Lyra estava vestida de branco. Um vestido simples mas que lhe assentava perfeitamente. O seu cabelo estava apanhado num coque. Duas franjas caíam de cada lado do seu rosto. Nas suas mãos encontrava-se uma cesta com duas pequenas caixinhas.

—Lyra, vamos descer. – ouvi o que parecia ser a minha mãe – O Ron deve estar a aparecer para levar a Rose.

—Rose não deixes o meu pai muito tempo à tua espera. – ouvi Lyra gritar antes de desaparecer pela porta.

Finalmente, encarei o espelho à minha frente. Também o meu vestido era branco. Comprido e sem alças. Justo até à cinta. Solto abaixo dela. O meu cabelo, ao contrário do de Lyra, estava solto. Nele apenas estava preso um gancho. O gancho do pequeno véu que tinha. Uma lágrima escorreu pelo meu rosto. Aquele dia, após tantos anos, finalmente tinha chegado.

Alguém bateu à porta. Disse que podia entrar. Afinal, o meu pai tinha de me vir buscar.

—Pensavas mesmo que eu iria deixar este casamento acontecer. – ouvi, reconhecendo a voz. Voltei-me e confirmei as minhas suspeitas. Era a Nott.

—O que…estás aqui a fazer? – consegui formular a pergunta perante o choque. Peguei na minha varinha e apontei-lhe. A Nott começou a gargalhar.

—Parece que não te lembras da última vez que nos enfrentamos. Não é uma varinha que me vai impedir…

—Acorda, sua cabra! – ouvi, ao longe. Senti a minha face esquerda a arder.

Tudo o que eu estava a viver era apenas um sonho. Eu não estava no meu casamento com o Scorpius…

Mantive os meus olhos fechados. O ideal era a Nott continuar a pensar que eu estava adormecida. Assim conseguia, nem que fosse por pouco tempo, adiar qualquer maldade que ela quisesse fazer.

—Não me digas que a mataste. – disse Nott, em tom alto, para quem eu achava que era Liam. Tinha sido Liam a adormecer-me – Eu sabia que não devia confiar em instrumentos muggles.

—Eu sei perfeitamente o que estava a fazer, Alicia. – respondeu Liam num tom sério – Eu nunca a iria matar. Nós vamos ficar juntos.

—Claro que vão. – respondeu Nott, suportando a sua mentira. Claro que não ficaríamos juntos. A Nott queria ver o Scorpius sofrer. Ela iria matar-me para que isso acontecesse – Vigia-a. Vê se ela acorda. Eu vou ver como está o pai da minha filha.

Ouvi a porta a abrir-se e a fechar-se. Estava sozinha com Liam.

Vi ali a minha oportunidade. Liam estava convencido que a Nott não me iria matar. Mas eu sabia que, se nenhum de nós fizesse algo, era exatamente isso que ela iria fazer.

—Liam. – sussurrei, tentando chamar a sua atenção – Liam.

Liam voltou-se para mim e aproximou-se.

—Estás bem? – perguntou num tom preocupado – Começava a ficar realmente preocupado.

—Porquê que a ajudaste? – perguntei, encarando-o. Eu queria que ele me dissesse na cara.

—Para ficar contigo. – respondeu Liam – Mesmo que ainda não tenhas dado realmente conta, eu sou a pessoa ideal para ficar contigo.

—Liam…

—Desculpa ter gritado contigo mais cedo. – desculpou-se Liam – Na casa de banho. Eu sei que não devia ter-me exaltado assim contigo.

Hesitei antes de responder. Por mais que neste momento Liam parecesse um louco, ele nem sempre foi assim. Durante o ano que estivemos juntos, eu não tive queixa dele. Claro que várias vezes, o Liam pedia para falar sobre o nosso relacionamento. Mas acaba sempre por aceitar o que eu lhe pedia.

—Eu fiquei assustada, Liam. – confessei – Tu nunca me falaste assim. Não com aquela agressividade.

—Eu estava revoltado. Eu estou revoltado. Eu estive um ano contigo e não quiseste um relacionamento sério comigo e depois estás meia dúzia de dias com o Nico e ficas logo grávida dele.

—Foi um acidente.

—Mas tu envolveste-te com ele.

—É verdade. – confirmei – Porque eu gostava realmente dele.

—Mas isso agora não importa. – disse Liam, afastando-se de mim – O que importa é que vamos ficar juntos.

—Nós não vamos ficar juntos, Liam.

—Não tens escolha, Rose. – respondeu Liam, voltando-se para mim. Conseguia perceber pelo seu rosto o quanto ele se estava a conter para não gritar comigo.

—Liam, ela vai matar-me.

