Claire's Anatomy escrita por Clara Gomes


Capítulo 31
Capítulo 28 – Can’t Fight This Feeling (Parte II).


Notas iniciais do capítulo

Boa tarde! Tudo bem com vocês?
Vocês ficaram sabendo que a Ellen (atriz que faz a Meredith Grey) renovou o contrato da série para mais duas temporadas além da 14ª??! Ou seja, temos até a 16ª temporada confirmadíssima! Isso significa que Claire ainda vai ter muito o que viver kkkkk
Além disso, queria perguntar se vocês assistiram "B-Team", a websérie que a ABC (produtora de GA) postou? Creio que cheguei a comentar sobre há alguns capítulos, é uma produção bem curtinha, que conta os primeiros momentos dos internos novos no Grey-Sloan. Acho que vale a pena conferir, para se familiarizar com eles. São 6 episódios de mais ou menos 2 minutos cada, então em 15 minutos no máximo vocês acabam. Vou deixar o link aqui da playlist do YouTube com todos os episódios legendados em PT, caso se interessem https://www.youtube.com/watch?v=xVvs4a-Sx_k&list=PLXYs-78xPUD_BrVLXeMtxtf0HfTjNJNpK
Agora, vamos ao capítulo. É a segunda e última parte, também narrada pelo Diego. Creio que as maiores revelações ficaram para essa parte, então aproveitem. O Mariano, barman da boate LGBT+, é o Diego Boneta na minha cabeça. E eu pretendo fazer capas para os capítulos no estilo dessa que postei hoje, são bem simples mas né, meus dons editores de imagem não são muitos kkkkk
A música é a mesma do outro capítulo https://www.youtube.com/watch?v=zpOULjyy-n8
Bem, juro que acabei de dar os recados. Boa leitura, e espero que gostem!



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Diego

 

Massachusetts, 2001.

Encontrava-me parado em frente ao local que tanto almejava estar. Estudei bem a fachada da clínica, tomando coragem de adentrá-la. Eu sentia que minha vida estava prestes a mudar, e que eu estava prestes a ter a conversa mais intensa dela.

Respirei fundo e caminhei para dentro, num surto de coragem. Olhei tudo em volta, abismado pelo luxo do local. Parecia coisa de filme, e eu mal pude acreditar que realmente estava ali.

— Posso ajudar? – perguntou a secretária, que encontrava-se atrás de um balcão.

— O Dr. Russell se encontra? – indaguei, tentando ao máximo disfarçar meu sotaque brasileiro, creio que não com muito sucesso, pois a moça olhou-me desconfiada.

— E o senhor é...? – ergueu uma sobrancelha.

— Diga que eu sou o filho de Diana Gomes. Ele entenderá do que se trata. – respondi, sorrindo simpático.

— O Dr. Russell só atende pessoas com hora marcada. – retrucou educadamente.

Abri a boca para falar alguma coisa, mas um homem entrou no local, deixando-me sem palavras. Era ele. Era o homem que engravidara minha mãe.

Ele conversou alguma coisa com a secretária, sem ao menos notar minha presença ali. O homem parecia bem relaxado, e eu observava boquiaberto cada um de seus movimentos, como se eles fossem em câmera lenta. Quando ele finalmente me viu, mediu-me com o olhar e ergueu as sobrancelhas, sem me reconhecer.

— Você já foi atendido? – questionou, ainda olhando-me de cima embaixo.

— O senhor é o Dr. Russell? – falei, já sabendo a resposta.

— Sim, eu mesmo. – respondeu e aproximou-se um pouco, parecendo intrigado.

— Bom dia. Eu procuro pelo doutor. Eu sou Diego Gomes, filho de Diana Gomes. – afirmei, e o médico à minha frente arregalou os olhos e pareceu ficar mais tenso. Nossos olhos ficaram presos uns nos outros por alguns segundos: eu olhava-o desafiadoramente, e ele desesperadamente. Engoliu em seco e olhou em volta, provavelmente procurando palavras.

— Acompanhe-me. – disse firmemente, e dirigiu-se a um corredor, sendo seguido por mim. Entramos em uma enorme e bela sala, e ele trancou a porta, caminhando até sua cadeira, que mais parecia um trono. Ficou segurando o encosto dela e encarando-me, enquanto eu analisava o local, impressionado.

