Corações Perdidos escrita por Syrah


Capítulo 32
32. De volta às origens com uma nova visitante




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BALZAC'S CAFÉ se encontrava particularmente vazio naquela tarde.

Após quase uma semana de almoços e encontros regulares ali, Sam já era capaz de admitir que se sentia bem familiarizado com a rotina do lugar. Contudo, o café, que geralmente era bastante frequentado, não tinha mais que alguns poucos clientes naquele dia.

Não que o Winchester não apreciasse aquele fato, na verdade até tinha certa preferência por locais mais vazios — a calmaria facilitava seu raciocínio e reflexão. Ainda assim, não podia evitar reparar no quão estranho era ver o estabelecimento quase deserto.

Perdido em devaneios, Sam se surpreendeu ao ver Jonas surgir ao seu lado, o rosto iluminado pelo sorriso calmo de sempre e envolto em uma aura naturalmente enérgica. Ele e os irmãos haviam marcado outro encontro ali, como de costume, mas aquele cara possuía o dom de aparecer de repente até quando já era esperado.

— E aí, Sams? — o moreno cumprimentou enquanto pedia um espresso duplo. De todas as características que Jonas possuía, pensou Sam, o vício por cafeína era definitivamente uma das mais assustadoras.

— Ei, Jonas — o Winchester o cumprimentou de volta e se virou para voltar à sua mesa após ter feito seu pedido. O outro o seguiu, assobiando baixinho uma melodia familiar. Beatles, talvez? Não saberia especificar, mas era algo que já ouvira antes.

Jonas vestia o mesmo de sempre; uma camiseta lisa e preta por baixo de um moletom azul escuro — ainda que o tempo estivesse relativamente seco nos últimos dias — e jeans escuros acompanhados de tênis brancos. Ele se parecia bastante com a imagem típica de um cidadão americano, mesmo que sua personalidade passasse bem longe disso.

Ao notar o olhar de Sam sobre si, o moreno sorriu, dando um gole em sua bebida antes de falar:

— Aproveitando os últimos momentos em West River antes de zarpar mundo afora? — perguntou com um ar divertido. — Espero que a cidade não tenha decepcionado os padrões Winchester.

Sam sorriu de volta, dando de ombros.

— É, quase isso. — Jonas revirou os olhos, ainda sorrindo. — Mas eu bem que me diverti bastante aqui — acrescentou categoricamente. — Nada como salvar o mundo do Apocalipse ou lutar contra anjos, mas deu pro gasto — ambos riram.

Jonas era um caçador experiente que auxiliara Sam e Dean no último caso em que haviam trabalhado. Ele tinha sido indicado por uma amiga e desde então não tivera problemas com os irmãos. Tinha um temperamento calmo na maior parte do tempo, embora pudesse se irritar facilmente quando alguns assuntos eram mencionados. Era difícil acreditar, mas o trio havia se tornado bastante unido durante a última semana — Sam até arriscava dizer que formavam uma ótima equipe, apesar de saber que Emma o esfolaria vivo se ouvisse uma coisa dessas.

Emma. Os pensamentos do moreno mais uma vez viajaram para a garota, lembrando-se de sua expressão apreensiva ao se despedir deles naquela manhã de terça-feira seis dias antes, quando ela precisara partir de volta para Sioux Falls em busca do pai desaparecido. O peito de Sam ainda apertava toda vez que a memória dos olhos verdes da garota lhe vinha à mente. Será que ela havia tido êxito em sua busca pelo tal Alvo?

Na última semana, Emma havia mantido contato com os irmãos, mas suas mensagens eram sempre compostas de textos curtos e diretos, informando apenas que ela continuava trabalhando arduamente na busca por pistas. Sam por vezes se sentia tentado a questioná-la sobre o que realmente estava acontecendo, visto que Emma claramente estava omitindo alguns dos detalhes, mas seria um esforço inútil. Se a garota realmente quisesse informá-los de algo mais, já o teria feito.

— Dean, meu ilustre camarada! — Jonas se sentou ao lado de Sam na mesa do café, ficando de frente para Dean, que se ocupava com algum jogo de caça-palavras em seu celular. O loiro ergueu a cabeça diante da chegada do irmão e do outro homem, acenando em cumprimento e voltando sua atenção para o aparelho.

— E aí, cara.

