Badlands escrita por Risurn


Capítulo 6
Capítulo Seis


Notas iniciais do capítulo

Prometi que ia postar quinta, e aqui estou eu, postando na quinta. Espero que gostem!



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O caminho até minha casa foi tranquilo e agradável, com Jason me alfinetando vez por outra com relação à Nico enquanto eu dava respostas evasivas. Afinal, o que havia para ser dito? Por fim, chegamos ao meu prédio.

— Tem certeza que não quer subir?

Jason assentiu com a cabeça.

— Piper está me esperando. Mas olha, nós podíamos sair um dia desses. Eu, você e o pessoal. O que você acha?

Sorri um pouco, tentando não parecer animada demais. Jason e eu precisaríamos percorrer um longo caminho antes de fecharmos todas as feridas.

— Eu adoraria.

Não consegui me manter acordada por muito tempo depois que cheguei em casa, com minha cabeça pesando de um jeito fora do normal, eu dormi.

Por volta das dez horas acordei com um aperto no peito, lembrando que não havia tomado os remédios.

Rumei até a cozinha buscando pelos comprimidos.

Gostaria de ter forças para não precisar deles. Gostaria de nunca ter sido diagnosticada com transtorno bipolar.

— Sabe do que você precisa, Thalia Grace? Você precisa se distrair. É disso que você precisa. Você precisa de uma distração. Uma distração de cabelos e olhos negros, para ser mais específica.

Respirei fundo sentando na minha cama bagunçada e pegando meu notebook.

Eu não costumo usar redes sociais ou algo assim, porque me distraem muito fácil e geralmente me colocam pra baixo.

Fechei os olhos, torcendo para não ser pega no que estava prestes a fazer: procurar Nico di Ângelo em todas as redes sociais possíveis.

Isso é coisa de stalker, sua maluca.

Depois de quase uma hora de exaustiva procura, cheguei à conclusão que ele também não era fã de redes socais, exceto uma: twitter.

Franzi um pouco o nariz, pensando que nada de bom podia vir de uma pessoa viciada em twitter.

Talvez eu tenha stalkeado ele um pouco.

 

Nico di Ângelo (@ghostking) · 7h
Eu não sabia que o Jason era tão super protetor

 

Nico di Ângelo (@ghostking) · 7h
Was sorta hoping that you’d stay
Baby we both know
That the nights were mainly made
For saying things that you can’t say tomorrow day

 

Nico di Ângelo (@ghostking) · 7h
Por Hades, quem fala “pelo amor do milharal”?

 

Nico di Ângelo (@ghostking) · Dom 23:53
A vida tem umas coincidências estranhas, não é?

 

Respirei um pouco mais fundo que o necessário ao perceber que talvez, apenas talvez, Nico tivesse jogado indiretas para mim – mesmo sem saber que eu as leria.

Juro que tentei evitar a parte de mim que seria uma louca perseguidora, mas acontece que eu não consigo separar a parte louca de quem eu sou.

Talvez eu tenha criado um twitter falso.

Talvez eu tenha favoritado o di Ângelo para saber o que mais ele diria sobre mim.

Talvez eu estivesse entrando num jogo perigoso.

Talvez eu esteja começando uma tempestade.

Mas tudo bem também, afinal, eu sou o próprio furacão.

(...)

Mal preguei os olhos a noite toda, então quando o despertador tocou eu quis chorar. Quis mesmo. Com toda a força dos meus pulmões, mas apenas levantei, tomei um banho e troquei de roupa. Saia preta, camisa azul e os instrumentos de tortura, conhecidos como saltos.

Novamente sai com pressa demais para tomar café em casa, mas dessa vez resolvi passar na cafeteria antes que Bóreas me mandasse passar pelo elevador.

O atendente era muito simpático, apesar de um pouco lerdo. Eu juro que fiquei a um passo de jogar o cardápio na cabeça dele, mas percebi que não seria prudente. E que daria muito trabalho ir até outro lugar para comprar café.

Ele terminou sorrindo e eu fui andando até a empresa, que não era muito longe. A universidade também não era muito distante daqui para ser honesta, e fiz uma nota mental de que deveria passar lá uma hora.

Peguei meu celular enquanto atravessava a rua e atualizei o feed do twitter, na esperança de encontrar mais alguma coisa, sem sucesso.

Quando entrei na empresa fui até Alice.

— Bóreas não está de bom-humor hoje. – Ela me alertou, entregando o celular de serviço, mas eu apenas revirei os olhos.

— E quando ele está?