As paredes eram de um branco que quase doía os olhos, com uma porção de certificados enquadrados e pendurados em um canto da parede. Os móveis eram de uma madeira escura, sendo eles um armário enorme, uma escrivaninha e um gigantesco relógio, que ficava atrás da cadeira do homem. Além disso, havia um esqueleto falso em um canto, e uma prateleira que combinava com todo o resto, lotada de grossos livros.

Meus olhos vasculharam cada canto daquela sala, até finalmente encontrarem os dele, que me fitavam intensamente.

— Então, vai me dizer logo o que quer? – indagou, sem tirar os olhos de mim.

— O que você tem a dizer sobre a minha mãe? – perguntei, desafiando-o com o olhar.

— Ela era uma garota bipolar, às vezes estava radiante, outras estavam beirando o suicídio. E também não se decidia nos relacionamentos. Hoje estava com um, ontem estava com outro, e amanhã provavelmente iria trocar de macho de novo... – respondeu, agora desviando o olhar.

— Você sabia que ela está morta? – questionei, jogando um verde.

— Oh... Não, eu sinto muito. – fingiu choque, fazendo meu sangue começar a ferver.

— Você sabia que ela foi embora levando um filho seu? – falei, já esperando uma atuação do homem.

— Filho meu? Como ela poderia saber se era mesmo meu? – riu debochado, e eu cravei minhas unhas contra as palmas de minhas mãos, tentando acalmar-me.

Não respondi, apenas coloquei minha mochila no chão e abri-a, pegando um monte de cartas. Coloquei-as sobre a cadeira de frente para sua mesa e peguei a primeira do monte, desdobrando-a.

“28 de novembro de 1984. Querido Bruce, eu sinto muito ter partido assim. Infelizmente, meus serviços de babá foram encerrados, e eu fui obrigada a retornar para o Brasil após o parto de Diego. A boa notícia, é que nosso filho está muito bem, e ele é a maior gracinha. Eu sei que sou muito jovem, e que a distância vai complicar tudo, mas eu amo muito vocês dois, e tenho certeza que você também ama!” — li em voz alta, e o mesmo fechou a cara – “7 de dezembro de 1984. Como você sabe que é meu? Enquanto você não puder provar, eu não irei responsabilizar-me por nada.”— continuei, e peguei a próxima carta – “15 de dezembro de 1984. Querido Bruce, você foi o único homem que mantive relações nos últimos meses. Não tem como ser de outra pessoa. Dou-lhe minha palavra, meu amor. Esse bebê é nosso.” — desviei o olhar do papel para ele, e peguei mais uma – “23 de dezembro de 1984. E você realmente acha que sua palavra vale como documento, comprovando que eu sou o pai? E enquanto não houver provas, não é verdade, ou seja, essa criança não é minha. Não me procure mais.” — olhei-o novamente, indo para a próxima – Agora a coisa vai ficar ainda melhor, preste atenção. – ri ironicamente e abri a carta – “01º de janeiro de 1985. Querido Bruce, primeiramente, feliz ano novo. É claro que essa criança é sua! Eu venho de uma família muito simples aqui no Brasil, e não tenho condições de sustentar esse bebê. Minhas últimas economias estão acabando, e eu não sei o que fazer. Por favor, me ajude!”. Calma, ainda vai melhorar. – peguei a outra – “10 de janeiro de 1985. Eu já disse que não vou me responsabilizar, e que é para você se virar. Não está aguentando segurar a barra? Então mate-se logo! O mundo agradece. Pelo menos o sofrimento vai acabar.” — o queixo de Russell pareceu tencionar-se – Só essa carta, já daria um bom processo. Mas ainda tem mais, calma. – desdobrei outra – “15 de janeiro de 1985. Bruce, por que está fazendo isso? Eu não pretendo me matar e deixar nosso filho sozinho nesse mundo. Eu só preciso de um pouco de dinheiro. Eu sei que não fará falta para você. Se não for por Diego, faça por mim. Eu imploro!” “25 de janeiro de 1985. E você realmente acha que eu faria alguma coisa por você? E você realmente acha que qualquer pessoa faria alguma coisa por uma pessoa suja como você? Você é a escória da humanidade, Diana. É um lixo, que um joga para o outro, querendo se livrar. Eu tenho pena de quem tem que conviver com você. Tenho mais pena ainda dessa criança que nasceu dessa sua vagina podre, que já rodou na mão de vários homens, que só te procuravam para sexo, afinal é só para isso que você serve, sua puta barata. Por que não

— Pare! – cortou-me, provavelmente já sabendo o que vinha depois – Não leia isso em voz alta, as paredes têm ouvidos... – falou mais baixo, olhando em volta, nervoso.

