Akuma To Hikari escrita por Yukii


Capítulo 1
Unique


Notas iniciais do capítulo

Essa oneshot, como já foi dito, foi escrita unicamente para metaforizar o livro que eu escrevo. Em fatos, os dois não tem muito em comum entre si - apenas o cenário, talvez -, e a ideia de escrever isso se deu graças à minha ansiedade por escrever a história inteira. Aqui vai sua versão metafórica e alternativa, então.



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Não havia um céu. Talvez houvesse um teto, ou algo assim. Talvez. Ninguém nunca havia tentado descobrir isso. Se um par de olhos humanos pudesse ver aquele cenário, chamaria de escuro. Porém, os seres daquele lugar nunca o chamariam de escuro, porque não sabiam o que era escuro. O escuro era a ausência de luz - mas a luz nunca tivera oportunidade de ser conhecida por ali.

 

Não era ausência de luz. A luz, simplesmente, não existia.

 

Um deles estava encolhido em seu pedaço de terra arenoso. Um deles, disforme, feio, esquecido. Alguns deles eram grandes e belos, mas não tinham consciência disso, vivendo nos próprios hábitos ignorantes. Não, "viver" não seria o correto. Eles existiam, e nada mais.

 

O ser esticou seus dedos lentamente, piscando as pálpebras enrugadas e sentindo o mesmo frio morto de tanto tempo. Acabara de acordar de um longo sono - que poderia ter durado séculos, se fosse contado em tempo humano -, e observava o terreno cinzento e pedregoso à sua volta, encoberto por silêncio. Não havia oxigênio, nem nenhuma partícula em especial.

 

Demônios não precisavam de oxigênio.

 

Erguendo a fronte, ele observou o panorama acima de si mesmo, lembrando-se dos rumores que escutara sobre um mundo de novas criaturas que haviam surgido. Um mundo enorme e vasto, que ganhava novas formas de vida com a crescente evolução, e era diferente daquele mundo onde todos eles habitavam.

 

Um mundo diferente?

 

Como poderia haver um mundo diferente?

 

Ele só conhecia aquele. Não conseguia imaginar nada "diferente".

 

E, se bem conhecia os seus conterrâneos, eles não deixariam aquele novo mundo perdurar. Aquele novo mundo, cheio de elementos que eles não tinham. Era da natureza de qualquer demônio destruir, transformar tudo o que pudessem na mesma podridão seca que habitava o vazio de seus corpos.

 

Um som estranho percorreu o ambiente, fazendo o demônio olhar ao redor. Vinha de cima. De cima? O que havia em cima, se não o negrume vazio?

 

Estalou. Estalou. Até fazer um grande ruído e ceder.

 

Havia um teto, afinal? O grande pedaço de placa se soltou, muitos metros acima do vulto do demônio e, antes que pudesse tocá-lo, se desfez em pó. O ser estava surpreso. Nunca havia presenciado nada semelhante.

 

Do buraco deixado pelo pedaço que se soltara, muitos metros acima do chão, algo estranhamente claro se revelou, fazendo um feixe largo que descia até o chão, bem defronte ao demônio.

 

Ele estava horrorizado. Não conhecia a claridade, e estranhou-a imensamente. Olhou ao redor, ansioso, mas não havia nenhum outro demônio por perto. Hesitante, ele deixou-se tocar pela luz, caminhando até o retalho iluminado e apertando os olhos, como se esperasse sofrer algo.

 

Nada ocorreu. Os olhos esbranquiçados seguiram as partículas douradas que flutuavam naquela estranha luz, e ele estendeu a mão esquerda e disforme para tocá-las. Por um instante, não reconheceu a própria mão, repetindo os movimentos para ter certeza de que aquele membro pertencia a ele. Na luz, sua pele enrugada e velha luzia em tons vermelhos, e, pela primeira vez, pôde enxergar suas garras compridas e encrostadas de sujeira.

 

Não foram precisos muitos minutos para que o demônio analisasse o restante do corpo, e o pedaço de terra que estava sendo iluminado pelo retalho luminoso. Poderia não ser luz, poderia ser outra coisa; qualquer coisa.

 

Antes que pudesse perceber, o demônio estava apaixonado pela luz.

 

Era linda e simples, pura, clara. Ela mostrava coisas que ele nunca havia visto, e ela vinha de um outro lugar. Tão diferente que fazia aquele retalho de terra parecer outro mundo. O mundo dele. A luz era sua, aquela luz era sua. Amou-a, sem perceber, pois jamais havia amado algo em sua vida. O demônio nunca se cansava de seu brilho intenso e amarelo, das partículas flutuantes, do vermelho que ela fazia luzir em sua pele. Algumas vezes, ele contemplava o buraco lá no alto, mas a luz o cegava. Em todos os sentidos.

 

Diziam que os homens eram maus, e que o sangue de alguns cheirava bem, naquele mundo. Mais tarde, graças ao buraco misterioso que unira o mundo humano e o mundo dos demônios, os homens descobririam a existência de novos mundos - descobririam, mas não entenderiam -, e dariam vários nomes para aquela terra: Submundo, Valhala, Inferno, Makai, Terra dos Mortos. Os nomes não importavam - a essência sempre fora o mais significativo. E os homens nunca seriam capazes de apalpar a essência daquele mundo, nem do seu próprio.

 

O demônio em seu pedaço de luz só passou a odiar os homens como os outros demônios quando os seres humanos passaram a interferir na sua luz. Os homens analisaram, tocaram, averiguaram, e, mesmo sem ver o demônio, concluíram que haviam bestas perigosas embaixo de sua terra, muitos milhares de metros abaixo.

 

Não eram bestas perigosas, eram apenas almas rejeitadas.

 

Mesmo assim, os homens quiseram fechar o buraco. E o fizeram.

 

Quando o demônio viu que seu feixe de luz diminuía a cada dia, entrou em desespero - o desespero angustiado dos apaixonados, que só eles entendem. Os outros demônios nada compreenderam, vendo-o berrar e arranhar as paredes, emagrecido pelo amor doentio, tentando voar sem ter asas.

 

A luz se foi. O buraco sumiu.

 

O demônio não saiu dali. Atirou pedras para o alto, querendo abrir um buraco no tal teto. Usou todas as suas forças. Chamou por eras a fio, pela luz. Gritou que nunca se cansaria dela, que precisava dela para viver. E os outros demônios apenas não entendiam. Afinal, demônios não amavam.

 

Um dia, o demônio parou de existir. Algumas pessoas poderiam considerar isso como um eufemismo da morte, mas não é algo assim; os demônios existem, simplesmente, e não vivem. Quem não vive não pode morrer. A morte é um privilégio dos seres dotados de grande espírito, e nenhum dos demônios estava interessado nela.

 

Com a extinção da luz, o demônio simplesmente deixou-se definhar ainda mais, enlouquecido. Havia sido humanizado pelo amor, e destruído pelo mesmo. Seu peito doía - uma característica de ser vivo.

 

Contemplando o corpo virado em pó do ser que amara a luz, os outros questionavam-se o que era a tal luz. Não acreditavam na claridade, e tinham fortes aspirações de que aquilo que o demônio chamava por "luz" fosse a matéria fundamental do mundo novo, aquele mundo de humanos e outras milhões de formas de vidas.

 

Aquele mundo podia destruir demônios?

 

Não poderia mais, se os demônios conseguissem destrui-lo antes.

 

Junto com a luz.

 

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Raia tu, ó luz!
O teu brilho adocicado
Há de prender-me na cruz.


 

 

 


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Notas finais do capítulo

Ficou sem nexo, mas era a intenção.
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