Capítulo Dois.

– Sra. Clearwater?

– Olá, Clarissa. – ela me cumprimentou e pelo tom de sua voz, ela estava preocupada mesmo que estivesse querendo esconder.

– Aconteceu alguma coisa?

– Na verdade, nada que você deva se preocupar por enquanto.

– Você tem certeza que— parei o que dizia ao notar que Sra. Stanley estava ali, no seu lugar de sempre fingindo ler uma revista quando eu sabia muito bem que estava escutando a nossa conversa, Sra. Clearwater pareceu perceber o mesmo, pois me lançou um olhar e eu captei a mensagem. – Que tal subirmos para o meu quarto? Você me conta o que houve, então.

– Claro. – agradeceu ela.

– Ah, boa tarde Sra. Stanley! Encontrei com Jess hoje. – falei com um sorriso, fazendo de conta que não tinha notado que ela estava ouvindo minha conversa.

– É mesmo, querida?

– Sim, ela foi muito legal e me apresentou os amigos dela, então nós almoçamos todos juntos. Estava com eles até ainda pouco e amanhã combinamos de sair. – falei soando simpática, a filha dela parecia ter uma personalidade parecidíssima com a de sua mãe.

– Espero que tenha se divertido.

– Sim, foi fantástico! Mas... agora vou subir, até mais!

– Até. Se precisar é só chamar – e ela contava mesmo que eu a chamasse, podia-se perceber isso.

Subi dois lances de escadas com Sra. Clearwater em meu alcanço, paramos no quarto número três – o meu quarto, e eu destranquei a porta, permitindo que Sra. Clearwater entrasse no quarto primeiro, que não era lá essas coisas, mas era uma suíte e tinha um espaço razoável para uma cama de casal, uma penteadeira com um banquinho, o papel de parede era azul claro e o chão era de madeira escura além de possuir uma janela que dava para quintal e logo depois a floresta. Fechei a porta atrás de mim e indiquei para que Sra. Clearwater se sentasse na cama enquanto eu sentava no banquinho da penteadeira.

– O que houve, Sra. Clearwater? – perguntei com a voz firme.

– Seth e Leah... Aconteceu essa noite com os dois. Foi horrível e eu pensei que talvez você—

– Ok, calma. Volta que eu não entendi! O que aconteceu com Seth e Leah?

– Eles, eles... não posso falar! Mas eu fiquei preocupada pensado que talvez você também tivesse isso. Você tem que vir comigo, vir para minha casa, sua casa, é preciso. Aqui não é seguro para ninguém...

– DO QUE VOCÊ TA FALANDO? – gritei completamente descontrolada, sem me importar quem me ouviria ou não. – PRIMEIRO VOCÊS ME REJEITAM E AGORA QUER QUE EU VÁ COM VOCÊ? E NEM QUER ME CONTAR A MERDA QUE TA ACONTECENDO!

Algo no meu interior se libertou, e eu berrava com todas as minhas forças, sentindo uma raiva que jamais sonhei que sentiria. E aquilo não era nenhum pouco meu eu natural.

– Shiii. – fez Sra. Clearwater – Clarissa, eu não posso contar, não ainda. Não hoje. Eu só fiquei preocupada com você. Você vai passar por uma coisa que eu não desejaria para ninguém, muito menos para meus filhos, mas acontece... Está dentro de você.

Eu estava começando a me sentir enjoada e com uma forte enxaqueca. Levei minha mão até minha testa e sentir tudo girar ao meu redor. Meu corpo tremia. O que diabos estava acontecendo comigo?! Eu estava bem uns minutos atrás e de repente me senti assim... Tão estranha...

– Ai não, não, não, não... – repetia continuamente Sra. Clearwater e sua voz soava estranha aos meus ouvidos, mas eu não ligava mais. Sentia meu corpo quente, muito quente, isso incomodava demais e minha cabeça estava latejando... Arde, está ardendo. Eu estou em chamas?... Eu já não agüentava mais e gritei. Depois tudo o que senti foi meu corpo se rasgando junto com minhas roupas e doeu, mas foi tão rápido. Quando dei por mim, a dor tinha desaparecido, abri meus olhos e eu estava mais alta, bem mais do que eu era, quase encostando minha cabeça no teto e minha visão estava diferente... bem melhorada, eu conseguia ver tudo de uma forma diferente, mais bonita. Via a Sra. Clearwater me olhar assustada e me perguntei o que tinha de errado comigo, tentei falar, mas não ouvi minha voz e sim o que parecia ser um latido. Fiquei atordoada e tentei mais uma vez. O mesmo. Olhei para mim mesma através do espelho da penteadeira e deixei escapar um guincho.

