Lá E De Volta Outra Vez escrita por Pacheca


Capítulo 81
Começo de um Fim


Notas iniciais do capítulo

Alo, pessoas. Vim postar antes de dormir (apesar de que deveria já estar dormindo, tenho aula cedo, já já). É um capítulo grandinho, mas dá uma continuada legal. Aproveitem!



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Para minha sorte, meus pais não tinham me esperado. Bom, minha mãe esperou, mas assim que ela me viu entrar no apartamento ela disse que já podia dormir. Ela já estava praticamente dormindo no sofá, então não reparou na maquiagem borrada pelo choro.

Eu simplesmente tirei o vestido e o deixei jogado na cadeira, caindo na cama e dormindo de calcinha e sutiã mesmo. Eu estava cansada demais para pensar em qualquer coisa.

Eu fiquei feliz por ter o domingo para me recuperar, mas a segunda parecia querer me assombrar logo. Acordei com minha mãe batendo na porta, avisando que eu ia me atrasar. Suspirei e me arrumei para começar a semana. Eu não queria ter outro confronto com Kentin, mas o fim de semana tinha sido suficiente para eu me convencer de que Lysandre tinha razão quando dizia que eu não tinha feito nada de errado.

Num geral, a escola parecia o ambiente de sempre. Kim percebeu que eu estava meio para baixo e veio falar comigo, onde eu acabei contando que briguei com um amigo. Ela chegou a me consolar, mas por fim simplesmente falamos da preguiça das segundas-feiras e nos despedimos.

Eu fui pegar meu material no armário e, ao subir as escadas para deixar minhas coisas na sala, dei de frente com Kentin. Na mesma hora ele passou por mim e saiu andando, me ignorando. E antes que eu o chamasse ouvi que ele não queria falar comigo. Revirei os olhos e entrei na sala.

— Oi, bom dia. O que foi? – Alexy me viu e veio falar comigo. Ainda não tínhamos conversado desde o sábado. – Tudo bem?

— O Kentin simplesmente me ignorou no corredor. E ainda teve o disparate de dizer que não queria falar comigo. Como se a errada fosse eu. – Reclamei, enquanto ele se sentava na mesa.

— Falando nisso, a gente preferiu não te incomodar no sábado, mas você não contou o que aconteceu.

— Em resumo, eu falei que ele estava mudado no mau sentido, que estávamos preocupados porque ele está se pondo em risco e que ele ia acabar se dando mal e a resposta dele foi, abre aspas, você nunca gostou de mim e se você não gosta de mim assim não deveríamos ser amigos, fecha aspas. – Suspirei, finalmente começando a sentir a raiva ser substituída por outro sentimento.

— Difícil. Eu sei como você fica mal quando se sente substituída ou posta de lado. Aliás, acho muito justo você se sentir assim. Ainda mais quando ele teve a coragem de dizer que você não se importa.

— O que mais me entristece é que eu sei que ele não é um imbecil como anda agindo, só está mal acompanhado.

— Eu dou certeza que isso não seria problema se a companhia dele fosse eu. – Ele riu e eu sorri junto. Eu sabia que Alexy tinha plena noção de que a relação dos dois não passaria de amizade, mas no fundo ainda dava para ouvir uma pontinha de esperança na voz dele. E eu não tinha coragem de falar nada sobre aquilo. – Bom, falando sério agora, ele está mesmo agindo feito um imbecil.

— Aconteceu mais alguma coisa enquanto estávamos lá fora?

— Bem, tecnicamente nós fomos chutados de lá. O Evan quis caçar mais confusão depois do belo sabão que você passou nele e os guardas acabaram pedindo encarecidamente que saíssemos. Eu ainda tive que passar essa vergonha.

— Vocês tinham razão sobre ser uma péssima ideia, me desculpem. – Dei de ombros, lembrando que podíamos ter evitado aquilo tudo.

— Imagina, meu bem. Eu sei que no fundo você também estava se sentindo imponente. Igual estamos agora. Não sabemos porque isso está acontecendo e nem como fazer isso parar.

O silêncio pairou entre nós por meio minuto, até eu me lembrar da forma como Kentin tinha defendido Evan. E como eles se cumprimentaram mesmo antes de encontramos o sujeito.

