Sora - Reaching For The Sky escrita por Assa-chan


Capítulo 3
Shings




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/57064/chapter/3

”Lucy sempre me dizia que quando ela era pequena, vivia pedindo ao seu avô para contar a história dos três shings lendários, enquanto segurava uma velha foto em preto e branco do céu.

Ele a recitava todas as vezes, como se não se cansasse daquele seu ato repetitivo. Mas aquele conto de fadas por muito tempo foi a única coisa em que ela acreditou.

Diz a lenda, que antes do Apocalipse, três robôs feitos com ossos de humanos foram criados para que depois do fim, eles pudessem levar a humanidade de volta para os céus. Portanto foram enterrados, e quando chegasse a hora, iriam voltar a caminhar e cumprir a promessa. Mas com o tempo, acredito que ela foi se esquecendo daquela fábula. Perdendo os detalhes, lembrando-se somente do sonho de ver o céu. E este... Foi o motivo do seu fim.”


Estava frio. Aquela fortaleza era, realmente, a mais gelada de todas. Mas a garota, ainda sem fôlego por ter atravessado toda aquela cidade correndo, nem sentia o frio mesmo com aquelas roupas finas. O cansaço parecia ser bem menor que a curiosidade, pois com o mesmo ritmo ela subiu os inúmeros degraus das escadas que levavam ao escritório de seu avô. Enquanto passava sem olhar para dentro das salas que encontrava no caminho, todos lhe davam bom dia, porém ela sequer escutava. Abriu a porta com força, sem escutar as reclamações da secretária que dizia ter que avisar antes da garota entrar.

Por trás daquela porta, encontrou seu avô sentado sobre a mesma cadeira de rodas de sempre, com aquela mesma expressão alegre que é a primeira de suas memórias.

- Vô! – gritou, respondendo ao sorriso. Caminhou até chegar perto dele, abaixando-se.

- Lucy. – ele falou quase no mesmo instante, olhando para a neta à sua frente. – Vamos, levante-se. – continuou, apertando um botão no braço de sua cadeira, fazendo-a se movimentar.

A garota obedeceu imediatamente. Seu escritório não era grande, e o atravessaram em poucos instantes. As paredes eram brancas, os móveis feitos em madeira, e até mesmo a decoração era bem sutil. Somente um quadro de sua amada neta ainda criança foi pendurado na parede atrás de sua mesa.

Logo se depararam de frente pra uma estante cheia de livros. A Greiner reconheceu de imediato aquele lugar, e sabia exatamente o que seu avô faria; puxar um livro. Ou melhor, um livro sobre alquimia, o quinto da antepenúltima prateleira. E assim foi feito, abrindo uma entrada secreta, que nem era tão confidencial assim para a jovem. Praticamente a estante se moveu de 60º, mostrando-lhes um local totalmente diferente do anterior.

As paredes não tinham sequer reboco, mostrando o muro feito com tijolos produzidos a partir da reciclagem. Dois computadores desligados estavam sobre uma mesma mesa, e a luz ali era bem fraca, em um tom verde. Era neste recinto que os projetos individuais de seu avô vinham feitos. Aquele era o covo de seus experimentos, quase todos por pedido da neta. Mas muitas vezes ela nem precisava pedir para que ele fizesse algo que desejava.

Entraram, e logo Lucy passou à frente do presidente da companhia, ao ver aquilo que sabia que iria presenciar. Seus olhos se abriram mais do que de costume ao notar aquele rapaz quase despido mergulhado dentro de um liquido viscoso e da mesma cor da pouca luz que tinha naquela espécie de laboratório. Tampou sua boca, escondendo os soluços. Todavia as lágrimas caíram de qualquer jeito, molhando seus finos e pálidos dedos. Quando notou, seu avô George já estava ao seu lado, olhando na mesma direção que ela.

- Esse... – Ela tentou falar, sem muito sucesso. Logo uma de suas mãos desceu até seu colo, segurando um pingente que estava em seu colar.

- ...Sim. – o senhor de lá seus oitenta anos se pronunciou, como se estivesse lendo os pensamentos da adorada neta. – Este é o shing que você tanto queria ver.

A jovem acabou cedendo à emoção, caindo de joelhos no solo. Aquelas eram lágrimas de felicidade, e o homem ao seu lado sabia, por isso sorria em silêncio.

- Mas como...? – Ela sussurrou, agora segurando com as duas mãos o pingente, sem acreditar nas palavras que ouvia nem na imagem inusitada que via.

- Lucy... – Ele a olhou com afeto, satisfeito com a reação dela. Todo aquele trabalho tinha valido a pena. – Eu sou o dono da Hades Corporation. Eu lhe prometi que iria trazer um deles para você, certo? Realmente acha que há algo que eu não possa fazer?

Ela respondeu negativamente, ainda com as incontáveis e salgadas lágrimas sobre o rosto. Seus olhos choravam, mas sua boca sorria.

