Conspiração escrita por Lura


Capítulo 38
Orgulho e Miséria


Notas iniciais do capítulo

E sim, mais um capítulo que não demorou um absurdo para sair. Estou orgulhosa de mim. Será que essa fic chegará ao final?
Apesar de termos muitas situações diferentes em um mesmo capítulo, com excessivas quebras de página (coisa que eu não gosto), senti que esses acontecimentos não caberiam em outro lugar. Falo mais sobre nas notas finais.
Como sempre, um agradecimento especial aos leitores Vivi Pearl, Ba, gutor e BabyCool, que comentaram o último capítulo.
Espero que gostem.



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Miori observou os pequenos esquadrões, que até então estavam posicionados de maneira organizada em frente ao antigo mezanino, se dispersarem para cumprirem suas missões, após o pronunciamento de seu soberano.

O homem em questão, havia chegado há pouco tempo e mal olhara para seus subordinados antes de proferir novas ordens. Não havia simpatia em seu semblante, ou preocupação com seus seguidores leais. Miori era capaz de apostar que, qualquer sentimento presente no semblante do homem, aproximava-se do puro desdém. Tinha a impressão que ele encarava as pessoas enfileiradas à sua frente, como se não valessem mais que a poeira que maculava sua armadura brilhante. 

Inevitavelmente, o interior da garota ferveu. Ela não sabia quem havia rasgado um dos lados da face do homem de cima abaixo, mas sentia imensa vontade de se voluntariar para deixar o outro lado igual. 

As coisas eram mais simples antes que ele chegasse e assumisse o controle da Signum Sectiones. Eles apenas viviam sua fé. Se capacitavam magicamente e se preparavam. Aguardavam a ascensão de E.N.D.., para que pudessem destruí-lo e cumprir sua missão. 

Mas então a anciã fez a profecia e, num sincronismo incrível, o soberano assumiu pouco depois. Foi quando Miori viu sua crença se transformar no trampolim para uma sequência de assassinatos. Pessoas bondosas, que fizeram parte de sua criação, tornaram-se homicidas delirantes. Quem diria que, com o discurso certo, fiéis poderiam facilmente ter sua fé manipulada em obstinação?

E ela teve que seguir o fluxo, para não ser exilada da comunidade em que cresceu. Seu pai, braço direito do soberano, foi o primeiro a lhe lembrar. Tudo bem, ela não tinha mesmo pretensão de nadar contra a corrente. Era a missão dela: dedicar sua vida à Signum Sectiones, por mais difícil que fosse. Sabia que, ainda que seus atos fossem questionados, no final salvariam o mundo da destruição por E.N.D., a criação mais terrível de Zeref.

Isso não a impedia de odiar o homem, no entanto, por ser o catalizador que trouxe o caos e o ódio à sua comunidade, que até meses atrás, vivia em paz.

— O soberano já se foi, sabe — Niall comentou, em tom zombeteiro. 

A jovem piscou, atordoada. Mal percebera que o líder se movera.  Era como se ódio tivesse gravado a imagem dele em suas retinas.

— E nós também precisamos ir — Ulric determinou, antes que Niall e Miori pudessem cair em outra discussão. — Nossa missão tornou-se mais delicada. Quanto antes nos prepararmos, melhor — lembrou.

— Finalmente! — Niall comemorou. — Eu já estava cansado de ficar eliminando alvos tão insignificantes. 

— Uma vez que as guildas perceberam as nossas ações, não temos porque continuar com ataques discretos. O soberano fez bem em nos reorganizar para um ataque concentrado — ponderou Ulric e Miori não pode deixar de pensar o quanto seu porte enorme contrastava com seu raciocínio afiado.

— O risco é enorme, no entanto — Miori ressaltou, franzindo o cenho. 

Ulric estudou-a, com curiosidade. Apesar de a jovem exibir grande bravata e arrogância no campo de batalha, na realidade mostrava-se cautelosa, sempre que discutiam planos de combate.

— Mas se atingirmos os alvos, o resultado compensará — o homem maior pontuou. — Sabíamos que a limpeza dos alvos menores somente duraria até que as guildas ou o Conselho Mágico emitissem alertas a respeito das nossas ações. Uma vez que o momento chegou, devemos passar para os alvos mais prováveis — reforçou.

— A profecia da anciã — Miori lembrou.

Niall soltou um suspiro dramático, antes de reclamar:

— Apesar de tudo o chefe ainda ficará com a parte mais divertida.

— O alvo mais difícil. Nós ficaremos com o mais provável — Ulric deu de ombros. — Mas não se preocupe. Haverá muita diversão para você até chegarmos nele — concluiu. 

— Tanto precisamos de uma isca, quanto seremos isca — Niall desdenhou. — E o prêmio pelo nosso esforço é um bebê idiota que ainda está na barriga de uma maga magicamente incapacitada — zombou. 

Ulric revirou os olhos.

— Contente-se com a honra de cumprir nossa missão — concluiu, antes de começar a caminhar para longe. 

— Claro, claro — sem qualquer sinceridade, Niall concordou, seguindo-o de perto. — Não vamos chegar nele sem algum tipo de resistência, de qualquer maneira — acrescentou.

Seguindo-os em seu próprio ritmo, Miori refletiu na realidade das palavras do colega de time. Apesar do alvo ridículo, certamente um punhado de magos poderosos se colocariam no caminho antes que o alcançassem. Afinal, estavam prestes a enfrentar a Fairy Tail, e não precisavam estudar o oponente a fundo para saber que não entregariam Lucy Heartfilia sem lutar. 

De qualquer maneira, ela não se preocupava. Todos os esquadrões de combate da Signum Sectiones haviam sido movimentados. Ela não se importava se teriam que passar por cima da Fairy Tail, ou do próprio Conselho Mágico.

Certamente, ela não falharia dessa vez. 

