All Out War escrita por Filho de Kivi


Capítulo 33
Whatever the Case May Be


Notas iniciais do capítulo

Hei!

Olá mais uma vez galerita!

Sem atrasos, aqui estou eu para mais uma atualização da única fic no nyah que segue as hq’s e retrata um período a frente do que mostra a série de tv. Ou pelo menos eu acho hehe...

Bom, como de costume, vamos aos agradecimentos...

Primeiramente, queria dizer a minha amiga Menta que não consegui colocar as imagens, muito provavelmente pelo fato de tê-las recebido por Mp, acho que por isso não pude pôr o link... Ou pode ser pelo fato de eu ser um total bronco nessas paradas, enfim. Reitero que elas ficaram fantásticas, e que amei o meu presente de aniversário um cadinho só atrasado hehe...

Quero agradecer as novas leitoras que lentamente vem se revelando. Obrigado meninas, espero que estejam curtindo da fic!

Teremos dois POVs hoje, sendo que um deles está dividido em duas partes. Rick e Hall são os escolhidos de hoje, espero que gostem!

Boa leitura!



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Leah dera alguns passos em direção ao portão. Os olhos espantados não pareciam conseguir entender o que se passava. A presença do estranho homem era novidade para a garota, que olhara para os lados, como se procurasse por algo, antes de agir.

Um toque em seu ombro a impedira de avançar. Tom Price, com um fixo olhar tenso em sua face, sinalizara para que a garota permanecesse parada. Caminhando lentamente em direção aos portões, fitara o sujeito que permanecia sorrindo, com o rosto entre duas grades, ainda esperando por uma recepção.

Com a mão direita próxima ao coldre na cintura, pronto para qualquer reação do desconhecido homem, Tom olhara-o brevemente por poucos segundos, notando que o mesmo não se encontrava sozinho naquela repentina visita surpresa. Um caminhão, que o ex-soldador reconhecera como sendo das forças armadas, trazia pelo menos quinze homens em sua carroceria. Todos em formação atrás de seu pretenso líder.

— Quem é você? – Indagara o sentinela com propriedade em sua voz.

O homem abrira os braços, ampliando ainda mais o sínico sorriso que estampava como uma marca registrada.

— Você tá de sacanagem comigo, porra? – O taco que trazia nas mãos fora posto em riste, enquanto o mesmo sujeito fazia uma pausa, aguardando a manifestação de Tom – Negan... Lucille... Tenho certeza que o Rick fez uma apresentação do caralho sobre mim!

Tom seguira encarando-o, ainda em silêncio. Estando totalmente no controle da situação, o portador da Lucille mantivera-se frio, exibindo o mesmo ar de tranquilidade e soberba que demonstrara ao aportar em Alexandria.

— Faz o seguinte negão... Vai atrás do maneta e avisa a ele que Negan está aqui. Ele saberá o que fazer. Enquanto isso daremos uma limpa nessa zona!

Sinalizando com o taco de baseball, Negan agrupara os seus homens, que prontamente passaram a exterminar alguns desgarrados errantes que tentavam se aproximar dos portões, muito possivelmente atraídos pelo próprio grupo hostil. Exibindo toda a força bélica que possuíam, os homens exterminaram as criaturas com enorme facilidade, sem a necessidade de disparar uma única vez.

Já interado a respeito da visita inesperada, Rick Grimes caminhara em direção aos portões, respirando profundamente a cada passo dado. Ele sabia que esse dia chegaria, e tentara preparar-se o máximo possível para ele, mas ainda assim, tudo parecia muito incógnito dentro da sua cabeça.

Ele estava lá, exibindo o taco que nomeara de Lucille, a mesma arma que retirara a vida de Maggie de maneira tão brutal. Matar a companheira de sobrevivência que há tanto tempo a acompanhara, principalmente em um momento tão feliz de sua vida, grávida do homem que amava. O que Negan fez não somente destruíra com a vida de Greene, mas arrancara um pouco de cada um que presenciara aquela noite horrenda.