— Alexy, Evan. Ele é a solução disso.

— Oi? – Ele estava perdido nos próprios pensamentos quando eu falei.

— Kentin está sob a influência de Evan por causa da convivência deles dentro do colégio militar. Ele mesmo me disse enquanto discutíamos, Evan foi quem o protegeu dentro do colégio.

— Ele associou Evan com segurança.

— Com alguém que só quer ajudá-lo. Só que Evan também foi doutrinado pelo colégio militar. É um ambiente completamente hostil e agressivo, cercado de homens querendo ressaltar sua masculinidade o tempo todo. Isso tudo é só reflexo do que os dois viveram.

— Evan age assim porque é a única forma que ele encontrou de não ser massacrado dentro do colégio e ensinou isso pro Kentin. Anna, faz todo o sentido. Você é uma gênia.

— Acho que a gente é quem demorou pra perceber o óbvio. A gente tem que falar com o Evan.

— A gente? Eu e Armin sinceramente achamos que seria melhor a gente dar um tempo para evitar mais uma discussão, sabe?

— Eu falo com ele sozinha, não tem problema.

— Bom, eu vou tentar convencer ele a te encontrar, mas não posso prometer depois que você acabou com ele em público. – Tivemos que rir, lembrando do sermão que eu tinha passado para Evan no meio da boate. – Bem, eu vou encontrar a Melody para recuperar minhas anotações.

Eu decidi dar mais uma volta com o tempo livre que eu ainda tinha. Fui até a biblioteca, achando Armin em um dos computadores. Cheguei perto, mas ele não me parecia muito receptivo.

— Bom dia.

— Dia. Tão bom quanto possa ser numa segunda, né?

— Eu queria pedir desculpas pelo sábado.

— Ah sim, a sua ideia de voltar para aquele inferno. Eu nunca mais teria posto meus pés lá, não fosse você.

— É, Armin, eu sei, desculpa. – Respondi no mesmo tom que ele, suspirando em seguida. – Eu achei mesmo que ia dar certo, mas claramente o Kentin não estava tão aberto assim.

— Eu sei. É uma pena que deu tudo errado. – Ele finalmente parecia mais calmo e perceber que eu não tinha gostado da noite muito mais que ele. – Se eu soubesse teria ficado quietinho em casa jogando Zelda.

— Obrigada por nos acompanhar, apesar de tudo.

— Obrigado por tentar ajudar. – Ele deu de ombros, finalmente voltando sua atenção para o computador. Pedi licença e o deixei. Andei mais um pouco, até achar Lysandre em uma das salas, concentrado em seu caderno.

Sorri, escorada no portal, observando-o. Ele ficava tão lindo com aquele olhar concentrado, o cabelo caindo enquanto ele encarava o caderno e tampava parte do seu rosto. Ele finalmente sorriu também e sem tirar os olhos do caderno falou.

— Você achou mesmo que eu não te vi chegar? – Ri e ele finalmente ergueu o olhar para mim, ainda sorridente. E que sorriso. – É quase como uma questão de energia, uma aura que você tem que eu sempre te sinto por perto.

Senti que meu rosto esquentava e meu sorriso se negava a fechar. E ele parecia muito satisfeito em ter me deixado naquele estado. Fui me aproximando, calmamente, enquanto ele acompanhava cada movimento meu.

— Bem, eu posso dizer que entendo. Rosalya sempre riu que eu tinha uma capacidade quase sobrenatural de sempre olhar na sua direção sem mesmo tentar, até quando eu não sabia onde você estava. – Finalmente cheguei perto o suficiente para lhe dar um beijo carinhoso. – Você estava lindo na sua bolha, não quis incomodar.

— Você sabe que nunca incomoda. – Ele tinha aberto as pernas para que eu conseguisse ficar de pé entre elas, enquanto ele abraçava minha cintura. – Está se sentindo melhor? Você estava mal quando eu te deixei no sábado.

— Bem, as coisas não melhoraram muito. Eu encontrei o Kentin e ele está definitivamente me ignorando. Por outro lado, eu consegui enfiar na cabeça que eu não fiz nada de errado e que ele não me disse nada que fosse uma verdade.