 

 

Magnólia — 20 de junho de X792

Após colocar no chão o pacote que trazia, Gray observou por um momento a sala que, a não ser pelas caixas, encontrava-se vazia. 

As antigas paredes pintadas em azul caribe eram o que havia de mais reconfortante, o tom trazendo uma frieza familiar. Ainda assim, não eram suficientes para sustentar o aconchego de um lar. Inferno, ele duvidava que mesmo em alguns dias, quando o espaço estivesse preenchido por móveis, essa sensação viria.

Porque agora, ele dividiria um apartamento com Juvia. Uma decisão impulsiva e impensada, motivada apenas pelo fato de ela estar grávida de seu filho e o dever moral que martelou no fundo de sua mente que ele deveria estar por perto para criar a criança. 

O mago do gelo sequer havia cogitado a possibilidade nos dias que se seguiram ao anúncio da gravidez. Na verdade, naquele período, a maga da chuva pareceu evitá-lo com um sucesso ainda maior. Foi por acaso que Gray a encontrou sentada em um dos bancos da praça de Fiore, as roupas de inverno trocadas por um vestido azul celeste fluido e fresco, mais condizente com o verão que se aproximava, os pés equipados com sandálias confortáveis. Ao lado da maga, descansando sob a madeira do assento, jazia um jornal, no qual percebeu, assim que se aproximou, anúncios imóveis circulados em vermelho.

A maga da chuva percebeu sua presença pouco depois e arregalou os olhos. 

— Você vai se mudar? — Gray foi direto ao ponto, ignorando totalmente que havia uma infinidade de coisas que precisavam discutir antes disso.

A mulher de cabelos azuis piscou incerta, mas após ajeitar-se para se sentar de maneira mais recatada, encarou-o com serenidade e respondeu:

— Juvia não poderá criar o bebê na Fairy Hills. São as regras do dormitório.

— Mas ainda há muito tempo até que ele nasça. Você não precisa sair agora — argumentou, tentando calcular o tempo de gestação. Céus, ele não havia pensado nem naquilo? Quando eles haviam dormido juntos mesmo?

Juvia cruzou as mãos sobre o colo. Gray se perguntou se por baixo do vestido, a barriga dela já estava saliente.

— Juvia sabe, mas acredita que a transição será muito mais difícil se for feita com a gravidez adiantada, ou após o nascimento do bebê — explicou. — Eu quero tempo para me acostumar. Tempo para preparar um ambiente adequado para a chegada dele — acrescentou. — Mel-chan concordou comigo e decidimos começar a procurar um apartamento — concluiu.

O semblante  do mago do gelo tornou-se surpreso. 

— Meldy está te ajudando nisso? 

— Na verdade, Mel-chan e Juvia-chan vão dividir um apartamento. Mel-chan não se adaptou muito bem a vida ao dormitório e já pensava em sair de qualquer maneira, por isso propôs que alugássemos um lugar juntas — a explanação da mulher-chuva foi breve, mas era nítido o alívio e a gratidão que seu rosto transmitiam, por não ter que fazer aquilo sozinha.

Naquele momento, Gray se sentiu um homem muito pequeno. Ele sequer havia parado para pensar em todas as implicações e providências que deveriam ser adotadas em razão da gravidez e Juvia já estava agindo, com a colaboração de terceiros.

Ele, que se considerava anos luz superior ao Natsu em maturidade, viu-se perdendo feio para o dragon slayer, que pelo que testemunhara, fora o suporte de Lucy desde que ela descobriu a gestação. Isso, em meio a uma trama mentirosa que podia acarretar na condenação criminal da maga estelar e resultar em pena capital. Mas Gray, só conseguia ficar confuso com o fato de que Juvia já havia decidido levar a gravidez adiante, com ou sem o apoio dele.

Em meio a toda essa confusão, ele nem sabia ao certo como havia proposto que morassem juntos. Lembrava-se que sequer tivera forças para argumentar com uma Meldy furiosa, que chegou no exato momento em que fizera o pedido. O fato é que, por algum milagre, Juvia - que recentemente apenas se esquivava dele - havia aceitado e, cinco dias depois, ali estava ele, parado no apartamento vazio que seria o primeiro lar de seu filho ainda não nascido.

Não que contribuísse para sanar toda a incerteza que sentia, mas ao menos tinha que admitir que haviam conseguido um lugar legal. O cômodo de entrada  era amplo o suficiente para acomodar as salas de estar e de jantar, visto que um balcão de pedras cinzas separavam tal ambiente de uma cozinha pequena, mas bem equipada. Além disso, havia um banheiro com uma banheira decente e dois quartos grandes, um para ele e outro que Juvia já havia decidido dividir com a criança. 

O melhor do lugar, em sua opinião, eram as amplas vidraças que permitiam a vista para o rio e possibilitavam um ambiente bem arejado. Agora mesmo, podia-se contemplar os barqueiros remando com suas cargas seguras em seus botes, totalmente alheios à aflição do jovem estacado no meio do apartamento.

Suas divagações só foram interrompidas pelos sons de passos, que fizeram com que automaticamente se virasse para encarar a aproximação da maga da chuva, que trazia uma caixa nas mãos. Pelo modo que sua caminhada estava afetada, a caixa parecia pesada, e automaticamente um alerta soou em sua mente, dizendo que talvez ela não devesse fazer aquilo.

Antes que pudesse tomar qualquer atitude, porém, Meldy disparou porta adentro, largando a caixa que trazia no chão para tomar a que Juvia segurava.

— Droga, Juvia-chan! Eu falei que era para você carregar apenas as caixas mais leves! — ralhou, enquanto caminhava em direção ao balcão de pedra, onde depositou o pacote que parecia conter utensílios de cozinha. — E você! Qual a utilidade de estar por perto se vai permitir que coisas como essa aconteçam? — voltando-se para o mago do gelo, a garota de cabelos rosas questionou.