Rick queria poder matá-lo, esmagar a sua cabeça da mesma maneira que fizera com a jovem esposa de Glenn. Mas infelizmente ele ainda não podia. Pela primeira vez Grimes via-se dentro de um buraco do qual havia poucas possibilidades de sair. Uma cratera tão profunda que talvez nem mesmo uma corda de salvação pudesse ajudá-lo. O xerife precisaria jogar o jogo do sádico chefe dos Salvadores, deixar que se sinta no controle, para só aí tentar, quase como um tiro no escuro, virar o jogo a seu favor.

Não seria fácil, e as possibilidades de sucesso eram poucas. Contudo, mesmo que remotas, ainda existia uma chance de reverter tudo aquilo. Uma chance de acabar com Negan. E era nisso que o policial se agarrava agora, era nisso que queria acreditar com todas as suas forças.

De pé ante os portões, Grimes e Negan se encararam por alguns segundos, incontáveis segundos que mais pareceram durar uma eternidade. Olhando-o nos olhos, Rick tentava controlar o ódio que lhe preenchia cada poro, cada fio de cabelo e cada célula do seu corpo. Ele sabia que tinha muito a perder.

Ainda não estava na hora.

— E aí, Rickyzito? – Indagara Negan com clara ironia – Vai ficar aí parado ou vai mandar o seu cachorrinho abrir essa porra? Você sabe muito bem que eu posso pôr toda essa merda a baixo.

Cerrando os olhos brevemente, em uma contagem mental de segundos mesclada a algum exercício de respiração que aprendera, Grimes tentara se acalmar, engolindo as palavras de Negan sem tomar nenhuma iniciativa. Abrindo os olhos outra vez, com a cabeça levemente baixa, sinalizara para Tom, que seguia estático ao seu lado, que destrancasse os portões, permitindo a entrada dos Salvadores.

Visivelmente espantado com a atitude do xerife, Price relutara em atender ao pedido, mas acabara cedendo ao notar a gravidade dos fatos. Com a entrada liberada, Negan e seus quinze homens caminharam com liberdade para o interior da comunidade.

Boa parte dos moradores, movidos pelos cochichos de que os milicianos que haviam atormentado a comunidade recentemente teriam retornado, já se aglomerava próximo a principal entrada da comunidade, visivelmente estupefatos com a submissão de Rick Grimes ante os seus algozes.

Sorrindo como um político em um palanque, Negan parecia sentir-se totalmente a vontade com o medo expresso nos rostos de cada um ali. Ninguém fazia menção de qualquer tentativa de resposta, todos pareciam totalmente dominados pelo terror.

Abrindo os braços e voltando-se para os moradores da comunidade, o líder dos Salvadores bradara em alto e bom tom.

— Vocês viram o que fizemos lá fora? Viram como esmagamos as cabeças daqueles carniceiros de merda? Eles poderiam facilmente ter comido um de vocês! Nós somos caras legais, porra! Poderíamos ter arrombado essa porra toda, mas não, não foi o que fizemos. Não ficamos putos com vocês e nem atacamos.

Os olhares amedrontados focavam-se totalmente no portador da Lucille.

— E também não estouramos a cabeça de nenhuma outra vadiazinha grávida. Viu como nossa relação está evoluindo? – As últimas palavras penetraram cada um ali como uma certeira bala, diretamente no ponto mais vulnerável – Eu e os meus camaradas ficamos simplesmente esperando, e aproveitamos para fazer o nosso trabalho. Nós nos esforçamos pra caralho para manter a segurança desse perímetro! Estamos fazendo um puta favor!

Ele se voltara em direção a Rick.

— Agora faça um pra mim Rickyzito – Negan estendera Lucille – Segure ela pra mim, por favor.

Grimes olhara para o taco de baseball, a mesma arma que fora utilizada para acabar com a vida de Maggie. Negan aguardava por sua resposta, e o olhar do sádico homem acusava o quanto estava sendo prazeroso para ele destruir a imagem de líder firme que o xerife cultivara por tanto tempo. Se o seu objetivo era dobrar Rick, o mesmo estava sendo executado com sucesso.

Ainda com a cabeça baixa, o mandatário de Alexandria recebera Lucille em mãos, pressionando o cabo com tanta força entre os dedos que sentira o fluxo sanguíneo ser interrompido naquela região. Ele evitava fitar as pessoas, não queria ter a constatação visual de sua derrota. Precisava passar por tudo aquilo. Precisava fazer o plano funcionar.

