Olhei ao redor e procurei algum sinal de que aqueles garotinhos apareceriam. Afinal, era impossível sonhar exatamente com a mesma coisa duas vezes seguidas. Eu estava assustada, não sabia o que fazer. Tinha um doido ao meu lado com o rosto, corpo e tudo o mais igual ao do Stiles me dizendo que era um espírito natalino. Aquilo não era normal. Eu estava enlouquecendo, é claro. Quando eu acordasse daquele sonho maluco, jurava que ia procurar um psiquiatra.

Aquilo era loucura.

— É só esperar um pouco e logo você irá aparecer com o seu antigo melhor amigo — o Stiles “espírito” falou calmamente.

— Isso é loucura — repeti aquelas palavras e andei um pouco até encontrar um banquinho. Ao encontrá-lo, logo me sentei.

— Pode ser, mas é necessário — percebi ele sentar ao meu lado.

— Por que eu estou tendo sonhos tão malucos hoje? — isso era pra ser apenas um pensamento, mas acho que acabei pensando alto demais.

— Já que você acha que é um sonho, eu não acho que possa te responder isso — ele falou olhando ao redor, provavelmente procurando pelos garotinhos também.

— Como assim eu “acho” que é um sonho? Tá querendo dizer que essa loucura toda é real? — perguntei.

— Eu não disse isso, mas já que você falou... — ele não terminou a frase e eu revirei os olhos. Pelo visto, o Stiles “espírito” é tão louco quanto o restante do sonho.

Nós ficamos calados, esperando por mais ou menos cinco minutos desde a última fala dele, quando avistamos as figurinhas pequenas correndo.
Logo ele se levantou e eu não tive escolha a não ser segui-lo.

— Espera, Stiles. Você tem que correr mais devagar! Para, assim eu não consigo te acompanhar! — e repetiu as mesmas falas do meu outro sonho, rindo e ofegando — Stiles, você tem que correr mais devagar, eu não consigo te acompanhar — ela falou quando finalmente o alcançou e, repetindo o gesto, o garoto retribuiu seu sorriso.

— Lydia, você tem que começar a praticar um pouco, você está cada vez pior — depois de ouvir tais palavras, a garotinha, que era a “eu” pequena, deu um pequeno murro em seu ombro direito — Ai! — eu me lembrava desse dia como se fosse ontem. Foi a última vez que eu tinha conversado normalmente com Stiles. Desde que ele tinha me abandonado, eu não quis mais falar com ele nem nada. Acho que esse foi um dos motivos para eu ter me tornado essa pessoa que sou hoje.

— Essa lembrança está tão viva que até parece ser real — falei.

— Ainda acha que isso é um sonho? Tá, o que você faz para saber se está sonhando ou não? — ele perguntou. Eu sabia o que fazer, mas tinha medo de fazer tal coisa e perceber que tudo aquilo realmente era real. Chega, Lydia! Isso não é real!

— Olho meus dedos — ele assentiu e eu olhei para minhas mãos. Cinco. Era a quantidade de dedos que eu tinha em cada mão. A conta exata. Aquilo me assustou — Não é possível. Não tem como isso ser real — como poderia ser real? Com certeza eu estou ficando louca.

— Só porque você acha que uma coisa não existe, não significa que ela não é real — ele falou e eu me irritei com a grosseria dele — Agora, continuando… Eu não sei se você se lembra, mas esse Stiles que está aí...

— É o mesmo Stiles que estuda comigo. É, eu sei — falei, decepcionada. Se eu sabia esse tempo inteiro que era ele? Claro que sabia. Mas doía muito admitir aquilo. Ele me magoou muito no passado. Ele foi embora sem nem mesmo se despedir de mim. Acho que por isso eu o odeio e o desprezo tanto hoje em dia. Pra falar a verdade, eu faço isso pra tentar esquecer a imagem dele como um amigo, um amigo que me abandonou sem nem pensar duas vezes. Se ele ao menos tivesse pensado em mim e tivesse se despedido…

— É isso mesmo. Eu tenho certeza de que você passou todos esses anos se perguntando o porquê de ele não ter se despedido de você, não é mesmo?