— Mel-chan! — Juvia exclamou, em tom de repreensão, fazendo com que a outra revirasse os olhos. 

— Eu não disse nada demais! — defendeu-se. — Se ele não vai te ajudar em tais situações, não vejo porque precisam morar juntos em primeiro lugar! Sorte sua que eu vou estar do outro lado do corredor — Meldy lembrou, enquanto abraçava a maga de cabelos azuis.

O lembrete fez com que um gemido desanimado involuntariamente deixasse a boca do mago do gelo. E o olhar assassino que a maga sensorial lhe lançou em resposta, não foi o suficiente para fazê-lo recuar. Porque se tudo parecia ruim, a perspectiva de ter Meldy, que nitidamente o odiava, como vizinha, definitivamente não melhoravam seu humor. Sobretudo porque a garota era de longe a pessoa mais animada com a existência daquela criança, e mais decidida a proteger Juvia. Um papel que era dele, e ele não sentia a mínima urgência em desenvolver.

Certamente, os próximos meses seriam longos.

 

 

Magnólia — 24 de junho de X792

— Está tudo bem, Lucy-san? 

Diante da pergunta, os olhos castanhos da maga estelar piscaram, na tentativa de se reorientar. Aquilo era o chão da guilda? Por que estava olhando para ele?

Só então, percebera que havia se curvado sobre a própria barriga. Com alívio pelo calor súbito que a acometera ter passado, endireitou-se e voltou-se para o balcão, onde Juvia a encarava com preocupação.

— Juvia!!! — exultou-se em ver a maga de cabelos azuis. — Faz alguns dias que eu não vejo você. Como tem passado? — indagou.

Dessa vez, a maga da chuva foi quem piscou os olhos azuis.

— Bem — respondeu com cautela. — Mas Lucy-San não parecia muito bem quando eu cheguei — observou, lembrando-se do susto que levou ao ver a loira dobrada contra a barriga, assim que adentrou a sede da guilda, especialmente porque não parecia haver mais ninguém por perto.

Lucy agitou as mãos em descaso.

— Não há dúvidas agora que a bebê herdou a magia do Natsu — contou. — Eu venho sentindo esses calores intensos e súbitos. Eles me causam fadiga — explicou. — Porlyusica vem acompanhando, mas uma vez que a gestação de um filho de um dragon slayer é inédita até onde ela sabe, não há muito o que fazer. Porém, ela garantiu que ambas estamos bem — concluiu.

— Oh! — Juvia exclamou em compreensão. — Mas era mesmo só calor? Lucy-San parecia com dor — apontou, preocupada. 

A loira tornou-se contemplativa.

— Porlyusica me alertou que nessa altura da gravidez, algumas mulheres sofrem contrações de treinamento — alegou, enquanto massageava a lateral da barriga. — Parece que eu fui contemplada — acrescentou em brincadeira, embora seu tom não fosse muito animado.

Juvia a encarou com um olhar de solidariedade.

— Há tantas coisas que  Juvia não sabe sobre a gravidez — lamentou.

Dessa vez, foi Lucy quem olhou para a outra com compaixão.

— Você pode me perguntar, sempre que quiser. Se eu puder ajudar, ajudarei — garantiu, apertando as mãos da maga entre as suas, por cima do balcão de madeira. — Eu queria mesmo conversar com você. Saber como estava — acrescentou, soltando as mãos da maga da chuva para contornar o balcão. — Apenas quis dar um tempo. Eu sei como esse período após o anúncio da gravidez pode ser perturbador — emendou, tentando e falhando miseravelmente em se sentar na banqueta ao lado da que a jovem de cabelos azuis ocupava. A barriga enorme cobrava seu preço.

Apiedada, Juvia desceu da banqueta, sinalizando para que sentassem na mesa mais próxima e Lucy a fitou com gratidão.

Uma vez que que se acomodaram uma de frente para a outra, Juvia abriu e fechou a boca algumas vezes, como se não estivesse certa do que dizer.

Em solidariedade, Lucy adiantou-se:

— Gray nos disse que vocês decidiram morar juntos, para que que ele possa acompanhar a gravidez e depois ajudar com a criança.

O olhar da maga da chuva tornou-se melancólico.

— Mas você não parece muito animada com isso — continuou a loira, com cautela. — A Juvia que eu conheço, estaria exultante.

A outra soltou uma risada cansada.

— É sempre melhor quando a criança tem a oportunidade de crescer junto com os pais — alegou. — Juvia cresceu num orfanato, então não quer que o bebê prove algo nem remotamente parecido.

— Eu entendo — Lucy afirmou. — Após a morte da minha mãe, mesmo que eu ainda vivesse com meu pai, ele não ligava muito para mim. Foi doloroso — contou. — Mas além de cuidar dos interesses do bebê, você não parece muito confortável com a decisão — observou, voltando ao assunto principal. — Na verdade, você já estava evitando Gray bem antes do idiota do Natsu deixar escapar sobre a gravidez — lembrou, revoltada. 

Juvia forçou uma expressão indiferente, mas involuntariamente se encolheu.

— Juvia nunca se importou em ser rejeitada e sempre confiou em sua perseverança para alcançar o amor do Gray-sama — contou. — Mas isso não quer dizer que as rejeições não machucavam. Juvia sabe que pode aguentar isso, mas não acha que aguenta ver o bebê passar pelo mesmo — alegou. — Aliás, apavora a Juvia que o bebê se sinta rejeitado pelo pai.

— Oh, Juvia! — Lucy exclamou, com empatia, sem saber muito o que dizer da situação. Ela sabia que os sentimentos em relação a uma gravidez indesejada eram complexos. Ela própria não estivera imediatamente certa em seguir adiante quando soube que esperava um filho de Natsu. — Eu não posso dizer o que você deve esperar de Gray em relação ao bebê, embora como amiga, eu sinta que ele apenas precisa colocar a cabeça no lugar. Pode levar um tempo, mas o senso moral dele é muito forte — garantiu, lembrando-se da maneira que o mago do gelo esteve disposto a se sacrificar se transformando em gelo eterno, para apagar seus erros do passado.