- Que nome você lhe deu? – ela tentou se recompor, limpando seu pranto com uma das mãos. Mas a outra continuava apegada ao pendente em seu colar.

- Sora. – respondeu.

- Eu já sabia. – fechou os olhos, levantando o rosto. Era o mesmo nome que estava em seu pingente. Aquele kanji era tão precioso quanto sua vida. A primeira memória que ela tem de si mesma é do sorriso de seu avô, dando-lhe este presente. Explicando-lhe que aquilo significava céu. O céu que ela tanto procurava desde que se reconhece como humana.

- Claro que sabe. Ele tem este nome...

- ...Por que nasceu sob os céus. – concluiu Lucy, com uma expressão contente.



Ela chegou ao seu trabalho, mas já estava cansada antes mesmo de começar. Limpou seus óculos com aquele lenço vermelho pela milésima vez, numa tentativa inútil de perder tempo. Mas para aquele gesto ela não gastava nem mesmo vinte segundos.

- Senhorita Bersezio! – um rapaz meio baixo exclamou, correndo em sua direção. Annalisa revirou os olhos, pensando que seria mais um trabalho como todos os outros: estressante e inútil.

- Diga, Philippe. – Annalisa respondeu ainda caminhando, enquanto entrava em uma sala repleta de pessoas com camisas iguais à sua.

- O senhor Chambers deseja vê-la. – ele falou, abaixando o tom de voz.

- Por quê? - pediu sem interesse, adentrando seu escritório ainda sendo seguida pelo aparente aprendiz.

- Ele tem um trabalho especial para a senhorita. - parou na frente da porta, vendo-a se sentar atrás da escrivania repleta de folhas.

- Certo. - convenceu-se - Diga-lhe que estou indo daqui a pouco.

Henry Chambers era o tipo de homem em que não se deve confiar; ambicioso e sem escrúpulos trando-se de algo que almeja. Era o vice-presidente da Hades Corporation, além de ser o braço direito de George Greiner em absolutamente tudo.

Levantou-se, ainda sem vontade. A cabeça doía com o barulho de pessoas correndo de um lado para o outro, e não conseguia pensar em um motivo para Henry querer falar com ela.

Atravessou novamente a sala em que tinha acabado de passar, segurando a cabeça com uma mão pra tentar ignorar a irritante presença daquelas pessoas. Começou a subir as escadas que levavam até o andar superior ao seu, onde ficava o escritório do vice-presidente Chambers. Ao chegar deparou-se com a visão de sua secretária: uma mera garotinha de traços orientais. Cabelos lisos, negros e finos, chegavam a pouco abaixo dos ombros. Magra, e pelo jeito bem vaidosa, pois no momento estava maquiando-se.

- Perdão...? - a cientista interrompeu-a, pondo-se à sua frente.

- Desculpa. - a menina disse, fechando o beauty case - Annalisa Bersezio, certo? O senhor Chambers a está esperando. Pode entrar. - concluiu, apontando para a porta atrás de si.

A loira assentiu, caminhando até a entrada mostrada-lhe anteriormente. Abriu-a, encontrando uma sala de dimensão bem superior à sua, com espelhos, detalhes e quadros por todas as partes. Focou o olhar ao centro, notando o vice-presidente sentado em sua cadeira que precedia uma vidraça que cobria totalmente a parede atrás dele. A panorâmica era simplesmente incrível, mas o ar cinzento da fortaleza não permitia que esta também fosse bela.

Henry, realmente, tinha uma aparência que refletia completamente sua personalidade: em sua vida tinha percorrido pouco mais de quarenta anos, mas por algum motivo - muito provavelmente estress -, demonstrava possuir ao menos dez a mais. A pele era clara, no entanto não chegava a ser alva. Os cabelos castanhos apresentavam os sinais da idade meio avançada através dos fios grisalhos aqui e ali, além das marcas de expressão claramente expostas perto da boca e ao lado dos olhos.

- Acomode-se. - ele disse quase em um sussurro, apontando pra cadeira pouco àdiante de sua escrivania - Estive esperando-a.

- Certo. - concordou sem pensar duas vezes, obedecendo-o.

- Imagino que não saiba o motivo de estar aqui. - o homem entrelaçou os dedos, apoiando a face sobre os mesmos. Sua voz, antes baixa, demonstrou um tom grave e forte, percorrendo todo o recinto.

- Acertou, senhor. - Annalisa parecia apreensiva, e Henry o percebera ao primeiro olhar.

- Não quero te deixar mais nervosa. - um leve sorriso apareceu nos lábios finos, desaparecendo instantes depois - Eu e o Sr. Greiner decidimos que você seria a melhor cientista para levar adiante o projeto "S".

- Projeto "S"? - repetiu - Nunca ouvi falar sobre isso.

- É claro que não. - ele afastou sua cadeira da mesa à qual estava apoiado antes, erguendo-se - Este é um assunto confidencial.