Assim que cheguei ao décimo andar, meu celular apitou com uma mensagem de Bóreas pedindo café.

Ri sozinha.

— Não é possível. – Ofeguei enquanto continuava a subir as escadas. – Acho que ele sabe quando eu vou estar subindo e manda mensagem para me fazer descer de propósito.

Depois de muita luta, muitos degraus, muita falta de ar e pausas estratégicas para que minhas pernas não virassem gelatina, consegui chegar até meu andar.

Acho que é por isso que tenho tanto apego à minha mesa. Simplesmente não existe sensação melhor do que sentar após subir sessenta andares. Estou considerando seriamente negociar com Bóreas um encontro com Zetes ou Calais em troca de uma sala no segundo andar. Considerando muito seriamente.

Mal tive tempo de sentar quando Bóreas irrompeu de sua sala, parecendo muito, muito irritado.

— Você já chegou? Não viu que eu disse que queria...

Apenas levantei o copo extragrande de sempre, fazendo-o ficar calado por alguns segundos.

— Certo. E a minha papelada para a reunião de hoje à tarde, já organizou?

Respirei fundo enquanto ligava meu notebook.

— Está na sua mesa desde ontem.

Bóreas apenas bufou e voltou para dentro da sala.

Olhei ao redor procurando por alguma câmera, porque não era possível ele sempre adivinhar o momento em que eu chego ao escritório.

A manhã corria normalmente conforme eu organizava pautas de reuniões, marcava e desmarcava compromissos e fechava os últimos detalhes das atuais transações comerciais.

Por volta das dez Bóreas saiu do escritório e me disse que tinha coisas importantes para resolver, que só voltaria quando eu já não estivesse ali e que eu deveria desmarcar todos os compromissos do dia.

Precisei usar muito do meu autocontrole para não jogar meu peso de papel na cabeça dele por me fazer perder quase uma manhã inteira de trabalho com agendamentos que não serviram para nada.

Era quase meio-dia quando o estagiário me trouxe outro copo de café, me deixando imensamente agradecida.

Tentei me concentrar em mais alguns pontos da papelada administrativa, mas meu celular parecia gritar sobre a mesa para que eu desse apenas uma olhadinha. Só uma. Que nem iria demorar. Só puxar o dedinho para baixo e ver o feed carregando.

Quase cai da cadeira ao notar que havia notificações.

 

Nico di Ângelo (@ghostking) · 3 min
E, claro, o melhor atendente @seaweedbrain

 

Nico di Ângelo (@ghostking) · 4 min
Aqui perto do campus tem o melhor café da cidade

 

Nico di Ângelo (@ghostking) · 15 min
Finalmente vou poder sair daqui

 

Achei que fosse cuspir todo o meu café. É uma oportunidade que eu não posso perder.

Puxei minha bolsa comigo e enfiei meus celulares lá dentro.

Acho que nunca desci aqueles sessenta andares tão rápido.

— Por Zeus, Thalia! O que foi? – Alice levantou da cadeira, parecendo assustada.

— Vou fazer... – Ofeguei. – Uma pausa para o almoço. Não sei se vou poder voltar. Você me dá cobertura? – Ela assentiu, ainda sem entender. – Obrigada! Eu trago um café para você amanhã.

— Com canela! – Ela gritou enquanto eu já passava pelas portas de vidro.

Tudo bem Thalia. Calma. Para que essa pressa toda? Você nem sabe se é a mesma cafeteria.

É claro que é.

Quando consegui avistar o lugar pude ver através da fachada de vidro, Nico, sentado, analisando o cardápio.

— Obrigada Deus, por me proporcionar esse momento.

Caminhei calmamente até lá, como se não tivesse corrido por quase três quarteirões em cima de um salto alto.

Quando entrei no café rumei até o balcão, propositalmente perto da mesa onde Nico estava sentado, e decidi ficar por lá, apenas analisando o cardápio – sem conseguir realmente lê-lo – até que ele me notasse.

E ele notou.

— Thalia?

Ensaiei minha melhor cara de surpresa e virei em direção à Nico.

Eu só posso ser maluca.

— Nico? Nossa! Uau. Que... Surpresa te ver aqui!

Ele sorria e me convidou para sentar com ele.

— Estou realmente começando a achar que você está me perseguindo.

Comecei a rir.

Pela primeira vez, você acertou.

— Eu que vou começar a achar que você me segue. Eu venho aqui todos os dias.

— Sério? Nunca te vi aqui.

— Eu venho quase sempre durante a manhã. Compro café para mim e para o meu chefe, essas coisas.