— Senso moral não é o sentimento que Juvia quer que Gray-sama tenha pelo bebê — disse a maga da chuva. 

— Bem, eu não sei os sentimentos dele, mas eu sei os meus — a maga estelar continuou. — E saiba que não apenas eu, mas todos os membros da guilda amarão muito essa criança, porque ela é família, Juvia. Seu bebê não poderia crescer em um lugar melhor — lembrou.

Finalmente, a maga sorriu e acariciou seu ventre ainda plano.

— Eu sei.

Percebendo que a atmosfera menos carregada, Lucy sentiu-se mais à vontade em levar a comversa para assuntos mais amenos:

— Mas me conta, quando descobriu sobre a gravidez? — indagou, curiosa, inclinando-se para frente em expectativa.

— Juvia soube no momento em que ela e Gray-sama terminaram de… — começou a responder, mas interrompeu-se a perceber o que diria.

Lucy, porém, entendeu, mas longe de explorar o aspecto íntimo da revelação, impressionou-se com outra coisa:

— Isso é incrível! Eu levei três meses inteiros para perceber que estava grávida e você soube no momento em que engravidou! — exclamou, impressionada.

Juvia, apesar de corada, continuou:

— Porlyusica-san disse que algumas mulheres sentem que estão grávidas no momento da concepção. Não é tão incomum. — Deu de ombros. — Juvia fica aliviada que tenha sido assim, porque o corpo dela é feito de água. Juvia não sabe se pode assumir uma forma líquida durante a gravidez, sem danos ao bebê — acrescentou.

— Faz sentido — Lucy comentou. — Talvez você tenha percebido justamente por causa da afinidade que a sua magia lhe dá com o próprio corpo — cogitou.

— É possível — a outra concordou. 

— Mas você ainda manipula seus poderes bem, apesar dessa limitação. Poderá continuar realizando missões, embora esteja mais vulnerável a ataques físicos — ponderou. 

— Juvia será bem cuidadosa nas escolhas das missões — garantiu. — Por falar nisso, é para isso que Juvia veio — contou, levantando-se e caminhando até o quadro, encerrando implicitamente a conversa.

Lucy compreendeu e seguiu-a.

— Vai pegar uma missão sozinha? Meldy ficará furiosa — a maga estelar afirmou.

A maga da chuva suspirou.

— Mel-chan e Gray-sama têm brigado o tempo todo. Juvia apenas sente que precisa de um tempo — falou, enquanto estudava os folhetos pregados no quadro. — Juvia queria uma missão simples e não muito longa. Havia uma para localizar objetos possivelmente mágicos em uma escavação — lembrou. 

— A Shadow Gear pegou essa — Lucy avisou. — Se uma missão envolver livros e antiguidades, você tem que ser muito rápida para superar a Levy — acrescentou, em tom risonho. 

— Lucy-san está certa — afirmou. — Bom, parece que eu vou ser a garçonete do Yajima-san por alguns dias — Juvia decidiu, apanhando outro folheto, aliviada em ver que o restaurante que precisava de garçonetes, não se situava em Magnolia.

— Yajima-San está sempre contratando — a maga estelar brincou, caminhando até o balcão para registrar a missão. 

— Lucy-san… — Juvia chamou, fazendo com que a loira erguesse os olhos do registro. — Juvia agradece pelo apoio. Assim como o filho da Juvia, a filha da Lucy-san e do Natsu-san será muito amada pela guilda.

Lucy sorriu.

— Eles serão grandes amigos — afirmou. — Mesmo que seu filho herde os poderes de gelo do Gray — acrescentou, embora seu timbre já não fosse tão confiante.

Inevitavelmente, as magas imaginaram de cenho franzido, duas crianças, uma de cabelos róseos e outra de cabelos escuros, brigando por todo o salão da guilda e destruindo o que quer que tivesse pelo caminho com suas rajadas de fogo e gelo. 

Ao final do pequeno devaneio, encararam-se de olhos arregalados, para em seguida caírem na risada.

— Eles ficarão bem — Lucy concluiu, enquanto a outra assentia, embora as duas, sem saber, pensavam ao mesmo tempo que, Makarov, por outro lado, não ficaria, se as duas crianças fossem tão problemáticas quanto seus pais.

 

 

Magnólia — 30 de junho de X792

Lucy remexeu-se, incomodada pelo calor abrasador que a engolfava. Isso porque, além de se sentir aquecida de fora para dentro, sentia-se queimando de dentro para fora.

Empurrando com as pernas, conseguiu se livrar dos braços protetores de Natsu, que até então a envolviam. O baque alto revelou que ela o havia derrubado no chão acidentalmente durante o processo, mas a onda de calor infernal que a acometia impediu que ela se importasse com o fato. Então, em vez de prestar atenção no modo que Natsu praguejada enquanto se levantava, a maga estelar apanhou a última edição da Sorceres Magazine que havia deixado na bancada de sua janela e passou a se abanar.

— O que aconteceu, Natsu? — Happy, que naquela noite dormia ao pé de ambos os magos, indagou, esfregando os olhos sonolentos com as patinhas. 

— A Lucy me chutou para fora da cama — reclamou, só então notando o quanto a loira, que se abanava freneticamente, suava. — Hei, você está bem? — indagou, preocupado, tirando a revista das mãos dela para que pudesse abaná-la ele mesmo.