— Então você sabe o que está escrito no resto da carta, né? – ri sarcasticamente – Você se lembra que descreveu exatamente como ela deveria fazer para se suicidar, não é? Disse os remédios, as quantidades, onde encontrar... – concordei lentamente com a cabeça, pegando-o no pulo – Você sabia que ela tinha depressão! E você sabia que ela fez exatamente como você ensinou? No dia 27 de fevereiro de 1985, ela cometeu suicídio, deixando para trás seu filho de 3 meses. – afirmei, encarando-o com todo o ódio que sentia.

— O que você quer, hein garoto? – questionou, perdendo a paciência.

— Eu tenho uma proposta, que envolve ou você cumprindo minhas condições, ou eu indo à polícia e entregando essas cartas, que já são provas o suficiente para destruir sua carreira e até mesmo te mandar para a cadeia, por suicídio assistido. – respondi, confiante.

— E como você vai provar que fui realmente eu que escrevi essas cartas? – perguntou, sorrindo zombeteiro.

— Os endereços nos envelopes, a letra, a assinatura, tudo combina. – dei de ombros – Você não vai se escapar dessa, papai. – ironizei a última palavra.

— Diga-me o que quer. – deu-se por vencido.

— Eu quero metade do seu patrimônio, e eu sei que isso é muito, e vai me manter estável por muito tempo. Além disso, quero que você arranje uma vaga para mim em Harvard, no curso de medicina. E não venha me dizer que não consegue, porque eu sei da sua influência naquela universidade, e que essa clínica é conveniada a ela. E por enquanto é isso. – expliquei, como se fossem coisas simples.

— Você promete que vai sumir totalmente da minha vida, e não vai abrir a boca sobre isso? – encarou-me com raiva.

— Creio que você vai ter que esperar para ver. – sorri vitorioso.

— Vou pagar em parcelas, para não ser muito suspeito, uma transação bancária de tamanha proporção. Por enquanto, tome aqui um cheque que vai te garantir algumas coisas já. – falou enquanto preenchia um cheque – Passe-me seu telefone, eu vou pedir para Harvard entrar em contato. E o número de sua conta bancária também, para eu ir depositando o resto. – pediu, entregando-me um pequeno papel, uma caneta e a folha de cheque, que fez meus olhos saltarem ao ver o valor. Se aquilo era uma pequena parcela, quem dirá quanto seria tudo.

Escrevi o número do meu telefone e o da conta no papel que ele me dera e o devolvi junto com a caneta, sendo assistido atentamente por ele a cada movimento.

— Foi bom fazer negócios com você. – abri um sorriso e comecei a guardar as cartas de volta na mochila – Espero nunca te ver novamente.

— Idem. – o médico revirou os olhos e bufou.

— Estarei aguardando a próxima parcela e o contato da Harvard. Tchau. – dei as costas e comecei a caminhar para fora, mas dei meia volta e aproximei-me dele novamente – Só mais uma coisa... – falei antes de acertar-lhe um soco no nariz, que instantaneamente o fez sangrar – Essa é pela minha mãe. – afastei-me e apressei-me para fora, sem ao menos olhar na cara da secretária.

Ao ganhar a rua, olhei em volta e respirei fundo, fazendo minha ficha cair. Eu realmente tinha feito aquilo, e dera certo! Minha vida estava prestes a mudar de verdade! Eu conheci meu pai! Eram tantas coisas, que minha cabeça parecia que ia explodir. Soltei um sorriso de vitória, mas logo fechei-o, sendo tomado pelo ódio novamente. Talvez eu estava errado de ter feito o que fiz, usando a morte da minha mãe para me dar bem assim. Mas ver a cara de desespero do responsável por sua morte, havia sido delicioso. Eu só não o entregaria, pois minhas vantagens iriam por água abaixo. Mesmo sendo o certo a fazer, eu não o faria.

