Eu podia sentir o mar próximo de mim.

Abri os olhos lentamente e passei o olhar pelo local a minha volta. As ondas baixas, os coqueiros á leste, a areia da praia, o vento em meus cabelos me faziam bem. Afinal, como um bom filho de Poseidon eu adorava tudo isso.

Bryan estava estirado próximo ao mar, estava vivo, é claro. Esse foi o acordo.

Me veio a memória o que acontecera horas atrás. Ou seriam dias?

Flashback On

Apolo, Bryan e eu estávamos á semanas nos domínios da Morte. Tânatos ainda não havia se decidido quanto ao fato de salva Luke, Annabeth e Ashley.

Sentado na cadeira de praia estava Apolo, seu sorriso costumeiro não estava mais lá. Eu sabia bem o porquê, o mesmo acontecera comigo. Nosso encontro com o deus da morte iria começar em instantes, sabíamos bem o que poderia acontecer caso não tirássemos os três do Tártaro naquele dia, Ashley estava quase cedendo completamente e eu tinha que evitar.

Eu tinha que evitar porque eu sabia o motivo que a fizera ceder, o que me deixou um pouco na dúvida: será que ela estava errada em desejar um futuro para nós?

O simples fato de saber que ela pensa em mim acende uma chama em meu interior, chama essa que se apaga quando penso que ela está sozinha em algum lugar daquele interminável abismo de dor e solidão. Eu a tirarei de lá nem que tenha que me arrastar pelas profundezas do próprio Tártaro.

30% de mim estavam com medo, os outros70% estavam completamente apavorados.

Encontrar a Morte com M maiúsculo? Mais um feio estranho para a lista das Coisas-que-o-Percy-já-teve-que-fazer-na-sua-curta-e-deprimente-vida.

Ótimo, as coisas só pioram para mim.

No momento em que conclui meu pensamento entra um anjo de asas negras, não qualquer anjo. O anjo.

Sua postura era de anjo, seu rosto era de anjo, sua expressão dura era de anjo, seu olhar era de anjo.

Se bem que se eu encontrasse aquela figura num beco escuro eu corria.

Entenda, não é anjo de bonito, é anjo de assustador mesmo. Você deve estar se perguntando: como um anjo pode ser assustador.

Conheça a morte e vai entender o que eu digo.

–Creio que vocês não precisam dizer o que vieram me pedir, pois já sei. Não são os primeiros que me pedem esse... Favor. A resposta depois de tanta pressão é obvia: sim, eu tirarei os semideuses do Tártaro, com um preço, é claro.

Nossa, esse deus dispensa qualquer formalidade – pensei comigo mesmo.

Não posso dizer que fiquei chocado com a resposta “com um preço, é claro”. Afinal, que deus olimpiano faz qualquer coisa de graça? Um deus bom, talvez.

Se bem que não existem deuses bons.

–Tirarei a menina sem lesões, mas os outros dois ficarão um tempo em coma. Tempo esse que vocês determinam. A quantidade de tempo que passarem em Ogígia será a mesma que eles passarão adormecidos. Depois de dez dias em coma, eu irei busca-los da pior forma.

Flashback Off

Sim, eu sabia onde estava e se dependesse de mim sairia naquele exato momento, Calipso já deve estar chegando e tenho como objetivo não deixar que ela note minha presença.

Arrastei Bryan até a sombra de uma palmeira, de modo que quem estivesse da praia não conseguisse nos ver. Segundo meus cálculos Apolo mandaria o barco em minutos. Ficar em silencio e escondido por tão pouco tempo não era tão difícil, certo?

Errado.

–Sabia que fugir dos outros é feio? – perguntou uma voz atrás de mim.

–Sim, sabia – respondi, soando mais grosseiro do que pretendia.

Calipso abaixou a cabeça, indicando que ia chorar.

Seus cabelos cor de mel estavam presos em uma trança bem feita e ela usava um vestido branco sem mangas no estilo grego, seus olhos eram de um tom de castanhos claro quase verdes e sua expressão fez eu me arrepender de ser rude com ela.

–Me desculpe, está bem? É que eu não posso ficar. Nós não podemos...

–Espera um pouco, dois? Ah, não! As Parcas me odeiam, não é possível – lamentou-se – Você tem razão, vamos acabar logo com isso. Um deus vai aparecer logo e você vai embora, o mais rápido possível – disse ela, saindo em seguida.

Confesso que fiquei arrasado por não poder fazer companhia a ela, quem sabe em outras circunstâncias mais favoráveis eu possa... Foco Percy! O barco vai chegar e você vai sair dessa ilha e voltar pros seus amigos, simples assim.

E assim se passaram horas, ou quem sabe dias.

Bryan já havia acordado e não parava de reclamar, porém eu já tinha parado de prestar atenção faz tempo, então nem me incomodei com isso, meu estomago roncava e eu estava com sono.

Bryan se ofereceu para ficar de guarda enquanto eu dormia, concordei e me deitei na areia.

(...)

Sabe quando você tira um cochilo a tarde e acorda sem saber se hoje ainda é hoje ou se você dormiu até o dia seguinte?

Foi bem assim que eu me senti quando vi o Bryan e a Calipso fazendo um piquenique na praia. O filho de Hades me deixou sozinho na mata, dormindo na areia molhada e foi comer um sanduiche natural com uma desconhecida. Típico.

Minha vontade era de arrastar o maldito pelo braço e sair nadando até Nova York, mais precisamente até o antigo Acampamento Meio-Sangue, onde nesse momento a Ashley deve estar se perguntando onde nós dois estávamos. Ou pior, deve estar fazendo isso ao lado de Apolo.

Um nó se formou em minha garganta ao ter esse pensamento nada feliz. Mas uma vez esse tipo de coisa acontece comigo. Por que deuses? Por quê? Me levanto completamente seco - ser filho de um deus do mar tem suas vantagens - e vou caminhando até o “casal” com meu melhor sorriso.

–Oi amigos, como vai o dia? Não sei se vocês sabem mais tem umas duas pessoas em coma que dependem de mim, então Calipso se me der licença eu vou arrastar esse semideus aqui e afoga-lo com minhas próprias mãos – felei, ainda sorrindo.

–Percy, eu vou ficar – disse Bryan.

–Que bom que resolveu sair logo daqui, o barco deve estar chegando e... O que? V-Você vai deixar os seus amigos morrerem? – falei, só depois percebendo o real sentido da frase do filho de Hades.

–Se você voltar eles não vão morrer, eu ficarei com a Cali e você não vai fazer nada para impedir. – falou, me apontando o barco – Sua carona chegou.

Antes de partir acertei um soco bem dado em sua barriga e fui em direção ao mar.