All Out War escrita por Filho de Kivi


Capítulo 53
All Out War – Part Seven: Every Man for Himself


Notas iniciais do capítulo

E depois de uma centena de anos... Aqui estou eu outra vez!

Hei!

Só para lembrar a vocês que jamais desistiria dessa fic que tanto me trouxe alegrias, principalmente agora que ela está na reta final! Entendam... Eu nunca fui muito bom em organizar os meus horários, e agora que estou com a semana cheia por conta da faculdade (além de otras cositas mas), me encontro mais bagunçado do que nunca! Mas uma hora eu crio vergonha na cara e consigo me organizar de verdade hehehe...

Quero agradecer aos leitores sobreviventes! Sim, pois precisa ser sobrevivente para seguir acompanhando essa história apesar dos pesares! Portanto, para aqueles que ainda se dispõem a ler All Out War, fica aqui minha eterna gratidão! Kiitos! Sami e Menta, amo vocês meninas! Obrigado mesmo! Vocês duas sintetizam bastante o que acabei de dizer...

Esse é possivelmente o antepenúltimo capítulo de AOW (ainda preciso realmente decidir se colocarei um capítulo a mais, ou não)... Bom, teremos vários POVs para compensar toda a demora. Ação, suspense, drama, tudo o que vocês gostam e muito mais! Além de algumas surpresas também, é claro hehe... Teremos Olga, Rick, Lizzy, Leah, Julia, Kal, Eduardo, Dwight... Enfim, capítulo cheio e com um final... Estou realmente curioso para saber o que vocês irão achar...

Então é melhor ler agora, não é mesmo? Vamos lá...

Boa leitura!



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— Amber! Não... Amor, fica comigo! Amber...

O homem com o rosto queimado chorava sobre o corpo da mulher que Olga abatera. Desesperado, ele tocava em seu rosto, como se ainda pudesse existir um filete de esperança para ela. Mas a ucraniana não costumava errar seus disparos, fazia isso desde muito nova e sua perícia, em outros tempos, já fora bastante invejada.

Uma das balas atravessara o osso esterno, bem no meio do peito. A segunda fora no pescoço, também em um ponto central. Era possível traçar uma linha reta entre os dois buracos de entrada, mais uma prova do quanto a combatente era boa com uma arma na mão.

Mas ali, com tantos olhares lhe fuzilando, já não sabia mais ao certo quem era amigo ou inimigo. Na verdade, mal sabia quem era ela própria. A adrenalina fora diminuindo e então a ucraniana começara a perceber detalhes que haviam lhe passado despercebido.

Os homens que executara na entrada estavam com suas armas guardadas, armas de baixo calibre, muito diferente das que vira nas mãos dos milicianos Salvadores. Por mais que tenha sido rápida, a reação dos dois, estabanada e assustada, demonstrara que ambos não possuíam experiência nesse tipo de situação, e que provavelmente jamais haviam sequer saído para uma missão externa.

Eugene e os demais reféns não estavam presos, amarrados ou trancafiados em alguma sala escondida. Pelo contrário, pareciam estar sendo escoltados, e pela escada que desciam, provavelmente estavam se encaminhado para a saída, para fora do covil dos Salvadores. Junto deles encontravam-se mulheres, crianças e idosos, simples moradores do lugar, forçados ao trabalho e prostituição para que pudessem ter um teto e um prato de comida.

Não eram inimigos, eram dissidentes. Desertores. Assim como Olga fora um dia.

Acabara percebendo isso tarde demais.

— Você a matou! Desgraçada! Desgraçada! Você matou a Amber!

Ensandecido, o sujeito de rosto queimado ergueu-se, correndo em direção a combatente. Desnorteada, a cabeça rodando após a percepção de tudo o que havia acabado de ocorrer, Olga não raciocinara. Ao ver o perigo se aproximando, simplesmente reagira.

Dera apenas um tiro, o suficiente para finalizar com o sofrimento do homem que acabara de perder a namorada. O disparo atingira a testa do sujeito, que tombara de lado, já sem vida.

— Mark! Não! – Vociferara um sujeito de corpo esguio, cabelos negros e óculos. Ele levara as duas mãos a cabeça, horrorizado, não conseguindo acreditar no que estava ocorrendo.

Eugene, igualmente atônito, aproximara-se lentamente da ucraniana, ainda com a pistola em punho, os olhos arregalados, sem piscar nenhuma vez. Erguera os braços com as mãos espalmadas, o clássico sinal de rendição. Cuidadosamente dera dois, três, quatro passos, até estacionar menos de dois metros a frente dela.

— Você faz parte do Garden, não é? Eu me lembro de você... Sei que faz parte da Aliança. – Sua fala era pausada e mansa – Você veio me resgatar? Foi enviada para nos tirar daqui? – Olga respondera com um aceno de cabeça – Então você precisa abaixar sua arma... Eles são amigos, estavam justamente nos ajudando a deixar esse lugar. – Ele apontara para trás, para todas as pessoas que permaneciam em silêncio, totalmente catatônicas após as quatro execuções – Eles não querem mais viver sob o jugo de Negan, querem ser livres...

— Então baixe a sua arma e todos nós sairemos daqui. O que aconteceu foi... – O professor fechara os olhos, respirando profundamente – Foi apenas um acidente. Precisamos ir embora. Negan já está marchando rumo ao Hill Top, não temos muito tempo.

Lentamente Olga fora recolhendo sua arma, ainda olhando para os lados, desconfiada, não conseguindo acreditar totalmente nas palavras que lhes fora dita.

Sua cabeça latejava. Lembrava-se da brutal morte de Mikey, e dos dois homens que assassinara com o seu facão. Assim como o casal que também exterminara, todos ali queriam apenas a liberdade, um bem que ela sabia ser por demais precioso. Um bem que lhe fora tirado há muitos anos.

Saíra então na frente, sem nada dizer, caminhando a passos pesados em direção à porta de saída. Seu coração ribombava potentemente em seu peito, enquanto sua respiração seguia descompassada, desajustada.

