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Capítulo 12
Capítulo 11 — Ataque ao Mestre


Notas iniciais do capítulo

Olá sz



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Aquela manhã alternava entre frio e uma brisa morna, mas o céu estava fechado e escuro, como se estivesse preparando-se para uma tempestade. O despertador que tocava em batidas repetidas de uma música antiga já começava a irritar Soul que ainda de olhos fechados tateou seu criado mudo, pegando seu celular e desligando-o. Após um longo bocejo desajeitado, ele se levantou da cama e abriu as cortinas brancas, deixando o sol frio ultrapassar a janela de madeira e iluminar o quarto escuro. Indo em direção ao banheiro, o rapaz tropeçou em algo no chão, seu notebook. Ele pegou-o, o pôs sobre a escrivaninha e desligou-o rapidamente e logo retornando ao banheiro para escovar os dentes e tomar seu banho.

Era uma nova manhã de segunda feira, dia da semana preferido de Soul Ashter.

**

Alice acordou aparentemente mais calma. Lydia supunha que a prima choraria a noite inteira, mas não. Não houve choramingo durante a madrugada toda e pela manhã, o rosto de Alice já estava desinchado e transparecia amenidade. Lydia estava organizando sua mochila quando sua prima saiu do banheiro, já vestida e penteada.

— Alice...

Lydia se calou quando Alice a olhou, não por que sua prima estava com uma expressão furiosa ou chateada, mas sim por que ela estava calma demais. Lydia não sabia o que dizer ou como lidar com Alice depois do dia anterior e considerando que a menina não parecia abalada, então um abraço e um “vai ficar tudo bem” não pareciam adequados.

— Eu estou bem, Lydia. — Alice suspirou, indo até o espelho para trançar seu cabelo. — Mantenho minha certeza de reconhecer a letra do bilhete e mantenho minha determinação de saber o que está acontecendo. Por que definitivamente, há algo acontecendo.

Lydia balançou a cabeça negativamente.

— Não Alice, não depois de ontem. — ela se posicionou atrás de Alice, de modo que as duas estavam refletidas no espelho. — A polícia está investigando o caso, você viu, deu na televisão. Não é problema nosso. Nunca foi.

— A polícia não estava lendo Cemitério das Cinzas e a polícia não recebeu bilhetes. A polícia não esteve com o autor. Eles não vão entender. Há algo no meio dessa matança que chega até nós. Nós vimos o cara e você sabe. — o tom de voz de Alice era maduro, quase como se estivesse aconselhando Lydia.

— Eu entendo que várias coisas apontam pra nós, mas nós não somos as crianças que salvam o mundo, isso é vida real, Alice. — Lydia quase suplicava, trocando olhares com sua prima através do espelho. — Já que temos tantas pistas vamos entregá-las à polícia!

Alice terminou a trança e virou-se para Lydia, com os braços cruzados, estava abrindo a boca para falar quando a porta do quarto foi aberta.

— Não podemos entregar isso que sabemos para as autoridades. Eles não vão acreditar em bilhetes, histórias online, e caras fantasiados que aparecem em esquinas de escolas. — era Soul, parado a soleira da porta.

— Você estava ouvindo nossa conversa? — Lydia questionou.

— Sim, eu estava. — ele deu os ombros, fitando-as com seriedade. — Mas o ponto é: Não podemos contar à polícia. Eles não vão acreditar que vimos o vilão de nossa história favorita em frente à escola, ou que Alice recebeu um bilhete misterioso desse cara e já pensou o que pode acontecer se nossos pais descobrirem que estivemos em uma clínica psiquiátrica, no centro da cidade, sozinhos?! — Soul despejou, quase com raiva.

Lydia continuou negando, com a insatisfação estampada em seu rosto.

— É isso que eu estava tentando fazê-la entender. — Alice apontou para Lydia.

Lydia ficou fitando o chão por longos segundos. Ela odiava ver que os primos estavam certos. Mas ela não queria continuar dando uma de detetive, ela estava com medo por ela mesma, por Soul e principalmente por Alice. Ela percebeu que tinha um senso de proteção pela prima mais nova que nunca tinha se aflorado antes.