 

Seattle, 2012.

— Ele ensinou minha mãe exatamente como se matar. – afirmei, depois de um tempo pensativo – Ele descreveu o suicídio eficiente em uma carta, e ela fez tudo do jeitinho que ele ensinou. – olhei-a, notando seu choque.

— Oh meu Deus... – falou, parecendo extremamente surpresa.

— E tem mais. – disse antes que ela continuasse – O que eu estou prestes a te falar, não pode sair daqui. – encarei-a seriamente, e a mesma assentiu e sentou-se ao meu lado.

Contei a ela toda a história, desde quando descobri as cartas até quando ameacei-o, e Anastasia pareceu ainda mais surpresa depois de todas aquelas informações. Ela ficou olhando-me boquiaberta por um bom tempo, e eu tinha quase certeza que ela estava me julgando.

— Você tinha todas as provas para colocá-lo na cadeia, e preferiu usá-las para seu próprio benefício? – questionou, incrédula.

— Eu sei que parece egoísta da minha parte. – rebati, ficando na defensiva – Mas se não fosse por essa minha atitude, eu não estaria aqui hoje. Não estaria salvando vidas. – continuei, olhando-a firmemente, tentando convencê-la – Se eu tivesse entregado as provas, ele ia para a cadeia, e o que mais? Se duvidar, nem isso, porque ele é muito influente, seria difícil derrubá-lo desse jeito.

— Você percebe que se ele fez isso uma vez, pode ser que faça de novo? Se ele já não fez... – retrucou, fitando-me com um pouco de desprezo – Ele quebrou totalmente o juramento médico! Ele não merecia estar lá em cima dando aquele discurso. – negou com a cabeça – Você ainda tem as cartas?

— É claro que sim, não vou livrar-me delas nunca! – respondi, um pouco irritado pela reação de minha amiga.

— Então ainda há chances de você ir na polícia e denunciá-lo! Você estaria fazendo um bem à humanidade. – falou com convicção, segurando meu ombro.

— Já faz muito tempo, Anastasia... 28 anos, para ser mais exato. Eu não quero passar por isso de novo. Ele continua com a vida dele, e eu continuo com a minha, recebendo uma grana preta por mês. Parece maravilhoso para mim. Ele salva as vidas que pode, e eu salvo as que posso. – dei de ombros, fazendo sua mão escapar.

— Como você consegue dormir à noite? – indagou com o cenho franzido, culpando-me com os olhos.

— Eu contei isso a você porque achei que fosse ser a única pessoa que me entenderia. – afirmei, agora ficando um pouco magoado – Mas não, você está me julgando.

— É a mesma coisa de acobertar um assassino, Diego! É como se você fosse cúmplice! Não denunciando ele, você está ajudando-o no assassinato da sua mãe!

— Não diga isso! – gritei e levantei-me, apontando o dedo para ela numa explosão de ódio, sem pensar. Ao voltar a mim mesmo, notei a expressão assustada da jovem, que olhava-me com os olhos arregalados, como se não me conhecesse, e estava paralisada. Vi que algumas lágrimas se formaram em seus olhos, fazendo meu coração apertar, e me arrependi instantaneamente – Ana, eu... – ela não esperou eu terminar, apenas deixou o quarto, provavelmente já em prantos. Neguei com a cabeça e dei um chute na cadeira que tinha ali, além de socar a pequena mesa de madeira com as duas mãos, apoiando o peso do meu corpo sobre ela. Aquele dia só piorava.

—-

Eu precisava sair daquele hospital, pois só o pensamento de estar no mesmo local que aquele monstro me dava náusea. Decidi então trocar minha folga por aquele dia, e eu já sabia para onde ia. Deixei um bilhete na prateleira de Anastasia, avisando que tinha ido embora, e peguei um táxi, fazendo uma ligação no caminho.

— Alô?— a pessoa para a qual eu ligara atendeu, com uma voz sonolenta.

— Você está em casa? – questionei, indo direto ao ponto.

— Sim. Por quê?— respondeu e perguntou, parecendo confuso.

— Estou indo para aí. – afirmei e desliguei antes que ele falasse qualquer coisa.