— Não — choramingou Lucy. — Essas ondas de calor estão ficando cada vez mais intensas! É como se houvesse lava no meu estômago! — reclamou, puxando para cima a blusa de seu pijama de verão, deixando que o tecido cobrisse apenas os seios, na esperança que, ao exibir mais pele, se refrescasse mais rapidamente. — E a culpa disso tudo é sua! — esbravejou em acréscimo, fulminando com o olhar o dragon slayer, que por sua vez se encolheu — Francamente, como você aguenta esse fervor?

— Lucy tarada está irritada! — Happy cantarolou, voando até o interruptor para acender a luz. Afinal, sabia que não dormiriam tão cedo.

A loira ainda teve energia para atirar uma almofada contra o gatinho, que desviou-se com facilidade, mas Natsu manifestou-se, chamando a atenção dela:

— Eu vou preparar um banho frio para você — alegou. — Isso com certeza fará com que se sinta melhor.

— Sim, claro, se eu não ferver a água enquanto estiver dentro dela!!! — zombou a maga.

— Se não der certo, sempre podemos chamar o Gray para resfriá-lá — Happy brincou, atraindo o olhar assassino de ambos os magos.

— Por cima do meu cadáver que o cueca gelada vai agarrar a Lucy — o dragon slayer declarou, entredentes.

— Ninguém falou em agarrar — Lucy comentou, refletindo melhor sobre a solução proposta, atraindo um olhar incrédulo de Natsu, por realmente considerá-lá. — Comece a encher a banheira, sim? — pediu. — E depois me traga sorvete — acrescentou.

O mago do fogo obedeceu, resmungando, deixando para trás uma loira ainda acalorada, que acariciava a barriga com carinho.

— É ótimo que você tenha herdado os poderes incríveis do seu pai, mas eu não sei quanto disso eu posso aguentar — conversou com o ventre estufado.

— Wow! Você está mesmo quente! — Happy observou, enquanto esfregava as patinhas contra a barriga de Lucy, em uma forma de conforto.

— Vai querer sorvete de que? — após sair do banheiro, Natsu gritou da cozinha, apenas o cabelo visível por cima da porta da geladeira, ainda mais espetado que o normal, como uma cerejeira selvagem.

O pensamento fez com que algo clicasse dentro de Lucy.

— Hmm — resmungou, desejosa.

— O quê? — indagou o mago do fogo, ciente que esses resmungos geralmente sinalizavam que em breve ele estaria no mercado ou na feira, em busca de ingredientes estranhos para realizar os desejos da loira.

— Sorvete de sakura seria bom — respondeu Lucy, praticamente salivando.

Natsu resistiu à vontade de bater na própria testa.

— Como diabos eu vou conseguir isso? — exasperou-se. — Eu nunca ouvi falar de um sorvete assim!

— Talvez tenhamos que conseguir os ingredientes e fazer — Lucy ponderou.

— Mas sakura? No verão? — Natsu tentou apelar para a racionalidade da parceira.

— Não seja bobo! As pessoas fazem chá com folhas de sakura. Só precisamos achar alguém que vende — alegou, como se fosse a coisa mais fácil do mundo, caminhando tranquilamente para o seu banho sem se preocupar em deixar para trás o companheiro que teria que encontrar um vendedor disposto a atendê-lo às duas da manhã. De novo.

Cerca de quarenta minutos mais tarde, Natsu e Happy voltaram de mãos abanando, após terem sobrevoado Magnólia em busca de um vendedor que tivesse as benditas folhas. 

— Nada? — Lucy, devidamente refrescada e descansando contra a cabeceira da cama, indagou, encarando-os com decepção.

— Os que estavam dispostos a nos atender tão tarde, não tinham as folhas — Happy informou, lembrando-se com um tremor dos comerciantes que foram corteses o suficiente para não atirar coisas contra eles.

— De manhã eu prometo que procuro melhor, sim? — o mago do fogo garantiu, ao ver a maneira que os olhos da maga estelar marejaram. 

— Mas eu preciso de sorvete de sakura agora! — pirraçou, para desespero dos outros.

— Lucy… — Natsu tentou acalmá-la, mas foi interrompido

— Oh, já sei! — exclamou a loira. — Acho que a Mira-san tem um pouco dessas folhas na guilda. Ela realmente gosta desse chá. 

Natsu encarou-a, estupefato.

— E você me fala que tem essas malditas folhas na guilda apenas agora? — irritou-se. — Depois de enfrentarmos uma série de vendedores sonolentos e furiosos.

— Não sei se acordar “Mirajane, o Demônio” vai ser mais fácil que lidar com os vendedores, Natsu — Happy lembrou.

O dragon slayer engoliu em seco. Aquela seria uma longa noite. 

 

 

A queimação familiar no braço direito, fez com que Gray acordasse, em estado de alerta. 

Estava acontecendo de novo.

Revoltado, o mago do gelo sentou-se, colocando as pernas para fora da cama, e passou as mãos pelos cabelos escuros. Era frustrante saber que, em algum lugar de Fiore, algum mago do fogo estava sendo atacado e ele não podia fazer nada para ajudar. Aquela maldita marca só servia para lhe alertar quando acontecia, não contribuindo com nada além disso. 

E cada vez que seu braço ardia em alarde, ele sofria com o pânico de saber que o alvo da vez podia ser um de seus colegas de guilda. Vez após vez, ele agonizou com a ansiedade da incerteza, respirando de alívio apenas quando Makarov lhe confirmava que todos os seus amigos estavam bem. E então, dentro de alguns dias, um mago desconhecido aparecia nos obituários como nova vítima e Gray pensava que, embora não fosse um companheiro seu, certamente era companheiro de alguém. Lyon mesmo havia lhe contatado, há algum tempo, lamentando a perda de um membro da Lamia Scale em um desses episódios.

Sem outro meio de contribuir, Gray apanhou na gaveta de cabeceira o Lacrima de Comunicação Portátil que o mestre havia lhe passado, com a determinação que ele o contatasse todas as vezes que a marca queimasse em seu braço. 