Era uma mulher fria, já havia passado por muitas situações limites, grande parte delas antes mesmo do mundo virar do avesso. Mas porque então estava tão desnorteada, tão sem direção após o ataque ao Santuário? Talvez ainda fosse a presença viva de Mikey em seus pensamentos, afinal de contas, o garoto havia morrido há pouquíssimo tempo, justamente após a ucraniana ter acreditado que poderia levá-lo em segurança, que poderia fazê-lo forte.

Talvez já estivesse cansada, totalmente saturada da vida que lhe fora posta a disposição. Do passado e presente que jamais questionara, mas que possivelmente, se tivesse tido escolha, não teria optado.

Fumara um maço inteiro enquanto aguardava os preparativos do grupo que partiria consigo rumo ao Hill Top. Sempre em silêncio, os demais passaram a seu lado, enquanto levavam roupas e suprimentos para os dois furgões que os aguardavam. Sequer a olhavam. Uma mistura de estarrecimento e revolta, claramente presente em todos os olhares daqueles que agora encontrariam a liberdade, mas que para isso haviam pagado um alto preço.

Apenas Carson, o homem esguio de óculos, que detinha do mesmo nome do médico do Alto o Morro, parara ao lado de Olga. Segurando uma caixa de papelão repleta de medicamentos, estacionara ao seu lado, e por cerca de vinte e três segundos permaneceu totalmente em silêncio. Só se manifestara quando os olhos da ucraniana se encontraram com os dele, quase que de forma involuntária.

Parecia estar esperando pelo ensejo.

— Ted e Joe. – Dissera, a voz fraca, mas ainda assim tentando manter-se firme. Olhara para Olga fixamente, decididamente – Ted era texano, filho de fazendeiros... Lutou a vida inteira para sobreviver, e quando o mundo mudou acabou parando aqui, junto com os porcos dos Salvadores. Negan disse que ele era gordo e inútil demais para lhe servir como soldado, então o obrigava a limpar as latrinas deles todos os dias. Esse era o trabalho dele, literalmente limpar a merda que aqueles desgraçados faziam... Quando eu contei a ele que finalmente sairíamos daqui, o cara sorriu de orelha a orelha, e se propôs a vigiar a porta caso algum dos homens de Negan retornasse...

— Joe também não pode servir aos Salvadores, suas mãos tremiam muito, reflexo de um acidente de moto quanto ainda vivia no Kentucky. Ele chegou aqui junto com a mãe doente, e como não era um dos protegidos de Negan, precisou ralar bastante para conseguir os medicamentos para o tratamento dela. Remédios contra pressão alta, totalmente trivial para o Negan, mas ainda assim... – Carson exprimia toda a sua revolta nas palavras proferidas, enquanto Olga apenas tentava assimilar tudo aquilo – Ele o forçava a trabalhar pesado, a exaurir os músculos para no final do dia lhe jogar um comprimido... O tratava como se fosse um animal, ou pior... Não hesitou em vigiar a porta junto com o Joe quando soube que daríamos no pé.

— Amber e Mark. – Prosseguira – Os dois eram casados, na verdade, recém-casados, pelo que soube. Faziam parte de um comboio ou de alguma comunidade pequena devastada pelos Salvadores, não sei ao certo dizer... Só sei que a beleza dela instigou o desgraçado. – Dera de ombros – É claro, ele sempre fez isso, sempre se achou a porra do rei do mundo! Transformou a vida dos dois num inferno até que ela se rendesse e se tornasse uma de suas esposas. Ela tentava fazer as pessoas acharem que elas estavam se voluntariando, quando na verdade tudo não passava de estupro! Uma regra básica criada por ele próprio, mas que nunca foi seguida...

— Ela e Mark se amavam e é claro que não conseguiriam se afastar um do outro, principalmente por conta situação de escravidão que Negan impôs a todos aquelas meninas. Os dois foram pegos juntos, e como aqui vale a regra do mais forte, alguém que queria tirar algum benefício em cima dessa informação os entregou a Negan, e de resto... O maldito marcou o rosto do pobre coitado com um ferro de passar em brasa, assim como também o fez com Dwight há tempos...

Olga piscara algumas vezes, tentava fugir dos olhares de Carson, mas o homem estava tomado por uma forte decisão. Incomodada, confusa e ainda tentando digerir todas as histórias funestas lançadas sobre si, a ucraniana resolvera interpor-se.

— Por que está me contando tudo isso?

O homem arrumara os óculos.

— Porque você matou quatro pessoas inocentes. No meio de toda essa guerra e de tanta gente que merece morrer, você retirou a vida de quatro pessoas que não mereciam esse destino... Depois de muito tempo eles haviam se enchido de esperança, acreditando que poderiam levar uma vida em paz outra vez e aí você surgiu e retirou isso deles... – A mulher tentara se pronunciar, mas Carson não permitira – Estou falando isso para que você não se esqueça do que fez, para que carregue isso com você para sempre... Isso precisa pesar dentro de você, precisa doer tanto quanto está doendo em nós agora...

— Pois talvez assim, enquanto o remorso ainda viver dentro do seu peito, algo desse tipo nunca mais voltará a ocorrer!

Recolocara a caixa de papelão nos braços, e sem mais nada a dizer, seguira rumo aos carros que já os aguardavam.

A Olga restava apenas refletir. Uma longa, silenciosa e solitária reflexão.

 

*****

 

O sol já havia alcançado o topo do céu quando, reunidos na área central do Alto do Morro, as comunidades irmãs, agora totalmente agrupadas, aproveitavam o pouco dos mantimentos que haviam conseguido juntar para produzir um almoço coletivo.

Sentados em algumas mesas de madeiras, nos capôs dos carros e até mesmo no gramado do Hill Top, as centenas de pessoas que ali constava, aproveitavam o alimento fornecido, deleitando-se com a comida e bebida. Saboreando aquele pequeno prazer como se não houvesse amanhã.

