Moonlight Lover escrita por Benihime


Capítulo 21
Escuridão




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Selene

Paro em frente à porta da antiga casa de Katerina, um casarão estilo vitoriano afastado da cidade. Tudo está exatamente como me lembro, exceto que todas as janelas estão escuras, refletindo somente a luz da lua.

— Tem certeza de que isso é uma boa ideia? — Ashlee pergunta.

— Não, mas é a melhor em que consegui pensar. — Admito. — Vamos tentar primeiro, está bem?

A loira assente, me dá um selinho rápido e desaparece nas sombras. Combinamos que, primeiro, eu entraria sozinha, para tentar fazer Kat ver a razão. Se isso não funcionar, a estaca de madeira que levo escondida terá de fazer seu trabalho.

— Kat. — Chamo, batendo de leve na porta. — Kat, sou eu. Estou aqui, como você queria.

 Nenhum sinal dela, mas mesmo assim a porta se abre. Lanço um rápido olhar por sobre o ombro, para o ponto onde imagino que Ash esteja escondida, antes de entrar no casarão às escuras.

Katerina

 Ouço a porta da frente se fechar, e então os passos dela no escuro. Olho para a garota sobre a cama, dormindo pesadamente, e sorrio. Ela serviu ao seu propósito, e agora minha Consorte vem ao meu encontro.

 Selene

 Estendo as mãos para sentir meu caminho naquele breu, até enfim tocar a madeira macia do corrimão da escada.

 — Kat? — Chamo, já não mais tão certa. — Kat, eu sei que você está aí. Pode parar com esse jogo.

 Ouço um murmúrio suave e momentos depois vejo uma silhueta no alto da escada. Não preciso ver para saber quem é. Katerina se aproxima sem dizer nada, estendendo uma das mãos num convite. 

 — O que foi? — Sua voz é calorosa, e por um momento ela soa exatamente como a garota por quem me apaixonei. — Está com medo, Lene?

 — De você? — Solto um bufo irônico enquanto coloco minha mão sobre a dela. — Por favor, Kat. Até parece.

 Ela solta uma gargalhada, a mesma gargalhada de antigamente, o riso que aprendi a amar, e delicadamente me puxa para perto de si. Nossos corpos se tocam, pressionados um contra o outro. Na escuridão, tudo o que vejo são seus olhos cor de âmbar.

 — Eu jamais a machucaria. — Katerina declara, inclinando-se para roçar os lábios em minha bochecha. — Você sabe disso, não sabe?

 — E quanto a minha irmã?

 — Maggie está bem. — Ela assegura, seus lábios agora se movendo para tocar o canto dos meus. — Eu não a machucaria, também. Nunca. Mas foi o único jeito de fazer você me ouvir.

 Seus lábios encontram os meus, e ela morde de leve meu lábio inferior, seus braços me apertando com mais força junto a si. Por um momento esqueço o que estou fazendo ali, minha mente dominada pelo corpo. Eu desejo Katerina, sempre desejei, e isso não mudou.

 Meus braços envolvem seu pescoço por reflexo enquanto retribuo seu beijo, ouvindo-a rir baixinho ao perceber minha rendição. Após alguns segundos já estou sem ar, e me afasto, mas seus braços continuam ao redor de minha cintura num círculo frouxo. 

 Sem pensar no que faço, quase como um reflexo de outra vida, deixo minha cabeça pender para trás, expondo a jugular. Katerina planta um beijo ali, bem onde minha pulsação é mais intensa, fazendo com que acelere ainda mais.

 — Selene. — Ouço a voz, mas estou tão absorvida pelo desejo que demoro a reconhecê-la. — Selene, não!

 A névoa de prazer se desfaz, e dou um passo para trás tão rápido que quase tropeço num degrau. Mãos pequeninas, porém extremamente fortes, me seguram pelos ombros antes que eu caia. Os olhos azuis de Ashlee brilham na escuridão quase como os de um gato.

 — Ah, é claro. — A voz de Katerina agora é puro veneno. — Você tinha que aparecer, verme.

 — Deixe ela em paz, Katerina. — Ashlee ordena. — Isso já foi longe demais. 

 — Pelo menos uma vez, nós concordamos. — Minha ex namorada declara sombriamente. — Vamos resolver isso, então?

 — Com todo o prazer.

 Num segundo as mãos em meus ombros desaparecem, assim como as duas vampiras. Estou sozinha na escada, naquela escuridão de breu. Estendo novamente as mãos, suspirando de alívio ao encontrar o corrimão e então, cuidadosamente, começo a subir.