– Acalme–se, Clarissa. – ela finalmente falou e tudo o que eu quis foi poder perguntar para ela o que estava acontecendo e porque eu havia virado uma loba de pêlos castanhos e com algumas partes mais claras, imitando exatamente o tom de meus cabelos. Eu era um monstro?

– Clarissa, olhe para mim. – ouvi Sra. Clearwater me chamar, mas não lhe dei atenção. Irei ficar assim para sempre? NÃO! EU NÃO QUERO ISSO! Desesperada, pulei a janela e corri para a floresta, a última coisa que ouvi foi ela me chamar, mas era tarde, eu estava muito longe agora.

Eu corri e corri, tentando ficar o mais longe possível daquele hotelzinho, eu não fazia idéia de o quanto corri e há quanto tempo, isso sinceramente não me importava. Eu quero voltar, mãe! Eu quero ser eu mesma de novo! Chorei em pensamentos.

Você pode voltar, basta se controlar. A voz estava dentro da minha cabeça, mas não era minha e dificilmente era da minha mãe. Eu estou ficando louca? Eu realmente estou ouvindo vozes dentro da minha cabeça?

Sim, você está. Clarissa, eu sou Sam. Agora a voz tinha até nome?! Meu Deus, eu estou enlouquecendo ou simplesmente sonhando... É isso! É um sonho, ou melhor, um pesadelo! Não é real. Nada disso é real e eu irei acordar e rir de tudo isso.

Sinto ser eu a informar você, mas isso não irá acontecer. A voz – Sam – falou. CALA A BOCA!

Corri mais rápido, e minhas patas – eu tenho patas! – não se importavam. Só queria que isso acabasse! Eu não quero ser um lobo, não quero, não!

Sam, estamos aqui. Sue ligou para o Velho Quil e ele nos contou o que houve. Outra voz falou. Ah não! Tem outra voz aqui. Me deixem!

Calma garota, queremos te ajudar! Disse uma terceira voz. Diabos. Quantos mais têm aqui?!

Você realmente quer saber?

Se eu não quisesse não perguntaria!

Clarissa? Clarissa?

Oh Deus, Seth, é você? O que está acontecendo comigo? Me ajuda, por favor!

Calma, ok?

EU NÃO QUERO FICAR CALMA, NÃO ENTENDE?! EU SOU UMA LOBA. VOCÊ JÁ OUVIU FALAR EM ALGUÉM QUE SE TRANSFORMA EM ALGO COMO ISSO?

Eu entendo você. Ah. Oi irmãzinha, você é o mais novo membro da alcatéia. Isso era Leah, e ela estava sendo bastante irônica na parte do “irmãzinha”.

Alcatéia?! O que é isso?

Você saberá assim que voltar ao normal.

Que merda! E como você acha que eu vou fazer isso, gênio? – Eu também estava sendo irônica.

Leah, parece que você tem uma concorrente de humor negro. Alguém falou.

Deve ser de família. Outro apoiou o anterior.

Concentração, pessoal, Leah, você trouxe algo para ela vestir?

Yep, está comigo.

Jacob, onde você está?

Eu a farejei, estou bem perto.

Tome cuidado, ela pode atacar você.

Vocês estão falando de mim?!

Sim, eles estão, baby.

Clarissa?

Sim, er, Sam?

Se concentre, se acalme, tire tudo da sua mente, ignore todo o resto e tudo o que importa é você. Pense em voltar à forma humana e só nisso.

E eu fiz. Exatamente como ele disse e então senti meu corpo diminuir de tamanho, me encolhi na grama molhada esperando terminar e quando dei por mim, era eu de novo. Nua. Eu estava pelada na floresta, me encolhi pensando que sentiria frio, mas não, eu estava bem. Ótima, e quente. Fiquei parada, e calma, mas me desesperando, afinal, estava sozinha no meio do nada e pelada! Nem sei para onde ir! Mas interrompi meus pensamentos ao ouvir um farfalhar de folhas e olhei para o leste – que era de onde o barulho vinha – assustei-me ao notar brilhantes olhos na escuridão. Um lobo?

Mas então, uma forma humana saiu dali, e quando chegou mais perto, notei que vestia apenas uma bermuda, deixando o peito incrivelmente malhado de fora. Me encolhi mais, colocando meus braços ao meu redor, envergonhada que ele me visse nua.

– Hey. – a voz dele era quase uma melodia para mim. E vagamente familiar.

– Oi. – murmurei, mas não me movi e muito menos o olhei. – Você é o Jacob?

– Exatamente.