Como se aquela fosse a última ceia.

— Eles têm mesmo toda essa comida? – Indagara Rick a Andrea, enquanto levava um belo pedaço de porco assado à boca – Não esperava ter um prato tão cheio assim.

A sardenta sorrira levemente, manifestando-se apenas após deglutir o purê que saboreava.

— Eu acho que eles capricharam na sua porção. – Troçara – Eles estavam racionavam mantimentos antes de todo mundo chegar do Reino e do Garden... E felizmente eles também trouxeram suprimentos de lá, em pouca quantidade, claro, mas acho que conseguiremos levar por um tempo... Bom, pelo menos por enquanto.

Rick mantinha um brilho enigmático no olhar. Diferentemente de outras épocas, em que estaria tenso, ou tomado por culpa e fúria após ver mais uma sequência cruel de mortes inocentes, o xerife agora parecia resignado, estranhamente sereno e esperançoso. Esperançoso como nunca antes havia se mostrado. Não naquelas proporções. Não com uma guerra em curso.

— Isso é bom... – Ele meneara a cabeça positivamente – Pois ficaremos aqui por um bom tempo.

A loira erguera os olhos.

— Em definitivo, não é?

Grimes sorrira outra vez.

— Acredito que não. Assim que acabarmos com Negan, vamos reconstruir nossa comunidade como era antes... Vamos voltar para casa. É sempre melhor termos o nosso próprio lar.

O rosto da loira ficara ruborizado. Ela olhara para Grimes por alguns segundos, fitando sua face enquanto segurava o seu coto. Parecia extremamente contente, talvez contagiada pela energia boa que emanava do companheiro.

— Eu nunca havia te visto tão otimista assim. – Confessara – É bom ver a sua confiança a todo o vapor. Isso me tranquiliza bastante.

Rick respondera ao afago, segurando a mão direita de sua mulher.

— Sei lá, Andrea... Eu posso até estar maluco, mas é que eu olho para todo esse mundo ao nosso redor e não consigo imaginar como Negan poderia acabar com tudo isso!

Os dois fitaram o horizonte. Crianças brincavam inocentemente, correndo de um lado a outro. Porcos eram assados em churrasqueiras. Novas porções de salada e purês, provenientes das batatas e cenouras ali produzidas, eram trazidas a todo o momento, servidas às mesas. Não havia nenhuma nesga aparente de preocupação.

O casal sabia que juntos eram mais fortes. E a regra criada entre os dois e estendida aos demais, parecia fazer cada vez mais sentido.

 

***

 

Alguns metros mais a frente, sentada no gramado verdejante da comunidade de altos muros erguidos em madeira, Lizzy Penn afinava o seu violão, que fora buscado cuidadosamente após o seu breve retorno ao Garden, em missão de resgate juntamente a Hanso. Agora que todos estavam aparentemente seguros, resguardados no mesmo lugar, chegara a hora de começar a cuidar um pouco mais dela própria.

A jovem moça sentia-se esgotada, exaurida de dentro para fora. Tantas coisas haviam ocorrido naquele pequeno espaço de tempo que ficava difícil até mesmo relembrar-se de todos os fatos. A dor acabava se misturando em um único corpo, formando uma bola de neve de angústia e solidão. Um vazio faminto que a consumia pouco a pouco.

Limpara então cuidadosamente as cordas de aço de seu Kansas, tentando mantê-lo a todo o vapor, apesar do tempo de desuso. A última vez que o tocara fora na famigerada noite em que vira dois grandes amigos serem mortos. E obviamente, estar diante dele fazia sua mente retornar a imagem do médico galês do qual tanto sentia falta.

Um filete de recordação, mas ainda assim uma grande pontada em seu peito. Era o tipo de dor que jamais se apagaria, assim como muitas outras resguardadas.

Retirara do bolso da calça jeans um pequeno pedaço de papel amassado e uma caneta. Alguns rabiscos podiam ser lidos ali, escritos às pressas com sua letra, que nunca fora nenhum primor de estética. Tentando esquecer, ou melhor, tentando encontrar uma folga em meio ao mar revolto de desolação que a invadia, Penn tentara voltar a compor, nem que fosse uma canção tomada de tristeza. O importante no momento era desviar um pouco o foco.

Qualquer distração ali seria bem-vinda.

Am I brave enough?

Am I strong enough?

To follow the desire

That burns from within

To push away my fear...

Ainda buscava as palavras que melhor se encaixariam. Estranhamente a canção que pouco a pouco começava a se formar não estava carregava de dor, mas sim de uma fúria que rugia nos confins de seu subconsciente. Uma Lizzy feroz que parecia pronta para saltar para fora.

Tocara algumas notas no violão e cantarolara mentalmente. Depois, voltara a anotar no velho bloquinho.

To stand where I'm afraid

I am through with this

Cuz I am more than this

I promise to myself

Alone and no one else

My flame is rising higher...

Olhara para os lados, observando toda a movimentação daquelas pessoas. Conseguia enxergá-las como alvos, como marionetes prontas para serem abatidas. Era triste demais passar a ver as coisas dessa forma, mas ao mesmo tempo exigia uma força tão grande que Lizzy sentia-se como se tivesse subido de nível em um jogo difícil. Deixara o comum, o trivial. Sentia até mesmo que o seu medo havia diminuído.

Olhara para o céu espesso, denso, as nuvens cinzentas retornando outra vez. Definitivamente não era um bom sinal. Aquelas malditas nuvens cinzentas nunca eram um bom sinal.

Voltara-se então outra vez para sua música. Estava mais forte, mais encorpada. E em um súbito de inspiração, conseguira criar o refrão, o ápice, o nirvana de sua arte em pouquíssimos segundos.

I am the fire

I am burning brighter

Roaring like a storm

And I am the one... I've been waiting for

Screaming like a siren

Alive and burning brighter

I am the fire...