— Fico feliz em saber que você deixou a idiotice só com ele. Só falta ele descobrir.

— É, mas tudo bem. O que você estava escrevendo? – Olhei para o caderno, mas ele correu para dizer que não era nada e fechar o caderno, meio sem graça. Sorri. – Ok, não precisa me dizer.

— Não é nada demais. Eu te deixo ler quando estiver terminado.

— Só se você quiser. Bem, vamos, temos que ir para a aula do Patrick. – Ele concordou, hesitando em me soltar, mas fazendo-o para poder juntar suas coisas e me acompanhar.

Voltei para a sala e fui para o meu lugar, junto de Iris. Ela sorriu, me dando bom dia. Como sempre, Patrick estava descontraído, rindo que precisava de férias tanto quanto nós e que nós quase o matamos de cansaço. Ainda assim, ele também nos lembro que esse fim de ano era um momento decisivo para todos nós. Suspirei.

— E eu não sei se vou bem. – Pensei. Eu nunca tinha tido problema com minhas notas, mas esse último ano tinha sido agitado e com certeza eu não tinha me dedicado ao máximo aos estudos. Iris ouviu meu sussurro e concordou.

— Eu também não estou confiante. Não consegui me concentrar mais depois daquilo tudo com a diaba.

— É, eu entendo. Foi traumatizante. – Acabamos a aula e decidimos ir logo almoçar. Eu estava saindo da sala quando Iris me segurou. – Oi, Iris.

— A gente está pensando em fazer uma sessão de estudos no fim do dia, o que você acha?

— A gente? – Perguntei só pela curiosidade, mas ela parecia ainda mais empolgada.

— Nathaniel aceitou nos ajudar. Até agora somos eu e Kim, mas você pode se juntar. – Finalmente notei Nathaniel, esperando uma resposta minha. Respirei fundo. Um pouquinho de estudo não me faria mal, mesmo não sendo meu conceito de fim de dia perfeito. E sempre seria bom passar um tempo com ele, afinal de contas.

— Claro, a gente se encontra. Bom, vou indo. – Concordei e finalmente fui guardar meu material. Encontrei Violette, lendo sobre um novo parque que chegaria a cidade, mas o assunto não se estendeu demais. Finalmente consegui ir para a cantina.

A fila não estava tão cheia, mas infelizmente eu estava atrás das duas pestes. Ambre e Li estavam discutindo sobre um pedaço de bolo e como isso afetaria a forma física das duas, sem me ver. Elas só me viram no final, quando eu já tinha me servido e as deixei antes de ouvir qualquer comentário.

— Olá para vocês. – Lys e Rosa dividiam uma mesa. Rosa me disse como Lys já tinha lhe contado sobre a Moondance, o que eu achei ótimo. Eu não queria mais ficar repetindo aquilo. – É, podemos dizer que Kentin não foi nem um pouco receptivo.

— O que mais me irrita é ver a imaturidade com a qual ele tem te tratado, justo você. – Lys resmungou, ao que vi Rosalya dar uma risadinha. Ele também não pareceu entender.

— Eu estou mesmo presenciando Lysandre perder sua paciência inabalável?

— Eu só não gosto de injustiças. – Ele deu de ombros. – Bem, e se eu tentar falar com ele?

— Não vai funcionar. Vocês não são próximos, ele vai achar que é uma conspiração contra ele e o Evan. – Rosalya concordou, afirmando que ainda assim era o que ele merecia. – Eu acho que o jeito é falar com o Evan.

— Ugh, eu só o vi uma vez e tive a pior impressão possível. – Ela falou, acabando de tomar seu suco. Lys também não parecia muito satisfeito.

— Bom, ele, com certeza, não é a pessoa mais agradável do mundo, mas ele me respeita porque eu ajudei os gêmeos e ele a se encontrarem. E no fundo eu acho que ele ser assim é culpa do colégio militar. Não custa tentar.

Acabamos nosso horário de almoço e eu fui dar uma voltinha antes de me enfiar dentro da sala de novo. Eu sempre ficava sonolenta após o almoço, andar me ajudava a despertar um pouco. Acabei encontrando Melody, aflita sobre um livro de história. Falei para ela da nossa sessão de estudos e fui para a aula.