Continuei o resto do percurso até meu destino em silêncio, apenas ouvindo a música do rádio do táxi, que tocava o que parecia um CD do Elton John, enquanto observava pela janela a grossa chuva que caía lá fora, típico de Seattle.

Ao chegarmos, paguei o taxista e saí do veículo, adentrando o prédio rapidamente para fugir da chuva. Interfonei para o apartamento de quem procurava, e em poucos minutos eu estava parado na porta dele.

— Bom dia. – cumprimentou ao abrir a porta, e eu medi-o com os olhos. Ele usava uma blusa e calça de moletom bem velhas, e sua cara era de quem acordara à pouco, com os cabelos castanhos bastante bagunçados – A que devo a honra de sua visita? – indagou depois de deixar-me entrar, e fechou a porta atrás de si.

— Eu precisava de um pouco disso. – falei e virei-me bruscamente, segurando seu rosto e unindo nossos lábios com vontade. O mesmo correspondeu ao beijo com a mesma intensidade, dando-me permissão para tirar sua blusa, até que ambos fomos parar em seu quarto, já praticamente pelados.

—-

Já encontrava-me totalmente vestido, apenas sentado na beirada da cama enquanto calçava meus sapatos. Sentia o olhar do rapaz em minhas costas, mas evitava olhá-lo.

— Okay, eu realmente gostei disso, mas agora vamos aos fatos. – disse, quebrando o silêncio tenso que estava formado – Por quê?

Suspirei e parei de mexer no cadarço de meu coturno, fitando o nada, enquanto pensava se deveria conta-lo o que estava acontecendo. A última pessoa para a qual eu contara, não tinha reagido muito bem, então o que me garantia que ele iria aceitar numa boa?

— Dia muito ruim no trabalho. Muito, muito ruim. – respondi e voltei a amarrar os sapatos.

— Uau. Então eu sou anestesia, agora. – ironizou, e eu revirei os olhos, ainda olhando para baixo – O que aconteceu de tão ruim assim, para você vir usar-me a essa hora da manhã?

— Você não quer saber. – neguei com a cabeça e levantei-me, procurando meu casaco pelo chão do quarto.

— É claro que eu quero! – rebateu, e eu continuei calado, até que finalmente encontrei a peça de roupa que procurava e vesti-a, dirigindo-me à porta – Hey! – gritou para chamar minha atenção, e eu virei-me para ele assustado, analisando sua expressão. O homem moreno apenas bateu a mão na cama ao seu lado, convidando-me para ir até lá – Você sabe que pode confiar em mim. – prendeu seus olhos castanhos nos meus com convicção, fazendo-me ceder.

Respirei fundo e voltei para a cama, deitando-me ao seu lado, por cima do lençol que cobria seu corpo.

— Creio que já te falei alguma coisa sobre meu pai. – afirmei, sem coragem de olhar para ele.

— Sim, você me disse que ele ajudou sua mãe a se matar. – concordou, e eu pude sentir que ele olhava diretamente para mim.

— Exatamente. – assenti, e continuei encarando a parede à minha frente – Ele é um médico renomado, e foi dar uma palestra no hospital hoje. Quando eu o vi, simplesmente não consegui. – prendi o choro, fazendo que não com a cabeça.

— Eu sinto muito, Diego. – colocou uma mão em minhas costas, aproximando-se mais de mim.

— Mas eu não te contei a história toda. – falei, agora abaixando os olhos para minhas mãos – Eu descobri as cartas que ele e minha mãe trocavam, e foi nelas que ele explicou a ela como cometer suicídio. Então eu peguei essas cartas e vim para os Estados Unidos, e subornei meu pai. Se ele não me desse dinheiro e me arrumasse uma vaga em Harvard para medicina, eu iria a público com as cartas. Foi assim que eu entrei na universidade. – expliquei hesitante, já esperando uma reação extremamente negativa do homem.

— Não culpo você. – disse, fazendo-me olhá-lo surpreso – Você tinha um sonho e uma oportunidade única de consegui-lo, então você simplesmente pegou-a. Pode não ter sido o politicamente correto a se fazer, mas eu não o condeno totalmente, isso porque eu talvez faria a mesma coisa. Olhe para mim, eu vim para a América achando que ia encontrar meu sucesso, e hoje em dia trabalho como barman. – riu fraco – Se eu pudesse fazer o que você fez, eu faria. Hoje em dia estaria com uma vida financeira estabilizada como a sua. Então não se culpe. Você pode não ter feito a coisa certa aos olhos dos outros, mas foi a coisa certa para você, para sua vida. – segurou meu rosto delicadamente com sua outra mão, olhando-me carinhosamente.