— Tudo bem, nós não vamos contar nada a ninguém. — a expressão de Soul tranqüilizou-se ao ouvir essas palavras de Lydia. — Mas nós vamos seguir com nossas vidas e não vamos procurar mais saber de nada sobre esta loucura. Deixem a polícia descobrir. Nós não fizemos nada, não é problema nosso.

Daí ela passou pelos primos, saindo do quarto.

— Não vamos nem falar sobre o que o Anonimato disse? Sobre eu ser... fantasma. — disse Alice, com um nó na garganta.

— Não. — Lydia foi sucinta. — Não vamos mais falar nada sobre ontem, sobre Anonimato, sobre os assassinatos ou sobre Cemitério das Cinzas.

**

As crianças chegaram à escola 20 minutos adiantadas. O pátio estava vazio naquele dia, havia alguns pássaros cantando nos arredores e as folhas estavam caindo das árvores, era oficialmente outono. A manhã que estava variando em temperatura tornou-se definitivamente gélida após eles saírem de casa. Os três seguiram decidiram entrar no prédio da escola antes mesmo do sinal tocar, eles seguiram juntos pelo corredor e notaram que o painel antes homenageando Manoela, estava agora preenchido com avisos, horários de aulas extras, futuros recessos escolares e afins.

— As pessoas com o tempo vão esquecer isso. — Alice sussurrou com rouquidão. — E eles não vão mais se importar com a pessoa que as matou, vai cair em esquecimento.

Ninguém disse nada, se entreolharam por alguns segundos e cada um seguiu para seu destino. Lydia para sua aula de inglês, Alice para sua aula de biologia e Soul seguiu sorrateiramente para fora da escola.

**

Frio. Gélido. Gelado. Essas três definições de clima se tornam ainda mais rigorosas quando se está sozinho, em um lugar fechado, sem nenhuma luz se quer para iluminar o ambiente.

Como um animal encarcerado.

Era assim que Enzo, o fabuloso Anonimato, se sentia diariamente. Mas hoje havia algo diferente, ele se lembrava detalhadamente do dia anterior no qual atacara uma garotinha loira e pálida. Alice. Ele sentia algo semelhante à um remorso. Anonimato tinha dias bons nos quais seus pensamentos se clareavam, e hoje era um deles. Ele se tocou que se não tivesse espantado tanto a pequena garota, ela poderia ser sua única companhia. Enzo já não agüentava mais aquela vida. Ele daria tudo para voltar a se jogar em seu sofá, tomar absurdas quantidades de café e escrever suas histórias. Mas era aí que ele se lembrava: fantasmas.

— Fantasmas. — disse o autor anônimo em um tom irritado, porém baixo. — Eu odeio fantasmas.

Mas a mente de Enzo estava conturbada. A garota. A garota não lhe queria mal. Cabelos dourados, pele branca, olhos castanhos. O garoto. Por um instante, a garota lembrou-o demais o menino. O remorso se tornou mais forte e logo em seguida foi tomado por ódio trago por lembranças. Ele quis parar, naquele instante, na linha tênue entre o desgaste emocional de estar preso, sozinho e deprimido e odiar seus fantasmas, Enzo Monroe quis parar.

Mas novamente lhe veio a onda de rancor. Mais lembranças, más lembranças. Ele começou a se debater na cama. Ele não sabia a que desejo profundo atender e sentia-se incapacitado de fazer qualquer coisa por estar preso. Ele gritava. Ora de ódio, ora de pavor. A porta foi aberta, mas não por um enfermeiro, mas por um homem vestido de preto. Galeno.

— Não podemos continuar... não, não, precisamos parar! A menina, ela não era má, a menina ela... ela... fantasma! Fantasma! Mate-a! — Anonimato começou a berrar olhando Galeno. — Parar... devemos parar! A menina... ela... ela... parar, nós devemos parar. Vamos... vamos... matar! Matar, não parar!

Galeno permaneceu em sua postura, apenas observando e negando devagar.