Erguendo os braços e bocejando em voz alta, Negan girara a cabeça, olhando a comunidade como se fizesse um mapeamento instantâneo.

— Mas esse lugar é fodasticamente foda pra caralho! – Exclamara – Vocês vivem em casas? Coisa fina, hein? E olha que eu cheguei a achar que vocês eram mais um bando de mendigos fudidos! Quantas casas vocês possuem?

O xerife se vira obrigado a responder.

— Quarenta e nove... Oito.

A voz de Rick saíra em um tom quase imperceptível.

Puta merda! Pelo que estou vendo, só nesse quarteirão devem ter umas vinte! Tenho certeza que algumas delas estão vazias. Porra, Rickyzito, vocês estão com a vida ganha aqui! Devem ter muito a oferecer.

Rick seguia parado, com o taco de baseball na mão esquerda, aguardando pelo próximo passo de Negan, quase assemelhando-se a mais um de seus capangas.

— E então, maneta? Por que não me leva em um tour pela comunidade? – O xerife mantivera-se em silêncio – E então, porra?

O líder de Alexandria erguera o rosto, olhando fixamente para Negan.

— Aonde você quer ir primeiro? – Perguntara Rick, engolindo totalmente o próprio orgulho.

Negan encostara a mão direita no ombro de Rick, passando a caminhar lado a lado com o policial. Os dois eram seguidos de perto pela comitiva dos Salvadores, que faziam questão de exibir suas armas, tentando de todas as formas amedrontarem ainda mais os moradores de Alexandria. Se é que isso era possível.

Pouco a pouco as pessoas começaram a retornar para as suas casas, possivelmente acreditando estarem mais seguras no interior das residências. Apenas os sentinelas prosseguiram com o trabalho, acompanhando Grimes a distância, analisando os passos dos milicianos e se preparando para qualquer ordem de ataque que pudesse vir de Andrea.

— O meu pessoal vai se dividir, fazer algumas buscas pelas casas, pra agilizar o processo – Negan interrompera a caminhada – Quero adiantar logo que não iremos mexer nos seus mantimentos, eu sei que vocês não devem ter muita coisa por aqui.

O hostil voltara-se em direção ao arsenal, onde uma amedrontada Olivia tentava de alguma forma manter a entrada segura.

— E eu não sou o único aqui que percebeu que a gordinha está cuidando dos mantimentos, não é? – Retomara – O lance é o seguinte... Se vocês morrerem de fome, eu acabo perdendo os meus tributos, e isso ia ser uma merda do caralho! Por isso hoje deixarei que vocês fiquem com a comida.

Rick não sabia o que dizer. Permanecera em silêncio, ainda mantendo Lucille em sua mão da mesma forma que recebera. A cada segundo que passava o xerife sentia-se ainda mais impotente.

— O que quer que eu diga?

Negan expandira mais um de seus sorrisos sádicos.

— Oras, um obrigado já seria um começo! – Exclamara – Não acha que eu mereço um agradecimento pelos serviços prestados? – Uma breve pausa se impetrara – Olha só, maneta, eu sei que começamos com o pé esquerdo. Eu não queria ter matado a sua amiguinha, mas você me obrigou a fazer aquilo! No fim das contas eu sou um cara justo pra caralho! Basta você cooperar para conhecer esse meu lado!

Grimes permanecera calado. A encarada entre os dois homens só fora interrompida por uma conhecida voz, que surgira inesperadamente diante deles.

— Você deveria dar o fora daqui... Antes que seja tarde demais!

Carl, com a mão no cabo de seu revólver, pronto para retirá-lo do coldre, fitara Negan com o olho esquerdo em chamas. O garoto com chapéu de cowboy e a bandagem que lhe cobria a metade direita do rosto, não parecia intimidar-se com a presença de todos aqueles homens em sua Alexandria.

