1º Capítulo – Entre Morangos e Maçãs.

Acordo ouvindo os berros do meu irmão mais novo, Eric, chorando ao lado da minha cama. Aquela era a segunda vez na mesma madrugada que o garoto interrompe meu sono. Não que ele não tenha motivos para fazer isso, tem até demais. Ele só está assim porque hoje é dia de Colheita. Suas mãos procuraram os meus braços para me chacoalhar.

–Jasmine... -– sussurrou – Posso dormir aí? Por favor! – pediu

– Ok, pode vir Eric – Ele se deitou de costas para mim. E tentou continuar dormindo. Olhei para a janela, o sol quase estava saindo. Resolvi levantar e me ajeitar para colher os morangos, enquanto meu pai dormia. Coloquei uma camiseta e uma calça com uma bota. E fui com minha grande cesta colher alguns morangos e maças.

Meus pensamentos não fugiam dos Jogos. Aquela seria a 15ª Edição dos Jogos Vorazes, E eu não passo de uma garota de 17 anos que treina com um machado sem fio do meu pai. Sou do distrito que nunca teve um vencedor. Um dos distritos mais esquecidos de toda a Panem, o Sete. Se eu fosse sorteada, não teria chance com os carreiristas do 1,2 e 4. Deitei no meio do pomar de morangos. Colocando alguns na boca. O sabor do morango e o tempo ensolarado definitivamente não combinavam com aquele dia. Fiquei uns 15 minutos pensando e ouvindo as Machadadas do quintal da minha casa. Meu pai estava começando a cortar a lenha. Fui até ele com as cestas fartas de morangos e maçãs.

– Olá mocinha. –Disse meu pai com o machado apoiado no pedaço de madeira que ele estava cortando. – Vai vender agora essas belezinhas? –Ele pegou um morango e comeu.

–Aham... – Olhei para o machado – Como o Eric está?

– Sua mãe tá cantando aquela música que ela cantava para você quando era pequena. –Ele jogou o galhinho do morango no chão e pegou o machado. –Acho melhor você cuidar as palavras, Jas. Esse é o primeiro ano do seu irmão, com certeza você é bem mais preparada que ele.

Balancei a cabeça afirmando.

– Eu tenho que ir, Papai. – Beijei sua bochecha e fui em direção ao mercado, antes passo na minha janela e fico espiando minha mãe cantar com sua voz suave a canção de ninar.

Você está, você está

Vindo para a árvore?

Use um colar de corda, lado a lado comigo

Coisas estranhas aconteceram aqui

Não seria estranho

Se nos encontrássemos à meia-noite na árvore-forca

Aquela era uma das proibidas, meu pai não gostava dessas cantigas. Ela sempre cantava longe dele. Segui caminhando para o mercado. Fui direto para a barraca de uma senhora que já era minha cliente. Claire, era seu nome. Em troca ela me deu um colar com uma bússola e algumas moedas. Fui até a padaria e comprei 4 pães. Aquela seria nosso almoço com algumas maçãs e morangos do quintal. Não éramos tão pobres como as outras pessoas do Distrito, mas morávamos digamos que numa periferia do Distrito. Dava para sobreviver. Quando eu era pequena, corria pelos pomares junto com meu amigo, Bradley. Ano passado, ele foi para os jogos, ficou em 2º lugar, foi morto por um carreirista do Distrito Dois. Ele era a pessoa mais inteligente e forte que eu conhecia. E até hoje sinto falta das minhas conversas com ele comendo morangos e roubando coisas da Padaria. Lembro-me do meu primeiro beijo, foi com ele. Lembro do primeiro arco que eu fiz, foi com ele. Também lembro do quanto ele me ajudou com o machado e o arco. Hoje, as lembranças só ficaram em uma única foto que eu tenho dele, uma semana antes da colheita do ano passado. Entrei em casa e coloquei as compras encima de uma mesa. Depois do almoço, fui tomar um rápido banho, coloquei o mesmo vestido do ano passado, verde claro, sapatilhas e cabelo preso em uma única trança e o colar de bússola. Ele era pequeno e delicado, mas a bússola funcionava perfeitamente. Olhei para o espelho e eu parecia enxergar Brad, ao meu lado, sorrindo. Ele estava do mesmo jeito, Cabelos grandes e cacheados, olhos verdes, expressão de menino travesso. Como sinto falta dele.

Esperei Eric que estava quase pronto, e comecei a ouvir as sirenes. Eric rapidamente foi para o meu lado e segurou minha mão. Meus pais foram de mãos dadas, suas expressões estavam totalmente desesperadas, como se nós já estivéssemos dentro da Arena. Fomos caminhando até chegar o Edifício da Justiça. Já estava cheio de jovens. Beijei a testa do meu irmão e fui para a fila aonde retiraram um pouco de meu sangue e fui para o lugar das meninas da minha idade. Fiquei observando as expressões das meninas da minha idade, não estavam tão diferentes de mim. Em poucos minutos, uma mulher, mais conhecida como Gwen Valentine, Começou a falar e falar da Capital e logo depois o mesmo vídeo do ano passado, só que narrado com uma voz de um homem mais novo. Aquele era o novo presidente, Snow. Esse homem, era um pirralho no poder. Como um garoto de 18 anos pode ser Presidente de um país que sempre foi um caos? E com certeza, não vai tirar o entretenimento da capital.

–Vamos começar pelas garotas! – falou animadamente, retirando um papel do enorme aquário. Repeti várias vezes “Eu não, Eu não...”. – Jasmine Grace, –Mas não adiantou. Engoli a seco, todos olhavam para mim. Algumas meninas aliviadas, outras sérias. Os garotos me olhavam com pena, talvez imaginando meu corpo coberto de sangue dentro da arena. Fechei meus punhos e andei lentamente para o palco, com dois ou três pacificadores ao meu lado. Gwen insistia em sorrir e falar para todos aplaudirem. Todos ficaram em silêncio. Novamente a mulher de cabelo roxo foi para o aquário de papéis e retirou um.

–Eric Grace. – Fechei automaticamente os olhos, tentando não deixar nenhuma lágrima escapar.