Era engraçado, mas Sam desconfiava que Dean também sentia a falta de Emma nos últimos dias, talvez até mais que ele, embora evitasse falar dela na maior parte do tempo. Aquela era uma característica que aprendera a reparar no irmão com o passar dos anos; sempre que algo atormentava demais seus pensamentos, ele isolava o assunto e agia como se nada estivesse acontecendo. Talvez não fosse a mais saudável das alternativas, mas era parte de quem ele era e Sam fazia o possível para lidar com isso da melhor forma todos os dias.

Outra vez disperso em pensamentos, o Winchester sentiu que Jonas o cutucava de leve para chamar sua atenção.

— Seu irmão é praticamente um viciado — comentou com um ar divertido, apontando para Dean, ainda focado em seu celular.

— É, eu sei.

Ambos riram quando Dean bufou irritado com algo, colocando o celular sobre a mesa e lançando aos dois homens um olhar acusatório.

— Vocês só estão com inveja — disparou, presunçoso — porque, é claro, eu sou o rei desse jogo.

Jonas de repente ergueu os braços, arregalando os olhos e fazendo uma expressão de quem acaba de ser descoberto.

— Você me pegou, cara, é exatamente isso! — exclamou, claramente ironizando. — E eu que pensei que Sam fosse o estranho quando se tratasse de eletrônicos — acrescentou enquanto balançava a cabeça, franzindo o rosto. — Pelo amor de Deus, você quase supera...

— Ei! — Sam o interrompeu com um protesto indignado.

Dean revirou os olhos, apenas ignorando os comentários idiotas de Jonas como sempre fazia. Sua carranca foi rapidamente substituída por um sorriso angelical assim que uma bela garçonete surgiu na mesa dos três, servindo a cada um seu respectivo pedido. Ela deu a eles um sorriso gentil antes de se afastar para servir outra mesa, atraindo alguns olhares enquanto o fazia, inclusive o de Dean, que só faltava sair flutuando atrás da garota.

— Qual é o seu lance com loiras, cara? — Sam perguntou rindo. — Fala sério...

Dean fez uma expressão confusa, como se aquela fosse uma pergunta um tanto idiota.

— Para a sua informação, eu prefiro morenas — respondeu com um sorriso lateral.

— Você prefere qualquer coisa que tenha peitos, cara — ouviram Jonas comentar, fazendo ambos rirem.

Eles voltaram a atenção para seus lanches. Sam pedira por um sanduíche, como de costume, enquanto Dean ficara com a boa e velha torta e Jonas optou por um simples espresso. Os dois últimos de repente se encararam por um momento precioso, que durou vários segundos, caindo na gargalhada logo depois. Foi a vez de Sam revirar os olhos. Será que estou mesmo sentado em uma mesa com dois homens adultos e perfeitamente maduros?, pensou. Era difícil acreditar.

Ele ainda se lembrava nitidamente da vez em que Dean e Jonas tiveram uma discussão calorosa — e totalmente estúpida, qual é — sobre qual seria melhor; torta ou café. Obviamente, a teimosia de ambos impossibilitou que chegassem a uma conclusão para o conflito em questão, fazendo com que declarassem uma espécie de "empate" entre si. Aquela era uma memória engraçada — e ao mesmo tempo assustadora, Sam achava — que desde então havia se tornado uma piada interna entre os dois caçadores.

É claro que o caçula Winchester continuava achando toda a situação de dias antes algo completamente imbecil da parte de Dean e Jonas. Infelizmente para ele, tal fato servia apenas de incentivo para que os dois o provocassem com isso sempre que podiam.

Eles então iniciaram uma discussão animada acerca dos últimos acontecimentos; sobre como haviam descoberto coisas surpreendentes a respeito dos Axefire e seus segredos, além da posterior aparição de uma testemunha que até então havia sido dada como inexistente. Para Dean, todo o caso não passara de apenas mais uma caçada como qualquer outra, mas Sam enchergava a coisa toda de maneira mais complexa. Para ele, era extasiante que houvessem descoberto detalhes que fossem contra a própria história daquele lugar; o moreno sentia como se houvesse acabado de sair de uma exploração insana e descoberto alguns diamantes fresquinhos — era quase isso, na verdade, exceto que o trio infelizmente não fora capaz de encontrar o tesouro em questão. Ponto para os fantasmas naquele caso.