- Com todo respeito, - sua voz recebeu um tom ligeiramente irônico - mas por que uma empregada de calão C como eu deveria ser a encarregada de algo tão importante?

- Gosto da sua personalidade. - ele passou à frente do móvel que os separava antes, escorando-se ao mesmo - Entretanto, o fato é que nós dois conhecemos seu potencial, senhorita Bersezio. O que fez com a alma daquele homem... Foi simplesmente sublime. Eu não consegui acreditar no que meus olhos viam ao ler a sua tese. Nem sequer um erro de cálculo. Você conseguiu prender algo que deveria ter desaparecido.

- ...Deixando isso de lado, - Annalisa fez um semblante triste, quase arrependido - como minha pesquisa poderia ajudar nesse tal projeto?

- Foi encontrado um robô. - ele fez uma pausa, enquanto a mulher escutava-o atentamente - Um robô feito durante o Apocalipse.

- Isso não é grande coisa. Acham-se pedaços de coisas do Apocalipse todos os dias.

- Você não me deixou terminar. - Henry cruzou os braços, dando uma entoação séria ao que estava por dizer - O sistema central dele é tão complexo que nem mesmo o próprio presidente da Hades Corp conseguiu reconstruí-lo. Nós encontramos vários pontos semelhantes entre este sistema e as informações presentes na sua tese... Parece quase uma alma humana.

- Aonde quer chegar? - ela lhe lançou um olhar desafiador, juntando as sobrancelhas. Começava a se cansar de andar em circulos sem chegar a conclusão alguma.

- Queremos que a senhorita reconstrua seu corpo e "alma". Poderá utilizar o laboratório de sua casa, se quiser. - ele viu uma expressão assustada nela, logo soltando um leve sorriso - O que foi, achava mesmo que ninguém soubesse sobre as instalações por baixo de seu domicilio? Não há nada que este governo não saiba, senhorita Bersezio. - concluiu, dando ênfase à palavra "nada".

- Eu posso pensar sobre isso? - ela encolheu-se por um segundo, desviando o olhar.

- Este não é um pedido, em primeiro lugar. Por enquanto o fato de você fazer experimentos por conta própria foi escondido pela nossa empresa com o propósito de utilizar aquele laboratório... - Annalisa voltou a encará-lo - Mas se realmente rejeitar a oferta, seremos obrigados a pedir que o governo a trate como todos os outros... E sabe muito bem que a pena por este reato é a morte.

- Isso é chantagem. - reprovou-o com o olhar, indignada.

- Esses são negócios. - corrigiu-a, mostrando certa superioridade - Então aceita?

- E eu tenho escolha? - fez uma pergunta retórica, sem deixar espaço para que Henry pudesse argumentar - Mas... Ao menos posso vê-lo?

- Me parece óbvio. - desencostou-se da escrivania - Venha. - lhe fez um sinal com a mão.

Annalisa hesitou, mas diante de algo obrigatório não poderia fazer a menos de segui-lo. Viu-o abrir uma porta posta na parede lateral daquele recinto, segurando-a aberta com uma mão enquanto olhava a mulher avançar até perto dele.

Fitou Henry com receio, antes de escorrer os olhos para dentro da sala. Prendeu a respiração pelos quatro segundos que seguiram aquele momento. Fechou os olhos, soltando o ar. Abri-los seria inevitável.

Lá estava ele; em cima de uma mesa de metal posta em um canto qualquer daquele lugar totalmente branco. De seu corpo tinha sobrado somente a carcassa. Mas o rosto, estranhamente, continuava intacto além de um ou dois arranhões. Os cabelos eram negros. A pele meio suja aparentava ser estremamente branca por trás do estrato de poeira. Os olhos, agora fechados, possuíam longos cílios negros.

Se aproximou, juntando as sobrancelhas. Um dos braços dele simplesmente tinha desaparecido. Os fios quebrados saiam diretamente do ombro direito, e podia claramente ver leves faíscas de eletrecidade transparecerem dos mesmos.

O braço esquerdo se encontrava privo de dois dedos. A blusa vermelha estava rasgada e cobria somente até a parte de seu umbigo, enquanto a parte inferior de seu corpo parecia ter-lhe sido arrancada completamente.

- Vou ter muito trabalho. - ela pegou a mão dele, sentindo um estranho calor na mesma. Arregalou os olhos; parecia que ele tinha se movido. Balançou a cabeça, tentando se desmentir. Entretanto, tocar seu rosto foi quase automático. Sorriu, aceitando finalmente o desafio.

Seria divertido repetir os passos que fizeram-na cometer um pecado por amor.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Bem... Esse capitulo (como podem notar) infelizmente não foi betado por que tem uma boa diferença de horario que me impede de encontrar minha BETA reader online. -__-
Puxem minha orelha se acharem erros e coisas assim. >