Nico tinha passado quase o dia todo dormindo, agora estava sem sono.

— Sente aqui. Podemos conversar – Will tinha dito.

Nico acomodou-se de pernas cruzadas com as costas apoiadas no umbral da porta da enfermaria, de frente para Will, e quis saber:

— Vamos conversar sobre o quê?

— Hmm... Me conte um segredo.

Will o observava com os braços sobe os joelhos dobrados.

— Tipo... alguma coisa que quase ninguém saiba sobre você.

— Por quê?

— Porque é o que amigos fazem – foi a resposta simples de Will.

Nico ainda não entendia por que Will insistia em querer ser seu amigo, mas também não queria que o loiro mudasse de ideia. O problema era que seu estoque de coisas que quase ninguém sabia a seu respeito era bem grande e não conseguia pensar em nada que se sentisse confortável para partilhar com Will assim de cara.

— Tudo bem, eu começo, então – Will decidiu. Parou um pouco para refletir, e finalmente disse: - Quando eu era pequeno, morava com meus avós no interior do Texas e quase nunca via minha mãe. Aí um dia ela veio no meu aniversário e me deu um elefante de pelúcia, disse que era para eu me lembrar dela quando o visse... Eu fiquei obcecado por aquele bichinho. Se não estivesse comigo quando fosse dormir, tinha pesadelos horríveis... Achava que minha mãe esqueceria de mim se ele não ficasse por perto...

— O que houve com ele? O elefante de pelúcia. Você ainda tem?

— Não... Com o tempo, ele foi ficando muito velho e sujo... Um dia, meu avô se irritou. Disse que eu estava bem grandinho para aquele tipo de bobagem... Aí ele o jogou fora. – Will encolheu levemente os ombros, como se não fosse nada de mais, mas Nico podia perceber que não era exatamente uma boa lembrança. Will acrescentou: - Meu avô era um texano bem típico, sabe. Republicano e tudo mais... Mas minha avó era maravilhosa... Você teria gostado de conhecê-la.

Nico não sabia bem o que pensar sobre Will imaginá-lo conhecendo sua avó, mas aquela história atiçou seu interesse sobre o garoto. Era como conhecer um outro  lado do filho de Apolo, difícil de imaginar quando se estava acostumado ao seu jeito calmo e sorridente.

— Eles... morreram? – perguntou hesitante.

— Sim. Minha avó teve câncer. Foi pouco antes de eu vir para o acampamento... Meu avô... Minha mãe diz que ele morreu por causa de toda a amargura que guardava, mas a verdade é que sofreu um derrame.

Os olhos de Will se desviaram para o lado de fora, meio perdidos. Nico pensou em lhe dizer algo para animá-lo. Mas o que ele sabia sobre animar pessoas?

— Às vezes... eu sonho que sou uma pipoca.

Will voltou-se imediatamente para ele, achando que tinha entendido errado.

— Acho que é porque... Quando estava com o pessoal do Argo II em Veneza, um deus fazendeiro me transformou em milho por um tempo... Então, nesse meu sonho, sinto que estou num lugar muito quente e, de repente... POP, eu explodo e viro pipoca.

Nico disse isso com uma voz neutra, mexendo distraidamente num buraco no joelho de sua calça jeans preta. Quando levantou os olhos, foi a tempo de ver Will cobrir a boca para abafar uma risada, enquanto tentava se desculpar:

— Ai, minha nossa! M-me desculpe por rir...

— Tudo bem, é idiota mesmo.

— Não, é só que eu...

Enquanto Will tentava, sem muito sucesso, parar de rir, Nico sentia como se as borboletas esqueleto no seu estômago estivessem derretendo.