— Eu realmente não consigo acreditar nisso — Sam resmungou em certo momento, após Jonas fazer um comentário sobre o tal tesouro que haviam descoberto. — É coisa de filme. E olha que eu já passei por muita loucura nesses anos todos, então entendo bastante do assunto.

Jonas sorriu para ele. Em sua expressão estava escrito: "Sim, eu sei bem do que você está falando."

— É sempre uma surpresa quando nossos casos contradizem os livros de história, né? — o homem deu um gole em seu espresso e balançou a cabeça, em seguida fez um gesto amplo com o copo, como se estivesse prestes a fazer a declaração do século. — Quem diria que o responsável por toda aquela matança não era realmente o sr. Axefire?

Sam assentiu.

— É. Aquele diário e todas as cartas da esposa, as sessões de exploração... Tipo, existia mesmo um... tesouro?

Jonas deu de ombros.

— Quem sabe? É tudo muito impreciso — Seu olhar passou por Dean, que continuava ocupado em devorar sua torta em velocidade sobrehumana, fazendo uma careta, então voltando para Sam e abrindo um sorriso tranquilo. — Nem mesmo Eleanor foi capaz de descobrir o paradeiro da fortuna escondida, e ela teve anos pra isso. É melhor que a gente simplesmente ignore essa parte dos registros, Sams.

Sam assentiu.

— O importante é que resolvemos tudo, agora não temos mais que nos preocupar com corpos mutilados ou incinerados aparecendo nos arredores da mansão — ele sussurrou para que os clientes próximos não o ouvissem. Então sua expressão de repente entristeceu um pouco. — Gostaria que Emma estivesse aqui. Conhecendo ela, tenho certeza de que acharia toda essa história bem divertida.

Jonas o observou atentamente, como sempre fazia todas as vezes em que os irmãos mencionavam Emma — ou melhor, quando Sam a mencionava, já que Dean parecia preferir impor um limite quanto a esse assunto em particular.

— Aposto que sim. — Ele hesitou por um momento, incerto se deveria acrescentar algo mais. Por fim, resolveu perguntar: — Por que ela teve de sair da cidade mesmo? — perguntou, os olhos verdes brilhando de interesse. Emma definitivamente cativara aquele ali, pensou Sam.

Eles ouviram Dean pigarrear impacientemente. Sam se virou para o irmão, que estava encarando os dois caçadores à sua frente com uma carranca evidente.

— Problemas urgentes, cara. — A voz de Dean foi direta e ligeiramente seca ao responder, mais rápido do que Sam para sanar a dúvida de Jonas. — A gente já não te explicou isso, tipo, umas vinte vezes?

Fora Emma quem indicara Jonas aos Winchester, aliás. Um dia antes de partir, ela havia dado a Dean o contato do caçador, e desde então ele se mostrara extremamente útil no caso; descobrindo o paradeiro de Eleanor Woods — que até então era uma testemunha falsa e inexistente —, encontrando o diário dos Axefire, dentre outras descobertas. Os irmãos precisavam admitir, jamais teriam solucionado aquela caçada tão rápido sem a ajuda de Jonas.

Entretanto, quanto mais Dean pensava naquilo, mais irritado ficava. Admitia que o homem havia sido de enorme utilidade e honestamente até arriscaria dizer que o considerava um bom parceiro, mas não conseguia evitar o pensamento de que com Emma as coisas talvez fossem ainda mais rápidas. Afinal, era do feitio dela reparar demais nos mínimos detalhes, coisa que ele sempre achara impressionante, apesar de normalmente ser algo irritante da sua parte. Dean ainda não entendia o porquê de sentir tanto a falta da caçadora. Era provável que os meses que passaram juntos houvessem feito com que ele criasse por ela a mesma afeição que por Sam — talvez isso explicasse a necessidade que tinha em ajudá-la, o sentimento de proteção em relação a garota e, principalmente, a raiva que sentia toda vez que Jonas mencionava seu nome. 

— É claro, eu me lembro. É só que é muito estranho, Emma parecia realmente interessada no caso — a voz do caçador preencheu os ouvidos de Dean, que deu de ombros.

— Ela se interessa por muitas coisas em muito pouco tempo, eu acho — disse com indiferença. — E desapega delas com a mesma facilidade também.

Jonas ergueu uma sobrancelha, captando a indireta. Sam parecia surpreso com a reação do irmão, mas não disse nada. Dean suspirou, talvez houvesse ido longe demais com as palavras.