Depois daquele tempo interminável, juntei minhas coisas e desci as escadas para ir estudar na biblioteca com os outros. Eu já estava na porta quando meu telefone começou a tocar. Peguei-o dentro da bolsa, vendo que não tinha identificação.

— Alô?

— Oi, Anna, é o Evan. – Estranhei ele ter meu número, mas imaginei que Alexy devia ter passado para ele poder me ligar. – Bom, o Alexy me disse que você queria conversar, podemos nos encontrar agora no parque?

— Oi, Evan. Bom, eu tenho algo para fazer hoje, mas quero sim falar com você. Você tem outro horário livre?

— Eu não sei, acho que não nos próximos dias, mas posso te avisar. Não é nada urgente, é?

— Posso esperar alguns dias, fique tranquilo. Bom, obrigada por ligar.

— Tudo bem, boa tarde. – Desliguei, pensando que ele tinha usado um tom muito quieto comigo. Imaginei que ele estaria um pouco mais irritado depois do sábado, mas talvez minha lição de moral o tenha pegado no fundo. Deixei a questão de lado e fui para minha sessão de estudos.

Os outros três já estavam lá, esperando. Pedi desculpa pelo pequeno atraso, ao que Nathaniel logo disse que não tinha problema. Ele sempre parecia tão tranquilo naquela posição de professor.

— A gente pode começar, sim? – Iris falou depois de ter posto seu material na mesa. – Eu sempre tenho dificuldade com história.

— Ok, podemos começar ai, que tal? – Nathaniel pegou seu material também. Eu corri para imitá-lo.

— Aliás, temos algum palpite da matéria que vai ser cobrada? Porque eu duvido que o Faraize vai cobrar tudo.

— É, tudo não vai ser, é muita coisa. – Nathaniel concordou. – É meio difícil saber qual matéria exatamente vai cair. Os professores evitam avisar para nos forçar a estudar tudo.

O tempo passou mais rápido do que o esperado. Estudar em grupo com certeza parecia mais divertido do que sozinha no quarto, principalmente porque acabamos dando risada algumas vezes. Por sorte, só estávamos nós por lá.

— Eu finalmente consegui estudar. – Kim sorriu. – Sério, eu simplesmente não consigo se estiver sozinha. Eu tenho que estar rodeada até para fazer dever.

— Sério? Eu praticamente busco o lugar mais silencioso e vazio possível. – Nathaniel falou, juntando suas coisas. Concordei.

— Bom, eu me concentro melhor com música, mas também prefiro estar sozinha na maioria das vezes. Apesar de minha concentração estar meio ruim ultimamente.

— Será que é culpa de um certo cantor de olhos diferentes? – Iris perguntou, rindo de mim. Fiquei chocada, nunca imaginando que ela conseguiria fazer aquilo.

— É óbvio, não? – Kim riu e eu quis matá-la, mas não tive forças para reagir. E pelo visto, Nath também não. Era verdade que aquela era a primeira vez que passávamos por um relacionamento entre nós, era estranho. Bem, ele já tinha tido uma namorada pelo que ele me contara, mas eu não estava na cidade na época.

— Bem, não vou dizer não completamente.

— Ciências, que tal? – Ele jogou o livro na minha frente na mesa, com cara de quem estava sem paciência. Ri, abrindo o livro onde a matéria começava.

Ao final da sessão, três horas tinham se passado. Minhas costas doíam de ficar nas cadeiras de madeira, eu estava cansada e com certeza não absorveria mais nada. Era o mesmo caso para o resto de nós. Celebramos nosso sucesso e decidimos ir tomar algo para celebrar. Nathaniel hesitou, mas eu segurei seu braço e o convenci de que já tinha estudado o suficiente por um dia.

Parecia que já estávamos de férias, o que era uma pena. Por hora, decidimos discutir nossos planos pro futuro. Meu coração deu um leve aperto quando Nathaniel disse que pensava em ir embora dali, mas eu podia entender a causa. Por fim, decidimos ir embora depois das nossas bebidas e descansar para o resto da semana. Eu jantei com meus pais, falamos do futuro e eu fui deitar.