—Não vai nada. Ela jurou-me. Ela prometeu-me que eu ficaria contigo para sempre. Ela só te quer separar do Scorpius.

—Ela não quer só isso. Ela quer certificar-se que o Scorpius nunca mais luta contra ela por mim. Liam, tu precisas de acreditar em mim.

—Cala-te. – berrou Liam, assustando-me. Ele estava a começar a exaltar-se. Outra vez.

—Liam… - chamei a medo – Liam, por favor, tu tens de me ouvir.

—Está calada, Rose. – disse Liam, num tom um pouco mais moderado. Colocou as mãos nos ouvidos e começou a andar de um lado para o outro – Tu só estás a dizer isso para que consigas fugir com o Malfoy. Mas tu não me vais enganar. Eu já disse que vamos ficar juntos.

—Liam, eu imploro-te. – pedi já em desespero. As lágrimas começavam a soltar-se pelo meu rosto – Liam, eu estou grávida. Eu não posso estar assim. Eu posso perder o meu filho.

—Tu não vais perder o nosso filho. – disse Liam, aproximando-se de mim.

Não consegui disfarçar a minha cara de espanto. O Liam tinha acabado de dizer que eu estava grávida de um filho nosso. Eu já não sabia em que ponto estava a sua loucura.

—Liam. – chamei mais uma fez – Eu estou assustada. Eu…eu estou grávida há menos de três meses. Eu não posso estar sobre esta pressão.

—Eu já disse que não vai acontecer nada ao bebé. – disse Liam num tom que dava por encerrada a conversa.

Permaneci calada, por momentos. Eu tinha eu pensar.

Liam era claramente a minha saída e a de Scorpius dali. Sem as nossas varinhas seria muito difícil. Mas, tendo ali um aliado, as coisas tornar-se-iam mais fáceis.

Só que, no meio disto tudo, haviam dois contras. Naquele momento, Liam estava completamente imprevisível. Ele tanto estava a berrar comigo, como estava todo preocupado. E, segundo, mesmo que eu convencesse o Liam a ajudar-me, eu não saberia como levar o Scorpius comigo.

—Liam, ouve-me. Por favor. – implorei para chamar a sua atenção.

Liam voltou-se para mim, novamente. E foi aí que eu a vi. A varinha dele. No seu bolso de trás. Aquele seria o meu plano B.

—Aproxima-te, por favor. – pedi. Liam acedeu ao meu pedido – A Nott é completamente louca. Ela é capaz de usar maldições imperdoáveis em mim. E isso vai fazer muito mal ao bebé.

—Ela não vai fazer nada disso. Eu não deixaria que ela fizesse uma coisa dessas contigo.

—Mas ela vai fazer, Liam. Por favor, olha para mim. – pedi, novamente – Aproxima-te mais.

Liam aproximou-se mais e agachou-se à minha frente.

Tentei, desajeitadamente, aproximar-me ainda mais dele. Eu estava a centímetros dos seus lábios.

—Liam. – sussurrei – Ela vai matar-me. Tu não podes deixar que isso aconteça.

—Isso não vai acontecer. – sussurrou também Liam, passando uma das suas mãos pelo meu rosto. Tentei não me afastar. Eu tinha de o conseguir convencer.

Aproximei ainda mais os meus lábios dos dele, tocando-lhe.

—Liam, eu preciso que me tires daqui.

—Eu não vou deixar que fiques com o Malfoy. A Nott vai dar-me tudo o que eu quero. Tu. E o Malfoy fora da minha vida.

—Tu não entendes, Liam? – perguntei, sussurrando. Mantive a distância. Isto fazia com que ele não pensasse tanto nas suas decisões. Eu era a distração perfeita – Eu deixei de amar o Scorpius há muitos anos. Ele não significa nada para mim. É apenas alguém que pertence a um passado que quero esquecer. Porque foi isso que me impediu de ficar contigo. Esse passado maldito.

—Então porquê que te encontraste com ele? Porquê que ele dormiu em tua casa? – perguntou o Liam não deixando de me encarar.

—Para o ajudar a livrar da Nott. Essa parte não é mentir. Ela é cruel, Liam. O Scorpius e a Lyra vivem sobre ameaça constante. A Lyra é só uma criança, Liam. Uma criança. Como este bebé que eu carrego.

—Quer dizer que não tens nada com ele?

—Nunca tive, Liam. Eu nunca mais estive com ele depois de Hogwarts. Para mim, ele é uma pessoa como outra qualquer.

—Isso quer dizer que podemos ficar juntos?

—O tempo o dirá, Liam. – respondi, beijando-o novamente – Mas eu quero tentar. Mas só consigo fazer isso se me ajudares a sair daqui. A mim e ao Scorpius.

