Redenção escrita por truthbullet


Capítulo 3
Capítulo 3 — Lôbrega infelicidade;


Notas iniciais do capítulo

Palavras usadas:

Lôbrego -
em que há pouca ou nenhuma claridade; escuro, sombrio.
p.ext. de aspecto soturno; funesto, lúgubre.
fig. que infunde pavor; tétrico, assustador.

Irrefutável - não refutável, que não se pode refutar, que não se pode contestar; incontestável, irrefragável, irrespondível.

Boa leitura!



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A garota era tudo, menos o esperado.

 

Akagane entrou no quarto expectando um olhar obscuro. Mãos trêmulas, expressões emudecidas, medo, qualquer coisa negativa, causada pelas marcas dos traumas já confirmados.

 

O que recebeu foi o fitar morno e gentil, de uma garota apreensiva que nem parecia notar os próprios ferimentos.

 

— Eu vou deixá-las sozinhas. — murmurou Meiko, fazendo uma reverência e se retirando. No passado, teria dado uma piscadela, ou falado em um tom sugestivo; agora, soava apenas como a criada que não queria ser invasiva.

 

Imaginou que silêncio fosse tomar a atmosfera após a porta bater, mas foi enganada. Na verdade, a saída de Meiko serviu para que a menina se levantasse e andasse, a princípio tímida, em sua direção.

 

Mais por instinto do que outra coisa, viu o corpo se impulsionando para a frente com a intenção de correr e levou a mão até a espada embainhada, ameaçando puxá-la pelo cabo. Sua ameaça implícita falhou, porque a garota jogou os braços ao seu redor assim que o alcance permitiu.

 

— A-Akagane-sama, certo? — apesar de sua voz enunciar que sim, ela tinha se assustado com a possível espadada, a assassina percebeu que estava mais distraída com o apelido, que trouxe um rubor inconsciente ao seu rosto. Amparou o pequeno corpo sem dificuldades, usando uma mão para tocar as próprias bochechas, numa tentativa de afastar aquele sentimento. — Meiko-sama me contou tudo! — apoiou a cabeça no corpo dela, começando a apertar o abraço. Notando a proximidade, afastou-a, sem brusquidão, desviando o olhar da expressão animada na face da garota.

 

—… Ela disse que queria falar comigo. — respondeu, tentando soar indiferente e falhando. Aquela garota tinha sido violentada. Repetidamente. Foi resgatada por uma assassina com tripas jogadas pelos cabelos, e agora, a abraçava com um sorriso estampado na cara. Sentiu que, se desse mais um passo naquele território, pisaria em falso e caíria num buraco.

 

— Sim! Eu precisava agradecê-la. — a fala se suavizou. Seus olhos, azuis e cálidos como a água de um gêiser prestes a eclodir, se fixaram no rubro dos da outra. Capaz de manter a encarada, começou a reparar nos outros pequenos detalhes que diferenciavam a resgatada de habitantes do vilarejo em geral; o rosto, não muito forte nem muito magro, tinha um formato oval e a benção de feições proporcionais. Traços meio asiáticos, meio europeus, coroados por cabelos loiros que certamente já tiveram dias melhores. Ela é muito bonita, algum ponto de sua mente constatou, a fazendo sentir fogo subindo do peito às bochechas mais uma vez. A refugiada estava falando, mas as palavras entravam por uma orelha e saíram pela outra. Só foi reparar nesse detalhe quando ela juntou ambas as mãos logo acima do peito, fechando os olhos num sorriso brando e minimamente nervoso. —… E é isso!

 

— Resgatá-la nunca foi meu objetivo, já que não me comunicaram quanto à sua existência, mas fico feliz em saber que pude libertá-la de um lugar tão terrível. — falou, sem pensar, procurando preencher o silêncio que sabia que viria caso não se pronunciasse. Não soube o porquê de seu lapso súbito de atenção, porém, sabia que seu peito pareceu estranho durante ele. Talvez a garota fosse a causa, concluiu, franzindo o cenho. — Você deveria descansar mais um pouco. Será chamada à corte mais tarde para uma audiência.

 

Ela assentiu, subitamente apreensiva.

 

— Não é nada grave, não se preocupe. Apenas tenha certeza de que está se recuperando bem. — reafirmou, sem resposta da parte da garota. Antes de se retirar, acrescentou. — Se precisar de alguma coisa, Meiko estará por perto.

 

— — — — —  

 

Somente quando saiu do quarto que percebeu que não sabia o nome da garota.

 

Não perguntou, e ela com certeza não tinha o deixado escapar durante seu monólogo despercebido. Antes que entrasse numa profunda reflexão a respeito disso, cochichos vindos de um bolinho de jovens no meio da rua chamaram sua atenção.

 

—… Vinte minutos…

 

— Já é a quinta desse mês…

 

—… Está piorando…

 

Akagane piscou, e pessoas estavam brotando de todos os cantos da avenida. Avistou Meiko entre uma dezena de olhares apreensivos — a maioria seguindo seus movimentos —, e se enfiou na multidão cada vez mais espessa, evitando dar braçadas contra os cidadãos, que em sua grande maioria, eram muito menores em altura e estrutura física.

 

—… O que está acontecendo? — perguntou, já em frente à criada, que tinha um olhar indecifrável.

 

— Uma execução. — o tom triste trouxe lhe trouxe memórias indesejadas. Afastou-as com um balançar de cabeça.

 

— Quem?

 

— Kimigiku-sama e Suzuko-san.

 

Pela primeira vez desde o jogo de matança, Meiko a via genuinamente chocada.

 

—… Ela realmente…?

 

— Sim. — o olhar se tornou mais claro. Meiko sabia o que tinha acontecido à mesa de jantar, e agora estava tão decepcionada quanto estaria seu pai ou Lize. — Se me for permitido, estarei acompanhando a esposa de Kimigiku-sama durante a execução. O mestre de armas era órfão, e os pais de Hina vivem em território tailandês. Sem filhos, ela estará sozinha.

 

— Tudo bem. — Akagane mordeu o lábio, franzindo o cenho, ainda surpresa. Chaku ordenou a morte de dois de seus oficiais mais eficientes graças a simples erros.

 

Erros que teriam passado despercebidos caso tivesse mantido a boca fechada.

 

A atmosfera ao seu redor pareceu, de repente, adquirir um tom lôbrego. Desde que hora do dia as nuvens estavam tão escuras? E desde quando a temperatura tinha caído tanto?

 

Virou-se à passagem para a praça principal, sentindo cada aldeão que passava ao seu redor. Durante um longo tempo, apenas encarou  o nada.

 

— — — — — 

O centro da praça estava silencioso feito um túmulo.

 

Se não fosse pelo lago, provavelmente teria sido feito de um para os dois executados. De maneira proposital, Akagane se dispôs, longe da esposa em prantos de Kimigiku, e dos sobrinhos de Suzuko, que nem entendiam o que estava acontecendo.

 

Mal percebeu as cabeças rolando, cortadas com habilidade pelo novo carrasco. Repetia, em loop, a realização irrefutável. 

 

Por ter agido daquela forma irracional, condenou duas pessoas à morte. 

 


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