A conspiração escarlate escrita por Drafter


Capítulo 2
Uma nova missão




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Aquela tarde tinha tudo para ser como todas as outras, se não fosse pelo chamado de Botan. Estava quase perdendo o interesse na condição de ser um detetive espiritual, para ser bem sincero. Parecia que as coisas estavam ganhando uma nova dimensão, e depois do problema que teve que enfrentar junto ao Mundo Espiritual graças ao seu ancestral do Makai, achou que ficaria longe do radar de Botan por uns tempos. Por isso, a curiosidade acabou falando mais alto e ele decidiu dar uma chance à guia espiritual e ver do que se tratava.

Ele foi o último a chegar. Até Kuwabara já estava lá, reunido com Botan, Kurama e Hiei. O ponto de encontro dessa vez havia sido uma praça perto do centro da cidade. Quanto mais gente por perto, melhor. Pelo menos era assim que Botan pensava, já que achava que um grupo de jovens chamaria menos atenção em um lugar movimentado do que em lugares ermos e afastados.

— E aí, Botan, o que está havendo? Achei que o Reikai não quisesse mais ouvir falar de mim. 

— Yusuke, até que enfim! Estávamos só esperando você chegar — ela exclamou.

— Eu já estava quase indo embora... — Hiei resmungou. Ele não encarava com a mesma emoção os chamados de Botan. Para ele, eram apenas distrações, que ele tentava se livrar o mais rápido possível. 

Kuwabara fez um esforço para não responder de maneira mal-educada ao demônio de fogo ao seu lado, mas não teve o menor problema em traduzir seu desagrado com aquela arrogância através de uma careta, que ele nem fez questão de esconder.

Botan, como sempre, ignorou aquela velha picuinha. Estava ansiosa e queria dar a eles algo com que se preocuparem de verdade. 

Segundo a deusa, Koenma recebeu alertas de uma estranha energia em algumas partes da cidade. Temendo mais algum ataque ao Mundo dos Humanos — e uma represália de seu pai por não prevenir tal coisa — achou melhor mandar a turma de Yusuke investigar. Provavelmente uma pista falsa, porém Koenma não queria dar motivos para ser repreendido. Além do mais, achou que seria uma boa maneira de fazer Yusuke ganhar pontos novamente no Reikai, já que o caráter incomum dessa energia poderia estar escondendo alguma coisa. 

— Energia estranha? Não dá para ser mais claro, não? — Kuwabara não estava gostando da conversa. Esperava grandes aventuras e momentos de ação, depois que se firmou como parceiro extra-oficial de Yusuke. Investigar suspeitas sem fundamento parecia entediante.

— O Sr. Koenma não tem mais informações. Na verdade, ele quer que vocês tirem isso a limpo antes que chegue aos ouvidos do pai e seja tarde demais — Botan se justificou, encolhendo os ombros. Ela entendia a decepção dos amigos, mas tinha que dar razão à Koenma. Trazer mais problemas para o Mundo dos Humanos era tudo que eles não precisavam, e nesse caso, era melhor prevenir do que remediar. Além do mais, a estratégia de mostrar a utilidade de Yusuke era válida.

— Talvez seja só uma pista falsa realmente, mas não custa darmos uma olhada. Vai deixar o sr. Koenma mais tranquilo e, se for mesmo algo errado, nos livramos do problema antes que ele piore — afirmou Kurama. 

— Bem, se não tem jeito, vamos acabar logo com isso — respondeu Yusuke — Quais são os lugares que Koenma quer que investigue?

Botan desdobrou um papel que acabara de tirar do bolso, expondo o conteúdo para o grupo. Apenas três linhas, cada uma contendo um endereço. 

— Vocês podem se dividir, se quiserem. Só preciso que prestem bastante atenção e não deixem passar nada! Investiguem qualquer alteração no lugar — ela pediu.

— Bem, se são só três endereços, vocês não precisam de mim, não é? Depois me contem como foi... — Kuwabara tentou escapar. Preferia ir se divertir com os amigos em algo mais emocionante do que ficar visitando lugares aleatórios da cidade sem nem saber o que procurar. Yusuke, no entanto, discordava.