 Ashlee

 Nunca gostei de lutar. Nunca aprovei a violência. Agora, porém, minhas presas estão expostas e tudo o que penso é em rasgar, dilacerar, derramar sangue. À minha frente, Katerina sorri. Suas presas também estão à mostra, e sei que ela espera apenas por um deslize para enterrá-las em minha garganta.

 — Desista de uma vez. — Ela diz zombeteiramente. — Sabemos que você não tem chance contra mim. Selene é minha, e não há nada que você possa fazer quanto a isso.

 — É o que veremos.

 Mal reconheço minha própria voz, distorcida por um rosnado gutural. Katerina ri, mas logo apago o sorriso de seu rosto ao investir com toda a força, minhas unhas mirando sua garganta. Ela, porém, é rápida, e bloqueia meu ataque.

 — Acha mesmo que vai conseguir me acertar? — A loira provoca. — Aceite logo a derrota. Isso já está ficando chato.

 Rosno e lhe acerto uma cotovelada, conseguindo libertar meu braço de seu aperto. Logo em seguida, pulo sobre ela, derrubando-a no chão. Antes de conseguir enterrar minhas presas em seu pescoço, sou repelida por suas garras, que abrem talhos profundos em minha bochecha.

 Selene

 Ouço os rosnados e os sons da luta. Sei que preciso me apressar, mas não posso correr o risco de cair nessa escuridão. A casa é grande, e avanço devagar, uma das mãos sempre na parede para me orientar.

Conheço o lugar, o que facilita minha situação. Mesmo assim, parece levar horas até eu finalmente alcançar o quarto de onde os sons do conflito se originam. É o antigo quarto de Kat, e as cortinas da enorme janela panorâmica estão abertas, fazendo com que o luar enfim quebre a escuridão.

 Posso ver a mobília destruída, manchas de sangue pelo chão, e não demoro muito a localizar as duas: Ashlee está caída contra o enorme guarda-roupa de carvalho no canto do quarto, e Katerina ajoelhada à sua frente, de costas para mim.

 A loira parece estar inconsciente, seu rosto uma máscara de sangue. Vejo Kat levantar uma das mãos, suas garras em riste, e de repente sou tomada pela raiva. Não sei como, mas num segundo estou ao lado dela, segurando seu pulso para deter o golpe.

 — Selene?! — Os olhos ambarinos de minha ex namorada se arregalam de choque, e por um momento sua expressão confusa a faz parecer quase inocente. — Selene, como ...?

 — É melhor parar com isso, Kat. — Ordeno simplesmente. — Agora.

 Ela luta contra meu aperto por um momento, mas depois desiste, deixando escapar um lamento baixo de dor. 

 — Selene. — Não há mais raiva em sua voz, apenas dor. — Selene, me solte!

 Estou com tanta raiva, tão tomada pela adrenalina, que demoro alguns segundos para perceber a expressão naqueles olhos cor de âmbar. Não é apenas dor ou surpresa, mas algo ainda mais inesperado: medo. Katerina está com medo de mim.

 Bem devagar, um a um, meus dedos se afrouxam ao redor de seu pulso, e deixo minha mão cair ao lado de meu corpo, ainda chocada com o que acabei de fazer.

 — Kat, aceite: acabou. — Declaro. — Deixe todas nós irmos embora.

 — Nunca. — Agora é ela quem segura meu pulso. Não forte o bastante para machucar, apenas para me prender. — Você é minha, Selene. 

 — Não, Kat. Não sou. 

 — Você é!

 Ela avança mas, para minha surpresa, as garras de Ashlee penetram fundo em seu braço, forçando-a a me soltar.

 — Deixe ... — Sua voz é rouca e fraca, mas cheia de determinação. — Deixe a Selene em paz.

 Katerina olha para Ashlee, então para mim, e seus lábios se separam em um sorriso cheio de malícia.

 — Pode tentar o quanto quiser, queridinha. — Ela diz. — Mas Selene vai ceder a mim no final ... Se não quiser que sua irmã se machuque.

 — Katerina! — Minha voz é um rosnado cheio de fúria. — Não se atreva a machucar minha irmã!

 — Bem ... — Kat sorri mais uma vez antes de se pôr de pé, desaparecendo mais uma vez na casa escura. — Isso depende de você, meu amor.

 Ashlee

 Assim que Katerina desaparece, as mãos de Selene estão ao redor de minha cintura, me amparando enquanto me ponho de pé.

 — Droga! — Ela exclama. — Caramba, isso está horrível! Você está bem, Ash?