— É claro que eu fiquei me perguntando, seu idiota. Ele era meu melhor amigo e nem teve a capacidade de dizer um simples “adeus” — falei.

— Mas para o Stiles não era apenas um simples “adeus”, Lydia. Ele gostava muito de você, e ele não conseguiria olhar para você e simplesmente dizer “adeus”. Você acha que foi difícil para você, mas que foi fácil para ele?

— Pode ter certeza que se ele gostasse mesmo de mim não teria me abandonado daquele jeito. Você não imagina o quanto foi difícil acordar no outro dia e ir na casa dele, sem saber que estava completamente fechada e que ele não estava mais lá. Você não consegue nem imaginar o vazio que eu senti por dentro — desabafei, praticamente gritando.

— Mas foi justamente por ele gostar tanto de você que ele não se despediu, cara! Você também não imagina o quanto foi difícil para ele lembrar que nunca mais poderia te ver! — ele também gritava.

— E como é que você sabe disso tudo? Não me diga que você é algum tipo de vidente também, porque já aconteceu muita loucura em apenas trinta minutos.

— No momento eu sou o Stiles, eu consigo saber tudo o que ele está sentindo.

— Tá legal, já chega! Isso é loucura demais para apenas uma noite.

— Não fala assim, Stiles. Você sabe que eu tenho dificuldades para correr — a garotinha continuou a falar e nós voltamos a prestar atenção neles. Pelo visto o tempo tinha parado desde o início da nossa discussão.

— Eles não podem nos ver? — perguntei, não conseguindo me conter.

— Não. Isso é apenas uma lembrança, e nós não fazemos parte dela. Somos invisíveis para qualquer coisa — ele respondeu rapidamente e nós voltamos a prestar atenção na cena à nossa frente.

Percebi a garotinha, que no caso era eu, deitar-se no chão e logo depois o Stiles criança também se deitou, bem ao lado dela.

— Gosto de olhar para as nuvens. A mamãe disse que sempre podemos encontrar desenhos, dependendo da forma delas — a Lydia criança falou e eu me lembrei daquele momento com clareza. Eu sabia tudo o que iria acontecer ali.

— É mesmo? Então deixa eu ver... Hm... Ali — ele apontou para uma nuvem e todos nós nos viramos para olhá-la — Aquela tem a forma de um bebê dentro de um carrinho — sem perceber, eu estava sorrindo.

Eu sentia muita falta daquele Stiles, a única pessoa que tinha me entendido, que sempre me apoiava, que sempre estava comigo e nunca trocava a minha amizade por nada. Mas aí ele foi embora e tudo acabou.

Ele foi embora sem se despedir, sem perguntar o que eu achava sobre aquela coisa toda. Eu sentia falta de conversar com ele daquela forma, sentia falta das piadas sem graça que ele fazia, sentia falta de quando ele tentava me animar e só piorava as coisas. Nós éramos apenas crianças, mas a nossa amizade era mais que isso.

— E aquela — e a Lydia criança apontou para outra nuvem. Logo me virei para olhar — tem a forma de um jarro de flores.

— Não, acho que é um cachorro correndo atrás de um guarda — o Stiles criança falou e a pequena Lydia riu.

— Percebe-se a diferença entre um jarro de flores e um cachorro correndo atrás de um guarda — a Lydia criança falou e dessa vez até eu ri um pouquinho.

O Stiles criança, que estava rindo, olhou para a Lydia pequena e eles ficaram se encarando, calados.

— Vamos brincar no balanço? — ele perguntou, depois de um grande momento calado.

— Claro — a “eu” criança respondeu e eles se levantaram correndo, indo em direção ao balanço.

— Acho que já deu dessa lembrança — e, segurando minha mão, o Stiles adolescente fez um pequeno movimento. Mais uma vez tudo ficou escuro e quando percebi já estávamos de volta ao meu quarto.

Ou melhor, eu estava de volta ao meu quarto. Stiles tinha sumido.