Só então ele reparou nas minhas roupas.

— Ah, está vindo do emprego? Horário de almoço?

— Na verdade... Fui dispensada mais cedo hoje.

— Jura? Que sorte, assim a gente pode almoçar juntos. Que tal?

Sorri.

Nem acredito que funcionou, pelo amor do ser superior que está de bom-humor comigo hoje.

— Eu adoraria.

Nico foi até o balcão pedir vários pãezinhos e pedaços de torta, junto com sucos e eu apenas ria sozinha. Era divertido flertar novamente, e Nico era minha presa da vez.

— Então... Onde você trabalha? – Ele perguntou ao trazer nossas coisas numa bandeja.

— Na Olimpus.

— Ah, claro. – Ele bateu na própria testa, como se fosse óbvio. – A empresa da família do Jason. Quer dizer, da sua família, bom, da família de vocês dois, afinal, você e Jason são irmãos. Ai. Estou me enrolando.

Ele pegou um dos pães e enfiou na boca, me fazendo rir.

Que gracinha, ele ficou tímido.

— Tudo bem. Você faz faculdade? De manhã?

— Sim. Quer dizer, eu fazia. Fiz fotografia. Agora eu dou algumas aulas sobre iluminação no campus durante a manhã, as vezes faço uns bicos como fotógrafo também.

— Você é fotografo? E ainda é professor? Sério? Que legal!

Ele pareceu um pouco envergonhando com tanta empolgação da minha parte, então tentei me conter.

— É, eu gosto bastante. Você ainda estuda?

Neguei.

— Larguei a faculdade há muito tempo. Eu estava no segundo ano de Administração e queria fazer uma pós em Processos Gerenciais, talvez uma outra graduação em empreendedorismo... Mas não deu certo. – Suspirei. – Provavelmente eu teria terminado minha pós no semestre passado.

— O que houve? Digo, por que você largou?

Eu enlouqueci. Tive um episódio hipomaníaco, seguido por um episódio de depressão maior¹ e outro hipomaníaco durante a segunda fase do curso. Durante o primeiro episódio hipomaníaco eu assinei minha saída da faculdade em um surto. Quando entrei na fase depressiva, me arrependi, mas percebi que era o melhor. E quando a maníaca voltou... Eu simplesmente esqueci, porque estava muito ocupada sendo expulsa de casa por meus problemas mentais.

— Problemas. Tive alguns desentendimentos com minha família e acabei sendo obrigada a sair. Morar sozinha e tal.

— Verdade! Você mora sozinha. – Ele fez uma pausa enquanto tomava um gole do suco. – Eu adoraria conhecer um dia desses.

Comi um pedaço da minha torta de morango e sorri para ele.

Vou fazer uma loucura e não estou nem aí.

— Você tem algum compromisso?

— Como?

— Algum compromisso marcado para hoje à tarde. Não sei, um ensaio fotográfico, visita de família, amigos?

— Não, por quê?

Sorri um pouco mais.

— Gostaria de conhecer meu apartamento?

Nico abriu e fechou a boca, antes de sorrir.

— Sem dúvidas.

(...)

— Bem-vindo ao meu lar!

Nico sorria enquanto entrava. Minha casa não era grande, como já devo ter mencionado, mas Nico agia como se eu tivesse aberto as portas do paraíso.

— Que lugar legal!

— E minúsculo. – Parei no meio da sala e fiz as indicações. – Aqui atrás de mim, é a cozinha. Não tem espaço para mesa, então eu uso passa-prato, não tem lugar para muitas banquetas também, pra ser honesta, então só tenho essas duas. Aqui é a minha sala. A TV fica nesse suporte para que eu possa girar ela tanto pra cá, quanto pra minha cama. – Apontei para o móvel à minha direita atrás da meia parede. – E ali é o banheiro. Sinta-se em casa. Vou pegar algo pra gente.

Abri meu armário de bebidas em busca de alguma coisa que fosse útil ao momento e não pude deixar de sorrir ao encontrar uma garrafa de licor.

— Isso é muito legal. Tudo conjugado. É quase como uma casa de alguém com alma de artista.

Meu sorriso vacilou um pouco ao pensar no sonho de minha mãe em ser atriz. Nunca realizado. Perdido no tempo como tantas outras coisas.

— Então ela seria perfeita para você. – Estiquei um copo para ele e o convidei a sentar no sofá. – Eu moro aqui há quase seis anos, mas acho que nunca me senti em casa.

Ele franziu o rosto ao tomar um gole da bebida e girou o corpo em minha direção.

— Por quê?