A imagem do que Negan fizera a Maggie não saíra de sua cabeça, e não havia uma só noite em que o garoto não tivesse pesadelos com aquela horrenda cena. O pequeno Grimes aprendera a cultivar o ódio em seu peito, e aprendera também a utilizar esses sentimentos como força motriz para a tomada de ações. O garoto crescera em meio ao caos, e todas as suas referências pareciam ter sido destruídas junto com o mundo que morrera.

— Perdão, meu jovem – Negan dobrara o corpo, aproximando-se ainda mais de Carl – Desculpe os meus modos rudes do caralho, mas é que não sei se consegui compreendê-lo totalmente... Por um acaso você estaria me ameaçando?

Grimes arregalara os olhos. O seu coração palpitava de forma descompassada.

— Carl, vai pra casa... Agora.

O chefe dos Salvadores interrompera o pai de Carl. Pela primeira vez Negan deixara o sorriso se esvair.

— Eu estou no meio de uma conversa aqui. Não seja grosseiro, porra! – Ele direcionara sua atenção novamente para o jovem Grimes – Onde estávamos mesmo? Ah, sim... Nos colhões de titânio que você deve ter para me enfrentar. Talvez eu esteja com algum problema de audição... Você poderia repetir o que me disse anteriormente?

Rick estava muito tenso. Não conseguia imaginar o que o seu filho poderia fazer. Ele entendia muito bem a raiva contida no peito de Carl, mas torcia para que o garoto não fizesse nenhuma besteira naquele momento. Totalmente de mãos atadas, o xerife pôde apenas aguardar ao desfecho sem nada fazer.

O garoto permanecera calado, olhando fixamente para o assassino de Maggie. Após um breve período ter se passado, Negan manifestara-se finalmente, aproximando o rosto com o de Carl Grimes.

— Bem melhor... Agora obedeça o seu pai e se manda daqui, moleque!

Rick apenas sinalizara com a cabeça, indicando que fizesse o que Negan lhe ordenara. Visivelmente contrariado, Carl abaixara os olhos, assim como o seu pai outrora fizera, caminhando lentamente para a residência dos Grimes, e se afastando do perverso homem.

O Salvador voltara a fitar o xerife, dando um tapa de leve em suas costas.

— O seu filho é uma gracinha, Rickyzito!

[...]

GARDEN, UMA NOITE ANTES.

— Então o seu sobrenome é Penn?

Vincent dera uma garfada curta na porção de frango que preenchia o seu prato. A ave criada na própria comunidade, zelada aos cuidadosos olhares de Lawrence Peck, completava agora o seu ciclo ao se tornar alimento para os moradores do Garden.

Acompanhado por Lizzy Penn, que até então era apenas nomeada como a invisível garota bêbada, Hall jantava sentado ao solo da cabana que agora lhe servia de morada, presente dado pela própria Imperatriz.

O casebre nos fundos da choupana da mandatária poderia ser considerado um grande luxo, já que a maioria das pessoas ali precisava dividir espaço para que todos pudessem se alojar. Morando sozinho, e é claro, sob as asas da líder do Garden, Hall parecia conquistar cada vez mais o seu espaço dentro do Jardim.

— E de onde você é? – Indagara novamente o médico.

A jovem sorrira, cobrindo os lábios com a lateral do indicador e médio, e fazendo uma pausa para que pudesse terminar de ingerir o alimento antes de responder. Olhando-a daquela forma, de cara limpa, por assim dizer, Hall conseguia enxergar cada vez mais a Lizzy real, retirando dela todas as cascas e armaduras que ela própria parecia ter criado.

Oakland... E você?

O médico devolvera um sorriso em resposta. Hall definitivamente não queria se envolver com aquelas pessoas. Decidira por si próprio manter distância, inclusive criando uma nova imagem para si, a do reservado Doutor Desmond. Mas infelizmente, para frustrar os seus planos, o cirurgião não esperava conhecer uma mulher que parecia enxergá-lo de forma tão crua. A mulher que unicamente pudera ler os seus demônios, compreender as suas perturbações.

Definitivamente havia algo de diferente em Lizzy Penn.