Sam pigarreou em uma tentativa óbvia para chamar a atenção dos outros dois.

— Hum... ok. Mesmo assim, obrigado pela ajuda, Jonas — ele sorriu enquanto agradecia. — Nunca teríamos terminado esse caso rápido assim sem você.

Jonas deu de ombros, mas tinha um sorriso sincero no canto do rosto.

— Eu que agradeço, vocês sabem muito sobre essas coisas. Diria que foi um belo de um trabalho em equipe — ele sorriu.

Sam concordou com um aceno.

— De qualquer forma, estamos contentes em ter tido você no clube por uns dias, mesmo que agora tenhamos que ir.

— Tudo bem, quem sabe não nos encontramos novamente? — Jonas riu ao observar o olhar de Dean. Era claro para ele que o caçador estava irritado com algo. Estranhamente, ele sentia que aquilo tinha alguma ligação com sua menção à Emma.

Emma... Ele sentia a falta dela. Foram apenas algumas horas de diálogo, mas ela parecera suficientemente esperta e experiente para que Jonas quisesse trabalhar ao seu lado. Era uma pena que precisasse ter ido embora tão cedo, ele gostaria de ter visto suas habilidades de caçadora em prática.

Dean lembrava muito ela, talvez por isso Jonas gostasse tanto da sua companhia. Infelizmente, o loiro não parecia partilhar do mesmo sentimento — pelo menos não nos momentos em que a garota era citada — e ele desconfiava que sabia o motivo. Será que Emma era ciente do quanto Dean gostava dela?

Pensando bem, nem o Winchester mesmo parecia saber muito do efeito que a garota exercia sobre ele. Jonas sorriu.

— É, quem sabe — Sam deu de ombros. — Se algum dia toparmos em outro caso de assassinato sobrenatural em massa, já sabemos pra quem ligar.

— É isso aí — Jonas piscou para ele. — Vocês são demais, não me incomodaria se caçássemos juntos de novo.

Dean fez uma mini reverência teatral para ele. Aquele gesto soou estranhamente familiar.

— Idem, caro amigo Jonas Decker.

Jonas riu enquanto se levantava. Uma vez que a discussão havia acabado, era hora de voltar ao sanatório e acertar os últimos detalhes com Miranda antes de partir. Quem sabe onde o destino o levaria dessa vez? Torcia para que os novos encontros fossem tão interessantes quanto o último.

— Até qualquer dia, Winchesters — Jonas sorriu, deixando algumas notas de dólares sobre a mesa e saindo dali rapidamente.

Os irmãos observaram enquanto o caçador deixava o café, levando alguns olhares nada discretos consigo. Jonas era o tipo de cara que conseguia um número de telefone só de estalar os dedos — o título de caçador não combinava em nada com ele, mas isso não tirava sua habilidade no assunto.

Após algum tempo, os dois Winchesters também decidiram sair dali e voltar para a pousada. Era hora de arrumar a bagagem e voltar para Sioux Falls. A viagem foi tranquila, ambos aproveitaram o trajeto em silêncio; enquanto Sam se ocupava com leituras em seu tablet, Dean cantarolava uma melodia dos The Clash animadamente.

Ao chegarem lá, Dean notou logo de cara que o lugar estava extremamente cheio, visto a dificuldade em encontrar uma vaga para estacionar o impala. Ele fazia uma manobra particularmente complicada para acessar um pequeno espaço no estacionamento, resmungando, quando notou o olhar de Sam sobre si.

— Tem algo na minha cara por acaso? — perguntou desconfiado.

O Winchester balançou a cabeça, negando. Ele tinha um sorriso presunçoso no rosto e uma expressão engraçada. Dean revirou os olhos. Lá vem, pensou.

— O que foi, Sam?

Sam sorriu. Ele encarou o horizonte por alguns instantes antes de responder.

— Nada. Eu só estava me perguntando... — seu olhar se perdeu em algo e o moreno deu de ombros. — Você parecia bem menos receptivo com o Jonas hoje.

Dean franziu o rosto.

— O quê? — perguntou confuso. Aquela afirmação não fazia muito sentido em sua cabeça. Havia sido ele mesmo com o caçador, como no restante dos dias em que tinham trabalhado juntos. — O que isso quer dizer?