Sorrira de canto de boca. Sentira vontade de gritar outra vez, de saltar de um palco sobre uma plateia alucinada. Sentira vontade até mesmo de beber até cair, sem pensar no amanhã. Afinal de contas ela era forte, sabia disso. Sabia que poderia suportar qualquer coisa. Por mais que tudo doesse e doesse bastante. A dor cicatrizaria.

Uma hora tudo cicatrizaria.

 

***

 

Ao mesmo tempo em que voltara a tocar o violão, fazendo soar os acordes mais potentes do refrão que se repetia ininterruptamente em sua cabeça, Elizabeth sentira uma aproximação familiar. A jovem Leah Fisher, com um prato contendo uma quantidade irrisória de comida, sentara ao seu lado.

Cumprimentando-a com um breve aceno, a adolescente simpática fizera um comentário tão logo Lizzy cessara sua canção.

— Eu ouvi os acordes do violão e resolvi vim ver quem estava tocando. – Os cabelos da menina estavam molhados e presos, seus olhos ainda inchados, tomados por olheiras muito bem delineadas. Ela parecia estar tentando reagir, mas visualmente o abalo que as recentes perdas lhe causaram estava mais do que evidentes – Nem me lembro qual foi a última vez que ouvi alguém tocar violão... Sei lá, talvez tenha sido na escola.

Fisher tentara esboçar um sorriso, mas a face marcada e cansada não lhe permitira ampliar sua simpatia para com Lizzy. Ela que pensara em se afastar de todos após a morte de Tom, começava a notar o quanto a vida em grupo a fazia sentir-se um pouco melhor. E era justamente em momentos triviais como aquele que Leah percebia que nem tudo estava acabado.

Por mais que todas as evidências jogassem contra.

— Na verdade – Voltara a falar Fisher – eu sempre quis aprender a tocar violão, mas nunca tive muita aptidão para a coisa. Acho que meus dedos são muito pequenos. – As duas sorriram – Agora eu mal consigo me concentrar nesse pedaço de porco que está bem na minha frente... E para falar a verdade, toda essa carne já está me enjoando para cacete!

Elizabeth olhara para o ventre de Fisher, cada vez crescendo mais ao ritmo em que a gravidez se encaminhava para o seu período mais crítico. Já Leah apenas suspirara, notando a fitada que recebera, percebendo a preocupação que aparentemente se mostrava presente em todos quando a olhavam. Logo alcançaria os últimos três meses de gestação. Logo seria mãe. Isso é claro, ainda dependia de qual lado sairia vencedor dessa guerra.

Os seus poucos pelos corporais se eriçaram apenas com a ideia que surgira em sua mente. Pensar em todas as consequências sempre lhe trazia sensações nada agradáveis.

— Você ainda pode aprender, oras! – Exclamara Lizzy – Eu posso muito bem ensinar a você, tenho certeza que pegará bem rápido. E não pense que eu sei apenas três acordes por ser uma vocalista de punk, viu? – Troçara – Acho que a única coisa ao que eu me dediquei com real afinco nessa vida foi a minha guitarra... – Fizera uma brevíssima pausa – E é justamente agora, diante de tudo isso, que eu posso dizer com certeza que não me arrependo de nenhum segundo sequer vivido.

Leah olhara em seus olhos, procurando a certeza que Penn tanto exaltava. Não conseguia, obviamente, seguir a mesma linha de raciocínio traçada por ela. Fisher sentia-se muito mais enegrecida, arrependida, presa as lembrança e memórias, e principalmente ao sentimento oriundo de todas elas. Não conseguia não se lembrar, não sentir e não sofrer. E não se sentia pior por isso.

Fora apenas a forma que encontrara para conseguir seguir em frente. Encontrar sempre um novo caminho, uma nova etapa a ser seguida. O seu eterno retorno. Mas isso não implicava necessariamente em fugir do que um dia ocorrera. O que ocorreu de fato ocorreu, mas as cicatrizes das pancadas da vida sempre podem ser aproveitadas de alguma forma, nem que para isso seja preciso olhar para elas todos os dias.

— Por que você diz isso de forma tão enfática? – Indagara Fisher.

Elizabeth voltara a fitar os céus, ainda parecia incomodada com as malditas nuvens.

— Porque se eu morrer hoje... Acabou. E se tudo acabar, Leah, nada disso terá importado. Só o que fomos e o que sentimos. E tudo o que foi feito, foi feito. – Soltara um pequeno muxoxo – Só acaba uma vez, querida.

 

***

 

Perto dali, mas sem a decisão de pensamento das duas jovens que conversavam sentadas no gramado, a recém-chegada Julia Alves ainda tentava se encontrar. Se encontrar nos mais diversos sentidos.

Não que estivesse estranhando o novo lar para o qual fora obrigada a se mudar, pois além de ser um reduto realmente impressionante, com todos os trailers a Barrington House a disposição, a vida nômade em meio à destruição do mundo não era algo novo para ela. Desde que saíra de Atlanta, nunca permanecera muito tempo no mesmo lugar. Com exceção do Reinado, é claro.

Confiava em Ezekiel, o sábio homem que conseguira manter a escola-comunidade de pé, apesar de todas as dificuldades. Confiava também na Aliança, acreditava na causa pelo qual estavam lutando e mais ainda, tinha certeza que aquela era a única saída para um futuro melhor. Ou, utilizando palavras mais adequadas, um futuro não tão ruim quanto o presente.

Mas por que diabos então ela ainda se sentia daquela forma? Uma estranha em uma terra estranha, essa era a melhor das definições. Tivera um breve relacionamento com James Goodwin, tentara de alguma maneira caminhar para frente, mas ainda assim... Nada. Nada parecia funcionar, nada parecia fazê-la sentir-se melhor. Nada parecia amaciar o turbilhão que lhe tomava conta, que lhe fazia implodir de dentro para fora.

Que porra era aquilo?