— Bom... Meus pais eram do País de Gales – O médico tentava ser o mais evasivo possível, mas inexplicavelmente, não parecia conseguir esconder algo da jovem. Era como se não quisesse esconder algo dela – Já passei por Baltimore, Ohio, Tampa, Atlanta... Nunca criei raízes em um lugar só. Minha vida era sempre definida por algo... Estudo, hospital... Acho que eu já vivia assim antes mesmo dessa merda toda acontecer... Sobrevivia, melhor dizendo.

Penn parecia interessada em suas palavras. Sua atenção dividia-se entre o rosto de Hall, e a taça de vinho que agora levava até a boca. Ela ajeitara parcamente os cabelos negros e ressecados, totalmente despenteados, para detrás das orelhas. Os olhos amendoados, em um escuro tom de castanho, fixaram-se novamente no cirurgião.

O médico não sabia dizer até onde poderia levar aquilo, ou se havia algum lugar para onde aquela conversa se direcionaria. Pela primeira vez ele se sentia bem no Garden, pela primeira vez o peso que esmagava sua consciência não parecia ter significância. Ele sentia como se tivesse voltado ao primeiro dia no acampamento de Tom e Mike, quando redescobrira a sua vocação, quando novamente sentira vontade de viver.

Tudo isso causado por uma simples troca de palavras. Era volátil demais. Demais até para que ele pudesse compreender.

— Eu era cantora – Manifestara-se Lizzy após mais alguns goles no vinho – Ou melhor, eu gritava e tocava guitarra no palco junto com minha banda de punk rock... Tocávamos basicamente Pistols e algumas originais também. Mas nunca conseguimos nada além de algumas apresentações em bares e pés sujos em Oakland.

Ela prosseguira.

— Não sei se você vai acreditar em mim, mas... – Mais uma garfada na comida, o prato já estava praticamente vazio – Fora da loucura da noite, eu me passava muito bem por uma pessoa normal. Trabalhava em uma agência de viagens, votava nos Republicanos, ia aos jogos dos Athletics... – Ela arqueara uma sobrancelha, parecia refletir profundamente – Acho que eu enlouqueci junto com o mundo.

Penn mostrava-se cada vez mais sóbria.

— Todos nós, Lizzy... – Complementara Hall – Antes eu acreditava que estava sendo castigado, que o mundo todo estava conspirando para que eu pagasse por todos os erros que cometi durante a minha vida... – Ele coçara a cabeça – Mas hoje, apesar das vozes na minha cabeça insistirem em tentar me convencer do contrário, eu sei que pensar dessa maneira é só mais uma forma de se entregar.

Penn tentara conter uma gargalhada com o dorso das mãos, mas parecera inevitável. Hall não conseguia entender o que pudera ter sido tão engraçado assim, e de certo modo até sentira-se ofendido pela atitude da garota. Ela pedira um tempo com a mão espalmada, recuperando-se aos poucos do riso inesperado.

— Desculpe... – Ela meneara a cabeça – É que essa cena é no mínimo bizarra – Vincent ainda não conseguia compreender – Eu devo estar de ressaca a pelo menos um mês, enquanto que você acabou de levar uma surra sabe-se lá de quem... O seu rosto está parecendo um chiclete mascado, e não acredito que o meu deva estar muito melhor, já que eu não me olho no espelho a uma caralhada de tempo... E ainda assim estamos aqui, comendo e bebendo sentados no chão enquanto filosofamos sobre a vida e os nossos monstros interiores!

Hall abrira um largo sorriso.

— Acho que isso é bem mais do que bizarro, Lizzy!

As íris novamente se encontraram, repelindo-se após alguns segundos de contato direto.

— Sabe, Desmond... – Penn deixara de encará-lo, fitando agora o prato enquanto passava o garfo na borda da louça, como se estivesse escrevendo algo – Eu nunca tinha me aberto assim com alguém... Bom, eu já me abri para muitos caras aqui, mas – Ela própria parecera refutar a piada dita – É que nunca ninguém demonstrou interesse em saber algo sobre mim, em querer conhecer mais do que a minha vagina.

Penn soltara um risinho nervoso.

— Eu vi muita coisa, fiz muita coisa... Eu cavei um buraco pra não me lembrar de tudo pelo que eu passei... Mas acho que eu cavei fundo demais. Às vezes eu tento me lembrar de como era a Lizzy de antes... De antes de tudo. Mas é como se fosse outra pessoa... Eu não consigo me ver mais daquele jeito.