Continuei encarando seus olhos por mais um tempo, sem falar nada. Foi ali que notei o quão especial ele era, e como ele me fazia bem. Eu o conhecera na boate LGBT+ que frequentava, pois ele trabalhava como barman lá. E como um bom barman, ele ouvira todos os meus desabafos, até que um dia levamos nosso relacionamento para fora da boate. No entanto, ainda nos encontrávamos às escondidas, nem mesmo Anastasia sabia. Sem contar que dormíamos com outras pessoas, ou seja, não era nada sério. Mas aquele momento com ele fez-me perceber que talvez ele fosse a pessoa. Aquele que me faria companhia não importava o quê. Aquele que me faria largar todos os outros. Contudo, o pensamento de ter algo mais sério me sufocava, e senti meu coração acelerar, dando-me pânico.

— Eu tenho que ir. Obrigado. – afirmei e pulei para fora da cama, livrando-me de suas mãos.

— Espere! – berrou novamente, antes que eu saísse do quarto – Você não vai embora assim. – levantou da cama, completamente nu, e começou a aproximar-se – Olha, eu tenho tentado te dar o espaço necessário, e respeitar o seu tempo. Mas não sei se consigo mais fazer isso. Então vou ser bem sincero com você. – disse seriamente, e eu temia o que viria depois – Eu estou apaixonado por você. E não é dessas paixões passageiras. Eu acredito que somos mais do que algumas ficadas. Eu... – hesitou um pouco, e eu já sabia o que ele ia dizer, e apesar de me assustar, deixei-o dizer – Eu te amo. – soltou finalmente e suspirou, encarando-me.

Fiquei sem reação por algum tempo, apenas olhando-o com os olhos arregalados. Eu não sabia o que dizer. Eu o amava? Talvez, mas eu não tinha 100% de certeza. Será que eu deveria tentar? E se desse tudo errado, e eu saísse ainda mais machucado? O amor nunca foi muito meu amigo. Será que dessa vez ele seria? Muitas perguntas e poucas respostas concretas.

— Eu... – falei apenas para quebrar o silêncio, sem ter a mínima ideia do que dizer – Olha, eu não vou mentir, eu gosto de você. Talvez até mais do que deveria. Mas não sei se posso fazer isso. Você é um cara incrível Mariano, mas eu tenho medo de dar tudo errado. – desabafei, lançando-o um olhar um pouco culpado.

— Eu sei que é difícil. O amor também me deu umas surras durante essa vida. Mas eu sinto que com você, as coisas são diferentes. Eu acho que dessa vez vai dar certo. – segurou minhas mãos e tentou convencer-me com o olhar – Vamos lá, pare de ser um covarde. – brincou, sorrindo de canto.

— Por que não podemos deixar as coisas como estão? Está tudo maravilhoso! – dei de ombros, tentando esquivar-me.

— Maravilhoso só se for para você. – rebateu, erguendo as sobrancelhas – Eu fico no bar apenas observando você flertando com outros caras. E toda vez que você vai embora com um deles, meu coração parte. Porque eu fico imaginando, e se você encontra em algum deles o que eu não tenho? E se você decide ficar de vez com algum deles? – suspirou, parecendo entristecer-se – Olha, eu sei que não tenho muito a oferecer, na verdade, tenho nada. Mas eu não quero mais ficar assim. Se não for para termos algo sério, prefiro não vê-lo novamente. Assim posso tentar seguir em frente. – ficou sério. Então ele estava lançando-me um ultimato? Inacreditável!

Abri a boca para responder, mas não consegui. Eu realmente gostava dele. E o sexo... Ah, o sexo! Mas não sabia se estava pronto, ou se algum dia estaria pronto. Contudo, não conseguia me ver sem ele. Não conseguia imaginar ficar um dia sequer sem vê-lo. Isso significava que eu o amava? Bem, talvez. Mas era complicado. Será que valia o risco?

