Olhos de Cobra escrita por Laura Salmon


Capítulo 17
Capítulo 17 - Karina




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Acordei antes do sol nascer. Eu não estava reclamando da hospedagem, ao menos se chovesse não iríamos nos molhar, mas ficar enrolada à toalha em um canto ouvindo o mar ensurdecedor deixou meu sono agitado. Metade do meu rosto estava amassado por causa da mochila que serviu de travesseiro.

Dei uma olhada em Cobra, um pouco mais afastado. Ele parecia na mesma situação, embora dormisse de forma serena. Por que eu não conseguia respirar sempre que ficava olhando para ele sem que ele percebesse? Por que eu não estava conseguindo falar sobre ele com outras pessoas? Fui engatinhando até ele. Estava deitado de lado com as costas viradas para mim. Minha cabeça girava a cada centímetro que eu me aproximava.

Passei um braço por cima dele e estiquei o pescoço para ver seu rosto dormindo.

Quase gritei quando ele segurou o meu braço, se virou de costas segurando meu corpo para me jogar por cima do dele e me virando com força no chão do outro lado. Seus dedos se enroscaram em volta do meu pescoço. Arregalei os olhos mal conseguindo respirar.

― Caramba, Ka. ― Cobra suspirou, relaxando as mãos. ― Não chega assim de surpresa.

Não conseguia dizer nada. Eu devia dar um soco bem no meio do olho dele. Mas fiquei ali, estática, sem saber por que havia me aproximado e sentindo a adrenalina de ter sido atacada.

― Machuquei você? ― Ele ergueu meu maxilar e fitou meu pescoço. ― Estou pilhado por causa disso tudo. Não consigo relaxar.

― Estou bem. ― Disse por fim. ― Só fiquei surpresa com o ataque.

― Estou sentindo cheiro de revanche.

― Vingança surpresa.

Nós rimos. Então percebi que estávamos perto demais. Me sentei rapidamente. Meu braço atingiu o nariz de Cobra sem querer e ele caiu para trás.

― Oh-ou! ― Virei seu rosto para mim. ― Não era exatamente isso que eu tinha em mente.

― De qualquer forma doeu. ― Seus olhos foram se abrindo.

Com minhas mãos segurando a extensão de seu maxilar, Cobra os retraiu, apertando os dentes. A única coisa que comecei a ouvir naquele momento foi o batucar do meu próprio coração. As mãos dele seguraram as minhas, mantendo-as ali.

― Você tá gelada. ― Ele sussurrou.

― Não. ― Pisquei com força. ― Não sei.

― Me deixa saber o que você tá sentindo, Ka. E eu saberei como agir daqui pra frente.

― Eu me sinto como uma Karina repartida no meio. ― Sussurrei. ― E agora é como se a metade de antes estivesse ficando para trás.

― E o que essa metade de agora quer?

O que eu dissesse naquele momento definiria como Cobra e eu seguiríamos dali em diante. Ele estava me dando uma chance de escolher. E como metade de mim que estava magoada e perdida em lembranças de Pedro se afastara, aquela metade nova queria ficar com ele. Não sabia por quanto tempo, nem se iria estragar o que havíamos construído. Mas depois de tudo que eu passara, aquela metade também aprendera que viver o presente era o melhor presente que a vida nos dava. E que se os contemplássemos o futuro poderia ser o mais terrível possível. Ainda teríamos um belo passado.

― Eu quero você, Cobra.

As mãos dele soltaram as minhas, subindo pelos meus braços, ombros e pescoço até alcançarem minhas orelhas e os fios do meu cabelo. O gelo do nervosismo foi derretendo com o fogo que Cobra emanava. Achei que ele fosse me puxar, mas ele fez melhor. Impulsionou o próprio corpo e se sentou, alcançando a minha boca bem devagar.

Meu coração selvagem batia enlouquecido contra a gaiola de costelas em meu peito. Fiquei de joelhos, o rosto ficando mais alto que o dele, o beijo se intensificando a medida que eu cercava seu pescoço com os braços. Os dele, por sua vez, escorregaram pela minhas costas, fechando com força ao redor da minha cintura.

Tivemos que nos lembrar que estávamos em uma varanda a céu aberto para conseguirmos para de nos beijar. Nossas bocas pareciam inchadas quando nos afastamos. Ele sorriu um pouco. E depois todo o seu rosto se iluminou em um sorriso intenso. Sorri de volta, abaixando os olhos e sentindo o meu rosto corar.

― Cobra. ― Minha voz saiu entrecortada. ― Eu... ― Tentei reunir as palavras enquanto erguia os olhos novamente para ele. ― Eu não quero que a nossa amizade acabe. Eu não quero um dia olhar para você como eu olho para o Pedro agora.

― Não posso te prometer isso, Ka. ― Ele estava sendo sincero. ― Mas posso confiar em uma história que minha mãe me contou uma vez. ― Ergui as sobrancelhas. ― Ela dizia que cada homem tem um pedaço da sua costela em alguma mulher. E aquele que conseguisse encontrar o seu pedaço de costela se sentiria completo. Você é o meu pedaço de costela. ― Nós rimos. ― Mesmo se isso tudo der errado, mesmo se um dia formos para caminhos opostos... Você sempre vai ter e ser um pedaço meu.

Eu entendia o que ele queria dizer. Ao invés de parecer opressor, ser um pedaço da costela de Cobra me pareceu reconfortante. Ele se sentia completo comigo. E eu me sentia parte dele. Passei os braços ao redor de seus ombros e os escorreguei para as costas, abraçando-o. Cobra fez a mesma coisa. Apesar do desejo latente entre nós, ainda éramos amigos. E aquilo, mais do que qualquer coisa, importava de todo o coração.

A voz de Bianca brincou na minha mente.

Cobrina, ela dissera.

Naquele momento eu soube que não importava as circunstâncias... Cobrina seria para sempre.


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