— Não pode desistir agora, meu mestre. Nosso objetivo inicial será completo. Não se esqueça do que fizeram a você. O que ele fez a você. — Galeno usava de seu tom suave e aterrorizante como o de costume. — As coisas que tiraram de você.

Anonimato continuava a berrar, e muitas vezes coisas sem sentido e ideias contraditórias. A vontade de parar existia, por culpa da garota. Alice. A lembrança que ela trouxe, era um misto de sentimentos. Galeno apenas observava Anonimato surtar, agora falando bem baixo, apenas consigo mesmo. O assassino sabia que não poderia continuar tudo com a dúvida de seu mestre e ele precisava encerrar o plano, e isso jamais aconteceria sem o consentimento do autor. Então, Anonimato precisava esquecer que um dia duvidou de seus objetivos, esquecer da menina que tinha lhe visitado.

Em um micro segundo Galeno olhou para a bandeja de alumínio na mesa, e depois para a janela alta que ali havia e lembrou-se de duas coisas: uma casa isolada e o imenso quintal do Instituto Westin Hills. Então não pensou duas vezes, deslizando sua mão até a bandeja de alumínio.

— Meu mestre, o que precisa ser feito, será feito. Irá me agradecer, é para o nosso bem.

Esse “nosso” foi carregado de acidez, Anonimato soltou um “o que?” e então, seu mundo foi escuridão. Galeno acertou-o na cabeça com três golpes da bandeja de alumínio e pulou a janela com ela, deixando o autor desacordado e sangrando.

**

A primeira aula de Lydia tinha acabado. E a segunda também. E ela já estava no final da terceira. E ela não havia cochilado em nenhuma daquelas aulas como sempre fazia. Seus pensamentos que não paravam de borbulhar, não a deixando pregar o olho durante toda aquela manhã.

O sinal tocou e todos organizaram seus materiais dentro de suas mochilas e saíram da sala. Lydia era a última a cruzar a porta e prendeu sua atenção quando viu Soul adentrando na escola, ele estava com os cabelos úmidos e o casaco molhado, e estava chovendo, então ele tinha andado muito lá fora, e algo dizia a Lydia que ele não tinha dado um passeiozinho pelo pátio. Soul parecia nervoso, andava pelo corredor em passos largos e precisos. Lydia ficou perguntando-se o que o garoto fazia fora da escola naquele horário no qual tinha aula.

Então Lydia seguiu pelo corredor, indo ao encontro de seu primo, que tinha parado perto do bebedouro e estava enchendo um copo d’água.

— Onde você estava? — Lydia foi direta, aproximando-se de Soul. — Está todo molhado. Por que não estava em aula?

Soul revirou os olhos e bebeu toda a água do copo, jogando-o vazio dentro da lixeira de metal.

— Não faça comigo o mesmo que você está fazendo com Alice. — Soul disse com aspereza.

Inicialmente, Lydia encarou-o confusa.

— E o que eu estou fazendo com ela? — ela perguntou de forma monótona, cruzando os braços.

— Tentando controlá-la. Protegê-la. — ele esclareceu, com impaciência. — Você faz isso só por que sente remorso, garota. Não finja que a protege por que a ama.

Lydia se sentiu pessoalmente ofendida e foi cerrando os punhos devagar, tentando se lembrar que não podia socar ninguém dentro da escola. Dentro da escola.

— É claro que eu me importo com ela! E obviamente eu a amo. — Lydia esbravejou, sem se importar que algumas pessoas estivessem a olhando. — Eu vivi com vocês a maior parte da minha vida! Acha mesmo que eu não desenvolvi amor por vocês? Você é um estúpido insensível e acha que todos são como você!

Soul soltou uma risada fraca, carregada de deboche e em seguida deu às costas para a prima e saiu caminhando pelo corredor.

Indignada, Lydia deu um chute na lixeira cinza, fazendo-a derramar todos os copos plásticos e papéis que guardava. Bufando, ela andou em passos precisos e estressados até a saída do colégio, e quando passou por Soul, esbarrou nele de propósito e então, atravessou os grandes portões de ferro da escola, indo embora.

 


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Notas finais do capítulo

Muito obrigada por ter vindo até aqui ♥