— O que eu quero dizer é que é bom poder falar com alguém, conversar com alguém que te enxergue... Então, mesmo que eu descubra depois que você é só mais um babaca igual a todos os outros... Obrigado. Obrigado por me enxergar essa noite.

Hall sentira um fogo em seu peito. Algo parecera despertar em seu interior, e pela primeira vez desde que o mundo virara de cabeça para baixo, ele não sentia mais medo. Era como se estivesse desnudo ante a mulher que conhecera há pouquíssimo tempo. Era como se ela já estivesse em sua vida desde sempre. Vincent também sentira ter sido finalmente enxergado pelos olhos de Lizzy Penn.

— Eu acho que ainda há lugar no mundo, mesmo nesse, para pessoas como nós – Os dois voltaram novamente a se olhar – Eu já prometi um milhão de vezes que iria começar de novo, reconstruir minha vida... Besteira. Eu acho que o Garden é o meu lugar no fim das contas... Ou não, vai saber – Ele dera de ombros – Eu perdi tanta gente... Porra, eu perdi uma perna! – O cirurgião abrira os braços, gesticulando – Nós fomos tão acostumados a sentir medo, ódio, dor... Chega uma hora que queremos sentir mais do que isso! – Ele apontara para Lizzy, balançando o indicador direito – Eu entendo você perfeitamente. E eu nunca vou te julgar, pois eu já fiz um monte de coisas apenas buscando sentir algo.

— Eu não quero mais esperar nada do mundo, e nem de mim mesmo... Só o que eu sei é quero viver, e mesmo que aparentemente não ajam motivos para isso, eu apenas... Quero. E acho que você também quer, e acho que é por isso que estamos tendo essa conversa maluca... No fim das contas Penn, acho que somos bastante parecidos.

A jovem mulher lentamente começara a se erguer, retirando os pratos, talheres e taças do solo e resguardando-os sobre um baú em um dos cantos da cabana. Sem nada dizer, ela caminhara até o médico, achegando-se entre os seus quadris. Lizzy enlaçara Hall pelo pescoço, respirando em uníssono no mesmo ritmo do cirurgião.

Os lábios se atraíram como imã e metal, e o beijo que se seguira parecera isolá-los do resto do mundo. Não havia mais errantes, vozes misteriosas, fim do mundo, mortes ou dor... Só havia os dois, sem culpa, sem razões e sem perguntas. Apenas vivendo. Apenas sentindo.

Os olhos não se fecharem, seguiram fitando-se, fervilhando em um encontro que não parecia ter fim. O beijo apenas fora finalizado para se iniciar novamente, agora com ainda mais afinco.

KLANK.

A porta do casebre sendo arrombara interrompera o torpor como uma explosão em um campo minado. Os dois se desvencilharam imediatamente, e em um susto, voltaram à atenção para a entrada da cabana, onde Hanso e uma já conhecida figura adentravam sem cerimônias.

Toctoc.

A Imperatriz do Garden sorria enquanto olhava de esguelha para os dois, que lentamente tentavam se recompor da entrada inesperada.

— Desculpe a minha falta de tato... – Ela dera dois passos mais – Eu devo ter perdido a chave em algum lugar – Ela utilizava sua prótese engenhada, mas dessa vez, ao invés de uma lâmina, havia dois pequenos ganchos na extensão em seu antebraço – Pelo que vejo, senhor Desmond, você já foi apresentado a minha querida Lizzy Penn – A ironia ficara mais do que clara – E ao que me parece, ela já estava lhe mostrando o que mais sabe fazer de melhor.

— Vá se foder, vadia careca! – Vociferara Penn, sem conseguir se conter.

— Educada como sempre... Uma verdadeira dama! – A mandatária seguia de queixo erguido, olhando para todos ali com uma verdadeira postura imperial – Mas o meu assunto não é com você, querida. Ainda teremos tempo para rever nossas indiferenças – Ela voltara-se para Hall, que agora também encontrava-se de pé – Eu estou aqui para notificá-lo de que houve uma pequena mudança de planos. Você, J.J., Marsha e Bill sairão essa noite.