A médica tinha medo da morte, obviamente. Tinha medo de um destino inexorável do qual não teria controle algum. Tinha medo de se transformar em uma das criaturas que aprendeu a odiar e exterminar sem culpa. Mas também tinha medo de viver mergulhada em um limbo de solidão, sem encontrar nada que pudesse amenizá-la, retardá-la ou diminuí-la. E isso nem mesmo uma vitória acachapante diante de Negan iria modificar.

Parecia um luto eterno. Os cinco níveis se repetindo constantemente. Algo que a puxava para baixo com força o bastante para lhe arrastar. Algo que Alves sequer compreendia.

Olhara para o seu prato, entregue por um homem barbudo que estava ao mesmo tempo cuidando de três churrasqueiras com porcos sendo assados. Não sentia fome e nem sede. Nem mesmo agradecera aquele que lhe servira. Não estava suportando o falatório alto, a correria, as brincadeiras desmedidas, os sorrisos, as piadas e histórias sendo contadas... A alegria totalmente fora de propósito e lugar.

O que eles estão pensando? Tem uma guerra lá fora! Tem uma guerra dentro de todos nós!

Um toque em seu ombro lhe quebrara tudo o que arquitetara como sendo a sua verdade.

— Você é a médica do Reino, não é? Desculpe, mas eu realmente esqueci o seu nome...

A obstetra se virara, confrontando aquela que se achegara. Deparara-se então com uma jovem garota de cabelos loiros presos em um coque. A pele alva destacava bastante os seus olhos, sua beleza juvenil. No ventre carregava uma visível gravidez, provavelmente com mais de vinte semanas.

— Julia. – Repondera sem esboçar nenhuma emoção.

A menina estendera a mão, obrigando-a por tabela a lhe cumprimentar formalmente. Sentira uma estranha sensação ao tocá-la, um calafrio incomum, esquisito. Olhara para aquele rosto e notara uma semelhança, uma ligação entre as duas. Sentira como se já tivesse se deparado com aquela garota anteriormente.

— Desculpe incomodá-la doutora, mas é que uma pessoa me falou de você e eu meio que prometi a ela que viria a sua procura. – Ela abaixara brevemente o olhar – Você deve tê-lo conhecido, chamava-se Tom, e fora levado por Rick Grimes até a sua comunidade, para treinar com os seus atiradores... Quando ele descobriu que você era obstetra, me fez prometer que... – Ela apontara para a barriga protuberante – Acho que já entendeu.

A sensação estranha prosseguia.

— Acho que eu me lembro dele. – Falara evasivamente – Homem negro, um dos braços amputado, e não parava de falar um só minuto. É... Acho que ele deve ter mencionado o seu nome enquanto fazia alguns curativos. Mas me desculpe, eu não vou conseguir me lembrar...

— Leah Fisher. Muito prazer. – Apresentara-se – Eu gostaria muito que você pudesse acompanhar minha gravidez... Eu não tenho ninguém mais a quem recorrer, não sei o que fazer e nem mesmo sei se está tudo bem com o meu filho. Você poderia me ajudar?

Ajudar. Fazer-se útil outra vez. Voltar a acompanhar uma paciente, uma gravidez. Há quanto tempo não sabia o que era isso. Há quanto tempo não sentia a adrenalina de um parto, de utilizar suas habilidades para fazer com que uma nova vida viesse ao mundo. Uma nova vida em um mundo morto. Quanta ironia.

Por mais que ainda pensasse que nada mais valia a pena, e por mais que nem sequer conseguisse entender os próprios sentimentos, o destino lhe confrontara outra vez, lhe obrigando a ficar ao invés de fugir. Sua força seria testada novamente, e as fraquezas que trouxera após tantos segredos enterrados poderia finalmente ser extinta.

Havia duas vielas a frente de Julia Alves, cada uma a levando para um caminho diferente. Restava a ela apenas saber escolher.

— É claro que sim. – Dissera – Vou pedir ajuda do Carson para usar alguns de seus aparelhos... Precisamos ter certeza que está tudo bem com sua criança, Leah.

Confrontada mais uma vez, Julia Alves fizera a sua escolha.

 

***

 

Virara o terceiro copo, novamente em uma única talagada. Não fizera mais cara feia, já estava habituada ao sabor do álcool lhe descendo a garganta. Principalmente quando era algo forte. Tomara a garrafa de uísque outra vez e servira o copo novamente. Puro. Sem pestanejar, virara.

Dessa vez fora mais suave, amenizado pela grande quantidade que já havia ingerido. Mas estava intacta, de pé, firme e forte. Não seria derrubada por algo tão trivial. Puxara com o coto a garrafa para ainda mais próximo de si. Deixara a prótese ao lado da mesa em que se sentara, a de lâmina, já que a com ganchos fora guardada dentro da residência que ocupara no Hill Top. Não precisaria dela, pelo menos por enquanto.

— E então, velhote. Não vai me dizer que ainda é cedo demais para encher a cara? – Confrontara a Hanso, os dois sorrindo, um de frente para o outro.

O lenhador puxara a garrafa para si, tomando no gargalo uma grande quantidade de uísque, provavelmente superior aos quatro copos que Eloise já havia entornado.

Gargalhara.

— Jamais diria isso a você, Imperatriz! – Exclamara Hanso, com o encantador sorriso aberto que lhe era peculiar. McIntyre gostava de vê-lo sorrir, os músculos da face todos se movimentando, iluminando o seu velho e cansado rosto. Bem diferente do que um dia já fora. – Não vai comer nada mesmo? – Complementara.

Eloise passara a mão sobre o couro cabeludo. A cabeça nua já começava a ser preenchida por claros fios ralos. Já fazia algumas semanas que não a raspava. Assim como também nunca mais havia feito sua pintura negra ao redor dos olhos, mais um de seus simbolismos, de sua marca como líder da comunidade em meio à floresta.

— Não estou com fome. – Dissera, enchendo o copo outra vez – Esse é o meu sangue... – Troçara – Sabe Han, já faz um tempo que não me sinto assim...