— Eu vou perguntar pela última vez. – afirmou, respirando fundo – Dr. Diego Gomes, você aceita ter um relacionamento sério comigo?

— Sim. – respondi na lata, parando um pouco de pensar.

— Sim? – abriu um sorriso largo, aparentemente sendo pego de surpresa.

— Sim. – concordei com a cabeça, abrindo um sorriso um pouco tímido.

O rapaz deteve-se em abraçar-me fortemente e depois beijar-me ternamente, transbordando alegria. Talvez ali começava um novo capítulo da minha vida.

—-

Adentrei o saguão do enorme e chique prédio em que Anastasia morava, dirigindo-me diretamente para o balcão. Antes que pudesse falar com o porteiro, ouvi uma voz masculina atrás de mim, interrompendo-me.

— Diego? – indagou, fazendo-me virar para ver quem era, e dei de cara com Erick.

— Oi, Erick. Não sabia que estava morando com sua irmã. – afirmei, medindo-o com o olhar.

— Só vim para uma visita. – deu de ombros – Tenho um encontro hoje. – disse, como se eu me importasse.

— Com quem? – tentei mostrar interesse.

— Claire. – sorriu sacana.

— Claire Scofield? A que trabalha no hospital? – ergui uma sobrancelha, surpreso.

— Sim. – assentiu, ainda sorridente.

— Tome cuidado com ela. Vá com calma. Ela já sofreu muito nos últimos anos. Não a iluda. – aconselhei, lembrando-me brevemente de tudo o que a jovem tinha passado. Eu considerava Claire uma grande amiga, já que tínhamos passado por várias coisas juntos.

— Ainda não sei muito bem o motivo desse sofrimento todo, mas eu estou respeitando o tempo dela. Obrigado. – disse fechando um pouco o sorriso – Ana acabou de entrar no banho. Pode subir, toma aqui as chaves. – entregou-me um molho de chaves – Pode deixa-lo subir, apartamento 212. – virou-se para o porteiro, que assentiu – Até mais. – deu dois tapinhas em meu ombro e seguiu para fora.

— Até mais. – despedi-me e observei-o deixar o local.

Respirei fundo e tomei coragem para subir para o apartamento de Anastasia, pois teria que encará-la depois de nossa briga mais cedo. Caminhei até o elevador e apertei o botão do andar dela. Algum tempo depois, estava destrancando a porta, e adentrei o imóvel um pouco hesitante. Tranquei novamente e segui até o banheiro.

— Ana? – chamei ao chegar na porta, e dei algumas batidinhas.

— Quem está aí?! – exclamou, parecendo assustar-se.

— Sou eu, o Diego. – respondi, querendo acalmá-la.

— Entre. – afirmou, e eu abri a porta lentamente, visualizando-a dentro da banheira cheia de espuma, com uma garrafa e uma taça de vinho ao seu lado. Fechei a porta atrás de mim e aproximei-me, sentando-me ao lado da banheira em seguida.

— Eu sinto muito. De verdade. Não queria ter gritado com você. – falei, depois de alguns minutos num silêncio pesado.

— Eu não deveria ter te julgado daquela forma. Quero dizer, o que você fez não está certo, eu não concordo, mas te atacar da maneira que eu fiz, também não foi certo. Desculpa. – disse, e ficamos quietos de novo.

— Estou namorando. – soltei, finalmente olhando-a.

— Como assim?! Com quem? – franziu o cenho, chocada.

— Mariano Garcia. – respondi, sorrindo fraco – Ele é o barman da boate LGBT+.

— Tome um pouco de vinho e conte-me mais. – apontou para a garrafa e voltou-se para mim, curiosa.

No final das contas, aquele acabou não sendo um dia tão ruim assim.

Justiça é um conceito complicado. O que é justo para você? A justiça realmente cabe apenas às autoridades? O mundo não é justo. Então muitas vezes, cabe a nós fazermos com ele seja. É assim que eu penso. Mas quem sou eu para falar qualquer coisa?

 


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Notas finais do capítulo

O que acharam do passado do Diego? Foi surpreendente? E sobre o novo namorado dele, qual suas opiniões?
Bem, espero que tenham gostado do capítulo. Vejo vocês nos comentários. Beijos!