Mesmo se não der certo escrita por prr
Sempre que tinha alguma oportunidade, Leonardo tentava inserir algum comentário sobre o bem que faria a viagem deles para o irmão. Chegou a comentar diretamente sobre o assunto com os pais uma única vez, mas os pais novamente disseram não, a menos que a mãe os acompanhasse. Entretanto, alguns dias depois, estando Denis dormindo em seu quarto, chamaram Leonardo para conversar.
— Bom, você sabe que desde o princípio não consideramos a possibilidade de autorizar você e seu irmão a viajarem sem a gente. Mesmo que seja uma viagem curta e sabemos que vocês sabem se cuidar.
— Certo, então? – Leonardo perguntou ansiando pelo momento que os pais dissessem que sim, podem ir.
— Então filho, eu e sua mãe conversamos com a psicóloga do Denis e tomamos opinião com outras pessoas com filhos em situações semelhantes pela internet. Depois de muito pensar, resolvemos deixar vocês irem.
— Sério? Só os garotos, sem nenhum de vocês? – Leonardo ficou eufórico, mas com certa desconfiança de que pudesse ser verdade.
— Sem adultos. – O pai deu um tapinha no ombro do filho. – Vamos dar esse voto de confiança para vocês. Como você mesmo tem nos dito nos últimos dias, pode fazer bem para o Denis estar no meio de pessoas desconhecidas e se sentir um pouco livre. Sentir que ainda pode fazer muitas coisas e quando a doença avançar, ele ainda terá muito o que fazer.
— Reconheço que tenho ficado muito “pregada” nele. Mas você vai entender isso quando tiver seus próprios filho, Léo. – A mãe apertou colocou a mão de Leonardo entre as suas e apertou. – Sabe filho, depois que você pega aquela pessoinha tão frágil e indefesa no colo e ela é parte sua, sua responsabilidade, você quer protegê-la de tudo de ruim.
— Acho que não preciso ter filhos pra saber disso. Posso ser só dois anos mais velho que o Denis, mas desde sempre me senti responsável por cuidar dele.
— Agora, temos que planejar a rota da viagem e os ônibus que devem pegar. Vamos deixar vocês irem, mas sob nossas regras. E temos também que conversar com o Denis, ver o que ele acha da ideia. – O pai tinha um sorriso no rosto, coisa que Leonardo não via há um bom tempo.
— E fazer ele prometer que não vai tentar nada de perigoso para... bom...
— Com certeza mãe, ele tem que prometer isso. E... não querendo abusar da boa vontade, acho que seria melhor eu e os garotos falarmos da ideia pro Denis. Além disso, a gente também decidir a rota da viagem e essas coisas, pro Denis se sentir parte da aventura de verdade.
— Não sei, acho melhor...
— Querida, deixa os garotos planejarem a “aventura” deles. O Leonardo é um garoto responsável, certo filho? – Leonardo concordou com a cabeça e olhou suplicante para a mãe. – E depois, o Leonardo vai nos repassar cada coisa.
— Vocês ainda me fazem enfartar de preocupação. Ainda bem que tive só dois filhos. – A mãe sorriu. – Podem planejar a tal aventura. Mas quando terminarem tudo, temos que aprovar, senão, nada feito.
Assim que o irmão acordou, Leonardo foi falar com ele. Estava tão empolgado com o fato dos pais terem autorizado a viagem, que se esqueceu que seu irmão poderia não querer ir. E dado seu humor nas últimas semanas, era mais provável que ele não quisesse fazer nada mais de diferente.
— Denis, adivinha só a novidade! – Leonardo abriu a porta todo animado e foi na direção do irmão, que estava acordado, mas ainda deitado na cama.
— Hum... pra você tá animado assim deve ter ganhado algum prêmio ou algo assim.
— Hã... isso também, mas é outra coisa.
— Olha, já vou avisando, não vou em premiação nenhuma. Ok? Porque sabe, já é ruim você ficar sentado lá no meio de um monte de gente e quando você não enxerga os detalhes muito bem ou não vê direto quem está lá na frente é pior ainda, porque ai não dá pra rir das caras e roupas engraçadas das pessoas.
— O que eu ganhei nem tem cerimônia de premiação assim. Foi só uma gincana na escola.
— Certo. Porque como eu disse, eu não vou. Não sei como você aguenta ficar indo nessas coisas de premiação, palestras, aulas...
— Não vim aqui pra falar disso. É outra coisa e, bem, envolve você.
— O que não me envolve ultimamente? Todo mundo agora resolveu que eu devo ser o centro das atenções. Falta pouco colocarem câmeras por toda a casa e transmitirem ao vivo na televisão, como um reality show sobre a vida do garoto que está ficando cego.
— Hã... é... – Leonardo perdeu as palavras no meio do caminho. Depois do que o irmão falou, ele dizer que iriam viajar para animar ele, seria confirmar que sim, ele é o centro das atenções.
— Mas então, o que é?
— Nas próximas férias, eu, Pedro, Victor e você, vamos viajar.
— Ah tá. – Denis falou com certa tristeza na voz. – Bom, divirtam-se lá. Eu não vou. A mamãe nunca vai deixar eu ir e se for pra ela ir junto, prefiro ficar. Porque pra não poder fazer nada, melhor ficar em casa.
— Ela e o papai deixam você ir. É claro, se você quiser.
— E vamos até onde? Até a outra esquina? Você tá louco que eles vão me deixar sair sem supervisão, principalmente do jeito que a mamãe está grudada em mim.
— Tô falando sério. Eles deixaram. Falei com eles e disseram que não. Mas ai depois de uns dias, disseram que podia. Podemos ir em cidades num raio de 150 km daqui e voltar em no máximo uma semana, além de ligar todo dia.
— Não vou. Vou atrapalhar vocês a se divertirem.
— Você quer ir, não quer? E não vai atrapalhar a gente, você é bem grandinho, não precisamos ficar limpando seu traseiro. – Os irmãos riram.
— Eu acho que vou.
— Ok.
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