A conversa com Makarov foi breve. Concisa. Não havia nada mais a dizer além da nova reação da magia Devil Slayer.

Uma vez que a comunicação foi cortada, o mago do gelo encarou brevemente a marca em seu braço — agora quase tão negra e nítida quanto uma tatuagem —, antes de jogar-se novamente na cama. Ele duvidava que o sono viria, mas não é como se tivesse algo melhor a fazer.

Seu momento de autopiedade foi interrompido pelo ranger do assoalho de seu novo apartamento. 

Novamente alerta, o moreno levantou-se e caminhou com curiosidade até à sala, apenas para deparar-se com Juvia junto à porta da frente, tentando esgueirar-se para fora.

— Aonde você está indo a essa hora? — seu tom era mais de estranhamento.

Inevitavelmente, a jovem de cabelos azuis pulou ao ser surpreendida.

— Gray-sama! — exclamou, levando ambas as mãos ao peito. — Você assustou a Juvia — não era uma reclamação e, sim, uma constatação.

— Bom, você me assustou primeiro, vagando pelo apartamento a essa hora da noite. — Isso, por outro lado, era uma mentira, mas ele não pretendia se contradizer para a outra.

— Juvia sente muito — a maga desculpou-se.

Os dois se encararam silenciosamente por alguns segundos, o que fez com que o mago do gelo franzisse as sobrancelhas, ante a ausência de explicações.

— Você ainda não disse aonde ia — lembrou.

— Oh! — a maga da chuva exclamou, como se só então tivesse se lembrado do fato. — Juvia ia até o apartamento da Mel-chan — contou.

— De madrugada? Por quê? — O moreno começava a ficar exasperado. 

— Bem — Juvia começou, torcendo a base da camisola azul clara de babados que utilizava, fazendo com que Gray automaticamente desviasse o olhar da visão mais favorável que recebia das coxas da mulher. —, Mel-chan sempre faz panquecas quando a Juvia sente desejo — explicou, envergonhada.

O moreno piscou, surpreso.

— Você quer dizer, desejos de grávida? — indagou, lembrando-se dos estranhos ingredientes para sorvete que Natsu vinha comprando para Lucy nas últimas semanas. — Você já sente isso? — questionou, voltando os olhos para o ventre ainda liso da mulher.

— Juvia sente muita vontade de comer panquecas. — A maga da chuva se encolheu. — Panquecas com coberturas estranhas — acrescentou, ainda mais constrangida.

Gray suspirou, resignado.

— Não que eu cozinhe muita coisa, mas eu sei fazer panquecas — afirmou ele, enquanto caminhava em direção à pequena cozinha. 

O rosto de Juvia iluminou-se, para em seguida se contorcer em culpa.

— Gray-sama não precisa fazer isso! — garantiu ela. — Juvia sempre procura Mel-chan para não precisar incomodar o Gray-sama — acrescentou.

Inevitavelmente, uma pontada atingiu o peito de Gray. Então era assim que as coisas funcionavam agora. Juvia preferia recorrer a qualquer outra pessoa antes de incomodá-lo. Ele sabia que não tinha o direito de se sentir aborrecido, mas não conseguiu evitar.

— Você pode me chamar — alegou, encarando o fundo da frigideira que havia apanhado pouco antes. — Essa criança também é responsabilidade minha. Você deve me chamar primeiro em qualquer situação que precisar — acrescentou, encarando-a com firmeza.

Juvia desviou o olhar.

— Mas é um motivo bobo — lamentou.

— Se fosse bobo, Meldy não te ajudaria toda vez, não é mesmo? — argumentou o mago do gelo, com gentileza. — O mesmo vale para mim — concluiu, enquanto separava os ingredientes necessários.

Juvia bem tentou, mas não pôde evitar abrir um sorriso leve, enquanto seu coração disparava. Seria difícil proteger seus sentimentos e os do bebê, se Gray continuasse surpreendendo-a daquela maneira.

Suas divagações, porém, foram interrompidas pela campainha.

Assustados, os dois magos se encararam, antes de caminharem juntos até a porta da frente.

Gray ainda tinha a frigideira na mão quando abriu a porta e deparou-se com um Natsu muito sonolento e um Happy que parecia ter desmaiado sobre os cabelos rosas do dragon slayer.

— Natsu! O que aconteceu? — o mago do gelo perguntou, alarmado. — A Lucy está bem? — questionou, com preocupação.

— Não muito — Natsu engrolou, a voz arrastada pelo sono. — Ela está com desejo. Quer sorvete de Sakura dessa vez.

Gray piscou com incredulidade. 

Juvia piscou surpresa.

Natsu também piscou, mas provavelmente de sono.

— Ok, mas o que você está fazendo aqui? — o mago do gelo decidiu ser direto.

O dragon slayer suspirou.

— Mira diz que tem os ingredientes e pode preparar, mas o sorvete tem que gelar de um dia pro outro para ficar pronto. Só que a Lucy quer agora — Natsu explicou e apenas então Gray entendeu aonde ele queria chegar.

Inevitavelmente, o sangue subiu à cabeça do mago do gelo.

— Vocês estão achando que eu sou uma geladeira, por acaso? — esbravejou.

— Finalmente você entendeu. — Era para ser uma provocação, mas o timbre do jovem de cabelos rosas não era nada além de cansado.

— São três horas da manhã! — exasperou-se Gray. — E além disso, eu tenho os desejos da minha própria grávida para cuidar — acrescentou, apontando com o polegar para Juvia, que encarava tudo por cima do ombro dele.

A maga da chuva não pôde evitar corar ante as palavras do outro, mas estranhamente não foi o fato de Gray tê-la chamado de “minha grávida” ou afirmado que cuidaria dos desejos dela que permaneceu em sua mente. 

Em vez disso, ela expressou o que havia atinado desde Natsu explicara a razão de sua vinda:

— Na verdade, sorvete de Sakura parece uma boa cobertura para panquecas.