Sam deu uma risadinha. Mas que diabos? Dean suspirou, impaciente, ao passo que seu irmão resolveu acrescentar:

— É melhor começar a tratar melhor as pessoas quando o assunto é a Emma, ou vão perceber rápido o quão apaixonado por ela você está.

Dean fez uma carranca tão grande que formou uma espécie de V na própria testa. A reação causou um ataque de risos em Sam, que precisou se curvar no banco em certo momento a fim de recuperar o próprio fôlego.

— Isso valeu só pela cara que você fez — comentou, ainda rindo.

— O sanduíche que te serviram naquele lugar estava estragado ou o quê? — Dean resmungou, claramente irritado.

Sam riu outra vez, ainda mais alto.

— Sabe, não vai te matar admitir que sente a falta dela — ele sugeriu observando o irmão. Dean abanou a mão em sua direção, como se espantasse uma mosca. — Eu também sinto. É como ter uma irmã mais nova, meio que me preocupo com ela.

Dean revirou os olhos.

— Você tem a opção de adotá-la se quiser — comentou com sarcasmo. — Só não garanto que vai ser a filha dos seus sonhos.

Sam deu um sorriso de canto, o mesmo que costumava exibir sempre que sabia o quão certo estava sobre alguma coisa. Dean precisou se segurar para não revirar os olhos uma segunda vez. Odiava aquela expressão no irmão, normalmente porque sabia que ela sempre vinha acompanhada de alguma declaração estúpida.

— Você gosta dela, né? — Viu? Declaração estúpida.

Dean balançou a cabeça, bufando alto para que Sam notasse sua irritação.

— Eu aturo ela, Sammy. É diferente — retrucou. — Mas se está incomodado que eu possa arruinar suas chances, pode ir na paz, não tenho segundas intenções com a sua garota. — Esta última declaração talvez não fosse totalmente sincera. Emma podia ser extremamente irritante, mas era de fato bonita. Não é como se Dean nunca tivesse pensado no assunto.

Sam riu, nem um pouco convencido, fazendo uma careta após a última frase do irmão.

— Cara, você ouviu a parte em que eu disse que ela é como uma irmã pra mim? Por favor, não — Dean lhe devolveu um sorriso quase inocente enquanto dava de ombros. — Sinceramente, você não vai morrer se admitir que Emma é legal — ele saiu do carro tranquilamente, sem se incomodar com o fato de seu irmão estar prestes a cuspir chamas em suas costas. — Vocês dois estavam se dando muito bem nas últimas semanas, pelo que me lembro.

Dean suspirou.

— Não faz muito sentido continuar implicando com ela, não temos mais 16 anos de idade, somos adultos e responsáveis — Sam ergueu uma sobrancelha desacreditada para aquela declaração. — Bom, eu sou pelo menos. — Agora o caçula estava rindo, obviamente sem acreditar em uma palavra do que seu irmão dizia. — Ah, vá se danar, Sam!

Sam sorriu enquanto balançava a cabeça, ainda incrédulo.

— Você, hein... — ele limpou uma lágrima do olho antes de continuar a falar. — Tudo bem, ela provavelmente nunca vai admitir, mas também gosta de você pra caramba. — Ele fez uma pausa, hesitando antes de acrescentar: — Bom, pelo menos é o que eu acho. E o que Bobby acha. E Moira, também.

Dean franziu o rosto.

— Quem é Moira? — ele pensou um pouco, então respondendo à própria pergunta: — Ah, a amiga gata dela. Como sabe que ela acha isso?

Sam fez um som estranho, algo semelhante a um pato tentando falar. Dean ergueu uma sobrancelha em sua direção.

— Ela... me disse antes de sairmos de Los Angeles. — Sam notou o olhar do irmão outra vez queimando suas costas. — O quê? Ela passou pra dar um oi antes da Emma ir embora.

Dean riu.

— Sim, é claro.

Sam revirou os olhos, não gostando nem um pouco da insinuação.

— Vamos entrar logo e cuidar das malas, ok? Prometi ao Bobby que voltaríamos hoje.

— Você é quem manda, Capitão.

Dean caiu no riso enquanto Sam seguia carrancudo para dentro da pousada. Quem ri por último, ri melhor, pensou alegremente.

***

A viagem de volta a Sioux Falls foi tranquila e quieta, nenhum dos irmãos conversou muito no caminho. Ao chegarem no ferro-velho Singer, os irmãos logo notaram que não havia sinal algum de Bobby ou Emma.

