— Podem entrar. – Jackson diz abrindo uma porta num corredor escuro. – Sejam bem-vindos ao meu lar. – Ele fecha a porta atrás de si quando entramos e nos lança um sorriso.

O lugar era minúsculo. Só tinha um cômodo. Era impossível chamar esse lugar de lar. Nós andamos por cerca de dez minutos depois que saímos do parque. Entramos em alguns becos, atravessamos algumas porta e corredores. Descemos umas escadas e, enfim, chegamos a esse lugar. Tudo parecia mais um labirinto. Posso apostar que passamos mais de uma vez num mesmo lugar.

Aqui era tão pequeno que não caberia uma cama. Tem apenas um colchão jogado no chão, uma mesa encostada na parede, duas cadeiras, uma cafeteira e papeis espalhados por toda a mesa. Dou uma olhada entre eles, mas nenhum é dirigido a mim. Dou uma volta lentamente pelo local. Tem uma única janela, minúscula por sinal. Eu olho para fora, mas não tenho ideia de onde estamos. Parece ser alto e longe o bastante para que ninguém nos ache.

Castle está quieto. Não falou nada desde que saímos do parque. Ele olha fixamente para a parede atrás de mim. Quando me viro fico surpresa. Um quadro enorme, com notícias que saíram no jornal sobre o Castle. Na pequena estante, que eu não tinha visto antes, os livros dele estavam todos guardados, como se aquilo fosse realmente precioso para Jackson.

— Eu comprei todos. Além de pai, sou um grande fã. – Ele diz se aproximando de Castle. – Eu tenho muito orgulho de você, Richard.

Castle lhe dá um sorriso forçado e se afasta, ficando parado ao meu lado.

— Hoje nós viemos falar sobre a situação da Kate. O que você tem para nos contar? – A voz séria de Castle faz meu corpo estremecer. Eu só o vi assim uma vez, e foi um pouco antes de eu ir atrás da Alexis.

— Vamos sentar? – Jackson oferece os apontando as únicas duas cadeiras do local. – Eu não sou muito de receber visitas, então... desculpem a bagunça.

— Nós estamos bem assim. Não vamos demorar, certo? – Digo séria. Eu ainda não entendi onde ele quer chegar com tudo isso. – Acho melhor irmos direto ao assunto.

— Claro. – Ele sorrir e respira fundo. Volto meu olhar para Castle, que olha fixamente o pai. Está tão perdido em pensamentos que aposto que nem escuta o que nós dois falamos. Ele está olhando cada detalhe do Jackson, cada detalhe do local. Com certeza não vai esquecer esse dia tão cedo

— Você deve ter muitas perguntas, Kate. – Olho novamente para Jackson.

— Sim, várias. A primeira é: quem é você? – Ele solta uma risada irônica.

— Já disse. Eu sou o pai do Richard.

— Não. Eu quero saber quem você realmente é. Como soube de mim, como sabia onde eu estava, como chegou na hora certa, como soube dos papeis. Eu quero saber tudo.

— Calma. Vamos devagar, ok? – Ele retira o casaco e o chapéu. – Como já disse, eu soube de você por causa dele. – Ele aponta para Rick, que franze a testa em minha direção. – E como vocês puderam notar, eu acompanho a sua vida, Richard, desde que você nasceu.

— Desde que eu nasci? E nunca pensou em aparecer para ser um pai de verdade? Para me levar ao futebol, para me levar a natação, para brincar comigo no parque? – Castle joga as palavras na cara do pai, com uma raiva visível nos olhos. – Porque você nunca assumiu o papel de pai?

— É tudo muito complicado, Richard. O meu trabalho não permite que eu tenha uma família. Não permite nem que eu tenha uma vida particular. Assumir você como filho seria como te colocar no meio de uma guerra. Mas eu fiz o que pude para participar da sua vida. Eu sempre te acompanhei de longe. Já li todos os seus livros, leio suas entrevistas. Eu faço parte da sua vida, mas da minha maneira.

— Ler livros e entrevistas não faz de você meu pai. – Ele diz magoado.