O coração do médico saíra de cem para duzentos batimentos por minutos em um piscar de olhos. Ele sabia que ainda não estava pronto para executar a missão que lhe fora dada. Fazendo tudo assim, às pressas, as chances de algo dar errado eram muito grandes.

— Mas senhora... – Vincent tentara demonstrar o máximo de respeito, ele sabia que Eloise gostava de reverências – Eu ainda não estou pronto... Lembre-se do que eu lhe falei, ainda precisamos pensar em uma forma de...

A mulher o interrompera.

— Eu disse que você estaria pronto quando eu dissesse que estaria. E a missão seria executada quando eu julgasse necessária. E adivinhe só? – Ela aproximara-se ainda mais do cirurgião – Você está pronto, Desmond. E a missão será executada agora, aos meus moldes.

Ela dera as costas, caminhando em direção à saída, acompanhada de perto por Hanso que permanecera calado o tempo inteiro.

— Vou te dar vinte minutos para se despedir da Lizzy, tenho certeza que há inúmeras coisas que ela pode fazer por você nesse período de tempo. Encontre os demais nos portões, vocês sairão na picape maior – Ela dera uma última olhada para Vincent – Não vou desejar boa sorte, vocês não vão precisar.

Hall levara as mãos ao rosto, ainda incrédulo. Respirara profundamente, tentando preparar-se mentalmente para os difíceis momentos que se seguiriam. Ao seu lado, Penn o encarava com o olhar baixo, em uma mistura de medo e surpresa, juntamente a uma boa dose de raiva intrínseca.

Assim que a Imperatriz e seu escudeiro finalmente deixaram o lugar, Lizzy tocara com a ponta dos dedos a mão esquerda de Vincent, que de supetão olhara de volta para ex-vocalista de punk.

— Só tenta não morrer agora, tá?

Ela também saíra, caminhando um tanto cambaleante e carregando em mãos uma garrafa que retirara de uma das malas do médico. Vincent a olhara partir, ainda tentando entender tudo o que ocorrera, e mensurando o que ainda iria acontecer.

A última indagação de Penn acabara ficando sem resposta. Hall queria poder dizer a ela que tudo ficaria bem, e que não havia motivos para preocupação. Mas ele próprio sabia, vide todas as experiências que já tivera com o novo mundo, e o conhecimento a respeito da missão, de que não havia como dar garantias a respeito de sua segurança.

Qualquer coisa poderia acontecer.

[...]

Atendendo as ordens de seu líder, os homens de Negan pouco a pouco começaram a se espalhar pelo interior da comunidade, adentrando as casas e retirando de lá o que lhes convinha.

Colchões, cobertores, mantas, roupas. Gradativamente Alexandria começava a ser saqueada pelos homens que algumas semanas atrás haviam invadido a comunidade e executado três dos moradores. Tudo isso com o aval do líder de Alexandria, que em meio a toda a passividade, apenas assistia parte do seu mundo desmoronar sobre sua cabeça.

O caminhão dos milicianos fora posicionado de modo a facilitar a ação dos homens, que até então não haviam encontrado nenhuma resistência, nenhuma ação vinda de um morador que tentasse impedir o fato consumado. Se Rick Grimes nada fizera, porque diabos alguém mais iria se arriscar?

Se bem que, para toda regra parece sempre haver uma exceção.

Rick caminhava ao lado de Michonne, debatendo com ela todas as questões que envolviam o delicado dia que enfrentavam, e observando o lento e destruidor trabalho dos Salvadores, quando notara a aproximação de uma assustada e alarmada moradora de Alexandria.

Com as bochechas rosadas e a respiração ofegante, Leah Fisher correra na direção do xerife, trazendo a ele uma importante e urgente notícia. Contara em meio ao cansaço que Negan e mais dois sujeitos haviam adentrado a residência/enfermaria de Rosita Espinoza, e que na tentativa de levarem uma grande quantidade de medicamentos, foram impedidos a força pela latina, que tomara um dos sujeitos como refém.

