe de acessá-las todos os dias, essa será sua chamada.

Ganbatte e Sayonara.

***

— Então foi isso que aconteceu pai. Pai não, a partir de hoje é Otousan.

— Otousan? – Questionou o meu pai. Um homem de 45 anos, com uma aparência um pouco envelhecida por ter que trabalhar demais­­­­­­­. Ele tem um restaurante com o sobrenome da nossa família e infelizmente eu não poderei dar continuidade com esse negócio, já que por acaso, eu meio que não sei cozinhar. Eu sou muito amiga do meu pai, nós somos realmente parceiros, antes mesmo da morte da minha mãe a 4 anos atrás, eu já me lembro de ter esse tipo de vínculo com ele. Depois da morte da minha mãe, meu pai foi muito forte, pois ele a amava demais e tentou esconder a sua tristeza e me criou do jeito que pode. Eu sou grata pelo “pãe” que eu tenho. Mas agora é Otousan.

Hai, Otousan. Hai é sim, Otousan é pai. Preciso melhorar para quando eu voltar para a escola poder agir como uma estudante normalmente.

— Filha, vamos ser realistas, normal você nunca foi, já te disse que você se parece muito com a sua mãe? – Começou a chorar falando isso. Ele SEMPRE chora.

— Não sei se aceito isso como elogio ou uma crítica.

— É um elogio, uma vida perfeita, sem dificuldades, sem imprevistos, uma vida com uma rotina eterna, é muito sem graça. Não ser normal é bom, muito bom. Mas você precisa se controlar um pouco, pois como que se apaixona só porque a pessoa é bonita e inteligente, na primeira vez que a vê, por favor né filha. Outra coisa, já te falei que a senhorita vai casar com o Kinho, filho do meu amigo de infância.

Otousan, o Kinho é bonito e tudo, apesar de só ter visto ele no enterro da minha mãe, sei que ele é legal também, mas agora esqueça isso, não estamos mais nessa vibe dos pais escolherem os companheiros dos filhos.

— Catarine, acredite, ainda existem os casamentos arranjados.

— Mas eu vou escolher meu marido, e no momento é o Irie-Kun.

Meu gatinho manhoso.

***

(Catarine olhando a escola)

Um mês se passou e agora é hora de retornar. A escola parece estar a mesma! Ganbatte Araia-chan!


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Como será o retorno de Catarine à escola?