— Nada disso! Você vai comigo — disse, puxando o amigo pelo braço — Eu e Kuwabara vamos no primeiro endereço — anunciou, se voltando para o grupo — e vocês decidam o que fazer com os outros dois.

— Eu posso checar o segundo e você fica com o terceiro. O que acha? — Kurama falou, se dirigindo para Hiei. Mostrou o papel para o amigo, que olhou o endereço por alguns segundos antes de sumir de vista.

Kurama interpretou o gesto como uma resposta positiva, e tomou nota do endereço que lhe cabia investigar. Pelo nome, parecia um bar, não muito longe dali. Decidiu que passaria pelo local na volta para casa, certo de que ainda estaria fechado, para sentir a aura do lugar. Alguns bares do centro preferiam só funcionar à noite, talvez pelo baixo movimento do dia, ou talvez para dar a seus frequentadores mais privacidade, longe dos olhos da polícia e dos transeuntes. Era o ambiente ideal para jogos, prostituição, venda de drogas e outras atividades ilegais que permaneciam semi-cobertas pela escuridão, pela corrupção policial e pelo vazio das ruas do bairro nas altas horas da noite. Não era de admirar que a energia suspeita de Koenma viesse dali. Tais lugares por vezes atraem demônios de classes baixas, que se esgueiram pelo Ningenkai procurando diversão barata.

Yusuke e Kuwabara pegaram o papel das mãos de Kurama e analisaram de novo o endereço. Apenas uma rua e mais nada. Nenhum número, nenhum nome.

— Por que ficamos logo com o mais difícil? Como vamos investigar uma rua inteira? — Kuwabara começou a reclamar.

— Porque somos em dois, parceiro! Ah, vambora, isso vai ser moleza!

E eles se afastam, com Kuwabara ainda arrastado pelo braço, deixando Kurama e Botan sozinhos na praça.

— O que você está achando disso? — ele perguntou à menina, assim que os amigos se distanciaram.

— Eu não acho nada, só estou trazendo o recado de Koenma...

Ele riu.

— Desde quando você tem medo de dar sua opinião?

— Não estou com medo — respondeu, ficando vermelha — só acho muito cedo para opinar, é isso. Vamos ver onde isso vai dar.

Eles caminharam juntos pela praça sem trocar mais nenhuma palavra, concentrados nos próprios pensamentos.

(...)

Yusuke e Kuwabara, depois de rodar pela cidade, perdidos, enfim localizaram o endereço mencionado. Para alívio, perceberam que se tratava de uma ruela, uma pequena travessa, não muito maior do que um beco, com saída para os dois lados.

— Não me admira a gente ter se perdido... nunca que ia saber o nome desse lugar... — murmurou Kuwabara, olhando ao redor.

Apesar da luz do dia, a travessa parecia escura. A falta de iluminação artificial e as paredes estreitas que formavam a ruela davam ao local uma aparência sinistra e de abandono. Com pouco menos de cem metros e meia duzia de janelas, em alturas diferentes, o beco parecia deserto. Os dois amigos andaram de um lado para o outro, tentando sentir alguma alteração na normalidade aparente do lugar. 

— Esse lugar realmente parece ter algo errado... está sentindo, Yusuke?

Ele não respondeu, atento ao menor dos movimentos que poderia surgir de alguma sombra. Ele concordava com o amigo: algo ali parecia não fazer parte daquele ambiente... mas o quê?

— Vem, vamos dar uma olhada nessas janelas.

Procurando encontrar algum detalhe fora do lugar, mas sem chamar a atenção de quem passava pela rua transversal, os dois começaram a examinar cada moldura na parede. Muitas janelas estavam bloqueadas com papelões grossos, impedindo pessoas de fora de enxergar o ambiente interno. Tantas outras estavam quebradas, com cacos de vidro espalhados pelo chão. A maioria parecia simplesmente abandonada, com uma grossa camada de poeira cobrindo toda sua extensão. Algumas, alguns metros acima, ainda pareciam pertencer à moradores, com suas sacadas com varal de roupas e flores quase mortas pela falta de luz.