Gray encarou-a como se dissesse “você não pode estar falando sério” e, em seguida, voltou-se para Natsu, fulminando-o com o olhar, em um claro gesto de “olha só o que você fez!”.

Entretanto, ele não tinha como voltar atrás. Não depois de todo o discurso de “conte  comigo para qualquer coisa” que havia feito na cozinha, momentos antes. 

— Argh! — cedeu, finalmente. — Mas fique sabendo que você está me devendo um desejo de grávida! — afirmou, apontando para o peito de Natsu. — Qualquer desejo que a Juvia tiver que envolva assar ou torrar, ou mesmo ferver a droga de um chá, e eu estarei na sua porta! — prometeu.

 

 

— Ah! Estou satisfeita! — Lucy exclamou, após largar na mesa à sua frente o que poderia ser sua sétima taça de sorvete de sakura. Natsu não tinha certeza, ele havia parado de contar.

— Eu pensei que ela fosse comer o balde todo — Happy comentou, impressionado. — Só a Lucy estranha, para pedir um sorvete tão esquisito — acrescentou, incrédulo com a maneira que a maga estelar parecia contente após ingerir toda aquela gororoba gelada.

— Na verdade, não ficou ruim — Juvia defendeu para, em seguida, colocar a última garfada de sua porção de panquecas com calda de sorvete na boca.

— Você misturou essa coisa com panquecas. Não está exatamente em posição de defender — Gray apontou com mau humor e a maga da chuva abriu um sorriso amarelo.

— Não perturbem as garotas — Erza, que encontrava-se sentada à cabeceira da mesa que ocupavam, interpelou em favor das companheiras de guilda. — É uma opinião comum na guilda que não deve ser muito fácil carregar os filhos de vocês dois — contou, afagando os cabelos de ambos os magos, cujos considerava irmãos caçulas. 

— Eu posso confirmar isso — Lucy falou, a voz arrastada pelo sono que começava a acometê-lá.

— E você está fazendo o que aqui mesmo? — ignorando a fala da loira, o mago do gelo questionou a ruiva.

Uma veia pulsou perigosamente na testa da maga de armadura.

— Por que o Natsu, pra variar, acordou a Mira e o resto da Fairy Hills — esbravejou.

— Como eu ia saber que você também estava lá? Você nem mora mais no dormitório — o mago do fogo engrolou, atraindo o olhar irado da mulher de armadura.

— Não muda o fato que você não pode chegar na casa dos outros, no meio da noite, acordando quem precisa e quem não tem nada a ver com o assunto — argumentou a mulher, sem querer tocar no assunto de o mestre Makarov ter pedido que ela retornasse temporariamente ao dormitório como proteção adicional para as magas residentes usuárias de magia de fogo, possíveis alvos da Signum Sectionis.

— Não explica o fato de você ter vindo — o mago do gelo lembrou.

— Ninguém  pode me culpar por ter ficado curiosa em relação ao sorvete de sakura — pontuou a ruiva.

— No fim, você concluiu o que todos percebemos apenas de olhar. Que essa porcaria é horrível. — Gray continuou desfiando seu mau humor.

— Sofisticado demais para mim — Erza tentou sair pela tangente. 

— Não é mais estranho que as combinações de sorvete que a Lucy vem pedindo, no entanto — Happy lembrou. 

— É sempre sorvete? — Erza indagou, fitando a loira com curiosidade.

Lucy, que encontrava-se com a cabeça apoiada nos ombros do dragon slayer, que por sua vez parecia muito mais dormindo que acordado, murmurou em confirmação.

— Eu venho sentindo muito calor de uns tempos para cá, então qualquer coisa gelada é bem vinda, embora os desejos estranhos se limitem a sabores de sorvete — explicou.

— Se qualquer coisa gelada é bem vinda, você deveria abraçar o Gray — Happy sugeriu, mal contendo o timbre risonho que findou em uma gargalhada ao ver a maneira que Natsu, bem mais desperto, e Juvia, haviam se empertigado. 

— Você não cansa de ser inconveniente? — Lucy perguntou, antes que Juvia pudesse entrar no modo “combate à rival no amor”.

— Não muda o fato que vocês tiveram que chamar o Gray de qualquer maneira, no fim das contas — o gatinho deu de ombros.

— Se a Lucy sente calor porque o bebê herdou os poderes do Natsu, será que a  Juvia sentirá frio se o bebê dela herdar os poderes do Gray? — Mirajane, que havia se aproximado para recolher os pratos, indagou.

— Magia de criação não pode ser herdada. Ela deve ser ensinada — o mago do gelo lembrou.

— Oh, é verdade — Mirajane concordou, levemente envergonhada por seu lapso. — Mas a da Juvia pode ser herdada, certo? — questionou, voltando-se para a jovem de cabelos azuis, que se remexeu incomodada.

— Juvia acredita que sim, já que nasceu com os poderes dela — afirmou, um tanto sem graça, ao passo que Gray arregalava os olhos.

— Uau, isso é incrível! — alheia à reação do moreno, Titânia elogiou, impressionada.

— Incrível como? — exaltou-se o mago do gelo. — Isso quer dizer que um belo dia o bebê pode simplesmente escorrer pelas grades do berço? 

Os presentes voltaram-se para Juvia, que se mostrava nitidamente desconcertada.

— Gray! — Lucy exclamou, em tom repreensivo. 

— Não seja rude! — Erza acrescentou, com firmeza, fazendo com que o mago do gelo se encolhesse, ao perceber que havia machucado os sentimentos da mulher chuva.

— Está tudo bem — Juvia se manifestou em favor dele. — Juvia realmente prefere que a criança não herde a magia dela — revelou. 

— Mas a sua magia é maravilhosa, Juvia! — Lucy afirmou.