Aquela sessão de estudos tinham me deixado exausta. Puxei as cobertas para me cobrir e peguei meu celular. Fui direto na minha conversa com Lysandre, lendo algumas mensagens antes de finalmente enviar a minha.

“Eu queria muito um cafuné nesse momento”

“Eu também adoraria um. Boa noite.”

Claro que ele me respondeu quase de imediato. Sorri e desejei boa noite de volta, antes de apagar tudo e ir dormir. Dormir até demais. Minha mãe puxou uma das cobertas, mas eu só tive forças para levantar o rosto antes de deixá-lo cair no travesseiro de novo.

— Vamos, mocinha, você ainda tem aula. – Fui forçada a me sentar, bocejando. Era como se eu não tivesse descansado um minuto que fosse. Demorei um pouco para me aprontar, mas ainda tinha tempo. Finalmente acabei de me arrumar e me despedi.

— Lys? – Eu com certeza não esperava encontrá-lo tão cedo, mas ele só sorriu e me abraçou.

— Bom dia.

— O que você veio fazer?

— Bom, a ideia era te fazer uma surpresa e te acompanhar até a escola. Parece bom?

— Parece ótimo. – Fiquei na ponta dos pés para lhe dar um beijo direito, que ele retribuiu. – Você é um fofo.

— Obrigado, fico feliz que tenha gostado. A gente deveria ir, não quero ser surpreendido pelo seu pai. De novo.

— Não se preocupe, ele já saiu. Só minha mãe ainda está em casa, mas ela estava tomando banho. De toda forma, a gente tem mesmo que ir.

Pus minha cabeça em seu peito e apertei o abraço, ao que ele retribuiu. Eu senti a palma da mão dele nas minhas costas, por baixo da blusa, acariciando a pele. Eu podia dormir naquele exato momento com todo aquele conforto.

— É muito agradável te ter só para mim um pouquinho. – Sorri, finalmente me soltando e pegando sua mão para podermos caminhar até a escola. – Aliás, como foi seu dia ontem? Você sumiu.

— Ah, desculpa. Eu acabei indo estudar um pouco com o Nath, ele se ofereceu pra ajudar as meninas.

— Legal da parte dele. – O Lysandre certamente fazia jus ao seu signo quando se tratava de ciúme. Sorri, achando graça da carinha fechada dele.

— Não seja assim, a gente estava em grupo. E além disso, foi preciso para me garantir boas notas.

— Eu tenho certeza que você vai bem de toda forma, mas se te deixa mais autoconfiante. – É, até chegarmos a escola eu estava tranquila, mas finalmente estávamos começando a fase final de provas. Tinha um aglomerado de alunos na entrada, todos nervosos. Nos aproximamos de Castiel, escorado no muro.

— Relaxem, as provas dele são só formalidade. Eu garanto que ele quer se livrar da gente tanto quanto nós dele. – Castiel falou no típico mau humor. – Ei, Velho.

— Bom dia, Castiel. – Respondi, ao que ele deu um sorrisinho sem vontade. Revirei os olhos. Achei que namorar o melhor amigo dele nos aproximaria, mas ele ainda vivia de fingir que eu não existia. Suspirei, ouvindo Nathaniel se aproximar.

— Ir bem nas provas implica em poder escolher fazer o que realmente se quer do futuro e não o que der.

— Eu concordo, mas não é preciso dramatizar a situação. – Lysandre adicionou, ao que Nathaniel concordou com a cabeça. Conseguimos ouvir Alexy ali do lado, concordando também.

— É verdade, mas eu fico triste que não usei minha cueca da sorte.

— Você tem uma? – Eu e Rosa perguntamos juntas, ao que ele sorriu.

— Óbvio, vocês duas já a viram inclusive. – Ele falou, e eu imediatamente lembrei da cueca dele na gaveta, mas decidi fingir de besta. – Fica sendo um segredinho.

Eu notei Kentin, escorado num muro do outro lado da rua, com cara de poucos amigos. Suspirei, mas não me demorei. Assim que os portões se abriram, nós entramos e ouvimos o aviso da diretora nos desejando boa sorte.