Uma das janelas chamou a atenção. Ficava a cinco metros do chão e, apesar de quebrada e empoeirada com tantas outras, parecia emitir luz do interior. A sensação de estranheza aumentou quando ambos pressentiram, quase ao mesmo tempo, uma forte energia negativa naquela direção.

— É ali que está o que estamos procurando! — exclamou Yusuke. Ele encarava a janela na esperança de alguma criatura aparecer no reflexo do vidro, enquanto tentava pensar em um meio de subir até lá.

Encontraram algumas latas de lixo e caixotes de madeira velhos e desgastados, que empilharam na tentativa de alcançar a janela. Kuwabara, que, apesar de mais desajeitado, era o mais alto entre os dois, tentou primeiro e conseguiu alcançar o parapeito.

— O que você está vendo? — gritou Yusuke, do chão.

— Nada, o lugar parece vazio! — a janela dava para uma sala pequena e bagunçada, com um papel de parede desbotado e com manchas escuras em alguns pontos, provavelmente causadas por infiltração. Os poucos móveis — uma poltrona forrada de tecido azul marinho, uma pequena mesa de canto de madeira, uma estante com uma prateleira faltando e um lustre de vidro — pareciam quebrados e empoeirados, além de espalhados de maneira desordenada pelo local. Havia entulho e papéis amassados espalhados pelo chão, coberto por um tapete que alguns anos atrás deveria ser de um verde vivo. Tudo ali indicava mais um apartamento abandonado pelos antigos moradores há anos atrás, a não ser um pequeno detalhe que chamou a atenção de Kuwabara: um maço de cigarros praticamente cheio, aberto, em cima da mesinha de canto, ao lado de um isqueiro também aparentemente novo. 

Ele tentava olhar cada canto da sala sem no entanto ficar muito exposto a quem quer que estivesse lá dentro. Já haviam passado uns bons minutos quando finalmente conseguiu vislumbrar uma figura de relance, aparentemente com um casaco longo de chuva e um chapéu enfiado na cabeça. Ele passou pelo corredor que havia à esquerda da sala, e Kuwabara teve certeza de que a energia que haviam sentido vinha dele.

O sujeito repentinamente apareceu no campo de visão de Kuwabara, que, ao tentar se abaixar para não ser visto, acabou perdendo o equilíbrio e caiu da torre de caixotes e latas de lixo.

Com um estrondo, tudo foi ao chão. O rapaz ainda demorou alguns segundos para se recuperar, gemendo de dor e esfregando a testa ligeiramente avermelhada pela batida, enquanto Yusuke se agachava para verificar se o amigo estava bem.

— Tem alguém lá dentro! — ele disse, ficando de pé em um pulo — Com certeza ele é a pessoa que Koenma está procurando!

—Espera, conta direito o que você viu. Quem está ali dentro?

— Eu não sei, não vi direito quem ou o que era! Só sei que tudo pareceu muito estranho. O lugar está completamente sujo, bagunçado, com cara de que ninguém aparece há anos, e mesmo assim, tinha alguém lá dentro, que não combinava em nada com aquilo — relatou esbaforido. — Tenho certeza de que a energia que sentimos estava vindo dele! Rápido, vamos tentar encontrá-lo!

Ele saiu correndo, procurando a entrada principal do edifício, com Yusuke logo atrás. 

O prédio parecia igualmente abandonado: sem luzes no interior, espelhos quebrados e muito entulho pelos cantos. A mesa da portaria estava quebrada e arranhada por toda sua extensão, e as paredes, rabiscadas. Tiveram que driblar os pedaços de madeira e vidro quebrado que bloqueava parcialmente a escada do edifício para conseguirem alcançar o segundo andar, onde ficava localizado o apartamento, a julgar pela altura da janela.

Chegaram correndo e usaram a intuição aguçada de Kuwabara para descobrir qual a porta deveriam abrir. Haviam apenas seis apartamentos por andar, três de cada lado do corredor. Pararam instintivamente na última porta à esquerda e arrombaram sem cerimônia. Se a pessoa ainda estivesse no prédio, aquele era o apartamento certo, disso não tinham dúvida.


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