Desesperado pelo rumo que a ação temerária poderia tomar, trazendo consequências gigantescas a comunidade, Rick dirigira-se velozmente até o referido local, chegando tão rápido quanto pudera.

Rosita estava de pé, com a pistola apontada para cabeça de um barbudo que usava gorro e casaco de motoqueiro, e que tinha nas mãos uma caixa de papelão repleta dos mais diversos tipos de medicamentos. Ao lado dele, gélido como um iceberg, Negan semicerrava os olhos, sorrindo de soslaio, como se estivesse se divertindo com o ocorrido.

— Você disse só a metade! – Vociferara Espinoza, pronta para estourar a cabeça do sujeito.

— Não entenda mal o meu companheiro, madame – Negan começara a utilizar uma de suas mais poderosas armas, a retórica – Se você olhar bem, verá que sobrou bem mais que a metade. Não há motivos qualquer para um desentendimento.

Ela virou-se em direção ao líder hostil.

— Vocês não tocaram nas aspiras, na penicilina e nos remédios pra gripe. Mas todos os tarjas-pretas, os anti-inflamatórios, a morfina, a oxicodona... Tudo o que vicia vocês pegaram!

Negan erguera as duas mãos espalmadas, mantendo o seu joguete de fantoches.

— Ainda assim vocês estão com saldo positivo! O combinado não era levarmos metade dos medicamentos? Estamos cumprindo nossa parte do acordo.

— Vocês não levarão nada! – Bradara Espinoza.

— Rosita, não! Abaixa essa arma!

Grimes tocara o braço da latina com o coto direito, impedindo que ela disparasse contra o Salvador. A mulher olhara com espanto para o xerife, não conseguindo compreender os motivos de o policial estar tão passivo. Rick meneara a cabeça negativamente, praticamente implorando para que Espinoza abaixasse sua arma.

— Rick... – Os olhos da enfermeira passaram instantaneamente a demonstrar tristeza – Você não pode deixá-lo fazer isso... Se alguma coisa séria ocorrer, como o que aconteceu com o Carl... Com os medicamentos que temos não poderemos fazer nada!

O xerife sabia que ela estava certa. A imagem do seu filho baleado, sendo socorrido prontamente e se recuperando de maneira espantosa, saltara em sua mente. Da forma que as coisas estavam, um milagre daquele não voltaria a se repetir. Grimes precisava fazer algo, pelo menos tentar alguma coisa.

— Negan, acho melhor...

O Salvador lançara-lhe um olhar endurecido.

— Sem essa, maneta! Os seus melhores medicamentos são os seus muros! Eles é que devem manter vocês seguros! Trato é trato, porra! Levaremos a metade e ponto final. A não ser que você queira que façamos outra busca, e aí dessa vez eu faço questão de levar comigo algumas das suas putinhas!

O sangue de Grimes gelara em suas veias.

— Não, tudo bem... Pode levar.

Atestando novamente a submissão do xerife, Negan voltara a sorrir, parecendo cada vez mais satisfeito com o resultado de sua visita.

— Bom... – Voltara a falar – Acho que por hoje é só. Muito obrigado pela atenção! – Lentamente o brutal mandatário começara a se dirigir até a saída da enfermaria – Opa. Que descuido o meu... – Ele interrompera a passada bruscamente, estacionando ao lado de Grimes – Você não achou que eu ia esquecer a Lucille, não é? Principalmente depois do que ela fez a vocês... Acho que você não ia querer ficar com ela!

Negan estendera a mão, recebendo o taco de baseball que Grimes carregara o dia inteiro. Tocando outra vez o ombro do xerife, o homem puxara o policial em sua direção, aproximando-se de seu ouvido e sussurrando para que somente ele pudesse ouvi-lo.

— Obrigado pela recepção, meu amigo! E caso não tenha sacado... Eu acabei de enfiar um pau na sua boca... E você me agradeceu por isso!


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Notas finais do capítulo

E então, o que acharam?

Estava bastante ansioso para retratar essa primeira visita do Negan, pois é um momento fodasticamente foda das hq’s!

A guerra está prestes a ser declarada, e os lados começam a se moldar cada vez mais...

Espero vê-los nos comentários...

Moi moi.



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