O homem arqueara uma das sobrancelhas.

— Assim como?

— Temerosa. – Respondera de pronto.

O austríaco tocara a nuca com uma das mãos, estalando o pescoço tenso.

— Mas isso é totalmente normal. Seria até estranho se você não estivesse se sentindo assim. O medo pode ser nosso aliado se soubermos como usá-lo.

Tomara a garrafa e levara o gargalo à boca.

— O que mudou, Han? O que aconteceu que mudou tanto a gente? – Ela abrira os braços, segurando o copo ainda cheio – Há poucos meses eu me sentia tão segura, tão certa das minhas decisões. Eu não sabia mais o que era o medo. Eu tinha deixado de sentir essas coisas tão triviais, tão...

— Você não percebe? – Interrompera Hanso – Você não está mudando, só está voltando ao que era antes. Tudo o que aconteceu... Tudo o que aconteceu depois de Bonnie. Aquilo foi forte, foi único e transformou todos nós. Foi como uma descarga elétrica, Eloise. Não havia como não mudar...

A Imperatriz sentira um nó na garganta.

— Mas aí veio o Doutor Wales, Alexandria, a doença dos porcos, o golpe que você levou do Bill... Isso também foi forte. Também foi uma descarga elétrica que modificou todo mundo. – Ele apontara para a mulher, que nada mais dissera – Talvez você não queira aceitar isso, mas acho que pouco a pouco você está deixando de ser a Imperatriz e voltando a ser apenas a Eloise. O problema é que você acha que isso é uma coisa ruim, quando na verdade não é.

Ela suspirara. Suspirara por saber que Hanso estava certo. E suspirar por ainda não ter encontrado uma resposta definitiva. Era um conflito muito grande, e enquanto não tomasse partido, enquanto não decidisse que pessoa seria daquele instante em diante, toda a confusão seguiria lhe atormentando.

Han... – Falara finalmente, fitando o copo ainda cheio – Você ainda pensa na Meg?

O lenhador sorrira um meio sorriso. Enviesado, dolorido. Ainda se lembrava do dia em que a filha de Hanso fora levada pelos homens de Negan.

— Todo santo dia. – Respondera com a voz pesada – E você... Ainda pensa na Bonnie?

Eloise McIntyre se calara. Levara o copo de uísque até a boca, tomando a quarta dose. Sentira o álcool descer como lâminas em sua garganta. Não precisava de palavras para responder aquela pergunta.

Fora retirada de seu estado inerte por gritos alarmados vindo dos portões.

Havia chegado a hora.

 

*****

 

— Os Salvadores estão vindo para cá! Todos a postos! Todos aos seus postos!

Kal gritara desesperadamente, apontando para a estrada, logo abaixo do grande morro em que se localizava a comunidade. A subida, apesar de íngreme não se mostrava como um obstáculo para os caminhões e 4x4 dirigidos pelos Salvadores, além é claro do comboio de motos, que como verdadeiros batedores, abriam caminho para os demais.

Mas além dos homens e das armas, o lanceiro obsevara algo que não era apenas estranho, mas também assustador. Do compartimento de carga de um dos grandes veículos dos milicianos, uma dúzia de mortos vivos, presos uns aos outros por correntes, eram trazidos como cães de guarda pelos soldados de Negan. E era o próprio líder que encabeçava a fileira que agora se aproximava dos portões.

Com sua Lucille em mãos, o psicótico comandava seus homens, espalhando-os rapidamente, de modo que a entrada principal pudesse ficar totalmente cercada. A cerca, é claro, era muito alta, e a visão que tinham dos postos de observação e da própria Barrington House, era um diferencial muito grande em favor da Aliança. Mas ainda assim o poder de fogo dos Salvadores não poderia ser subestimado. O que haviam conseguido fazer em Alexandria era um claro sinal de que a guerra ainda não tinha determinado vencedores e vencidos.

Precisavam agora, nesse momento, fazer o seu próprio destino.

Ao lado do havaiano estava Eduardo, também segurando firmemente sua lança no punho direito. Abaixo deles, Rick, Ezekiel, Andrea, Michonne, Jesus e Eloise começavam a se organizar, protegendo os mais fracos e expostos, e posicionando todos os guerreiros que estivessem dispostos a lutar uma última vez. Uma derradeira vez.

— Fiquem bem aí! – Bradara Kal para Negan, erguendo sua lança. Estava tentando de alguma forma ganhar tempo para que seus aliados conseguissem se preparar – Não precisamos continuar com isso! Olha só, cara, você não faz ideia do que te espera do lado de dentro desses muros, então é melhor...

PKOW!

Um disparo vindo de um dos milicianos atingira a testa de Kal, perfurando sua têmpora a atravessando até o outro lado. Uma grande quantidade de sangue espirrara por seu crânio, atingindo Eduardo que se lançara ao solo no mesmo instante. O amigo tombara, caindo inerte do ponto mais alto dos muros protetores do Hill Top.

— Rick! – Gritara Negan. O brasileiro, com as mãos trêmulas, limpara o sangue que lhe manchara o rosto, vestindo nervosamente o capuz de seu casaco, enquanto mantinha-se escondido da linha de tiro dos Salvadores. O chefe inimigo então prosseguira – Mostra a tua cara, ô maneta de merda! Eu vou matar cada um dos infelizes nessa caralha de comunidade! Aparece, ou então as coisas vão ficar bem feias para o teu lado!

Eduardo erguera a cabeça muito rapidamente, o suficiente para gritar a plenos pulmões.

— Rick? Não tem nenhum Rick por aqui, é melhor voltar mais tarde!

Em um ato de bravura em meio à covardia, lançara sua arma branca em direção a Negan, cravando a lança no chão a cerca de três metros de distância do alvo. Voltara então a se esconder, rezando para que a estrutura conseguisse suportar a possível saraivada de tiros que possivelmente seriam impetrados contra ele.