Aquele provão era mais assustador que o normal. Faraize nos organizou e nos deu quatro horas de prova, passando as orientações. Assim que ele iniciou o relógio, virei a folha. Notei que Melody pareceu desorientada em ter errado seu palpite sobre a matéria principal, mas não tinha o que ser feito. Me concentrei e, assim que entreguei a prova, ele me liberou.

Encontrei Iris consolando Melody pouco depois, preferindo não me intrometer. Acabei indo falar com Priya, que encontrei logo em seguida. Ela estava sorridente, então deduzi que ela tinha se saído bem.

— E ai?

— A matéria não poderia ter sido melhor. A descolonização da Índia é minha própria história, eu ouvi relatos direto com meus avós.

Ela pediu licença para estudar para as próximas provas, então eu aproveitei e fui pegar um dos cadernos no meu armário. Alexy logo se aproximou, perguntando da prova.

— Bom, eu fui bem para quem só quer encontrar o amor na universidade.

— Como é?

— Claro. A faculdade é como um self service de homens bonitos.

— Eu acho que estou bem só com um. – Falei, sentindo um calor inesperado. Fechei meu armário com um pouco de força, mas Alexy não notou.

— Espere até você perceber a quantidade de oportunidades que a faculdade vai ter dar. Bem, depende do curso, alguns cursos tendem a ter menos homens em sala.

— Al, eu vou tomar um ar no jardim. Te vejo depois. – Ele sorriu, indo atrás do irmão. Pus minhas mãos na nuca e sai quase correndo até o jardim. O sol não me ajudou nem um pouco, quase me esmagando. Sentei no banquinho, sentindo uma tensão horrível no pescoço e um mal estar avassalador.

— Ei, está tudo bem? Você ficou branca feito um papel. – Era Lys, se sentando ao meu lado e passando o braço por minhas costas.

— Eu não sei, eu não me sinto bem. Parece um ataque de pânico, meus ombros doem e eu não consigo pensar direito.

— Ei, tudo bem, respira fundo. – Ele me deu um abraço apertado, me deixando espaço para respirar tranquilamente. Fechei os olhos, inalando o cheiro dele.

— Eu não sei o que fazer da minha vida. Eu nunca soube. – Ele continuava acariciando minha nuca de leve, o que parecia ajudar com a tensão nas costas. – Eu percebi que eu nunca planejei nada a longo prazo depois de Viktor. Eu podia morrer qualquer dia também, por que eu pensaria nisso?

— Shh, continua respirando. – Eu sabia que tinha começado a tremer mais, mas ele continuava tentando me acalmar. – Está tudo bem.

— Eu sempre disse que me decidiria na hora, mas a hora chegou e eu não faço ideia do que fazer. E também, vamos começar a nos afastar. Nath disse que ele quer ir embora. Eu não quero ficar sozinha. – Eu ia começar a chorar, mas ele não deixou. Com um aperto um pouco mais firme ao meu redor ele finalmente falou.

— Eu entendo que está preocupada, mas tente pensar com clareza. Nathaniel nunca vai te deixar sozinha, você sabe disso. Assim como eu também não vou. – Ele me soltou um pouco quando eu comecei a tremer um pouco menos. – Eu sei como é assustador, mas isso é só uma nova página das nossas vidas. Uma que eu sei que você sempre esperou. Você já planejou possíveis carreiras, eu já vi. Você ainda tem tempo para se decidir, vai ficar tudo bem.

Eu continuei respirando fundo, finalmente sentindo meu coração voltar para seu lugar. Mais alguns minutos e eu já me sentia melhor. Agradeci, arrumando meu cabelo com as mãos.

— Eu estou melhor. Obrigada.

— Fico feliz em ter te ajudado. E fico feliz que tenha dito que não estava bem, não hesite em dizer se precisar de novo. Não é bom ficar sozinho nesses momentos. – Ganhei um senhor beijo antes de ele finalmente me soltar.

— Bem, não pretendo ter outros, mas digo sim. Vou me preparar para a prova da Delanay. Te vejo depois.