Dei de ombros.

— Quem pode saber? É só uma sensação boba.

Ele se aproximou um pouco mais de mim enquanto eu esvaziava meu copo.

— Eu tenho certeza agora: você tem um sério problema com bebidas.

— Todo mundo tem um sério problema com alguma coisa.

Touché.— Ele levantou o copo como que em um brinde com o ar.

Nico estava tão próximo que eu conseguia sentir a fragrância do seu perfume. O cheiro da bebida misturado ao hálito. Cada pequeno ponto espalhado pelo rosto.

Ele sorria de um jeito que as pessoas não deveriam sorrir em ambientes fechados caso não tenham a intenção de se pegar loucamente.

Tentei acabar com a distância entre nós, mas não tive sucesso por ele ter levado os lábios em direção ao meu pescoço.

Lábios suaves com gosto de licor, eu tinha certeza.

— Então... Então é verdade. – Ofeguei conforme os copos se perdiam no chão e Nico me puxava para mais perto.

Ele brincava com os botões da minha camisa enquanto meu pescoço insistia em ficar inclinado, dando um espaço considerável para Nico explorar.

— O que é verdade?

— Essa história... De que você não costuma beijar.

Senti o sorriso dele no meu pescoço, conforme subia os lábios até minha orelha.

— Talvez.

Me recompus, afastando-o um pouco para encarar seus olhos.

— Você sabe que isso vai ser apenas uma distração, não sabe? Um... Caso.

Nico me puxou para cima do próprio colo, espalmando as mãos nas minhas pernas e depois sorrindo.

— As coisas não costumam passar de casos de uma noite comigo Nico. – Ele beijou meu pescoço, abrindo os botões da minha camisa.

— Que sorte a nossa, comigo também não.

Ele levantou, içando meu corpo com ele e nos guiando até a cama. Meus pensamentos começaram a ficar nebulosos e me peguei tirando a blusa do di Ângelo, enquanto meus sapatos se perdiam em algum lugar entre a sala e o quarto.

Sua boca corria por meu pescoço lentamente, fazendo com que tudo se embaralhasse ainda mais na minha cabeça conforme eu era deitada na cama.

As mãos de Nico percorriam por lugares que me faziam contorcer.

— Pra mim, a boca é… especial.

Essa boca é realmente especial.

— O beijo com uma pessoa... é algo sem igual. Quase mágico.

Os lábios ainda desciam pelo meu torço, me fazendo arrepiar, e ele sorria com os lábios contra minha barriga.

Suas mãos me seguravam no lugar, deixando minha respiração falha. Tentei puxá-lo, para perto, numa tentativa falha de beijá-lo, mas ele apenas riu e desceu um pouco mais, puxando minha saia.

— Além de que, querida Grace, existem lugares muito mais interessantes para beijar.

Todo o ar que existia no meu corpo foi embora assim que ele começou.

— Tem razão. Vamos deixar a boca para depois.

Conforme os minutos passavam, eu não conseguia me dar conta do caminho sem volta em que eu havia entrado.

 

 

 

 

¹Episódio Depressivo Maior: Um pouco diferente da depressão convencional, ocorre quando uma série de sintomas persistem durante duas semanas e representam mudança de comportamento; pelo menos um dos sintomas é humor deprimido ou perda de interesse ou prazer (tem que ter pelo menos um desses dois). Exemplos de sintomas: Sensação de tristeza ou desânimo diária, dificuldade de concentração e memória, comer em excesso, sentir-se sem esperança, perder interesse em situações prazerosas, pensamentos suicidas, insônia ou excesso de sono, pensamentos de conteúdo negativo, culpa, dores pelo corpo e diminuição importante ou perda da libido.

²Percebi que eu não falei alguns sintomas do episódio hipomaníaco, então: Autoestima em alta ou grandiosidade (sem delírios), pouca necessidade de sono, compulsão para falar demais, pouca concentração, agitação psicomotora, envolvimento excessivo em atividades prazerosas com alto potencial para consequências dolorosas (como fazer compras até se endividar, fazer sexo com muitas pessoas ou praticar esportes radicais sem o equipamento adequado por exemplo), pouco controle temperamental, fácil irritabilidade, aumento da agressividade, excesso de positivismo, abuso/dependência de álcool e/ou drogas.

³Nem todo mundo apresenta todos os sintomas de uma só vez, mas boa parte deles estão presentes nos episódios.

 

 


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Notas finais do capítulo

Vou sempre buscar colocar alguma informação relevante sobre os transtornos pra vocês, espero que continuem me acompanhando!



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