 

***

 

— Ok. Parece que vamos ter mesmo que entrar. – Negan meneara a cabeça negativamente, tomando a lança que havia acabado de ser atirada contra ele, e partindo-a em duas – Puta que o pariu! Beleza então, lambuzem suas armas nesses mortos de merda! Vamos dar a eles uma passagem só de ida para o maravilhoso mundo dos zumbis!

Os milicianos começaram então a passar a lâmina de suas facas e machados, e o corpo de seus tacos e bastões nos cadáveres ambulantes acorrentados. O sádico plano de Negan passava por criar verdadeiras armas biológicas, que seriam mortais até mesmo se produzissem um simples arranhão em sua vítima. E essa ideia deixava Dwight ainda mais enojado.

Ainda havia, é claro, as armas de fogo. Boa parte da munição havia sido gasta no ataque a Alexandria, mas o que conseguiram roubar da fábrica de Eugene, havia-os suprido o bastante para mais essa investida. Por mais que pensasse em alguma forma de atrapalhar os planos dos Salvadores, uma maneira de cessar de vez com aquele terror ainda não tinha surgido. Precisava de uma luz, de um salto definitivo para que Negan fosse enfim derrotado.

Mas na situação em que se encontrava, tudo o que o motoqueiro poderia fazer era seguir o barco, ou então tudo o que construíra estaria perdido.

— Certifique-se que os seus dardos estejam sujos! – Dissera Negan, olhando fixamente para Dwight.

Às vezes ele pensava quais seriam as chances de Negan saber que ele estava enganando-o. Será que aquilo era mais um dos jogos sádicos daquele desgraçado? Será que uma hora tudo seria revelado e todos os planos suplantados? Precisava do seu pedaço de vingança. Fazia aquilo não apenas por ele, mas principalmente por Sherry.

— Preciso tomar cuidado para não mudar muito o peso e o balanço... E nome correto é flechas.

O mandatário do Santuário revirara os olhos.

Foda-se, tanto faz! – Dera alguns passos em direção aos portões. A movimentação no posto dos sentinelas havia cessado após a execução daquele lanceiro. Somente o silêncio imperava no lugar – Rick, eu vou entrar! Você está me obrigando a fazer isso ao se esconder aí dentro igual a uma garotinha!

Ele abrira os braços, girando Lucille no ar.

— Ok, então. Todos vocês aí dentro, ouçam-me com atenção! – Bradara, ampliando ainda mais o tom de voz – Fiquem abaixados com a porra do rosto no chão! Entenderam? Coloquem as mãos atrás da cabeça e não movam um só músculo! Quem se render irá viver... E todos os filhos da puta que tentarem reagir serão trucidados! Vocês me ouviram? Bom, já estão avisados!

Erguera o punho fechado, o sinal que já havia sido combinado anteriormente.

DERRUBEM O PORTÃO!

O primeiro caminhão acelerara, avançando com toda a força contra o grande portão do Alto o Morro. Impetrara tamanha força, que além de derrubá-lo, também levara consigo a estrutura que servia como ponto central de observação para os sentinelas. O veículo seguira por dez metros no interior da comunidade, antes de frear, a poeira ainda baixando, a entrada agora totalmente exposta.

Dwight preparara sua balestra. Olhara para os lados, sempre atento, os olhos de caçador preparados para agir ao menor sinal de perigo. Negan sinalizara com uma das mãos, pedindo para que seus homens aguardassem. O interior da comunidade mais parecia um deserto. Não havia uma só alma ali presente, e o silêncio, apesar de todo o estrondo produzido pela investida dos Salvadores, seguia presente. Uma quietude que chegava a incomodar os ouvidos.

— Mas que...

O resmungo de Negan logo fora interrompido pelo som das balas dos soldados da Aliança, que haviam se posicionado tão logo os Salvadores aportaram. A breve distração criada por Kal e Eduardo servira para que o pessoal de Rick pudesse se preparar, afinal de contas, já deveriam esperar que os milicianos fossem até eles.

Os homens que estavam nos caminhões não tiveram tempo de se defender, sendo exterminados com uma quantidade colossal de disparos. Não esperavam que os alexandrinos tivessem se recuperado tão rapidamente do traumático baque impetrado. E essa grata surpresa enchera o caçador de esperança. Esperança de que as coisas pudessem terminar logo. E de que o lado certo saísse vencedor.

 

***

 

— Protejam-se! Rápido, em suas posições!

Rick correra para trás do caminhão que havia acabado de arrombar os portões do Hill Top. Certificando-se de que os dois Salvadores que nele continham estavam realmente mortos, o xerife sinalizara para que os demais se espalhassem, posicionando-se da melhor forma que conseguissem.

Andrea e Carl já haviam feito o seu ninho de sniper, enquanto que os membros da linha de frente da Aliança marchavam agora ao seu lado, enfrentando cara a cara os homens que haviam acabado de invadir o lugar. Não tinha mais volta.

Rick terminava de verificar sua munição quando Glenn, armado com uma submetralhadora, surgira do seu lado, protegendo-se na lataria do caminhão inimigo. Parecia nervoso, tenso.

— Você não precisa participar disso! – Exclamara Grimes – Volte e fique com sua filha, todos vamos...

— Rick! – Rhee chamara sua atenção.

O policial sorrira. Meneando a cabeça, mostrara que entendera o recado.

Olhara rapidamente em direção à entrada, tentando enxergar a movimentação hostil que começava a se aproximar. Era possível ouvir o barulho dos motores, das motocicletas acelerando, avançando pelo gramado da comunidade.

— Pelos velhos tempos, então? – Indagara Glenn.

O xerife erguera o cano de sua arma, olhando nos olhos do amigo.

— Por aquele Beco em Atlanta.

O asiático abrira um largo sorriso ao se deparar com as lembranças trazidas por Rick. Já fazia tanto tempo que às vezes as memórias ficavam difusas, foscas. Como se tivessem feito parte de outra realidade, distante de tudo o que viviam agora, ao mesmo tempo em que pareciam tão próximas.