— Eu sei, mas ela é uma condição realmente difícil para uma criança — explicou a maga da chuva. — Juvia foi abandonada em seus primeiros dias de vida por causa da chuva ininterrupta que a acompanhava desde o nascimento, e transferida muitas vezes até encontrarem um orfanato que a aceitasse. Juvia também foi  rejeitada em muitos lares adotivos pelo mesmo motivo e não conseguia fazer amigos. Crianças não gostam muito de chuva — contou, tentando bloquear as imagens mentais de seu passado que vinham junto com a narrativa. — Além disso, a magia do Gray-sama é tão bonita! Eu realmente ficaria muito feliz se nosso filho crescesse aprendendo magia de criação, em vez de crescer aprendendo a controlar a magia da água — concluiu, com uma expressão serena, apesar das palavras tristes que havia proferido.

Dessa vez, todos os olhos se voltaram para Gray, que se sentiu incrivelmente idiota por ter feito pouco caso dos poderes de Juvia, sem avaliar as dificuldades que ela havia enfrentado. Apesar de ele ser o primeiro a saber que ela havia tido um passado sofrido, apenas agora percebia que não era preciso muito poder de dedução para descobrir que as coisas poderiam ter sido mais difíceis do que ela havia contado inicialmente. Pela primeira vez, o moreno sentiu pesar em suas costas o fato que Juvia se esforçara para aprender tudo sobre ele, enquanto ele não sabia nada sobre ela.

— Também me preocupa que a nossa filha vai crescer aprendendo a controlar a própria magia — Natsu, finalmente desperto, manifestou-se, na tentativa de se solidarizar com a maga da chuva.

— Especialmente porque você não é nenhum mestre na arte do controle — Lucy observou, fazendo com que o dragon slayer a encarasse exasperado. 

A cena arrancou uma risadinha da maga da chuva, fazendo com que Lucy e Natsu a encarassem ao mesmo tempo, com alívio.

— Você vai me deixar terminar? — em falso tom repreensivo, Natsu voltou-se novamente para Lucy, que lhe fez uma careta. — O que eu queria dizer é que, apesar das minhas inseguranças, eu confio que a nossa filha ficará bem, pois sempre terá o apoio da guilda. Da nossa família — explanou, contornando o corpo de Lucy com o braço direito, para que sua mão pudesse descansar na lateral da barriga estufada dela. — Então você pode ficar mais tranquila também, Juvia, pois o mesmo vale para o bebê de vocês — completou.

Juvia não pôde evitar abrir um largo sorriso.

— Eu sei. O sol brilha dentro da Fairy Tail — declarou, embora a frase fizesse muito mais sentido para ela própria..

Apesar do clima ter se tornado mais ameno para a maioria dos presentes, Gray não pôde evitar se sentir sobrecarregado ao testemunhar a interação harmônica do casal que seus parceiros de time haviam se tornado. Natsu havia amadurecido o suficiente para transmitir confiança à Lucy, à filha que teriam e até mesmo à Juvia. Enquanto isso, ele, o pai do filho que a maga da chuva carregava, falhava com ela dia após dia, fazendo com que ela se sentisse mais insegura e depressiva. Definitivamente, ele era um fracasso como pai e pessoa.

A espiral de autocomiseração só não o puxou completamente para o fundo do poço pois, naquele momento, suas divagações depreciativas foram interrompidas pelo irromper do Mestre Makarov guilda adentro. 

A tensão na postura do mestre, imediatamente foi captada pelos seus protegidos, que ae viram apreensivos, diante da expectativa de que algo errado ocorria.

— Crianças! Eu não esperava vê-los aqui tão cedo — cumprimentou, o timbre exibindo tanto seriedade quanto cansaço.

— Aconteceu algo, mestre? — Erza adiantou-se.

O pequeno homem suspirou.

— Vocês ficarão sabendo de qualquer maneira, então é melhor que eu conte logo — começou, deixando-os ainda mais apreensivos. — O empregador da Shadow Gear me contatou diretamente, reclamando que o time não apareceu para dar sequência à missão que começaram — narrou, fazendo uma breve pausa antes de especificar o que exatamente aquelas palavras implicavam: — Faz mais de vinte e quatro horas que Levy, Jet e Droy estão desaparecidos. 


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Notas finais do capítulo

Este capítulo é em sua maioria feito de trechos que pensei cortar na esperança de acelerar a fic. Originalmente, alguns acontecimentos, como a mudança do Gray e da Juvia, a conversa da Juvia com a Lucy e o desejo que elas tiveram, estariam separados, em capítulos diferentes, mas com o rumo que a história tomou, não consegui fazê-los se encaixar dessa maneira. No fim, fiquei com dó de cortar, pois algumas dessas cenas (especialmente, Natsu tendo que recorrer ao Gray para cumprir o desejo da Lucy, e a percepção de Gray de que Juvia recorria à Meldy para suprir os desejos dela, em vez de ir até ele) estavam planejadas desde o comecinho da fic. A ideia de colocá-las em um spin off ficou na minha mente por um tempo, mas por fim, pensei “Por que ao menos não tento escrevê-las todas juntas? Pode ficar bom.”. No fim, gostei do resultado e esses foram os momentos agridoces que serviram como a calma que vem antes da tempestade.
Sim, consegui meu gancho para o fim, embora não tenha uma ideia precisa do que exatamente vai sair.
Mudando de assunto, para se enquadrar com o cânon, embora a fic se desvie dele, eu fiz algumas mudanças no enredo. Ao final da fic eu vou compilar tudo que foi alterado das minhas ideias originais caso alguém se interesse, mas, por enquanto, vocês só precisam saber que o nome do filho do Elfman e da Evergreen foi MUDADO de “Egeo” para “Garret”, para que o apelido anterior “Ege” não se confunda foneticamente com o apelido de um personagem que será introduzido.
É isso. Espero que tenham gostado.



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