Jackson me olha, suplicando para que o ajude nessa. Mas eu não posso. Estou totalmente de acordo com o Rick. Não importa as suas desculpas, não importa o quanto ele sabe sobre o filho, ele nunca foi um pai de verdade. E eu acho que já é muito tarde para isso.

— Vamos falar logo sobre a Kate. Eu quero sair daqui o mais rápido possível. – Castle diz firme.

— Certo. – Jackson respira fundo. – Por onde quer que eu comece, Kate?

— Pelo começo. Eu quero saber de tudo.

— Ok... como eu já falei, sempre acompanhei a vida do Richard. E desde que ele começou a te seguir pelas ruas eu tenho ficado mais atento. Nesse tipo de trabalho se arrumo muitos inimigos. Por coincidência, eu estava na cidade naquela semana. Sou da morte do capitão Montgomery, e eu tinha que ir ao enterro.

— Não lembro de te ver por lá. – Rick se manifesta.

— Eu fiquei de longe. Foi então que eu o vi. – Ele me olha sério. – O cara que atirou em você.

— Você o viu? Você viu o rosto dele? Você consegue se lembrar, fazer um retrato falado talvez... – as palavras saem de pressa e um pouco atropeladas. Castle segura minha mão, me dando apoio.

Algo dentro de mim se agita. Só de lembrar desse dia eu sinto vontade de vomitar.

— Eu não consegui ver o rosto dele. Ele estava de capuz. Eu tentei segui-lo, mas o perdi de vista na rua. A única coisa que eu sei é que ele é alto e branco. Nada mais.

Não falo nada. Minha cabeça gira pensando no que teria acontecido se o Jackson tivesse pego o cara. Talvez eu não tivesse passado por uma experiência de quase porte novamente. Por mais forte que eu seja, ou aparente ser, eu sei que essas experiências me deixaram marcas que nunca vão se apagar. Rick se aproxima de mim e envolve seu braço pela minha cintura, me puxando contra seu corpo. A única coisa que me acalma é sentir ele perto de mim agora. Eu sempre me sinto mais segura quando ele está aqui.

— Está tudo bem? – Ele pergunta acariciando meu rosto com a outra mão. – Se você quiser, podemos ir.

— Não. – Engulo o nó na minha garganta. – Eu quero escutar até o fim.

Encaro Jackson. Ele tinha que continuar.

— Depois daquele dia eu não consegui sair da cidade. Fiquei observando vocês de longe. Estava tudo normal, eu já estava pronto para partir quando a Alexis foi levada. Eu tive trabalho para conseguir encontrá-la. Mas quando cheguei lá, ela já não estava mais. Apenas a Kate.

— Então você foi lá por causa da Alexis? – Rick diz. Ele ainda me amparava, me segurando firme pela cintura.

— A princípio sim. Eu cheguei lá esperando encontrar a Alexis, mas só encontrei a Katherine. Ela estava caída no chão, com um ferimento no braço. Talvez tenha sido culpa minha, eu não pensei nas consequências. Eu a levei para sua casa o mais rápido possível. Não tinha ninguém melhor para cuidar dela do que você.

Ele para um momento e olha para o filho. Mesmo não sendo o pai perfeito, ele ama o Rick. Posso ver em seus olhos.

— Quando nós estávamos no carro a Kate não parava de me perguntar por esses papeis. Perguntava se eu tinha pego os papeis. E eu fiquei com isso na cabeça. Então voltei lá e peguei todos os papeis que vi. Demorou um pouco para entender tudo, mas quando eu entendi, eu sabia que precisava proteger você. Vocês. –Ele aponta para nós dois. – Vocês não fazem ideia onde se meteram.

— Nos proteger de que? De quem? – Mesmo temendo a resposta, eu precisava perguntar.

— Kate, eu estudei o caso com cuidado. Eu sei o que ele significa para você, e imagino o quanto você quer colocar esses bandidos na cadeia. Mas esses papeis é o que a mantém viva. Pelo menos por enquanto.

— Você está com os papeis?

— Sim. Eles estão seguros. – Ele se aproxima de nós. – Kate eu quero que você entenda uma coisa, aquele homem que te levou até aquela casa, estava te protegendo a pedido do capitão.

— Eu sei, ele me contou isso. Mas ele fez um acordo pela minha vida, e eu não posso aceitar isso.