— Bobby? — Dean entrou na casa sem se incomodar em antes bater na porta e foi direto até a sala, onde esperava encontrar o velho fazendo o de sempre: sentado em sua poltrona predileta assistindo a algum jogo ou afundado em livros antigos de história. Contudo, o cômodo estava silencioso e solitário, sem qualquer resquício da presença de Bobby, assim como o restante do primeiro andar. — Onde ele se meteu? — resmungou o Winchester, confuso. O velho singer raramente saía de seu covil, então onde diabos ele estava?

Sam finalmente chegou na sala, carregando sua mala e parou ao lado de Dean, fazendo a mesma observação que o irmão e franzindo o rosto.

— Cadê o Bobby?

— No meu bolso não está — Dean respondeu com sarcasmo, fazendo Sam revirar os olhos. — Também não sei. Quem diria que ele tinha uma vida fora daqui — acrescentou, dando risada.

Foi então que ambos ouviram o som de passos atrás de si e se viraram ao mesmo tempo, mecanicamente. Naturalmente, eles esperavam ver Bobby, mas não era o velho Singer que se encontrava descendo as escadas.

— Ah, olha só quem voltou! — Emma se aproximou dos dois com um sorriso no rosto. Ela estava descalça e vestia um short jeans preto, acompanhado de uma camiseta azul sem estampa que certamente era de um tamanho maior que o seu. — Estava no banho e não ouvi vocês chegarem. Foi mal.

Suas mãos se encontravam brevemente ocupadas enquanto prendia os cabelos em um rabo firme no topo da cabeça. Ela deu um último puxão em seus fios castanhos para ter certeza de que estavam devidamente presos, então deu mais alguns passos, parando na frente de Sam e envolvendo o moreno em um abraço breve.

— Ei, grandão.

— Como foi passar a semana sem a gente? — ele sorriu para ela com afeto e retribuiu seu abraço.

Emma deu um sorriso reluzente.

— Um paraíso. — A garota piscou para Sam, que revirou os olhos.

Emma então se virou para Dean. O sorriso que havia em seu rosto pareceu vacilar por um momento, ele percebeu, mas logo sua expressão era a mais tranquila possível outra vez. A caçadora o observou por longos segundos, parecendo analisá-lo por um momento.

— O quê? Eu não ganho um abraço também? — ele quebrou o silêncio lançando uma provocação, o que imediatamente fez com que Emma risse.

Seus olhos pararam no corte que Dean tinha na bochecha, resultado da caçada anterior, onde ele quase havia virado peça de museu nas mãos de um poltergeist — não passava de uma cicatriz temporária agora, mas havia sangrando bastante na hora. Emma levou as mãos ao rosto de Dean para analisar melhor o machucado, mas o loiro se esquivou de seu toque em um gesto de puro reflexo.

— Hum, o que foi? — ele resmungou, retirando a mão dela. A garota revirou os olhos diante de sua reação, levando novamente as mãos ao machucado. Dean não recuou dessa vez.

— Não posso deixar as crianças sozinhas nem por alguns dias... — ela fez uma careta ao tocar a cicatriz, provocando um sorriso no loiro. Emma notou isso e piscou para ele, como se compartilhasse uma piada interna entre si. — "Dois dias", ele disse. E eu ainda me dei ao trabalho de esperar! — seus lábios se uniram em um sorrisinho debochado.

Dean deu de ombros.

— É verdade que resolvemos o caso em apenas uma tarde, o resto da semana passamos evitando você e aproveitando os momentos de paz — foi a vez do loiro sorrir.

Emma fez uma carranca, zangada, logo em seguida a substituindo por uma carinha de cachorrinho abandonado. A expressão ficava estranhamente adorável nela, pensou Dean, embora nunca fosse dizer isso em voz alta. Emma tinha um ego um pouco grande demais às vezes — e com às vezes, ele queria dizer "sempre que recebia um elogio".

— Isso sim é maldade — ela deu um soco nos ombros dos irmãos, que riram. — Então deu tudo certo lá?

Sam assentiu.

— Sim, General — Emma sorriu.

— Que bom, então. — respondeu, dando alguns passos para trás para que pudesse encarar ambos os homens à sua frente. Ela pareceu lembrar de algo, o que fez seu rosto se iluminar por um segundo. — A propósito, já cumprimentaram o Bobby? Ele só falta arrancar os cabelos da cabeça de preocupação por vocês dois. E olha que já não tem tantos assim pra isso.