Cada um partira por um lado, atirando contra os motoqueiros Salvadores. Rick derrubara dois deles, tão rápido que não tiveram tempo de gastar uma só bala contra o policial. Glenn não fora tão preciso quanto o xerife, mas com apenas três disparos, conseguira derrubar dois também. Escondidos, os demais atiradores da Aliança, comandados por Jesus e Ezekiel, deram cobertura pra que os solitários conseguissem encontrar um novo abrigo.

Grimes virara uma das mesas de madeira, improvisando uma barricada. Já o amigo coreano se lançara atrás de um dos trailers vazios, dando um rolamento no chão enquanto os disparos seguiam incessantes, zunindo em seu ouvido. Estavam seguros, pelo menos por enquanto. A Aliança ainda não havia sofrido nenhuma baixa.

Mas o coração do xerife disparara quando ouvira o som dos carros maiores, rasgando o gramado e acelerando na direção dos atiradores. Negan encontrava-se pendurado na porta do caminhão, gesticulando amplamente com o seu taco, atiçando os seus soldados para que exterminassem todos que ali residiam.

PARA A BARRINGTON HOUSE! TODOS PARA A BARRIGTON HOUSE!— Vociferara Grimes, deixando o seu esconderijo e dando dois tiros a esmo, fugindo do carro que acelerara em sua direção – Recuar! Recuar! Não podemos deixá-los se aproximarem da casa!

Rick jogara-se na lama, conseguindo escapar do carro que por muito pouco não passara por cima dele. Recuperado, disparara três vezes contra o motorista, que tombara com o rosto no volante, perdendo o controle e batendo em cheio contra um barraco de madeira.

SNIPERS! MIREM NOS CARROS! ACERTEM OS CARROS!

Grimes bradara ao mesmo tempo em que movia as pernas com toda a potência que podia, correndo em disparada na direção da Barrington House. Atirara duas vezes para trás, contra outro carro que agora o perseguia. O veículo que seguia em linha reta, logo perdera o controle, capotando após chocar-se com um trailer. O policial percebera então que Andrea, Carl e os demais atiradores de elite haviam ouvido as suas súplicas.

A comunidade era grande o bastante para que pudessem se esconder dentro dela própria, apesar da invasão. Os disparos haviam afastado momentaneamente o avanço dos veículos maiores, mas era certo que isso não prosseguiria por muito tempo. Pelo menos houvera uma brecha para que conseguissem retornar em segurança até o casarão colonial. Jesus surgira na porta, carregava nos braços um fuzil de grosso calibre.

— Vamos, Rick! Entre!

O policial estacionara em frente à porta. Ao seu lado surgira Glenn correndo, também conseguindo escapar do ataque hostil. Os snipers seguiam atirando, e os disparos logo eram respondidos pelos homens de Negan, que agora haviam deixado os veículos e passavam a utilizar as casas vazias como abrigo e bases provisórias.

— Não podemos ficar todos reunidos em um único local! – Dissera – Precisamos nos espalhar. Glenn, você...

A fala de Rick fora interrompida de pronto. Ele sentira um pequeno incômodo em seu abdome, um ardor que lhe subira rapidamente por todo o corpo, aumentando a cada milésimo que passava. Tocara a lateral direita da barriga, sentindo um formigamento na região, a mão molhada, tomada por algum líquido viscoso.

Olhara nos olhos de Glenn.

Sua mão estava tomada por seu próprio sangue. Ao direcionar o olhar para o local afetado, conseguira perceber a origem de tudo o que estava sentindo.

Uma flecha havia atravessado a lateral de seu abdome. A dor latente já se mostrava insuportável. Suas pernas bambearam, descompassadas. Dera apenas dois passos antes de cair ao solo de lado.

— Dwight... Ele estava nos enganando o tempo todo... Dwight...

 

*****

 

— É isso aí, garoto! – Negan dera dois tapas no ombro direito de Dwight, que ainda mantinha sua besta em posição de disparo – O filho da puta do Rick maneta está condenado! – Os dois haviam se abrigado atrás do barraco utilizado como ferraria, local que tinha uma visão privilegiada da entrada da Barrington House. E fora justamente dali que Negan exigira que o arqueiro disparasse contra o líder da Aliança. Pois sabia que mesmo que a flechada não fosse fatal, a arma contaminada faria com que o xerife morresse aos pouco. Era que o acontecia.

Era o que sempre acontecia.

PKOW! PKOW! PKOW!

Com a localização descoberta, os soldados da Aliança começaram a atirar ininterruptamente contra o barraco, obrigando os dois a se agacharem para se protegerem das balas. Mas Negan, com um extenso sorriso em sua face, não parecia sentir medo da resposta raivosa dos companheiros de Rick. Parecia satisfeito, prazerosamente satisfeito.

— Rick já era! – Exclamara – E com ele fora o jogo acaba! Esse caralho de guerra está em nossas mãos!

O arqueiro fechara os olhos, agarrando sua balestra firmemente contra o peito. Suspirara algumas vezes, enquanto os tiros inimigos seguiam passando perto, quase o atingindo. Sua cabeça girava, pesava em mil pensamentos a respeito do que havia acabado de fazer.

Mas naquele momento, uma única frase ecoava em sua mente. Repetindo ab aeterno.

Não morra, Rick! Ainda não acabou... Ainda não acabou...


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Notas finais do capítulo

E então, o que acharam?

Já digo que não adiantarei o destino do Rick. Vocês precisarão aguardar o próximo capítulo para saber o que irá ocorrer...

A guerra chegou a sua batalha final! A porradaria irá cantar ainda mais nos próximos capítulos. Isso, é claro, antes do final, que será bem tranquilo e emocionante... Tenho certeza que irão se emocionar com o que tenho guardado para as senhoras e os senhores! Hehe...

Nos vemos nos comentários, abraços!

Moi moi.



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