— Eu sei sobre esse acordo também.

— Então! Me entrega esses papeis para eu meter esse desgraçado atrás das grades.

— Eu não posso Kate.

— O QUÊ? – Me exalto. Castle me pede calma, mas ignoro ele.

— Kate, esses papeis protegem alguém poderoso. Meu trabalho requer descrição, e quase ninguém sabe que estou vivo, então eu posso te proteger.

— E que trabalho é esse que você tanto fala? – Castle pergunta interessa. Por mais que ele sinta raiva, e um pouco de revolta, por não ter tido o pai antes, eu sei que ele está feliz em finalmente conhece-lo, e quer saber mais sobre ele.

— Espião. – Ele fala como não quer nada e continua. – Eu fiz outro acordo por você, Kate. Eles não sabem quem eu sou, então fica muito mais fácil para mim e para você. Eles não podem chegar perto de você ou da sua família, seus amigos ou qualquer um que seja próximo a você. Caso isso aconteça, isso tudo se tonará público. E acredite, ele não quer que isso se torne público.

— Eu agradeço, mas dispenso. Se você não vai me entregar os papeis eu não posso aceitar esse acordo. Eu não vou parar de investigar o caso da minha mãe. Eu quero ver esse desgraçado preso.

— Você não entendeu. Esse acordo só beneficia uma parte, a sua. Ele não pôde fazer exigências. Eu nunca falei que te manteria longe do caso da sua mãe.

— Você não vai me dizer quem é, mas vai me dar a chance de investigar o caso.

— Esse foi o acordo. Eu disse que não poderia te parar, mas que não entregaria os papeis. Então, desde que seja pelos meios legais, você pode investigar o caso à vontade. Nada vai te acontecer. Apenas investigue com cuidado. Ele é cauteloso. É quase impossível provar alguma coisa contra ele. Você não vai poder provar tudo o que ele fez, ele fez coisas piores do que fez com sua mãe. E isso, infelizmente, você não vai provar. Mas a prova do assassinato de sua mãe está mais próxima do que você imagina. Desde que você a encontre... você conseguirá a sua vingança.

— De que prova você está falando? – Ele sorrir.

— Isso é com você, Kate.

— Eles são perigosos. E se chegarem até você? – Castle pergunta preocupado.

— Não precisa se preocupar. Eu ficarei bem. Enquanto isso, algumas copias ficarão salvas com alguém que confio. Se algo me acontecer, vocês serão os primeiros a receberem os arquivos. Mas por enquanto... – ele abre o sorriso. – Curtam a vida de vocês. Esqueçam isso por algum tempo e curtam a vida de vocês. Não se preocupem com isso agora.

Castle e eu nos olhamos. Ambos com uma esperança no olhar.

— Mas... e o cara que atirou em mim? Ele ainda está solto.

— Acho que ele não será mais um problema.  – Jackson sorrir e eu me sinto confortável com isso. – Agora vão. Vão curtir a vida de vocês. Vão ser felizes.

— Obrigada. – Digo com um sorriso que insiste em não sair do meu rosto. – Obrigada por tudo.

Castle me solta e se aproxima dele.

— Obrigado também. Espero... espero que um dia eu possa te conhecer melhor.

— Eu também espero. – Jackson diz, estendendo a mão para Castle.

Eles apertam as mãos e nós saímos. Não sei como conseguimos acertar o caminho de volta. Aparentemente Castle tinha decorado o caminho. Eu estava tão feliz que deixei que ele me conduzisse para fora dali. Assim que saímos do prédio Castle para e me abraça forte.

— Está pronta? – Ele pergunta enquanto me abraça. Me afasto um pouco, apenas para que eu possa olhá-lo.

— Pronta para que?

— Para viver sem medo. E principalmente, esquecer esse assunto um pouco. Cuidar de você. Cuidar de nós. – Eu sorrio com sua proposta. – Pronta?

— Pronta. – Digo sem pensar duas vezes.

Castle segura minha mão e saímos o mais rápido possível dali. Tinha tanta coisa para aproveitarmos ainda. Nossa relação tinha apenas começado e já enfrentamos tantos desafios, já estava na hora de termos um pouco de paz.