Dean sorriu para o comentário, achando impossível imaginar o velho Singer se comportando de outra maneira com o caso dos dois, ainda que dificilmente fosse admitir isso.

— Nós acabamos de chegar, mas ele não está em lugar nenhum — o loiro respondeu.

Emma franziu o rosto.

— Que estranho, eu conversei com ele há poucos minutos... — ela balançou a cabeça, por fim decidindo que aquele não era um assunto com o qual deviam se preocupar. — Provavelmente foi comprar algo, ou visitar a Jody. Ele tem feito muito isso ultimamente — a caçadora sorriu sugestivamente.

Dean e Sam se entreolharam com cumplicidade, sorrindo também. Era inevitável não ver Jody e Bobby como um bom casal depois de todos aqueles anos trabalhando com ambos.

— Bom, eu vou deixar as malas lá em cima e tomar um banho — anunciou Sam, já com a bagagem nas costas e indo em direção às escadas. — Caso Bobby apareça, digam a ele que eu dei um oi.

Emma assentiu, ao passo que Dean se jogou na poltrona da sala e suspirou, jogando a cabeça para trás e encarando o teto.

— O velho vai matar você se te ver sentado aí — ele ouviu Emma resmungar e revirou os olhos.

— Faz menos de cinco minutos desde que eu cheguei e você já tá enchendo o meu saco?

Ela riu alto.

— Claro, senti falta disso. É uma das desvantagens de ficar longe de vocês.

Dean sorriu.

— Desvantagens — repetiu convencidamente. — No plural. Olha como ela já está, louca de saudades.

Ele não precisou olhar para saber que Emma revirava os olhos.

— Vá se danar, Winchester.

Dean fez um aceno de mãos, como se entendesse, porém descartasse o fato. Ele ouviu o som de espuma afundando quando Emma se sentou no sofá de couro ao seu lado. A garota ficou em silêncio por alguns momentos; ele sentiu que ela o observava, mas também não disse nada.

— E aí, vai me contar como resolveram o caso? — perguntou por fim, curiosa.

Dean sorriu.

— É claro. Depois que eu me trocar e voltar a cheirar como gente — respondeu, ouvindo a risada da garota em resposta. — Quer ir tomar alguma coisa mais tarde? Te dou todos os spoilers.

Através das pálpebras fechadas, ele sentiu que Emma lhe dava um olhar desconfiado.

— Por que não? — disse finalmente.

Dean assentiu.

— Acho que Sam vai querer ir também.

— Sem problemas — ele ouviu a garota se inclinar em sua direção, ficou se perguntando o que ela estava fazendo. — Mas... me conta, vai: como foi caçar ao lado de um completo estranho? — o loiro deu um sobressalto ao notar que a voz dela estava próxima demais, recompondo-se em seguida.

Ele abriu os olhos, notando que Emma havia se inclinado sobre o braço da poltrona em que estava sentado. Seus fios escorriam pelo ombro e roçavam levemente no braço de Dean. Ele deu de ombros diante da pergunta dela.

— A mesma coisa de dois meses antes, quando precisei socorrer uma certa moradora de Los Angeles em apuros na mansão assombrada de... — ele franziu o rosto por um momento, sem conseguir se lembrar. — Qual era mesmo o nome dele?

Emma riu, socando seu ombro. Ele sorriu para ela.

— Edward-alguma-coisa.

Dean assentiu.

— É, esse mesmo. Bons tempos — ele sorriu para ela com cumplicidade. Ficaram os dois em silêncio por alguns segundos, até que Dean decidiu acrescentar: — Não foi a mesma coisa sem você lá.

Emma sorriu, devolvendo o olhar dele com um ar convencido.

— Ah, sem drama. Aposto que Jonas foi um ótimo parceiro — disse.

— E foi, mas infelizmente ele não era tão bom em ser pego por armadilhas como você. Ficamos sem alguém para usar de isca e isso dificultou consideravelmente as coisas.

Emma revirou os olhos, prestes a retrucar. Mas o som da campainha os interrompeu.

— Eu atendo — anunciou Dean, já se levantando. — Aquele velho deve ter esquecido as chaves de novo, pra variar.

Ele saiu da sala acompanhado pelo riso de Emma, indo em direção a porta de entrada da casa. Dean se surpreendeu ao se deparar com uma adolescente ali, que ao vê-lo franziu o rosto, parecendo confusa.