 — Estou. — Consigo responder. — Vampiros se curam rápido, isso não é nada. Vamos, temos que encontrar sua irmã.

 — Tem razão. — Concordo. — Acha que conseguimos?

 — Talvez. — A morena passa um braço por minha cintura e me apoio nela, ainda tonta demais para caminhar por conta própria. — Temos que tentar, não é?

 Selene

 Com a ajuda de Ashlee, navegar na escuridão se torna mais fácil. Logo chegamos ao fim do corredor, onde uma escadaria estreita leva ao terceiro e último andar.

 — É o antigo quarto de Lennya. — Digo. — A mãe da Kat.

 — Acha que sua irmã está lá em cima?

 — Poderia estar. — Concordo. — Você fica aqui e descansa. Eu vou dar uma olhada.

 — Não! É perigoso.

 — Tem razão, e mais perigoso ainda se você estiver ferida demais para se defender. — Eu digo enquanto nós duas nos acomodamos na escadaria estreita. — Ande, tome meu sangue.

 — Eu ... Não posso. — Ashlee protesta. — Não posso fazer isso, Selene.

 — Pode e vai. — Minha resposta é uma ordem. — Você precisa, e eu não vou a lugar nenhum até você fazer isso.

 Estamos acomodada na escada, e desço um degrau de forma que Ashlee possa alcançar meu pescoço sem dificuldade. Nos encaramos por mais um longo momento em silenciosa discussão, até a loira enfim ceder, erguendo delicadamente meu queixo para poder pegar o ângulo correto. Ela é tão cuidadosa que mal sinto suas presas penetrarem minha pele.

Katerina me disse que trocar sangue com um vampiro é algo extremamente íntimo, que forma um elo eterno entre as duas partes. Na primeira vez em que isso aconteceu, com Kat, só senti o desejo, o que tornou a troca de sangue apenas parte do erotismo daquela noite. Com Ashlee, porém, é diferente. É quase como se eu pudesse sentir minha força vital passando para ela, tornando-a forte também.

 Depois de apenas alguns segundos, ela se afasta. Eu me ponho de pé, uma de minhas mãos pressionando as duas perfurações minúsculas, porém profundas, em meu pescoço.

 — Fique aqui, está bem? — Digo. — Se recupere.

— Se precisar de mim ...

— Você vai saber. — Me inclino e beijo seus lábios ainda rubros de sangue. — Não precisa se preocupar.

Lanço um sorriso por sobre o ombro enquanto subo os degraus estreitos. Só estive no terceiro andar da casa de Kat umas poucas vezes, mas me lembro que Lennya o havia transformado em uma mistura de escritório e biblioteca. O quarto fica bem no fundo, numa porta quase escondida entre duas estantes, impossível de achar naquela escuridão.

— Kat. — Chamo. — Maggie?

Caminho cautelosamente, mais uma vez com as mãos estendidas para não tropeçar ou trombar em nada. De repente, dedos se fecham ao redor dos meus. 

— Oi, Selene. — Eu soube que se tratava de Katerina antes mesmo de ela falar, tendo reconhecido imediatamente aquela mão pequenina, quase a mão de uma criança. — Eu sabia que você viria. Onde está sua amiguinha?

— Ashlee foi embora. — Minto. — Eu ... Eu a mandei ir.

— É mesmo? — A voz de Kat é um ronronar sedutor. — Ora, ora, muito bem. Você tomou a decisão certa. Venha cá.

Deixo que ela me puxe para mais perto de si. De repente, porém, Katerina me solta e ouço-a sibilar como um gato zangado.

— Sua mentirosa! — Ela exclama. — Você a deixou beber seu sangue! 

— Sim. — Admito. — Para curá-la depois do que você fez a ela. Seu monstro. 

— Selene, Selene ... — A loira suspira, sua voz trêmula de raiva. — Você não devia ter feito isso. Acabou de cometer um grande erro.

— Vá se ferrar, Katerina! — Perco a paciência. — Onde está minha irmã?

— Ah, você já vai saber. — Ela responde. — Margareth, venha aqui.

Ouço o som de uma maçaneta e a porta que dá para o quarto de Lennya se abre. Margareth sai de lá, trazendo nas mãos uma vela. A fraca luz das chamas é a única a quebrar aquele breu.

— Maggie! — Exclamo, aliviada. — Maggie, você está bem?

Ela não responde, caminhando silenciosamente até estar ao lado de Katerina, que toma a vela de suas mãos e a coloca sobre uma estante próxima. A luz é suficiente para que eu a veja passar um braço pela cintura de minha irmã.