A prova da Delanay não foi das piores, mas eu ainda tinha que sobreviver à avaliação de educação física. Aquela com certeza não seria minha maior nota. Fui me trocar no vestiário, aproveitando que ainda estava vazio. Quase. Li e Ambre já estavam se trocando também.

— Ai, acredita que eu me atrasei, justo hoje? Bom, cheguei na hora, mas tive que pular o café da manhã e até agora não comi nada. – Li reclamou, ajeitando o cabelo depois de vestir sua blusa.

— E daí? Eu não tenho uma despensa na minha bolsa.

— Você podia me emprestar para eu poder comprar alguma coisa na máquina da sala dos representantes. Não quero ficar de estômago vazio.

— Ah, Li, você vai se entupir de bombom? E de todo jeito, eu não tenho dinheiro. – Quando Ambre olhou no espelho ela me notou. – Perdeu algo?

— Achei. – Enfiei a mão na mochila e peguei uma nota de cinco que eu entreguei para Li. – Se você quiser comprar alguma coisa, Li. Você precisa de umas calorias para queimar nessa prova.

— Ah, eu… – Acho que a peguei desprevenida, porque ela demorou uns segundos para pegar a nota e, pasmem, me agradecer. – Já volto.

— Qual a sua? Quer ser chamada de Madre Teresa?

— Me surpreende que você saiba quem é essa. – Respondi antes de pegar uma gominha no meu armário e sair do vestiário. Esperei a turma estar completa até Boris explicar a prova. Ele já tinha selecionado nossas duplas, e pelos nomes eu acabei caindo com Armin.

Não era difícil, teoricamente. A primeira prova era cronometrarmos nossos tempos numa corrida de quinhentos metros e comparar com os tempos que tínhamos estimados para nós mesmos. Armin resmungou e pegou o cronômetro da minha mão.

— Você vai primeiro. Vai lá. – Resmunguei mas fui para a marca na quadra. Assim que ele deu a largada, eu corri. No meio da segunda volta eu já sentia meu rosto pegar fogo. Era verdade que os comentários das aulas eram sempre como eu ficava toda vermelhinha com qualquer esforço. A sensação não era a melhor do mundo, no entanto.

Eu estava morrendo quando finalmente dei a última volta. Com certeza eu não tive o melhor tempo da turma, mas eu não tinha me dado uma estimativa muito boa mesmo. Armin anotou o tempo, parecendo achar graça do meu estado. Assumi seu posto e comecei a rodar o tempo assim que ele saiu correndo.

Ainda tivemos que fazer alguns exercícios de ginástica, mas não fizemos nenhuma pose comprometedora dessa vez. E, quando eu achei que minhas pernas finalmente desistiriam, Boris nos liberou. Finalmente deixei o ginásio, querendo tomar um bom gole de água.

— Ei, Anna. – Tomei distância do bebedouro antes de responder Bia com um aceno de cabeça. Ela sorriu. – Eu te vi depois da prova de história com o Lysandre. Foi meio estranho te ver daquele jeito.

— Bom, eu estou me sentindo melhor. Obrigada. – Eu queria me esconder, mas ela deu de ombros.

— Normal. Eu gosto de você, sabe?

— Estou aprendendo, Bia. – Ela sorriu e me deu tchau antes de se afastar.

Bom, não vivemos muito depois disso além de prova atrás de prova. Eu estava exausta, mas não era exclusividade. Até Ambre parecia ter perdido peso e estava com olheiras por baixo da maquiagem.

A prova do Patrick me pareceu diferente das outras. Eu percebi que queria me sair bem para ele perceber que eu tinha evoluído na disciplina. Não que a prova parecesse difícil, mas era bom ter uma inspiração, e aquela matéria era uma das minhas favoritas. Finalmente me dei por satisfeita e sai da sala.

— Desculpa. – Era Kentin. Virei para ele incrédula. Ele não parecia tão agressivo, mas sua postura ainda não voltara ao normal.

— Como?

— Desculpa, preciso que você saia para eu passar. – Estranhei a forma como ele pediu licença, mas ainda estava decepcionada demais para apontar aquilo. Sai do caminho e ele passou sem nem olhar para trás. Revirei os olhos e fui para o pátio para descansar.