Ela era baixa e magra, não aparentando ter mais que dezesseis ou dezessete anos, e vestia uma calça jeans cinza meio surrada, tênis all-star azuis e uma camiseta branca onde se lia WELCOME TO THE END OF THE FUCKING WORLD. Seus cabelos, do mesmo tom que os de Dean, eram curtos na altura dos ombros e ondulados. O Winchester imaginou o que uma garota como aquela fazia ali. Estaria ela perdida?

Dean coçou a nuca, confuso e um tanto contrariado. A garota não disse nada, apenas ficou ali parada, encarando o loiro de modo determinado. Algo dizia a Dean que sua postura tinha o objetivo de intimidá-lo ou, no mínimo, impressionar o rapaz.

— Hum... oi? Quem é você? — Ele resolveu ir pelo caminho da dúvida e perguntar seu nome. Talvez ela houvesse errado de casa?

Não era o que parecia, mas não deixava de ser uma possibilidade.

— Você é... um dos Winchester? — ela perguntou de volta, sem se preocupar em responder.

Dean não gostou da atitude da garota e menos ainda do fato de ela parecer saber quem ele era. O loiro cruzou os braços, se apoiando no batente da porta e retribuindo o olhar dela de maneira dura e séria.

— Talvez. — Ela também não pareceu gostar da esquiva dele. — Quem pergunta?

A garota ajeitou os óculos e respirou fundo. Ela tomou fôlego, parecendo reunir coragem para alguma coisa. Para Dean, aquela situação toda era muito estranha. Ele pensou que não era todo dia que adolescentes de perfil nerd apareciam na casa de Bobby se recusando a iniciar contato, mas claramente à procura de algo.

Por fim, a garota pareceu se encorajar o suficiente para dizer algo:

— Desculpe, meu nome é Sara. Eu preciso falar com...

— Quem está aí?

Dean se virou surpreso ao mesmo tempo em que a garota, Sara, espiava por trás de seu corpo imenso que cobria quase todo o vão da porta. Eles avistaram Emma se aproximando com uma expressão curiosa. A caçadora caminhou até a porta, empurrando Dean para o lado para que pudesse ver a convidada ali. Ela tinha soltado os cabelos novamente e parecia confusa com a situação.

— Hum, olá? — ela se dirigiu a garota na porta com um sorriso amigável. — Podemos ajudar?

A menina, por outro lado, arregalou os olhos instantaneamente ao ver Emma, parecendo completamente chocada.

— V-você é Emma Grace? — perguntou, estática.

Dean sentiu Emma ficar tensa ao seu lado. Ele não a questionava, aquela situação toda era muito estranha.

— Sim. Quem é você? — o tom da caçadora havia se tornado ligeiramente frio.

A garota ajeitou seus óculos outra vez — aquele devia ser um gesto involuntário — e respirou fundo, parecendo tomar coragem antes de dizer qualquer coisa. Por fim, ela ergueu o rosto, Dean achou que seus olhos brilharam em um tom estranho de branco por um momento, mas talvez fosse apenas reflexo das lentes da armação.

— Meu nome é Sara Ross, e preciso falar com você.

Emma parecia totalmente perplexa.

— Falar comigo? — perguntou. — A respeito do quê?

Sara assentiu, respirando fundo antes de falar:

— A respeito de Adam Grace. — Disse a garota, e Dean sentiu que a temperatura ao redor deles de repente abaixara 10 graus. — É o seu pai, não é?

Ao lado de Dean, Emma tremia ligeiramente. Ele se sentiu tentado a segurar sua mão, seus ombros ou até mesmo seu braço; queria de alguma forma tranquilizá-la, mas sabia que não adiantaria nada naquele momento.

— Ele... é, sim. Por quê?

Sara tinha uma expressão impassível no rosto ao responder.

— Porque ele está atrás de mim nesse exato momento — disse. — E porque acho que você vai querer ouvir o que tenho a dizer sobre seu paradeiro.


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Notas finais do capítulo

No próximo capítulo: De volta aos olhos de Emma Grace, temos uma visita inesperada: Sara Ross, o Alvo. A garota vai ter uma conversa calorosa com nossa caçadora e os irmãos a respeito de Adam e... os Remanescentes? Preparem-se para descobrir um pouco mais sobre o clã!



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