—Porquê ele também? – perguntou Liam afastando-se de mim – Tu estás a tentar enganar-me. Tu queres é fugir com ele e estás a tentar manipular-me.

—Liam olha para mim. Olha-me nos olhos. – pedi – Eu não amo o Scorpius. Mas também não vou permitir que a Nott continue a fazer-lhe mal. A ele e à filha. Eu não sou esse tipo de pessoa. E tu também não.

Ouvi a porta a abrir. Fechei os olhos para fingir que continuava desmaiada. O resto seria com o Liam.

—Essa cabra ainda não acordou? – ouvi a Nott a perguntar.

—Já te pedi para não lhe chamares esses nomes. Ela falou por breves instantes. – respondeu Liam – Mas voltou a adormecer.

Suspirei. Liam iria ajudar-me.

—E porquê que a deixaste voltar a dormir? Tu sabes que eu quero ter uma conversinha com esta menina.

—Ela não estava consciente. Ela apenas soltou palavras.

—Muito bem. – respondeu Nott. Pelo seu tom, eu não conseguia perceber se ela tinha acreditado – Já o Scorpius continua acordado. Podes ir até lá, Liam, e ter a tua vingança. Tenta só não lhe estragar aquele rosto maravilhoso. Afinal, a beleza conta tudo.

Prendi a respiração. Se Liam me deixasse sozinha, seria o meu fim. Ele não conseguiria impedir que eu perdesse o meu bebé. Ele nunca conseguiria impedir que a Nott me torturasse. Ele nunca conseguiria impedir que ela me matasse.

—Eu quero estar aqui quando a Rose acordar. Eu quero que o meu rosto seja o primeiro que ela veja quando acordar.

Voltei a respirar. A minha morte seria adiada por mais alguns momentos.

—Muito bem. – respondeu a Nott num tom completamente falso. Os planos não lhe estavam a correr como ela queria. Temos pena! – Mas depois, eu quero conversar com ela. Sozinha!

—Está bem. – respondeu Liam.

Voltei a ouvir a porta abrir e fechar. A Nott tinha saído.

—Temos que ser rápidos. Ela não pode desconfiar. – disse Liam, soltando as minhas mãos.

—Dá-me a tua varinha, Liam. – pedi – Por favor.

—Para que queres a minha varinha?

—Para nos proteger. Apenas confia em mim, por favor.

Liam permaneceu com a varinha na mão.

—Eu é que vou à frente por isso eu é que levo a varinha. Mantém-te atrás de mim.

A porta estava aberta. Liam fez-me sinal para continuar atrás dele. Segui as suas ordens. Só esperava que a Nott não aparecesse.

—O Scorpius está no fundo daquele corredor. – sussurrou Liam – A Alicia deve estar com ele.

—Nós temos que a atacar antes que ela dê pela nossa presença. Liam, eu sempre fui melhor em duelar. É melhor ser eu a ataca-la. – afirmei, esticando a minha mão para ele – Tu sabes que eu consigo derrota-la mais facilmente.

Relutantemente, Liam entregou-me a varinha.

—Vais entrar lá e vais dizer que eu acordei. Ela vai querer logo vir ter comigo. Vai ser a minha oportunidade de a atacar.

Liam não disse nada. Continuou o caminho e entrou na sala onde se encontrava Scorpius.

Eu conseguia ouvir os gritos de dor que ele dava. Aquilo era horrível. Cada berro dele parecia uma chicotada nas minhas costas. Ele estava a sofrer. E isto tudo era por minha causa.

Vi a porta a abrir-se. Um friozinho passou pela minha barriga. Aquela era a minha última oportunidade.

—Petrificus Totalus. -  gritei acertando em cheio na Nott.

Corri até ao Scorpius. O seu rosto estava todo ensanguentado. As suas roupas estavam rasgadas.

—Scorp. – chamei, aproximando-me dele. As lágrimas voltaram em força – Eu já estou aqui.

—Rose. – chamou para ter a certeza que não era um sonho – Tu estás bem?

—Estou ótima. Nós vamos conseguir sair daqui.

—Com que então já não querias mais nada com ele, Rose. – ouvi Liam berrar.

 Voltei-me para ele. Na sua mão esquerda estava uma arma muggle.

—Liam tem cuidado com isso. É um objeto muito sensível.

—Eu sei perfeitamente que objeto é este. Achas mesmo que ia entregar-te a minha varinha sem ter mais nada que me defendesse?

—Liam, nós temos de sair daqui. Por favor.

—Agora eu percebo porquê que a Alicia te queria matar. É a única maneira de vos separar. – foi a última coisa que ouvi antes do disparo.