— Você não tem mais amigos? – Ambre. Abri os olhos, que eu tinha fechado para aproveitar o sol. – Ou seu namorado finalmente se cansou de você?

— Estamos muito bem, Ambre, mas obrigada pela preocupação. – Sorri e voltei a fechar meus olhos. Ela foi embora e eu decidi usar aquele tempo livre para dar mais uma revisada.

Para alguém que estava tão cansada, eu não esperava que ia passar tanto tempo na biblioteca. Bom, na verdade fez sentido, porque na verdade eu dormi. Eu tinha me sentado numa das mesas mais escondidas, e depois de uma meia hora estudando eu não me lembrava de mais nada. E a dor nas costas entregava que eu tinha ficado debruçada na mesa.

— Ai, droga, quantas horas? – Tentei checar meu celular, mas tinha descarregado. Juntei minhas coisas, só então percebendo que estava tudo escuro e silencioso. Resmunguei, correndo até o pátio. – Ah, fala sério. Como me trancaram na escola?

Revirei as salas, mas todos já tinham ido. O zelador não deve ter me visto na mesa onde eu estava. Acabei indo até o porão, conferir se eu poderia usar uma das escadas para pular o muro. E até achei, mas a porta bateu atrás de mim e eu ouvi a tranca.

— Não. Ei, abram agora. Não tem graça. – Eu batia na porta, mas o som parecia se afastar. – Vocês não podem me prender assim. Abram a porta.

— Eu vou soltá-la. – A luz do corredor finalmente tinha acendido, revelando Kentin e Evan do outro lado. Franzi o cenho. – Vem, Anna.

— Kentin, não podemos. Nada contra você, Anna.

— Evan, não ouse… – Mas ele me empurrou de leve para dentro e bateu a porta mais uma vez. Bati mais uma vez. – Kentin, pelo amor de Deus, me solta.

— Acorda, Anna. – O cutucão no meu ombro me trouxe para a realidade, piscando devagar.

— Kentin? O que está fazendo aqui? – Perguntei, alongando o pescoço. Aquele cochilo doeria por algum tempo.

— Eu quem te pergunto.

— Eu vim revisar, mas acho que estava cansada demais. Ai.

— É, você demorou um pouco para me ouvir. Bom, você deveria encerrar o dia em casa, a escola já fechou.

— E por que você está aqui?

— Detenção. A diretora me encarregou de reorganizar os livros em ordem alfabética, estou nisso há alguns dias. – Ele parecia irritado ao fim da frase. – Mas hoje eu percebi que o zelador me esqueceu aqui, pra melhorar. Bom, você também, estava escondidinha ai.

— Tem ideia de como vamos sair? – Eu já tinha juntado minhas coisas, pronta para ir embora e tomar um analgésico. Ele deu um sorrisinho.

— Pelo muro, oras. Vem. – Ele pegou sua própria mochila e eu o segui até o jardim. Parecia até o dia em que tínhamos vindo investigar o caso de Iris. Ele se abaixou perto do muro e juntou as mãos, ao que entendi a intenção, mas hesitei.

— Você vai conseguir sair sem ajuda?

— Fica tranquila, o muro não é tão alto. Anda, sobe logo. – Suspirei, respirando fundo antes de subir. Como eu não era a menor garota que se tinha, eu sempre achava horrível aquela experiência de me apoiar nos outros. Ele parecia bem. Fiz um esforcinho e consegui subir o muro, mesmo estando de saia. Aliás, que eu esperava não tivesse exposto nada, considerando que era comprida.

— Ai, consegui. Kentin? – Chamei, mas não ouvi nada por alguns segundos. Até ele começar a correr. – Kentin?

Ele se agarrou ao muro com as mãos antes de se erguer e pular do meu lado. Eu fiquei olhando, achando aquilo o máximo. E ele fez aquilo com a mochila nas costas.

— Parede vertical. É um dos obstáculos no colégio. Vem, eu te deixo em casa. – Concordei, seguindo-o pela rua, sem saber o que mais reagir com esse Kentin que se parecia muito com meu amigo.


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Notas finais do capítulo

Obrigada, pessoas ♥



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