— Se você não quer ver a razão, Selene ... — Katerina diz suavemente. — Talvez sua irmãzinha o veja. 

A vampira agora está atrás de minha irmã, segurando-a pelos ombros. Margareth não protesta, sua expressão vaga deixando claro que está sob influência dos poderes de Katerina. Por um momento, não entendo o que ela quer dizer, até vê-la cravar as presas no pescoço de minha irmãzinha.

— Desgraçada! — Grito tão alto que minha garganta dói. — Solte ela!

Aqueles olhos cor de âmbar me encaram, e posso ver um sorriso sádico no canto de seus lábios. Katerina está gostando disso, está adorando cada segundo. É então que, mais uma vez, a raiva toma conta de mim.

Meus lábios agem por conta própria, formando palavras que nem sequer compreendo. Empurro o ar à minha frente e, para minha surpresa, Katerina é arremessada para trás por uma força invisível. Não me importo em olhá-la, saltando para o lado de minha irmã e amparando-a antes que seu corpo bata no chão.

 — Maggie. — Chamo. — Maggie, você está me ouvindo? Maggie!

Leva um ou dois segundos, mas ela enfim abre os olhos. Não consigo evitar as lágrimas de alívio.

— Lene? — Sua voz é apenas um sussurro, mas mesmo assim é a sua voz. — Lene, o que aconteceu?

— Nada, Mags. — Não consigo evitar um soluço enquanto a abraço o mais forte que posso, pegando-a no colo com facilidade. — Anda, vamos sair daqui.

Minha irmã simplesmente faz que sim, deitando a cabeça em meu ombro enquanto a carrego, como fazia quando era criança. Estou tão tonta de alívio que não ouço Ashlee subir as escadas ao meu encontro, nem vejo Katerina se levantar.

— Selene, cuidado!

Ashlee é rápida como só os vampiros podem ser, mas Katerina está mais perto. Mesmo que tente, ela jamais conseguiria interceptar minha ex namorada, que salta sobre Margareth e eu como um guepardo sobre sua presa.

Eu abraço minha irmã com mais força, protegendo-a com meu próprio corpo, mas o impacto que esperava nunca acontece. Ao invés disso, Katerina atinge uma barreira invisível e é mais uma vez lançada para trás.

— Selene! — Agora Ashlee está ao meu lado, facilmente tomando Margareth de meus braços. Eu permito. Ela é a melhor chance de minha irmã. — Anda, temos que ir!

— Vai! — Ordeno. — Tire a Maggie daqui.

— Mas você ...

— Preciso ficar. — Declaro, observando enquanto Katerina mais uma vez se põe de pé. — Isso é culpa minha, eu preciso terminar o que comecei.

A loira me encara silenciosamente por um breve segundo, mas por fim assente, e desaparece escada abaixo com minha irmã.

— Isso não vai adiantar. — A voz de Katerina agora é um rosnado gutural. — Eu vou conseguir o que quero, Selene.

— Não, Kat, não vai. — Respondo. — Acabou. Você tomou essa decisão quando partiu, e eu deixei. Agora faça o mesmo. Me deixe ir.

— Nunca!

Desde a primeira vez que a vi, eu soube que Katerina era diferente. Mesmo assim, nunca senti medo dela, nem quando descobri seu segredo. Isso é, até agora, quando ela salta sobre mim com as presas expostas.

Meu corpo mais uma vez age por vontade própria, meus braços descrevendo um longo movimento circular. Quando minhas mãos se encontram na frente de meu peito, uma bola de luz se forma, atingindo Katerina em cheio.

Estou tão surpresa que giro nos calcanhares e disparo pela escuridão do corredor abaixo, sem me importar em cair ou tropeçar. Corro como se minha própria vida dependesse disso. Assim que atinjo o primeiro andar, porém, sinto minhas forças se esvaírem como se alguém desligasse um interruptor, e teria caído ali mesmo se alguém não me segurasse.

— Ash. — Reconheço imediatamente os braços que me envolvem. — Ash ... Maggie ...

— Sua irmã está bem. — A loira garante, afastando gentilmente os cabelos de minha testa suada. — Está esperando no carro. Acabou agora, Selene. Acabou.

— Não, ainda não. — Protesto. — Katerina está ...

— Inconsciente por enquanto. — Ashlee completa. — Muito bem, Selene. Boa caçada.

Não consigo não sorrir ao ouvir as palavras de minha mãe serem repetidas. Ashlee me carrega até meu carro, mas acabo desmaiando antes de chegarmos lá.


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